APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000309-53.2016.4.04.7104/RS
RELATORA | : | Marina Vasques Duarte de Barros Falcão |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | ELY DA SILVEIRA RIBEIRO |
ADVOGADO | : | CAROLINE LENZI ADAMY |
: | Luís Otávio Montemezzo Ribeiro |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE.
REVISÃO DO ATO CONCESSÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. SEGURANÇA JURÍDICA. DECADÊNCIA. RESTABELECIMENTO DO BENEFÍCIO.
1. Embora o INSS tenha o dever de revisar seus atos, quando eivados de ilegalidade, não é legítimo que o faça com base em mera reavaliação do potencial probatório dos elementos considerados por ocasião da concessão de benefício levada a efeito há mais de 20 anos, sob pena de ofensa ao princípio da segurança jurídica. Decadência configurada na hipótese.
2. Em se tratando de benefícios concedidos anteriormente ao advento da Lei n.º 9.784/99 e decorridos mais de 10 (dez) anos entre o início de sua vigência e a revisão administrativa, impõe-se o reconhecimento da decadência do direito do INSS revisar o ato de concessão.
3. Uma vez restabelecido o benefício anteriormente cassado por suposta irregularidade que foi afastada pelas provas juntadas aos autos, o início do pagamento do mesmo deve ser fixado no dia seguinte à data de cessação.
4. O Supremo Tribunal Federal reconheceu no RE 870947, com repercussão geral, a inconstitucionalidade do uso da TR, determinando a adoção do IPCA-E para o cálculo da correção monetária nas dívidas não-tributárias da Fazenda Pública.
5. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29-06-2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança.
6. Se o valor da condenação é estimável por cálculos aritméticos, à vista dos elementos existentes nos autos, e se o resultado não excede o equivalente a 200 salários mínimos, os honorários devem ser desde logo fixados, nos termos dos §§2º e 3º do art. 85 do novo CPC.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao apelo do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 31 de janeiro de 2018.
Juíza Federal Marina Vasques Duarte de Barros Falcão
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Juíza Federal Marina Vasques Duarte de Barros Falcão, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9257947v8 e, se solicitado, do código CRC A9E92BBF. | |
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| Signatário (a): | Marina Vasques Duarte de Barros Falcão |
| Data e Hora: | 06/02/2018 14:29 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000309-53.2016.4.04.7104/RS
RELATORA | : | Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | ELY DA SILVEIRA RIBEIRO |
ADVOGADO | : | CAROLINE LENZI ADAMY |
: | Luís Otávio Montemezzo Ribeiro |
RELATÓRIO
Trata-se de ação previdenciária proposta por ELY DA SILVEIRA RIBEIRO contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, postulando o restabelecimento da sua aposentadoria rural por idade, com a restituição dos valores não recebidos desde a cassação, em 01-07-2012, além da declaração de inexigibilidade da cobrança de execução fiscal pelo INSS de valores percebidos devidamente entre 27-10-1992 a 01-07-2012.
O juízo a quo proferiu sentença, em 17-08-2017, deferindo a antecipação da tutela, e julgando procedente o pedido, para condenar o INSS ao imediato restabelecimento do benefício de aposentadoria por idade em favor da parte autora, com o pagamento das parcelas vencidas desde o seu cancelamento (01-07-2012), acrescidas de juros de mora e correção monetária; bem como para declarar indevido o débito apurado pelo INSS relativo ao ressarcimento das parcelas recebidas a tal título. Condenou a Autarquia ainda ao pagamento dos honorários advocatícios, em valores a serem apurados em liquidação de sentença.
O INSS interpôs recurso de apelação alegando que não foi comprovada a condição de segurada especial da autora no período de carência, razão pela qual deve ser reformada a sentença e determinada a devolução dos valores recebidos a título de antecipação de tutela. Em não sendo este o entendimento, pugna pela aplicação integral do art. 1º-F da Lei n.º 9.494/97, com redação da Lei n.º 11.960/09.
Com contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal para julgamento.
É o relatório.
VOTO
A apelação preenche os requisitos de admissibilidade.
Da aposentadoria por idade rural
No tocante à revisão de ato que concedeu benefício previdenciário, é cediço que o INSS pode, em princípio, rever a situação quando restar configurada ilicitude. Essa possibilidade há muito é reconhecida pela doutrina e pela jurisprudência, e restou consagrada nas Súmulas 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal, passando posteriormente a contar com previsão legal expressa (art. 43 da Lei 9.784/99 de 29/01/1999 e art. 103-A, da Lei 8.213/91, introduzido pela MP 138/03).
Cumpre destacar, contudo, que existem limites para a atuação do INSS ao revisar atos que impliquem reconhecimento de direito em favor do segurado.
A Administração, em atenção ao princípio da legalidade, tem o poder-dever de anular seus próprios atos quando eivados de vícios que os tornem ilegais (Súmulas 346 e 473 do STF). Para os benefícios concedidos desde o início da vigência da Lei n. 9.784/99, o prazo decadencial a incidir é o de dez anos (MP n. 138, de 2003), contados da data em que foi praticado o ato administrativo (ou da percepção do primeiro pagamento, conforme o caso), salvo comprovada má-fé. Tal prazo há de ser aplicado, inclusive, quando o ato administrativo houver sido praticado anteriormente à vigência da Lei 9.784/99 (e depois da revogação da Lei 6.309/75). Nessa hipótese, conta-se o prazo a partir da entrada em vigor da Lei 9.784, que é de 29 de janeiro de 1999, com vigência a partir da data da publicação em 1º/02/1999, ante a impossibilidade de sua retroação, conforme entendimento do STJ.
No caso concreto, o benefício foi concedido em 27-10-1992, portanto anterior à vigência da lei anteriormente mencionada, o que já seria suficiente para que se cogitasse da decadência do direito à revisão do ato concessório, uma vez que a cessação do pagamento do benefício por indício de irregularidade se deu apenas no ano de 2012.
Independentemente disso, a Administração não pode desfazer ato de concessão de benefício ou reconhecimento de direito com base em simples reavaliação de provas e nova interpretação em processo administrativo perfeito e acabado, como na espécie.
Não sendo comprovada a ilegalidade, não é dado à Administração simplesmente reavaliar a situação, voltando atrás quanto à sua manifestação, em prejuízo do administrado em clara supressão da segurança jurídica. Nessa linha, quando não há prova de ilegalidade que possa justificar a anulação do ato pela Administração, mas tão-somente mudança de critério interpretativo, ou mesmo reavaliação da prova, não se mostra possível o desfazimento do ato administrativo. Confira-se precedente:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. FRAUDE E MÁ-FÉ. INEXISTÊNCIA. NOVA VALORAÇÃO DA PROVA. RECONHECIMENTO DO TEMPO DE SERVIÇO RURAL.
1. Nos processos de restabelecimento de benefício previdenciário, compete ao INSS o ônus de provar a ocorrência de fraude ou ilegalidade no ato concessório de aposentadoria, pois tal ato se reveste de presunção de legitimidade.
2. O cancelamento de benefício previdenciário fundado tão-somente em nova valoração da prova e/ou mudança de critério interpretativo da norma, salvo comprovada fraude e má-fé, atenta contra o princípio da segurança das relações jurídicas e contra a coisa julgada administrativa .
3. Apelação do INSS e remessa oficial improvidas.
(AC: 200072070021618. 6ª Turma TRF 4. Rel. Des. Fed. Luís Alberto D"Azevedo Aurvalle)
No caso dos autos, a autarquia previdenciária alega indícios de irregularidade no ato de concessão do benefício de aposentadoria por idade rural percebido pela autora desde 27-10-1992 (NB 41/041.008.894-3 - evento 6/3, pág. 10). Narra que a autora pleiteou o benefício na condição de segurada especial, sendo que, posteriormente, no ano de 2012, por meio de solicitação de benefício de outro segurado, foram apresentados documentos que demonstram que, na época do requerimento, a autora era empregadora rural entre 01-10-1976 a 17-10-1994 (evento 6/3, págs. 31-33).
Em 26-09-2012, informa o INSS que, embora tenha a parte interessada sido cientificada acerca do indício da irregularidade, não apresentou defesa e/ou interpôs recurso, razão pela qual foi considerada irregular a concessão do benefício entre 27-10-1992 a 31-05-2012 (evento 6/3, págs. 72 e 76-77).
Como se observa, não há elementos indicativos de fraude, mas uma reavaliação dos documentos considerados para a concessão do benefício, a partir de elementos posteriormente obtidos em processo administrativo de solicitação de benefício de outro segurado, que não produzem efeitos diretos sobre a relação previdenciária.
Ademais, como já salientado, da documentação juntada ao feito, somente em 01-06-2012 pode-se ver que a demandante teve ciência de que o ato concessório estava sendo questionado (evento 6-3, págs. 34 e 47-48).
Exigir que só então vá buscar novas provas para corroborar as inicialmente apresentadas configura absoluta violação do princípio da segurança jurídica e da proteção previdenciária.
Se a reavaliação do ato de concessão do benefício demorou quase 20 anos para produzir efeitos, não pode resultar no cancelamento do benefício de aposentadoria em questão. Presente o instituto da decadência, uma vez que passados mais de 10 anos entre 01-02-1999 (advento da Lei n.º 9.784/99) e a data de a ciência do segurado (01-06-2012).
Nesse sentido, aliás, bem assentou o juízo a quo ao prolatar a sentença, na parte que a seguir reproduzo:
"(...) a conclusão de que o benefício não era devido à autora, na DER, não é suficiente para que se reconheça a legalidade do ato de cancelamento de sua aposentadoria. No direito brasileiro, o transcurso do tempo gera efeitos nas relações jurídicas. Após o transcurso do prazo de decadência não é mais possível a revisão do ato de concessão do benefício, seja por iniciativa do segurado, seja por iniciativa do INSS. Necessário analisar, assim, no caso, se era possível a revisão do ato de concessão, e o cancelamento, do benefício de aposentadoria da autora, nos termos em que promovida tal revisão pela autarquia. No caso, o benefício da autora foi deferido em 27.11.1992, com DIB em 27.10.1992 (evento 06/PROCADM3, p. 11). Somente em 2012 foi iniciado procedimento para revisão do benefício. No que se refere ao prazo de decadência para o INSS rever seus atos, havia previsão, no art. 7º da Lei nº 6.309, de 15.12.1975, no sentido de que "os processos de interesse de beneficiários e demais contribuintes não poderão ser revistos após 5 (cinco) anos, contados de sua decisão final, ficando dispensada a conservação da documentação respectiva além desse prazo". Tal lei foi revogada, porém, pela Lei nº 8.422, de 13.05.1992, que nada dispôs sobre o prazo de decadência para o INSS. Posteriormente, com o advento da Lei 9.784, de 29 de janeiro de 1999, surgiu previsão legal do prazo decadencial de cinco anos para a Administração rever seus atos de que decorressem efeitos favoráveis aos destinatários. No entanto, antes do transcurso do prazo de cinco anos do advento de tal diploma legal, foi estabelecido o prazo decadencial de dez anos para revisão do ato de concessão dos benefícios previdenciários pelo INSS. Nesse sentido, o art. 103-A da Lei nº 8.213/91, acrescentado pela Medida Provisória nº138, de 19.11.2003, convertida na Lei nº 10.839/2004, estabeleceu que "o direito da Previdência Social de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os seus beneficiários decai em dez anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé".
Verifica-se, assim, que havia previsão do prazo de decadência de cinco anos até o advento da Lei nº8.422/92 e que no período compreendido entre o advento de tal lei e a entrada em vigor da Lei nº9.784/99 não havia previsão legal de prazo de decadência para o INSS rever seus atos. O benefício da autora foi deferido, assim, após a revogação da Lei nº 6.309/1975 pela Lei nº 8.422/92. Diante da lacuna existente no período compreendido entre a revogação da Lei nº 6.309/75, pela Lei nº 8.422/92, e a entrada em vigor da Lei nº 9.784/99, acabou o Superior Tribunal de Justiça por pacificar a questão, manifestando o entendimento de que em relação aos atos concessivos de benefício anteriores à Lei n. 9.784/99, o prazo decadencial decenal estabelecido no art. 103-A da Lei n. 8.213/91 tem como termo inicial 1º/2/1999. Nesse sentido, o seguinte julgado do Superior Tribunal de Justiça:
RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA A DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DA RENDA MENSAL INICIAL DOS BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS CONCEDIDOS EM DATA ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI 9.784/99. PRAZO DECADENCIAL DE 5 ANOS, A CONTAR DA DATA DA VIGÊNCIA DA LEI 9.784/99. RESSALVA DO PONTO DE VISTA DO RELATOR. ART. 103-A DA LEI 8.213/91, ACRESCENTADO PELA MP 19.11.2003, CONVERTIDA NA LEI 10.839/2004. AUMENTO DO PRAZO DECADENCIAL PARA 10 ANOS. PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL PELO DESPROVIMENTO DO RECURSO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO, NO ENTANTO.
1. A colenda Corte Especial do STJ firmou o entendimento de que os atos administrativos praticados antes da Lei 9.784/99 podem ser revistos pela Administração a qualquer tempo, por inexistir norma legal expressa prevendo prazo para tal iniciativa. Somente após a Lei 9.784/99 incide o prazo decadencial de 5 anos nela previsto, tendo como termo inicial a data de sua vigência (01.02.99). Ressalvado ponto de vista do Relator. 2. Antes de decorridos 5 anos da Lei 9.784/99, a matéria passou a ser tratada no âmbito previdenciário pela MP 138, de 19.11.2003, convertida na Lei 10.839/2004, que acrescentou o art. 103-A à Lei 8.213/91 (LBPS) e fixou em 10 anos o prazo decadencial para o INSS rever os seus atos de que decorram efeitos favoráveis a seus beneficiários. 3. Tendo o benefício do autor sido concedido em 30.7.1997 e o procedimento de revisão administrativa sido iniciado em janeiro de2006, não se consumou o prazo decadencial de 10 anos para a Autarquia Previdenciária rever o seu ato. 4. Recurso Especial do INSS provido para afastar a incidência da decadência declarada e determinar o retorno dos autos ao TRF da 5ª. Região, para análise da alegada inobservância do contraditório e da ampla defesa do procedimento que culminou com a suspensão do benefício previdenciário do autor.
(REsp 1114938/AL, Terceira Seção, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, unânime, DJe de 02.08.2010)
Consta, ainda, no voto condutor do julgamento antes referido o seguinte:
1. Nos termos da Súmula 473 do STF, a Administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.
2. Diante do corolário da segurança jurídica, esse poder de autotutela do Estado encontra-se limitado por prazos decadenciais previstos na legislação ordinária.
3. A controvérsia posta na presente demanda cinge-se à contagem do prazo decadencial para a revisão da RMI (Renda Mensal Inicial) dos benefícios previdenciários concedidos em data anterior à vigência da Lei 9.784/99, como no caso.
4. Acerca dessa questão, entendo que, ainda que ausente, num primeiro momento, lei previdenciária expressa quanto ao prazo para a Autarquia Previdenciária rever os seus atos, deve ser aplicado, por analogia, o Decreto 20.910, de 6 de janeiro de 1932, que estabelece o prazo prescricional de 5 anos para as dívidas da União, dos Estados e dos Municípios, aplicando-se esse mesmo prazo às iniciativas do Poder Público, em face do princípio da isonomia.
5. Além disso, a legislação previdenciária posterior ao Decreto 20.910/32 (art. 7o. da Lei 6.309, de 15.12.75; art. 383 do Decreto 83.080, de 24.01.79 e art. 207 do Decreto 89.312, de 22.01.84) disciplinou o prazo de revisão de benefício por parte da Autarquia Previdenciária, fixando expressamente o prazo decadencial quinquenal.
6. Por fim, consagrando o que já estabelecia anteriormente a legislação previdenciária, a Lei 9.784/99, que regula o processo administrativo no âmbito federal e era aplicada para a revisão de benefício previdenciário, tratou do prazo para a Administração rever seus atos, nos seguintes termos:
Art. 54 - O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.
§ 1º. - No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da percepção do primeiro pagamento.
(...).
7. Assim, o prazo para a Autarquia Previdenciária rever o cálculo do benefício previdenciário, ainda que concedido em data anterior à Lei 9.784/99, é de cinco anos, a contar da data em que o benefício foi constituído.
8. Entretanto, a colenda Corte Especial do STJ firmou o entendimento de que quanto aos atos praticados antes do advento da Lei 9.784/99, como no caso, poderia a Administração revê-los a qualquer tempo, por inexistir normal legal expressa prevendo prazo para tal iniciativa. Somente após a Lei 9.784/99, passou a incidir o prazo decadencial de cinco anos nela previsto, tendo como termo inicial a data de sua vigência, qual seja 1º de fevereiro de 1999. Eis a ementa desse julgado:
ADMINISTRATIVO - ATO ADMINISTRATIVO: REVOGAÇÃO - DECADÊNCIA - LEI 9.784/99 - VANTAGEM FUNCIONAL - DIREITO ADQUIRIDO - DEVOLUÇÃO DE VALORES.
Até o advento da Lei 9.784/99, a Administração podia revogar a qualquer tempo os seus próprios atos, quando eivados de vícios, na dicção das Súmulas 346 e 473/STF.
A Lei 9.784/99, ao disciplinar o processo administrativo, estabeleceu o prazo de cinco anos para que pudesse a Administração revogar os seus atos (art. 54).
A vigência do dispositivo, dentro da lógica interpretativa, tem início a partir da publicação da lei, não sendo possível retroagir a norma para limitar a Administração em relação ao passado.
Ilegalidade do ato administrativo que contemplou a impetrante com vantagem funcional derivada de transformação do cargo efetivo em comissão, após a aposentadoria da servidora.
Dispensada a restituição dos valores em razão da boa-fé da servidora no recebimento das parcelas.
Segurança concedida em parte (MS 9.112/DF, CE, Rel. Min. ELIANA CALMON, DJU 14.11.2005, p. 174).
9. Em face dessa orientação jurídica já consolidada, ressalvo, com o maior respeito, o meu ponto de vista pessoal, para acompanhar a tese de que o prazo decadencial de cinco anos previsto na Lei 9.784/99 tem como termo a quo, para os atos que lhe são anteriores, a data da sua publicação (01/02/99).
10. Ocorre que, antes de decorridos os 5 anos da Lei 9.784/99, a matéria passou a ser tratada no âmbito previdenciário pela edição da MP 138, de 19.11.2003, convertida na Lei 10.839/2004, que acrescentou o art. 103-A à Lei 8.213/91 (LBPS) e fixou em 10 anos o prazo decadencial para o INSS rever os seus atos de que decorram efeitos favoráveis a seus benefíciários. O referido art. 103-A da Lei 8.213/91 encontra-se assim redigido:
Art. 103-A - O direito da Previdência Social de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os seus beneficiários decai em dez anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.
§ 1º. - No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo decadencial contar-se-á da percepção do primeiro pagamento.
(...).
11. Como consequência, no presente caso, tendo o benefício do autor sido concedido em 30.7.1997 e o procedimento de revisão administrativa sido iniciado em janeiro de 2006, não se consumou o prazo decadencial de 10 anos para que a Autarquia Previdenciária reveja o seu ato.
12. Diante dessas considerações, dá-se provimento ao Recurso Especial do INSS para afastar a incidência da decadência declarada e determinar o retorno dos autos para ao TRF da 5a. Região, para análise da alegada inobservância do contraditório e da ampla defesa do procedimento que culminou com a suspensão do benefício previdenciário do autor. É como voto.
Nesse sentido, aplica-se, para os benefícios concedidos antes do advento da Lei nº 9.784/99, o prazo decadencial de dez anos, contados a partir de 01.02.1999. No caso, conforme já antes referido, o benefício de aposentadoria foi deferido à autora em 27.11.1992, com DIB em 27.10.1992, e foi revisado somente em 2012. Nesse sentido, quando da revisão do benefício da autora já havia transcorrido o prazo de decadência para o INSS revisar o ato de concessão. Com efeito, tendo o benefício da autora sido deferido antes da Lei nº 9.784/99, o prazo de decadência para revisar tal concessão iniciou em 01.02.1999 e encerrou em 01.02.2009.
No caso, apesar de demonstrado que a autora não fazia jus ao benefício desde a sua concessão, não ficou comprovada sua má-fé, fato que afastaria a fluência do prazo de decadência antes referido. Em se tratando de revisão de ato administrativo de que decorram efeitos favoráveis aos administrados, é clara a legislação que regula a matéria ao excluir a fluência do prazo de decadência nos casos em que o beneficiário tenha agido com má-fé. Quanto a este ponto, são claros o artigo 54, caput, da Lei nº 9.784/99 ("O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé") e o art. 103-A da Lei nº8.213/91 ("O direito da Previdência Social de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os seus beneficiários decai em dez anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé"). Tal questão é, além disso, pacífica no âmbito dos Tribunais Superiores (nesse sentido, por exemplo, os seguintes julgados: STJ, MS 18149/DF, Primeira Seção, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, maioria, DJe 09.06.2015; TRF da 4ª Região, Apelação/Remessa Necessária, proc. nº5000141-36.2016.404.7109/RS, Quinta Turma, Relator Desembargador Federal Rogerio Favreto, unânime, decisão de 20.06.2017).
Não sendo possível imputar à autora prática de fraude e/ou atos com má-fé, para fins de obtenção da aposentadoria, não há como afastar a ocorrência de decadência do direito do INSS de revisar o ato de concessão de seu benefício de aposentadoria. Conforme já antes referido, concluiu este Juízo, diante do conjunto probatório constante dos autos, que a autora não fazia jus ao benefício de aposentadoria na qualidade de segurada especial. No entanto, restou este Juízo convencido também de que não houve má-fé da autora. A boa-fé se presume, cabendo à autarquia comprovar a má-fé do beneficiário. No caso, o motivo que ensejou o cancelamento do benefício da autora foi a conclusão de que esta teria sido empregadora rural, apesar de ter requerido e obtido benefício como segurada especial. Pelo que restou apurado na instrução, porém, a autora não foi, de fato, empregadora rural do Sr. Adalmir José Antunes Ribeiro. Restou este Juízo convencido de que o Sr. Adalmir, sobrinho da autora, nunca foi seu empregado, tendo apenas ficado encarregado de cuidar da propriedade rural da família após a autora ir morar na cidade com seus filhos. A parte autora anexou aos autos inclusive cópia dos contratos de parceria agrícola firmados na época com o Sr. Adalmir (evento 16/PROCADM3). Além disso, os depoimentos colhidos em Juízo foram claros no sentido de que o Sr. Adalmir de fato não era empregado da autora. O próprio Sr. Adalmir declarou que nunca recebeu ordens da autora, não recebia salário e que a autora somente assinou sua CTPS em razão da orientação de seu advogado no momento em que foi encaminhar o pedido de aposentadoria (evento 57). De igual modo, os depoimentos das testemunhas Rita Marlene Dias Ribeiro e Clarimundo Mendes de Lima foram claros no sentido de que o Sr. Adalmir não era considerado empregado da autora (evento 65). Não há, assim, no caso, prova de real existência de uma relação de trabalho entre a autora e o Sr. Adalmir.
Não se pode atribuir à autora, assim, a prática de fraude para fins de obtenção do benefício. Não restou comprovado ter havido intenção da autora de fraudar a Previdência, apresentando, por exemplo, documentação falsa. Quanto a este ponto, importante salientar que a declaração da autora no sentido de que não era empregadora rural não pode ser considerada falsa (evento 06/PROCADM3, p. 8). Conforme antes exposto, ficou esclarecido que a autora nunca foi, de fato, empregadora do Sr. Adalmir José Antunes Ribeiro, fato no qual foi embasado o cancelamento do benefício. A autora é pessoa simples, ignorante, que foi, de fato, proprietária rural, não tendo praticado qualquer ato com intenção de fraudar a Previdência Social para fins de obtenção de benefício indevido. Isto ficou claramente demonstrado pela prova colhida na instrução, especialmente diante do depoimento pessoal da autora. Conforme antes referido, a autora não fazia jus à aposentadoria na qualidade de segurada especial. No entanto, não há prova de que tenha ela praticado ato fraudulento ou agido com má-fé para obter tal benefício. Pelo que consta dos autos, a autora, acreditando fazer jus ao benefício, formulou requerimento administrativo e apresentou a documentação de que dispunha. Não é demais salientar, ainda, que a autora foi absolvida, na Ação Penal nº5004861-95.2015.4.04.7104/RS, da denúncia de prática do crime de estelionato que lhe foi imputada pelo Ministério Público Federal.
Sendo assim, não é cabível afastar a fluência do prazo decadencial, impondo-se o reconhecimento da decadência do direito do INSS de revisar/cancelar o benefício de aposentadoria da autora. Diante do que consta no presente feito, restou este Juízo convencido de que o benefício de aposentadoria por idade foi equivocadamente deferido à autora, já que esta não ostentava a qualidade de segurada especial por ter deixado a atividade agrícola muitos anos antes de implementar a idade para aposentadoria e/ou de formular o requerimento administrativo. Apesar disso, quando da revisão do benefício já havia ocorrido a decadência do direito do INSS de cancelar o ato de concessão da aposentadoria da autora, não sendo cabível, ainda, afastar a fluência de tal prazo pela ausência de comprovação de má-fé da autora, consistente na intenção de fraudar a Previdência Social e receber benefício que sabia indevido. (...).
Mantida assim a sentença no mérito.
Correção monetária
A correção monetária, segundo o entendimento consolidado na 3ª Seção deste TRF4, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos seguintes índices oficiais:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94;
- INPC de 04/2006 a 29/06/2009, conforme o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, combinado com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91.
- IPCA-E a partir de 30/06/2009.
A incidência da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública foi afastada pelo STF, no julgamento do RE 870947, com repercussão geral, tendo-se determinado a utilização do IPCA-E, como já havia sido determinado para o período subsequente à inscrição em precatório, por meio das ADIs 4.357 e 4.425.
Juros de mora
Os juros de mora devem incidir a partir da citação.
Até 29-06-2009, os juros de mora devem incidir à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado hígido pelo STF no RE 870947, com repercussão geral reconhecida. Os juros devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, 5ª Turma, AgRgno AgRg no Ag 1211604/SP, Rel. Min. Laurita Vaz).
No ponto, merece provimento o apelo do INSS.
Honorários Advocatícios
Tendo em vista que a sentença foi publicada sob a égide do novo CPC, é aplicável quanto à sucumbência aquele regramento.
O juízo de origem, tendo por aplicável a hipótese do inciso II do § 4º do art. 85 da lei adjetiva (decisão ilíquida), estabeleceu que a verba honorária deveria ser calculada em liquidação.
Considerando, porém, que o valor da condenação, embora não possa ser definido com absoluta precisão neste momento, é, no mínimo, facilmente estimável, sendo possível afirmar que não excederá 200 salários mínimos, impõe-se fixar, desde logo, a verba sucumbencial. Para tanto, devem ser observados o grau de zelo profissional, o tempo despendido, a natureza e a importância da causa, bem como os parâmetros relacionados à extensão da base de cálculo.
Assim, e considerados os pressupostos dos §§2º e 3º do art. 85 do CPC, a verba honorária deve ser fixada em 10% sobre o valor das parcelas vencidas.
Mantida a decisão em grau recursal, contudo, impõe-se a majoração dos honorários, por incidência do disposto no §11 do mesmo dispositivo legal.
Dessa forma, os honorários vão fixados em 15% sobre o valor das parcelas vencidas, observado o trabalho adicional realizado em grau recursal.
Antecipação de tutela
Confirmado o direito ao benefício de aposentadoria, resta mantida a antecipação dos efeitos da tutela, concedida pelo juízo de origem.
CONCLUSÃO
Mantida a sentença no mérito, adequando-se os critérios de correção monetária.
Dado parcial provimento ao apelo do INSS para fixar os juros de mora de acordo com o disposto no art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação da Lei 11.960/09, na forma da fundamentação supra.
Majorados os honorários advocatícios em decorrência da incidência do §11 do art. 85 do NCPC.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao apelo do INSS.
Juíza Federal Marina Vasques Duarte de Barros Falcão
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 31/01/2018
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000309-53.2016.4.04.7104/RS
ORIGEM: RS 50003095320164047104
RELATOR | : | Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PROCURADOR | : | Dr. Alexandre Amaral Gavronski |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | ELY DA SILVEIRA RIBEIRO |
ADVOGADO | : | CAROLINE LENZI ADAMY |
: | Luís Otávio Montemezzo Ribeiro |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 31/01/2018, na seqüência 702, disponibilizada no DE de 09/01/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DO INSS.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO |
VOTANTE(S) | : | Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO |
: | Juiz Federal ÉZIO TEIXEIRA | |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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