| D.E. Publicado em 03/05/2017 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0014243-48.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | MARIA REMILDA DE OLIVEIRA VIEIRA |
ADVOGADO | : | Andréa Roldão dos Santos Munhoz e outros |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. REQUISITOS LEGAIS NÃO PREENCHIDOS.
. A aposentadoria rural por idade é devida a trabalhador qualificado como segurado especial, nos termos do art. 11, VII, da Lei nº 8.213/91 e pressupõe a satisfação da idade mínima (60 anos para homens e 55 para mulheres) e a demonstração do exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, independentemente do recolhimento de contribuições previdenciárias.
. O exercício de atividades de natureza urbana pelo cônjuge da autora, abrangendo a totalidade do período de carência e auferindo renda em valor superior a dois salários mínimos, demonstram a prescindibilidade do labor agrícola, afastando a condição de segurada especial.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação da parte autora, nos termos da fundamentação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 25 de abril de 2017.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal ROGER RAUPP RIOS, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8911551v2 e, se solicitado, do código CRC 451EB4AE. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Roger Raupp Rios |
| Data e Hora: | 25/04/2017 18:32 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0014243-48.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | MARIA REMILDA DE OLIVEIRA VIEIRA |
ADVOGADO | : | Andréa Roldão dos Santos Munhoz e outros |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
RELATÓRIO
Trata-se de apelação contra sentença que julgou improcedente o pedido de aposentadoria por idade rural, e que condenou a parte autora a pagar as custas processuais e honorários advocatícios, esses fixados em R$ 500,00 (quinhentos reais), com base no art. 20, §4º, do CPC/1973. Foi suspensa a execução da referida verba sucumbencial, em face da assistência judiciária gratuita concedida.
Em suas razões, sustenta a parte autora que faz jus ao benefício postulado, porque provou ter exercido a atividade rural, como bóia-fria, no período de carência por meio de início de prova material, corroborada por prova testemunhal. Aduz que o trabalho urbano exercido pelo seu cônjuge no período de carência não descaracteriza a sua condição de segurada especial. .
Sem contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
A parte autora peticionou (fls. 170), requerendo a prioridade de tramitação no feito.
É o relatório.
VOTO
Do novo CPC (Lei 13.105/2015)
Consoante a norma inserta no art. 14 do atual CPC, Lei 13.105, de 16/03/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Portanto, apesar da nova normatização processual ter aplicação imediata aos processos em curso, os atos processuais já praticados, perfeitos e acabados não podem mais ser atingidos pela mudança ocorrida a posteriori.
Nesse sentido, serão examinados segundo as normas do CPC de 2015 tão somente os recursos e remessas em face de sentenças/acórdãos publicado(a)s a contar do dia 18/03/2016.
Da ordem cronológica dos processos
Dispõe o art. 12 do atual CPC (Lei nº 13.105/2015, com redação da Lei nº 13.256/2016) que "os juízes e os tribunais atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão", estando, contudo, excluídos da regra do caput, entre outros, "as preferências legais e as metas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça" (§2º, inciso VII), bem como "a causa que exija urgência no julgamento, assim reconhecida por decisão fundamentada" (§2º, inciso IX).
Dessa forma, deverão ter preferência de julgamento em relação àqueles processos que estão conclusos há mais tempo, aqueles feitos em que esteja litigando pessoa com mais de sessenta anos (idoso, Lei n. 10.741/2013), pessoas portadoras de doenças indicadas no art. 6º, inciso XIV, da Lei n. 7.713/88, as demandas de interesse de criança ou adolescente (Lei n. 8.069/90) ou os processos inseridos como prioritários nas metas impostas pelo CNJ.
Observado que o caso presente se enquadra em uma das hipóteses referidas (preferências legais), justifica-se seja proferido julgamento fora da ordem cronológica de conclusão.
Da aposentadoria rural por idade
São requisitos para a concessão de aposentadoria rural por idade, no valor de um salário mínimo, a trabalhador qualificado como segurado especial, nos termos do art. 11, VII, da Lei nº 8.213/91: (a) idade mínima (60 anos para homens e 55 para mulheres) e (b) exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao da carência de 180 meses (arts. 39, I, 48, §§1º e 2º, e 25, II da Lei nº 8.213/91), independentemente do recolhimento de contribuições previdenciárias.
Quanto à carência, há regra de transição para os segurados obrigatórios previstos no art. 11, I,"a", IV ou VII: (a) o art. 143 da Lei de Benefícios assegurou "aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência no referido benefício"; b) o art. 142 previu tabela específica de prazos diferenciados de carência, conforme o ano de implementação das condições para a aposentadoria por idade, por tempo de serviço e especial, "para o segurado inscrito na Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, bem como para o trabalhador e o empregador rural cobertos pela Previdência Social Rural".
Assim, àqueles filiados à Previdência quando da edição da Lei nº 8.213/91 que implementarem o requisito idade até quinze anos após a vigência desse dispositivo legal (24-7-2006), não se lhes aplica o disposto no art. 25, II, mas a regra de transição antes referida.
Na aplicação da tabela do art. 142, o termo inicial para o cômputo do tempo de atividade rural é o ano em que o segurado completou a idade mínima, desde que já disponha de tempo suficiente para o deferimento do pedido, sendo irrelevante que o requerimento tenha sido efetuado em anos posteriores, ou que na data do requerimento o segurado não esteja mais trabalhando, em homenagem ao princípio do direito adquirido (art. 5º, XXXVI, da CF/88 e art. 102, §1º, da Lei nº 8.213/91).
Na hipótese de insuficiência de tempo de exercício de atividade rural ao completar a idade mínima, a verificação do tempo equivalente à carência não poderá mais ser feita com base no ano em que atingida a idade mínima, mas a partir de sua implementação progressiva, nos anos subseqüentes à satisfação do requisito etário, de acordo com a tabela do art. 142 da Lei de Benefícios.
Caso o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31-8-1994 (data da publicação da Medida Provisória nº 598, que alterou a redação original do art. 143 referido, posteriormente convertida na Lei nº 9.063/95), o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, anterior ao requerimento, por um período de 5 anos (60 meses), não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei n° 8.213/91.
A disposição contida no art. 143 da Lei 8.213, no sentido de que o exercício da atividade rural deve ser comprovado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada em favor do segurado; ou seja, tal regra atende àquelas situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente a comprovação do exercício do labor rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser temperada em função do disposto no art. 102, §1º, da Lei de Benefícios e, principalmente, em atenção ao princípio do direito adquirido, como visto acima.
O benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo; ou, inexistente este, da data do ajuizamento da ação, conforme modulação contida no julgamento do RE 631.240.
Da comprovação do tempo de atividade rural
O tempo de serviço rural pode ser comprovado mediante a produção de início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea - quando necessária ao preenchimento de eventuais lacunas - não sendo esta admitida exclusivamente, salvo caso fortuito ou força maior. Tudo conforme o art. 55, § 3º, da Lei n.º 8.213/91 e reafirmado na Súmula n.º 149 do STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário).
Nesse contexto probatório: (a) a lista dos meios de comprovação do exercício da atividade rural (art. 106 da Lei de Benefícios) é exemplificativa, em face do princípio da proteção social adequada, decorrente do art. 194 da Constituição da República de 1988; (b) não se exige prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, sendo suficientes documentos que, juntamente com a prova oral, possibilitem juízo conclusivo quanto ao período de labor rural exercido; (c) certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural da parte autora (REsp n.º 980.065/SP, DJU, Seção 1, 17-12-2007; REsp n.º 637.437/PB, DJU, Seção 1, de 13-09-2004; REsp n.º 1.321.493-PR, DJe em 19-12-2012, submetido à sistemática dos recursos repetitivos.); (d) quanto à contemporaneidade da prova material, inexiste justificativa legal, portanto, para que se exija tal prova contemporânea ao período de carência, por implicar exigência administrativa indevida, impondo limites que não foram estabelecidos pelo legislador.
As certidões da vida civil, documentos admitidos de modo uníssono pela jurisprudência como início probatório de atividade rural, no mais das vezes, registram fatos muito anteriores à implementação da idade de 55 ou 60 anos, e fora dos prazos constantes do art. 142 da Lei 8.213/91. O período de carência, em se tratando de aposentadoria por idade rural, correspondente a estágio da vida do trabalhador em que os atos da vida passíveis de registro cartorário, tais como casar, ter filhos, prestar serviço militar, ou inscrever-se como eleitor, foram praticados muito antes do início do marco para a contagem da carência prevista para tal benefício.
Nesse sentido, a consideração de certidões é fixada expressamente como orientação pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ, 3ª Seção, REsp 1.321.493-PR, procedimento dos recurso repetitivos, j.10/10/2012). Concluiu-se imprescindível a prova material para fins previdenciários, ainda que o labor tenha sido exercido à margem da formalidade, cabendo às instâncias ordinárias a verificação da condição de trabalhador:
"E, nesse aspecto, por mais que o trabalho seja informal, é assente na jurisprudência desta Corte que há incontáveis possibilidades probatórias de natureza material. Por exemplo, ainda que o trabalho tenha sido informal, constatando-se que o segurado tem filhos ou é casado, devem ser juntadas certidões de casamento e de nascimento, o que deve ser averiguado pelas instâncias ordinárias."
De todo o exposto, consideradas as notórias e por vezes insuperáveis dificuldades probatórias do segurado especial, é dispensável a apresentação de prova documental de todo o período, desde que o início de prova material seja consubstanciado por prova testemunhal, nada impedindo que sejam contemplados os documentos extemporâneos ou emitidos em período próximo ao controverso, desde que levem a supor a continuidade da atividade rural.
Ademais, já restou firmado pelo Colendo STJ, na Súmula 577 (DJe 27/06/2016), que "É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório.".
Registre-se, por fim, que, em se tratando de aposentadoria por idade rural, tanto os períodos posteriores ao advento da Lei 8.213/91 como os anteriores podem ser considerados sem o recolhimento de contribuições. Quanto à Carteira de Identificação e Contribuição, prevista no art. 106 da Lei 8.213/91 como necessária à comprovação do exercício de atividade rural a partir de 16.04.94, trata-se de documento voltado principalmente à esfera administrativa, sendo instrumento que visa a facilitar futura concessão de benefício ou reconhecimento de tempo de serviço e cuja expedição, via de regra, ocorre após a comprovação junto à entidade pública das alegadas atividades agrícolas. Uma vez expedida, é instrumento hábil, por si só, àquela comprovação. Todavia, a inexistência do referido documento não obsta ao segurado demonstrar sua condição de segurado especial por outros meios, mormente no âmbito judicial. Se a parte autora tivesse CIC expedida em seu nome não necessitaria postular o benefício em juízo, pois com base nesse documento é de supor-se que o próprio INSS já o concederia administrativamente, porque assim prevê a Lei de Benefícios.
Da prova da atividade rural prestada como boia-fria
No caso de exercício de trabalho rural caracterizado por sua notória informalidade, comprometendo a prova da atividade e, por conseguinte, a obtenção do benefício previdenciário, a jurisprudência pacificada por esta Corte era no sentido de abrandar a exigência relativa ao início de prova material, admitindo, até mesmo, em situações extremas, a comprovação da atividade exclusivamente por meio de prova testemunhal.
Todavia, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento, em 10-10-2012, do Resp nº 1.321.493/PR, representativo de controvérsia, firmou o entendimento de que se aplica também aos trabalhadores boias-frias a Súmula 149 daquela Corte. Sobressai do julgado que o rigor na análise do início de prova material para a comprovação do labor rural do boia-fria, diarista ou volante, deve ser mitigado, de sorte que o fato de a reduzida prova documental não abranger todo o período postulado não significa que a prova seja exclusivamente testemunhal quanto aos períodos faltantes. Assim, devem ser consideradas as dificuldades probatórias do segurado especial, sendo prescindível a apresentação de prova documental de todo o período, desde que o início de prova material seja consubstanciado por robusta prova testemunhal.
Cumpre salientar, também, que, muitas vezes, a Autarquia Previdenciária alega que os depoimentos e informações tomados na via administrativa apontam para a ausência de atividade agrícola no período de carência. Quanto a isso, deve ser dito que as conclusões a que chegou o INSS no âmbito administrativo devem ser corroboradas pelo conjunto probatório produzido nos autos judiciais. Existindo conflito entre as provas colhidas na via administrativa e em juízo, deve-se optar pelas últimas, produzidas que são com todas as cautelas legais, garantido o contraditório.
Da prova da atividade em regime de economia familiar
O §1º do art. 11 da Lei de Benefícios define como sendo regime de economia familiar aquele em que os membros da família o exercem "em condições de mútua dependência e colaboração", sendo que os atos negociais da entidade respectiva, via de regra, serão formalizados não de forma individual, mas em nome daquele considerado como representante do grupo familiar perante terceiros. Assim, os documentos apresentados em nome de algum dos integrantes da mesma família consubstanciam início de prova material do labor rural, conforme preceitua a Súmula 73 deste Tribunal: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental".
A existência de assalariados nos comprovantes de pagamento de ITR não tem o condão, por si só, de descaracterizar a atividade agrícola em regime individual ou mesmo de economia familiar, pois o mero fato dessa anotação constar nos referidos documentos não significa, inequivocamente, regime permanente de contratação, devendo cada caso ser analisado individualmente de modo a que se possa extrair do conjunto probatório dos autos, a natureza do auxílio de terceiros (se eventual ou não), enquadrando-se assim na previsão do art. 11, VII da Lei 8.213/91, que define o segurado especial. Mesmo o fato de constar a qualificação empregador II b nos respectivos recibos de ITR não implica a condição de empregador rural. Ocorre que a simples qualificação no documento não desconfigura a condição do trabalho agrícola em regime de economia familiar, como se pode ver da redação do artigo 1º, II, "b", do Decreto-Lei 1166, de 15.04.71.
Importante ainda ressaltar que o fato de o cônjuge exercer atividade outra que não a rural também não é "per se stante" para descaracterizar a condição de segurado especial de quem postula o benefício, pois, de acordo com o que dispõe o inciso VII do art. 11 da Lei nº 8.213/91, é segurado especial o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 14 anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo; ou seja, ainda que considerado como trabalhador rural individual, sua situação encontra guarida no permissivo legal referido, sendo certo também que irrelevante a remuneração percebida pelo cônjuge, que não se comunica ou interfere com os ganhos oriundos da atividade agrícola.
Do tempo rural do segurado especial a partir dos 12 anos de idade
No tocante à possibilidade do cômputo do tempo rural na qualidade de segurado especial a partir dos 12 anos de idade, a Terceira Seção desta Corte ao apreciar os Embargos Infringentes em AC n.º 2001.04.01.025230-0/RS, Rel. Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, na sessão de 12-03-2003, firmou entendimento no sentido da possibilidade do cômputo do tempo de serviço laborado em regime de economia familiar a partir dessa idade, na esteira de iterativa jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça, tendo recentemente a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o AI n.º 529.694/RS, da relatoria do Ministro Gilmar Mendes, com decisão publicada no DJU de 11-03-2005, reconhecido o tempo de serviço agrícola ao menor de quatorze anos, não merecendo tal questão maiores digressões.
Do caso concreto
A parte autora, nascida em 02/08/1956 (fls. 27), implementou o requisito etário em 02/08/2011 e requereu o benefício na via administrativa em 15/09/2011 (fls. 23). Assim, deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural nos 180 meses anteriores à implementação da idade (02/08/1996 - 02/08/2011) ou nos 180 meses que antecederam o requerimento administrativo (15/09/1996 - 15/09/2011); ou, ainda, em períodos intermediários, mesmo que de forma descontínua.
Para a comprovação do trabalho rural, foram apresentados os seguintes documentos:
- Declaração de exercício de atividade rural, emitida pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Francisco Alves, datada de 04/11/2011, na qual consta que a autora exerceu atividade rural como bóia-fria no período de 1996 a 2011 (fls. 25);
- Certidão de casamento, datada de 18/09/1976, na qual o cônjuge da autora foi qualificado como lavrador (fls. 26);
- Declaração emitida pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Francisco Alves, datada de 04/11/2011, informando que José Vieira Neto, cônjuge da autora, foi associado da entidade no período de 22/01/1987 a 01/1989 (fls. 28);
- Ficha de cadastro do cônjuge da autora junto ao Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Francisco Alves, na qual a autora consta como um de seus dependentes, com data de admissão em 22/01/1987 e registro de pagamento das mensalidades de 01/1987 a 01/1989 (fls. 29);
- Ficha de fiel junto à Paróquia Nossa Senhora Aparecida, na qual o cônjuge da autora foi qualificado como lavrador, com data de registro em 29/04/2000 (fls. 30);
- Requerimento de matrícula de Rosângela Vieira, filha da autora, datada de 15/12/1983, na qual o cônjuge da autora foi qualificado como retireiro (fls. 31);
- Requerimento de matrícula de Rosângela Vieira, filha da autora, datada de 29/10/1992, na qual o cônjuge da autora foi qualificado como retireiro (fls. 32);
- Declaração emitida pelo Bazar São Lucas, datada de 04/11/2011, afirmando que a autora possui cadastro junto ao referido estabelecimento desde 1993, e foi qualificada como trabalhadora volante na agricultura, acompanhada da ficha de cadastro, datada de 17/04/1993, na qual a autora foi qualificada como bóia-fria (fls. 33/34);
- Declaração emitida pela Farmácia Paraná, datada de 25/08/2011, afirmando que a autora possui cadastro como cliente desde 08/1995, e foi qualificada como trabalhadora rural/volante, acompanhada da ficha de cadastro, datada de 28/06/1992, na qual a autora foi qualificada como bóia-fria (fls. 35/36);
- Declaração emitida pelo Mercado Raimundi, datada de 25/08/2011, afirmando que a autora consta no cadastro de clientes desde 08/1995, e foi qualificada como trabalhadora rural/volante (fls. 37);
- Ficha de cadastro da autora junto à Sumóveis, datada de 08/05/2004, na qual a autora foi qualificada como bóia-fria (fls. 38);
- Fichas de cadastro da autora junto ao Serviço Hospitalar de Saúde de Francisco Alves, com primeiros registros em 02/06/2009 e 06/05/2008, nas quais a autora foi qualificada como trabalhadora rural (fls. 39/40);
- Certidão emitida pelo Cartório do Cível, Comércio e Anexos da Comarca de Iporã, datada de 13/09/2011, informando que na consta ação de curatela em nome da autora, a qual foi qualificada como trabalhadora rural bóia-fria (fls. 41);
- CNIS da autora, emitido em 08/11/2011, no qual não consta quaisquer registros de vínculos empregatícios, recolhimentos ou recebimento de benefícios (fls. 48/50);
- CNIS do cônjuge da autora, emitido em 08/11/2011, no qual constam registros de vínculos empregatícios nos períodos de 01/02/1987 a 05/09/1988, 01/08/1989 a 05/04/1990, 01/03/1991 a 31/12/1992, 02/08/1993 a 06/08/1996, 01/09/1997 a 31/03/1999, 01/04/1999 a 16/12/2005, e recolhimentos como contribuinte individual nos períodos de 10/2008, 12/2008 a 04/2009, 04/2010 a 05/2010 (fls. 54).
Do depoimento pessoal da parte requerente (mídia juntada às fls. 124), colhe-se que a autora começou a trabalhar na roça aos 7 anos, com os pais. Disse que veio de Minas Gerais para o Paraná com 3 anos, e foi morar em Francisco Alves. Afirmou que o seu pai arrendava terras em diversos locais, mas sempre no município de Francisco Alves. Referiu que permaneceu trabalhando com o pai até se casar, no ano de 1976, e foi morar com o marido. Assinalou que moravam no sítio de uma terceira pessoa, e trabalhavam para o proprietário. Esclareceu que o marido trabalhava para o proprietário e a autora trabalhava para os vizinhos, donos de outros sítios, como diarista. Informou que plantavam feijão, soja, algodão, milho, amendoim, e que ia todos os dias, se tivesse serviço. Mencionou que ia a pé para as propriedades onde trabalhava, e que o marido trabalhava de retireiro (de leite) por vinte anos, que moraram em várias propriedades, e posteriormente se mudaram para a cidade, em 1993 ou 1994. ressaltou que continuou trabalhando na roça, como diarista, mesmo após se mudar para a cidade, e o marido começou trabalhando com um açougueiro, e atualmente trabalha com laticínios. Observou que o ponto onde a autora toma a condução para ir trabalhar é próximo a sua casa, e que já trabalhou para o Ibraim, e para as outras propriedades o "gato" leva, que atualmente tem trabalhado com o Zé da Viola. Relatou que são os gatos que controlam o pagamento pelo serviço prestado, e inclusive trabalhou no dia anterior ao depoimento. Assinalou que atualmente recebe R$ 45,00 (quarenta e cinco) reais por dia de trabalho, que não tem recibo, apenas o gato marca no caderno. Disse que em Francisco Alves tem diversos pontos onde os gatos buscam os trabalhadores, mas a autora sempre pega o ônibus no João Palmeira. Ressaltou que nunca trabalhou na cidade, que freqüentou a escola, mas na época de colheita não ia para as aulas porque tinha que ajudar o pai na roça. Descreveu que no dia anterior ao depoimento foi trabalhar na propriedade do Catarinense, levada pelo Zé da Viola, e foi carpir mandioca. Citou o nome de outros gatos para os quais trabalhou, como o Joãozão e o Geraldão. Informou que seu marido é motorista, mas que precisa trabalhar, porque o salário dele é insuficiente para o sustento, pois o marido tem pressão alta e diabetes, e gasta com remédios.
Em sede judicial, foram ouvidas duas testemunhas (mídia juntada às fls. 124).
A testemunha Geralda Rosa Dias de Sá declarou que conheceu a autora há uns 30 anos, trabalhando na roça, que nessa época a autora trabalhava no sítio. Disse que trabalharam juntas em diversas propriedades durante esses 30 anos, como bóia-fria, que via a autora no ponto. Relatou que continua trabalhando com a autora, inclusive no dia anterior trabalharam juntas no Catarinense, que foram com o gato Zé da Viola, que foram apanhadas no ponto de Kombi. Afirmou que vão receber o pagamento no final de semana, que recebem R$ 45,00 por dia, que carpiram mandioca, e na propriedade também tem plantação de milho. Esclareceu que trabalharam na cultura do milho em fevereiro. Citou que trabalharam para o João Japonês, e com o gato Joãozão. Ressaltou que a autora sempre foi da roça e nunca trabalhou na cidade, e que o marido da autora trabalha no laticínio, mas não sabe qual a atividade dele. Observou que o marido da autora já trabalhou na roça. Referiu que já trabalhou na fazenda do Ibraim com a autora, na plantação de soja, e também trabalharam na colheita de abacaxi, na estrada Iara.
Já a testemunha Maria das Graças da Silva relatou que conheceu a autora em 1980, na roça, que na época já moravam em Francisco Alves, e na época a autora morava no sítio do Wilson Nunes, e a depoente morava na cidade. Disse que o marido da autora trabalhava na roça, que nessa propriedade não havia gado leiteiro, apenas plantação de café. Declarou que trabalhava na colheita de café, como diarista, e trabalhou junto com a depoente nessa propriedade. Afirmou que posteriormente a autora e o marido foram morar na cidade, mas que a autora continuou trabalhando na roça. Referiu que trabalharam juntas em outras propriedades, que eram levadas pelo caminhão de bóia-fria. Assinalou que a partir de 1993, quando a autora se mudou para a cidade, continuaram se encontrando na roça, até a depoente se aposentar. Informou saber que até a semana passada a autora trabalhou, que foi levada pelo Zé da Viola para carpir mandioca. Ressaltou que a autora continuou trabalhando na roça porque precisa, pois o marido da autora é doente, e ela cuida de um neto desde criança. Esclareceu que após a trilhadeira passar colhendo milho, sobra milho para as pessoas catarem, e o Zé da Viola leva os trabalhadores para executarem esse serviço, e que o pagamento é feito nos finais de semana. Mencionou que trabalharam juntas na colheita do algodão, do café, até a depoente se aposentar, hã dois ou três anos. A depoente referiu que pegava o transporte no ponto próximo à rodoviária, e que às vezes a autora também ia para esse ponto. Ressaltou que a autora sempre trabalhou na roça, que trabalhou com os gatos Joãozão e Geraldão, e para os proprietários Wilson Nunes e Ibraim, sendo que nesta última propriedade a depoente colheu milho junto com a autora. Assinalou que quem faz o pagamento é o gato, que ele não emite recibo, e que o controle é feito em um caderno.
Da análise do conjunto probatório, conclui-se que, em que pese haja provas de que a autora exerceu atividade rural, esse labor não foi praticado em regime de economia familiar, porquanto o sustento da família provinha principalmente da atividade laborativa do esposo da autora. Em consulta ao CNIS do esposo da autora, verificou-se que ele exerce atividades urbanas como empregado desde 01/02/1987 até 10/2016. Constatou-se, ainda, que as remunerações por ele auferidas desde 1997, ou seja, durante quase a totalidade do período de carência, correspondiam a três salários mínimos ou mais no valor vigente à época, sendo suficiente para caracterizar a prescindibilidade da renda obtida pela autora com o labor agrícola, afastando a sua condição de segurada especial.
Dos ônus sucumbenciais
Mantenho a sucumbência nos termos em que fixada, visto que está de acordo com o entendimento da Turma para ações desta natureza.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação da parte autora, nos termos da fundamentação.
É o voto.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal ROGER RAUPP RIOS, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8911550v4 e, se solicitado, do código CRC A8CA988C. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Roger Raupp Rios |
| Data e Hora: | 25/04/2017 18:32 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 25/04/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0014243-48.2015.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00007966220128160094
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Flávio Augusto de Andrade Strapason |
APELANTE | : | MARIA REMILDA DE OLIVEIRA VIEIRA |
ADVOGADO | : | Andréa Roldão dos Santos Munhoz e outros |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 25/04/2017, na seqüência 193, disponibilizada no DE de 04/04/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ | |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
| Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8956781v1 e, se solicitado, do código CRC B34BC15F. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Lídice Peña Thomaz |
| Data e Hora: | 25/04/2017 19:56 |
