APELAÇÃO CÍVEL Nº 5003129-56.2017.4.04.9999/PR
RELATOR | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | JOSE CARLOS FERREIRA |
ADVOGADO | : | LIGIA MARIA FAGUNDES |
: | JAQUELINE LUIZ |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. SEGURADO ESPECIAL BOIA FRIA. REQUISITOS. INÍCIO DE PROVA MATERIAL COMPLEMENTADA POR PROVA TESTEMUNHAL.
1. Para a concessão de aposentadoria rural por idade, disciplinada nos parágrafos do artigo 48 da Lei 8.212/91, deve o beneficiário demonstrar a sua condição de segurado especial, atuando na produção rural em regime de economia familiar, pelo período mínimo de 180 meses (para os casos em que implementadas as condições a partir de 2011, conforme tabela progressiva constante no artigo 142 combinado com o artigo 143, ambos da Lei de Benefícios) e o requisito idade, qual seja, 60 anos para homens e 55 para mulheres. Para este benefício, a exigência de labor rural por, no mínimo, 180 meses (tabela do artigo 142 da Lei 8.212/91) é a carência, não se exigindo prova do recolhimento de contribuições.
2. No caso particular dos trabalhadores rurais boias frias, dada sua peculiar condição e notável dificuldade em portar documentos que comprovem sua condição de segurado especial, o egrégio Superior Tribunal de Justiça, em regime de julgamento de recursos repetitivos, ao julgar o REsp 1321493/PR (1ª Seção, rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 10/10/2012) fixou tese no sentido de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, conhecer em parte do apelo do INSS e negar provimento à parte conhecida, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 28 de agosto de 2017.
Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9106887v11 e, se solicitado, do código CRC 29064558. | |
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RELATÓRIO
O Sr. Desembargador Federal
AMAURY CHAVES DE ATHAYDE (Relator):
Trata-se de procedimento comum ajuizado por JOSÉ CARLOS FERREIRA contra o INSS, onde o Autor pede que o Réu seja condenado a lhe conceder a o benefício previdenciário de aposentadoria rural por idade, desde a data do requerimento administrativo, em 4.11.2011. Alega perfazer os requisitos exigidos para o benefício.
Instruído o feito, inclusive com realização de audiência para a oitiva de testemunhas, foi entregue sentença julgando procedente o pedido inicial, concedendo o benefício de aposentadoria rural por idade ao autor, no valor de 1 salário mínimo, com início desde o requerimento administrativo. Os valores pretéritos devem ser corrigidos pelo INPC, desde o vencimento de cada parcela, e acrescidos de juros de mora de 1% ao mês, até 29 de junho de 2009, com base no DL 2.322/87 e, partir dessa data, pelo índice de juros das cadernetas de poupança, com incidência uma única, vez, nos termos do art. 1º-F da Lei 9.494/97, na redação dada pela Lei 11.960/2009.
O INSS apelou. Sustenta, em suma, que não há prova material suficiente a demonstrar o trabalho rural do Autor, pelo período exigido em lei. Pede a reforma da sentença, julgando-se improcedente o pedido inicial. Subsidiariamente, pede seja integralmente aplicado o artigo 1º-F da Lei 9.494/97.
Processado o recurso, vieram os autos a este Tribunal.
É o relatório. Peço inclusão em pauta.
Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE
Relator
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VOTO
O Sr. Desembargador Federal
AMAURY CHAVES DE ATHAYDE (Relator):
I - Aposentadoria por idade rural - fundamentação legal
Trata-se de ação onde se postula a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, previsto nos parágrafos 1º e 2º do artigo 48 da Lei 8.212/91. Transcrevo os referidos dispositivos:
Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)
§ 1o Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11. (Redação Dada pela Lei nº 9.876, de 26.11.99)
§ 2o Para os efeitos do disposto no § 1o deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os incisos III a VIII do § 9o do art. 11 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 11,718, de 2008)
A aposentadoria por idade rural, referida nos parágrafos 1º e 2º do artigo 48 da Lei de Benefícios, é dirigida aos segurados especiais, assim definidos no inciso VII do "caput" e parágrafo 1º do artigo 11 da Lei 8.212/91:
Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas: (Redação dada pela Lei nº 8.647, de 1993)
(...)
VII - como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de: (Redação dada pela Lei nº 11.718, de 2008)
a) produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividade: (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)
1. agropecuária em área de até 4 (quatro) módulos fiscais; (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)
2. de seringueiro ou extrativista vegetal que exerça suas atividades nos termos do inciso XII do caput do art. 2º da Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000, e faça dessas atividades o principal meio de vida; (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)
b) pescador artesanal ou a este assemelhado que faça da pesca profissão habitual ou principal meio de vida; e (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)
c) cônjuge ou companheiro, bem como filho maior de 16 (dezesseis) anos de idade ou a este equiparado, do segurado de que tratam as alíneas a e b deste inciso, que, comprovadamente, trabalhem com o grupo familiar respectivo. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)
§ 1o Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes. (Redação dada pela Lei nº 11.718, de 2008)
De modo geral, para a fruição dos benefícios prestados pelo Regime Geral da Previdência Social - RGPS, deve o beneficiário implementar três pressupostos básicos: a) a condição de segurado ou de dependente (este último, nas hipóteses em que lhe caiba algum benefício), que nada mais é que o vínculo com o RGPS, b) a carência, definida no artigo 24 da Lei de Benefícios como sendo o "(...) número de contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário faça jus ao benefício (...)" e, conforme o caso, c) os pressupostos específicos para o benefício pleiteado (idade, incapacidade laborativa, relação de dependência de segurado, etc.).
No caso da aposentadoria rural por idade, disciplinada nos parágrafos do artigo 48 da Lei 8.212/91, deve o requerente demonstrar a sua condição de segurado especial, atuando na produção rural em regime de economia familiar, pelo período mínimo de 180 meses (para os casos em que implementadas as condições a partir de 2011, conforme tabela progressiva constante no artigo 142 combinado com o artigo 143, ambos da Lei de Benefícios) e o requisito idade, qual seja, 60 anos para homens e 55 para mulheres. Para este benefício, em especial, a exigência de labor rural por, no mínimo, 180 meses (tabela do artigo 142 da Lei 8.212/91) é a carência, não se exigindo prova do recolhimento de contribuições.
II - Aposentadoria por idade rural - orientação jurisprudencial
O desafio para a obtenção da aposentadoria por idade rural está, exatamente, em demonstrar o implemento dos seus pressupostos.
A idade demonstra-se pelos meios ordinários, mediante apresentação de documentos civis: carteira de identidade, certidão de nascimento ou casamento, etc.
A prova da implementação do tempo de atuação na produção rural, em regime de economia familiar, no mais das vezes, apresenta alguma dificuldade. Tratam-se os requerentes do benefício de aposentadoria rural por idade de pessoas, de modo geral, com pouca instrução e sem uma disciplina adequada para a guarda de documentos. Por esse motivo, a produção de prova oral idônea (testemunhal) é de grande valia, que, embora não admitida de forma exclusiva, serve para complementar o imprescindível início de prova material (artigo 55, parágrafo 3º, da Lei 8.213/91). Sobre o tema, relevante destacar a Súmula nº 149 do Superior Tribunal de Justiça, objetivando que a "(...) prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário".
Ainda quanto ao necessário início de prova material, a jurisprudência lhe atribui efeitos retroativos, desde que complementada por prova testemunhal, conforme orientação firmada na Súmula 577 do Superior Tribunal de Justiça (É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório). Aquela Egrégia Corte também consolidou entendimento no sentido de atribuir efeitos prospectivos ao início de prova material, reconhecendo-lhe "(...) eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o posterior à data do documento, desde que corroborado por robusta prova testemunhal" (tópico 2 da ementa do AgInt no REsp 1606371/PR, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 20/04/2017, DJe 08/05/2017).
Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o REsp. .354.908-SP, da relatoria do Ministro Mauro Campbell Marques, em 9.9.2015, pelo regime de recursos repetitivos, decidiu que, para a concessão da aposentadoria rural por idade, deve o beneficiário estar em atividade no momento em que cumprir o requisito de idade mínima. A tese restou fixada nos seguintes termos:
Tema STJ nº 642 - O segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade.
Para a demonstação do exercício da atividade rural, como cumprimento de requisito para o benefício de aposentadoria por idade rural, vale o elenco de documentos previstos no artigo 106 da Lei 8.212/91, a exemplo de contrato de arrendamento, declaração do sindicato, cadastro no INCRA e bloco de notas de produtor rural, entre outros. Contudo, o rol de documentos ali apontados não é exaustivo (TRF4, APELREEX 0002032-82.2012.404.9999, QUINTA TURMA, Relator ROGER RAUPP RIOS, D.E. 18/11/2014), sendo viável o manejo de outros elementos probantes. O que não se admite, conforme já consignado acima, é o uso de prova exclusivamente testemunhal (parágrafo 3º do artigo 55 da Lei 8.212/91).
Considerando-se que o segurado especial pode, muitas vezes, integrar força de trabalho em regime de economia familiar, a jurisprudência reconhece que embora a documentação probante do exercício da atividade rural esteja em nome de apenas um membro, pode ser aproveitada para os demais integrantes da família. Esse entendimento restou sumulado pelo Tribunal Regional Federal Federal da 4ª Região, nos seguintes termos:
SÚMULA 73: Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental.
Quanto aos critérios legais caracterizadores do regime de economia familiar, cabem algumas considerações.
Não obstante aplicável o limite legal do tamanho da propriedade, de até 4 (quatro) módulos fiscais, para caracterização do regime de economia familiar (item 1, alínea 'a', inciso VII do artigo 11 da Lei 8.212/91, na redação dada pela Lei 11.718/2008), a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça entende que "(...) o tamanho da propriedade rural, por si só, não tem ocondão de descaracterizar o regime de economia familiar, quando preenchidos os demais requisitos legalmente exigidos" (REsp 1649636/MT, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 28/03/2017, DJe 19/04/2017).
Embora a configuração do segurado especial em regime de economia familiar não admita a utilização de empregados permanentes (artigo 11, § 1º, "in fine", da Lei 8.212/91), a própria Lei de Benefícios viabiliza, no parágrafo 7º do seu artigo 11º, que:
O grupo familiar poderá utilizar-se de empregados contratados por prazo determinado ou de trabalhador de que trata a alínea 'g' do inciso V do caput, à razão de no máximo 120 (cento e vinte) pessoas por dia no ano civil, em períodos corridos ou intercalados ou, ainda, por tempo equivalente em horas de trabalho, não sendo computado nesse prazo o período de afastamento em decorrência da percepção de auxílio-doença. (Redação dada pela Lei nº 12.873, de 2013)
Importante assentar, também, que o parágrafo 9º do artigo 11 da Lei 8.212/91, elenca algumas fontes de rendimento relativas a determinadas atividades, as quais não afastam a condição de segurado especial, a exemplo do exercício de mandato eletivo de dirigente sindical de organização da categoria de trabalhadores rurais, o mandado de vereador do Município em que desenvolve a atividade rural e a atividade artesanal desenvolvida com matéria prima produzida pelo respectivo grupo familiar, entre outras. Contudo, afora essas circunstâncias excepcionais, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça, pela sistemática dos recursos repetitivos, que o "(...) trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada, a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar (...)" (REsp 1.304.479/SP, Relator Min. Herman Benjamim, julgado em 10/10/2012). Quanto a esse tópico, também reconhece aquela Egrégia Corte que o "(...) exercício de atividade urbana pelo rurícola não afasta, por si só, sua condição de segurado especial. No entanto, não se considera segurado especial quando ficar demonstrado que o trabalho urbano constitui a principal atividade laborativa do requerente e/ou suaprincipal fonte de renda" (REsp 1483172/CE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/10/2014, DJe 27/11/2014).
Por fim, no caso particular dos trabalhadores rurais boias frias, dada sua peculiar condição e notável dificuldade em portar documentos que comprovem sua condição de segurado especial, o egrégio Superior Tribunal de Justiça, em regime de julgamento de recursos repetitivos, ao julgar o REsp 1321493/PR (Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/10/2012) fixou a seguinte tese:
TEMA 554: Aplica-se a Súmula 149/STJ ('A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário') aos trabalhadores rurais denominados 'boias-frias', sendo imprescindível a apresentação de início de prova material. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
III - Aposentadoria por idade rural - caso concreto
O Autor, nascido em 14.10.1951 (cédula de identidade, evento 1, OUT7), completara 60 anos em 14.10.2011, contando com 61 anos na data do ajuizamento da presente demanda (em 6.2.2013). Logo, implementa o requisito idade para o benefício perseguido, necessitando verificar se preenche a carência e a concomitância do exerício de labor rural, no momento em que satisfizer a idade mínima ou em momento posterior, conforme o caso.
Conforme narrado na inicial, afirma o Autor que sempre trabalhou em atividade rural, e continua trabalhando, como boia fria. Contudo, teve indeferido o pedido do benefício de aposentadoria rural por idade, proposto na via administrativa, em 24.11.2011, por falta de prova.
Constam nos presentes autos os seguintes documentos, trazidos com a inicial:
- certidão de casamento do Autor, contraído com LÚCIA APARECIDA SOUZA BATISTA, em 12.12.1981, constando que o demandante exercia a profissão de lavrador (evento 1, OUT6);
- certidão de nascimento do filho, WANDERGON JOSÉ FERREIRA, em 24.9.1982, constando que o Autor exercia a profissão de lavrador (evento 1, OUT8).
Também foi produzida prova oral, em audiência, realizada em 4.5.2016, com depoimentos do Autor, de uma testemunha e de um informante (evento nº 62, TERMOAUD1, VIDEO2, VIDEO3 e VIDEO4). De ambos os depoimentos colhe-se que o Autor atuou na atividade rural, na condição de boia fria.
O Autor afirma que atua como lavrador há muito tempo e que mora em Itapira, há 30 anos, aproximadamente, trabalhando sempre como boia fria. Não recorda direito o nome dos "gatos", mencionado, apenas, um que tinha o apelido de "Gato" e outro chamado Davi. Disse que, atualmente, reduziu o ritmo, mas continua trabalhando. Menciona que quem contrata bastante são os Irmãos Menezes, cuja propriedade produz mandioca, soja e milho. Aponta que um diarista (boia fria) em Itapira recebe R$ 60,00 por dia. Afirma que para o transporte para o trabalhado, espera o ônibus num ponto denominado "pãozinho" e que, para realizar o trabalho, levava a própria enxada. Disse ue nunca trabalhou na cidade (atividade urbana), que tem CTPS, que já foi empregado na Fazenda Ipê (trabalhava com gado e morava lá), mas depois que veio para Itapira nunca teve carteira assinada. Por fim, apontou que tem um filho, que trabalha num abatedouro e que a esposa "é doméstica em casa".
Inicialmente arrolado como testemunha, o sr. JOSÉ DONIZETE LORENZETI afirmou perante o magistrado que é amigo íntimo do Autor. Por esse motivo, seu depoimento foi acolhido na condição de informante. Afirmou que conhece o Autor há 15 (quinze) anos, período em que trabalharam juntos como boia fria, em Itapira, até aproximandamente três anos atrás, entre outras atividades, em carpinagem. Disse que ora trabalhavam com um "gato", ora com outro, e que esperavam o ônibus no ponto denominado "pãozinho". Lembra dos "gatos" Tonho e Paulinho, não recordando os nomes de outros. Apontou o nome Tita, como uma das pessoas que mais contratava diaristas. Depois que o informante aposentou-se (há três anos), o Autor continou trabalhando. Disse que não tem conhecimento de o Autor ter trabalhado na cidade (atividade urbana). Lembra que trabalharam juntos para o Monteiro, onde plantavam e arrancavam grama e carpiam.
A testemunha SISNEI FRANCO afirmou que conhece o Autor há 15 anos, por ambos trabalharem na roça, como boias frias, enfatizando que quando se conheceram já eram diaristas, e que eperavam o ônibus para o trabalho no ponto denominado "pãozinho". A testemunha aponta que ainda trabalha e o Autor também, embora não todos os dias. Lembra dos "gatos" Raimundo, Márcio, Cláudio e Tonho. Entre os que mais contratam diaristas aponta os Irmãos Menezes, que produzem mandioca, onde o serviço é arrancar e carpir. Disse que o valor da diária, que depende do número de sacas, varia de R$ 80,00 a R$ 100,00 por dia. Por fim, afirmou que o Autor nunca trabalhou na cidade (atividade urbana).
Analisando o conjunto probatório, verifica-se que a prova documental, aponta que o Autor, de fato, é afeito à atividade rural, tendo em conta que não se apresenta qualquer outro motivo para declarar-se como lavrador, por ocasião do seu casamento, em 1981, e do nascimento do filho, em 1982, senão o fato de estar dizendo a verdade. De qualquer modo, mesmo que as certidões de casamento e nascimento sejam indiciárias, formam suficiente início de prova material, tendo em conta que corroborado e complementado pelos depoimentos da testemunha e do informante, os quais dão conta de que o Autor atua na atividade rural há mais de 15 anos. Importante salientar que o depoimento do sr. José Donizete Lorenzeti, embora acolhido como informações, sem o mesmo peso de um depoimento testemunhal, trata-se de pessoa que afirmou ter trabalhado com o Autor até meados de 2013 (três anos antes da audiência), o que lhe confere alguma robustez. Já o depoimento do sr. Sisnei Franco é robusto e firme, além de estar em sintonia com as informações prestadas pelo depoente José, no sentido de que o Autor atua na atividade rural, como boia fria, inclusive atualmente, embora em ritmo desacelerado.
Tendo em conta todo esse conjunto probatório, calha lembrar, conforme já apontado em tópico anterior, entende a jurisprudência que, relativamente aos boias frias, dada sua dificuldade em possuir documentos que provem essa condição, a exigência do início de prova material fica um pouco mais mitigada, podendo ser acolhida, mesmo que contemple, apenas, parte do período a ser considerado, desde que complementada por idônea e robusta prova testemunhal, o que é o caso dos autos.
Com efeito, considerando-se o conjunto probatório, verifica-se a existência de início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea e convincente depoimento na condição de informante, a demonstrarem que o Autor exerceu atividade rural, como boia fria, pelo menos, desde 2001, se considerado, com excessivo rigor, que os depoimentos cobririam 15 anos anteriores à audiência, realizada em 2016. No entanto, tendo em conta que as certidões de casamento e nascimento indiciam que o Autor já era trabalhador rural na década de 80 e que a testemunha Sisnei afirma que o Demandante já era diarista quando se conheceram, é mais que razoável que se reconheça que, em 2011, quando completara 60 anos de idade, o Autor já contava com mais de 15 anos (ou 180 meses) de atividade como boia fria, o que vem a atender ao período de carência exigido, conforme a tabela constante no artigo 142 da Lei 8.213/91, para o ano de 2011, ou seja, 180 meses de atividade rural. Note-se que os depoimentos também dão conta que, em 2011 (e em anos posteriores, inclusive) o Autor ainda estava em atividade.
Logo, o Autor preencheu os requisitos necessários para a obtenção do benefício de aposentadoria rural por idade, razão pela qual mantenho a sentença.
IV - Consectários
1. Correção monetária e juros moratórios
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.
Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O recente art. 491 do NCPC, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.
E no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo, especialmente se considerado que pende de julgamento no STF a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810).
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente regulados por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que sejam definidos na fase de cumprimento do julgado, em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentado que "diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução. 4. Embargos de declaração rejeitados". (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014).
Na mesma linha vêm decidindo as duas turmas de Direito Administrativo desta Corte (2ª Seção), à unanimidade, (Ad exemplum: os processos 5005406-14.2014.404.7101 3ª Turma, julgado em 01-06-2016 e 5052050-61.2013.404.7000, 4ª Turma, julgado em 25/05/2016)
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do novo Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a decisão acerca dos critérios de correção, ocasião em que, provavelmente, a questão já terá sido dirimida pelo tribunal superior, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
A fim de evitar novos recursos, inclusive na fase de cumprimento de sentença, e anteriormente à solução definitiva pelo STF sobre o tema, a alternativa é que o cumprimento do julgado se inicie, adotando-se os índices da Lei 11.960/2009, inclusive para fins de expedição de precatório ou RPV pelo valor incontroverso, diferindo-se para momento posterior ao julgamento pelo STF a decisão do juízo sobre a existência de diferenças remanescentes, a serem requisitadas, acaso outro índice venha a ter sua aplicação legitimada.
Os juros de mora, incidentes desde a citação, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Evita-se, assim, que o presente feito fique paralisado, submetido a infindáveis recursos, sobrestamentos, juízos de retratação, e até ações rescisórias, com comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional, apenas para solução de questão acessória.
Diante disso, este Regional tem diferido para a fase de execução a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009.
No entanto, no caso dos autos, a sentença reconheceu exatamente a forma de atualização pretendida pelo Apelante, ausentando-lhe, nesse tópico, interesse recursal. Logo, não conheço do apelo quanto a este tópico.
V - Prequestionamento
Em arremate, consigno que o enfrentamento das questões suscitadas em grau recursal, assim como a análise da legislação aplicável, são suficientes para prequestionar junto às instâncias Superiores os dispositivos que as fundamentam. Assim, deixo de aplicar os dispositivos legais ensejadores de pronunciamento jurisdicional distinto do que até aqui foi declinado. Desse modo, evita-se a necessidade de oposição de embargos de declaração tão somente para este fim, o que evidenciaria finalidade procrastinatória do recurso, passível de cominação de multa (artigo 538 do antigo CPC).
Ante o exposto, voto por voto por conhecer em parte do apelo do INSS e negar provimento à parte conhecida.
Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 28/08/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5003129-56.2017.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00002954920138160070
RELATOR | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
PRESIDENTE | : | Luiz Fernando Wowk Penteado |
PROCURADOR | : | Dr. Sérgio Cruz Arenhart |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | JOSE CARLOS FERREIRA |
ADVOGADO | : | LIGIA MARIA FAGUNDES |
: | JAQUELINE LUIZ |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 28/08/2017, na seqüência 141, disponibilizada no DE de 15/08/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU VOTO POR CONHECER EM PARTE DO APELO DO INSS E NEGAR PROVIMENTO À PARTE CONHECIDA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
: | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA | |
: | Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO |
Suzana Roessing
Secretária de Turma
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