APELAÇÃO CÍVEL Nº 5031673-54.2017.4.04.9999/PR
RELATOR | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | MANOELA IUSA DA SILVA |
ADVOGADO | : | ANDRÉ LUÍS PEREIRA BICHARA |
: | PAULO PEREIRA BICHARA | |
: | MONICA MARIA PEREIRA BICHARA |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. SEGURADO ESPECIAL BOIA FRIA. REQUISITOS. INÍCIO DE PROVA MATERIAL COMPLEMENTADA POR PROVA TESTEMUNHAL.
1. Para a concessão de aposentadoria rural por idade, disciplinada nos parágrafos do artigo 48 da Lei 8.212/91, deve o beneficiário demonstrar a sua condição de segurado especial, atuando na produção rural em regime de economia familiar, pelo período mínimo de 180 meses (para os casos em que implementadas as condições a partir de 2011, conforme tabela progressiva constante no artigo 142 combinado com o artigo 143, ambos da Lei de Benefícios) e o requisito idade, qual seja, 60 anos para homens e 55 para mulheres. Para este benefício, a exigência de labor rural por, no mínimo, 180 meses (tabela do artigo 142 da Lei 8.212/91) é a carência, não se exigindo prova do recolhimento de contribuições.
2. No caso particular dos trabalhadores rurais boias frias, dada sua peculiar condição e notável dificuldade em portar documentos que comprovem sua condição de segurado especial, o egrégio Superior Tribunal de Justiça, em regime de julgamento de recursos repetitivos, ao julgar o REsp 1321493/PR (1ª Seção, rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 10/10/2012) fixou tese no sentido de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 28 de agosto de 2017.
Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE
Relator
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RELATÓRIO
O Sr. Desembargador Federal
AMAURY CHAVES DE ATHAYDE (Relator):
Trata-se de procedimento comum ajuizado por MANOELA IUSA DA SILVA contra o INSS, onde a Autora pede que o Réu seja condenado a lhe conceder a o benefício previdenciário de aposentadoria rural por idade, desde a data do requerimento administrativo. Alega perfazer os requisitos exigidos para o benefício.
Instruído o feito, inclusive com realização de audiência para a oitiva de testemunhas, foi entregue sentença julgando procedente o pedido inicial, concedendo o benefício de aposentadoria rural por idade ao autor, no valor de 1 salário mínimo, com início desde a DER, em 5.2.2014. Os valores pretéritos devem ser corrigidos na forma prevista no artigo 1-F da Lei 9.494/97, na redação dada pela Lei 11.960/2009. O Réu foi condenado, ainda, ao apgamento de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a prolação da sentença (Súmula 111 do STJ) e ao pagamento de custas e despesas processuais. Foi deferida, ainda, atencipação dos efeitos da tutela, determinando-se a implementação do benefício no prazo de 60 dias da intimação do INSS.
O INSS apelou. Sustenta, em suma, que não há prova material suficiente a demonstrar o trabalho rural da Autora, pelo período exigido em lei. Destacou, ainda, que os depoimentos testemunhais foram vagos e imprecisos. Pede a reforma da sentença, julgando-se improcedente o pedido inicial.
Processado o recurso, vieram os autos a este Tribunal.
É o relatório. Peço inclusão em pauta.
Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE
Relator
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VOTO
O Sr. Desembargador Federal
AMAURY CHAVES DE ATHAYDE (Relator):
I - Aposentadoria por idade rural - fundamentação legal
Trata-se de ação onde se postula a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural, previsto nos parágrafos 1º e 2º do artigo 48 da Lei 8.212/91. Transcrevo os referidos dispositivos:
Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)
§ 1o Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11. (Redação Dada pela Lei nº 9.876, de 26.11.99)
§ 2o Para os efeitos do disposto no § 1o deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os incisos III a VIII do § 9o do art. 11 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 11,718, de 2008)
A aposentadoria por idade rural, referida nos parágrafos 1º e 2º do artigo 48 da Lei de Benefícios, é dirigida aos segurados especiais, assim definidos no inciso VII do "caput" e parágrafo 1º do artigo 11 da Lei 8.212/91:
Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas: (Redação dada pela Lei nº 8.647, de 1993)
(...)
VII - como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de: (Redação dada pela Lei nº 11.718, de 2008)
a) produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividade: (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)
1. agropecuária em área de até 4 (quatro) módulos fiscais; (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)
2. de seringueiro ou extrativista vegetal que exerça suas atividades nos termos do inciso XII do caput do art. 2º da Lei nº 9.985, de 18 de julho de 2000, e faça dessas atividades o principal meio de vida; (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)
b) pescador artesanal ou a este assemelhado que faça da pesca profissão habitual ou principal meio de vida; e (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)
c) cônjuge ou companheiro, bem como filho maior de 16 (dezesseis) anos de idade ou a este equiparado, do segurado de que tratam as alíneas a e b deste inciso, que, comprovadamente, trabalhem com o grupo familiar respectivo. (Incluído pela Lei nº 11.718, de 2008)
§ 1o Entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes. (Redação dada pela Lei nº 11.718, de 2008)
De modo geral, para a fruição dos benefícios prestados pelo Regime Geral da Previdência Social - RGPS, deve o beneficiário implementar três pressupostos básicos: a) a condição de segurado ou de dependente (este último, nas hipóteses em que lhe caiba algum benefício), que nada mais é que o vínculo com o RGPS, b) a carência, definida no artigo 24 da Lei de Benefícios como sendo o "(...) número de contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário faça jus ao benefício (...)" e, conforme o caso, c) os pressupostos específicos para o benefício pleiteado (idade, incapacidade laborativa, relação de dependência de segurado, etc.).
No caso da aposentadoria rural por idade, disciplinada nos parágrafos do artigo 48 da Lei 8.212/91, deve o requerente demonstrar a sua condição de segurado especial, atuando na produção rural em regime de economia familiar, pelo período mínimo de 180 meses (para os casos em que implementadas as condições a partir de 2011, conforme tabela progressiva constante no artigo 142 combinado com o artigo 143, ambos da Lei de Benefícios) e o requisito idade, qual seja, 60 anos para homens e 55 para mulheres. Para este benefício, em especial, a exigência de labor rural por, no mínimo, 180 meses (tabela do artigo 142 da Lei 8.212/91) é a carência, não se exigindo prova do recolhimento de contribuições.
II - Aposentadoria por idade rural - orientação jurisprudencial
O desafio para a obtenção da aposentadoria por idade rural está, exatamente, em demonstrar o implemento dos seus pressupostos.
A idade demonstra-se pelos meios ordinários, mediante apresentação de documentos civis: carteira de identidade, certidão de nascimento ou casamento, etc.
A prova da implementação do tempo de atuação na produção rural, em regime de economia familiar, no mais das vezes, apresenta alguma dificuldade. Tratam-se os requerentes do benefício de aposentadoria rural por idade de pessoas, de modo geral, com pouca instrução e sem uma disciplina adequada para a guarda de documentos. Por esse motivo, a produção de prova oral idônea (testemunhal) é de grande valia, que, embora não admitida de forma exclusiva, serve para complementar o imprescindível início de prova material (artigo 55, parágrafo 3º, da Lei 8.213/91). Sobre o tema, relevante destacar a Súmula nº 149 do Superior Tribunal de Justiça, objetivando que a "(...) prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário".
Ainda quanto ao necessário início de prova material, a jurisprudência lhe atribui efeitos retroativos, desde que complementada por prova testemunhal, conforme orientação firmada na Súmula 577 do Superior Tribunal de Justiça (É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório). Aquela Egrégia Corte também consolidou entendimento no sentido de atribuir efeitos prospectivos ao início de prova material, reconhecendo-lhe "(...) eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o posterior à data do documento, desde que corroborado por robusta prova testemunhal" (tópico 2 da ementa do AgInt no REsp 1606371/PR, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 20/04/2017, DJe 08/05/2017).
Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o REsp. .354.908-SP, da relatoria do Ministro Mauro Campbell Marques, em 9.9.2015, pelo regime de recursos repetitivos, decidiu que, para a concessão da aposentadoria rural por idade, deve o beneficiário estar em atividade no momento em que cumprir o requisito de idade mínima. A tese restou fixada nos seguintes termos:
Tema STJ nº 642 - O segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício. Ressalvada a hipótese do direito adquirido, em que o segurado especial, embora não tenha requerido sua aposentadoria por idade rural, preenchera de forma concomitante, no passado, ambos os requisitos carência e idade.
Para a demonstação do exercício da atividade rural, como cumprimento de requisito para o benefício de aposentadoria por idade rural, vale o elenco de documentos previstos no artigo 106 da Lei 8.212/91, a exemplo de contrato de arrendamento, declaração do sindicato, cadastro no INCRA e bloco de notas de produtor rural, entre outros. Contudo, o rol de documentos ali apontados não é exaustivo (TRF4, APELREEX 0002032-82.2012.404.9999, QUINTA TURMA, Relator ROGER RAUPP RIOS, D.E. 18/11/2014), sendo viável o manejo de outros elementos probantes. O que não se admite, conforme já consignado acima, é o uso de prova exclusivamente testemunhal (parágrafo 3º do artigo 55 da Lei 8.212/91).
Considerando-se que o segurado especial pode, muitas vezes, integrar força de trabalho em regime de economia familiar, a jurisprudência reconhece que embora a documentação probante do exercício da atividade rural esteja em nome de apenas um membro, pode ser aproveitada para os demais integrantes da família. Esse entendimento restou sumulado pelo Tribunal Regional Federal Federal da 4ª Região, nos seguintes termos:
SÚMULA 73: Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental.
Quanto aos critérios legais caracterizadores do regime de economia familiar, cabem algumas considerações.
Não obstante aplicável o limite legal do tamanho da propriedade, de até 4 (quatro) módulos fiscais, para caracterização do regime de economia familiar (item 1, alínea 'a', inciso VII do artigo 11 da Lei 8.212/91, na redação dada pela Lei 11.718/2008), a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça entende que "(...) o tamanho da propriedade rural, por si só, não tem ocondão de descaracterizar o regime de economia familiar, quando preenchidos os demais requisitos legalmente exigidos" (REsp 1649636/MT, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 28/03/2017, DJe 19/04/2017).
Embora a configuração do segurado especial em regime de economia familiar não admita a utilização de empregados permanentes (artigo 11, § 1º, "in fine", da Lei 8.212/91), a própria Lei de Benefícios viabiliza, no parágrafo 7º do seu artigo 11º, que:
O grupo familiar poderá utilizar-se de empregados contratados por prazo determinado ou de trabalhador de que trata a alínea 'g' do inciso V do caput, à razão de no máximo 120 (cento e vinte) pessoas por dia no ano civil, em períodos corridos ou intercalados ou, ainda, por tempo equivalente em horas de trabalho, não sendo computado nesse prazo o período de afastamento em decorrência da percepção de auxílio-doença. (Redação dada pela Lei nº 12.873, de 2013)
Importante assentar, também, que o parágrafo 9º do artigo 11 da Lei 8.212/91, elenca algumas fontes de rendimento relativas a determinadas atividades, as quais não afastam a condição de segurado especial, a exemplo do exercício de mandato eletivo de dirigente sindical de organização da categoria de trabalhadores rurais, o mandado de vereador do Município em que desenvolve a atividade rural e a atividade artesanal desenvolvida com matéria prima produzida pelo respectivo grupo familiar, entre outras. Contudo, afora essas circunstâncias excepcionais, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça, pela sistemática dos recursos repetitivos, que o "(...) trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada, a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar (...)" (REsp 1.304.479/SP, Relator Min. Herman Benjamim, julgado em 10/10/2012). Quanto a esse tópico, também reconhece aquela Egrégia Corte que o "(...) exercício de atividade urbana pelo rurícola não afasta, por si só, sua condição de segurado especial. No entanto, não se considera segurado especial quando ficar demonstrado que o trabalho urbano constitui a principal atividade laborativa do requerente e/ou suaprincipal fonte de renda" (REsp 1483172/CE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/10/2014, DJe 27/11/2014).
Por fim, no caso particular dos trabalhadores rurais boias frias, dada sua peculiar condição e notável dificuldade em portar documentos que comprovem sua condição de segurado especial, o egrégio Superior Tribunal de Justiça, em regime de julgamento de recursos repetitivos, ao julgar o REsp 1321493/PR (Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/10/2012) fixou a seguinte tese:
TEMA 554: Aplica-se a Súmula 149/STJ ('A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário') aos trabalhadores rurais denominados 'boias-frias', sendo imprescindível a apresentação de início de prova material. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
III - Aposentadoria por idade rural - caso concreto
A Autora, nascida em 19.8.1958 (carteira de identidade, evento 1, out3), completara 55 anos em 19.8.2013, contando com 57 anos na data do ajuizamento da presente demanda (em 7.7.2016). Logo, implementa o requisito idade para o benefício perseguido, necessitando verificar se preenche a carência e a concomitância do exerício de labor rural, no momento em que satisfizer a idade mínima ou em momento posterior, conforme o caso.
Conforme narrado na inicial, afirma a Autora que sempre trabalhou em atividade rural, como boia fria. Contudo, teve indeferido o pedido do benefício de aposentadoria rural por idade, proposto na via administrativa, em 5.2.2014, por falta de prova.
Constam nos presentes autos os seguintes documentos, trazidos com a inicial:
- certidão de casamento contraído com JOÃO CESÁRIO DA SILVA, em 29.12.1979, constando que este exercia a profissão de lavrador (evento 1, OUT3);
- certidão de nascimento de MÁRCIA MARIA DA SILVA, filha da Autora, em 29.3.1988, constando que o esposo da Autora era lavrador (evento , OUT5);
- certidão de nascimento de LUCIANA APARECIDA DA SILVA, filha da Autora, em 17.7.1995, constando que tanto a Autora quanto seu esposo tinha por atividade, agricultora e agricultor, respectivamente (evento 1, OUT5);
- carteira de filiação do esposo no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Jardim Alegre, admitido em 19.4.2004 (evento 1, OUT6);
- ficha da Autora, expedida pela Prefeitura do Município de Lidianópolis/PR, como usuária do atendimento de saúde do município, constando como ocupação lavradora, registrando atendimentos médicos/ambulatoriais do período de 2005 a 2015 (evento 1, OUT7);
- cadastro da Autora como cliente da loja PAVAN E MARTINS LTDA - EPP, constando como função lavradora, já no ano de 1985 (evento 1, OUT7).
Também foi produzida prova oral, em audiência, com depoimentos de duas testemunhas (eventos nº 37 e 38). De ambos os depoimentos colhe-se que a Autora atuou na atividade rural, na condição de boia fria.
O depoente Francisco Antônio Teodolino (evento 37, VIDEO2) afirma que conhece a Autora há 20 anos e, por também ser lavrador, boia fria, trabalhou junto com a Autora, por todo esse período. Trabalharam nas propriedades de Luís (sobrenome inaudível), Sérgio Mendes, Maria Machado e Jaime, além de outras propriedades. Aponta que recebiam por dia trabalhado, recebendo o pagamento sempre nos sábados. Dentre as atividades que realizavam, mencionou que roçavam, colhiam café e plantavam feijão. Afirma que a Autora deixou de trabalhar há 2 (dois) anos. Por fim, afirma que a Autora nunca trabalhou "na cidade" (atividade urbana), pois atuou, apenas, como boia fria.
O depoente Antônio da Silva (evento 37, VIDEO3) afirma que conhece a Autora há 22 anos, que a Autora exercia atividade como boia fria, assim como ele, e que trabalharam juntos. Afirma, com segurança, que a Autora trabalhou, como boia fria, até 2007. Nos 12 (doze) anos que trabalhou com a Autora, atuaram nas propriedades de Sérgio Mendes, (inaudível) Machado e Roberto (inaudível). Explica que o trabalho se dava semana para um proprietário, semana para outro, ocorrendo os pagamentos, por dia trabalhado, sempre no sábado e que nada recebiam pelos dias não trabalhados. Dentre as atividades realizadas, disse que colhiam algodão e café, quebravam milho e carpiam. Aponta que a Autora nunca trabalhou na cidade. Quanto ao momento em que a Autora teria encerrado suas atividades laborais como boia fria, o depoente hora afirma que ela teria parado em 2007, hora dizia que ela parou há 2 (dois) anos. Perguntado, disse não "saber explicar sobre isso".
Analisando o conjunto probatório, verifica-se que a prova documental, aponta que a Autora, de fato, exerceu a atividade rural como boia fria. Embora nas certidões de seu casamento e de nascimento da primeira filha, conste apenas o esposo da Autora como agricultor/lavrador, não é desarrazoado considerar que a Autora também já exercesse essa atividade. De todo o modo, já a partir do nascimento da segunda filha, em 1995, a respectiva certidão informa que a Autora declarou-se como agricultora. Além disso, há nos autos ficha cadastral da Autora, como cliente de loja, constando que em 1985, ao preencher o cadastro, declarou-se como lavradora. Além disso, tem-se a cateira do esposo, como associado ao Sindicato Rural, desde 2004, e a ficha de atendimento de saúde, prestado pelo Município de Lidianópolis/PR, constando que desde 2005 a Autora declara-se como lavradora.
Embora os documentos acima referidos, sejam indiciários quanto à atividade rurícola da Autora, formam suficiente início de prova material, que foi complementada pelos depoimentos testemunhais, no sentido de que a Demandante execeu a atividade rural, como boia fria. A testemunha Francisco Antônio Teodolino assegura, com robustez, que a Autora trabalhou como boia fria de 1995 a 2015 (20 anos ou 240 meses). Já a testemunha Antônio da Silva afirma de forma convincente que a Autora atuou na atividade rural de 1995 a 2007. Quanto ao período posterior, a testemunha ditubiou entre afirmar que a Autora teria parado de trabalhar em 2007 ou 2015. Apesar do magistrado tentar colher uma afirmação mais precisa, a testemunha não soube se explicar, o que se pode atribuir ao nervosismo de estar atuando como testemunha perante juiz. Contudo, isso não infirma o depoimento prestado pela outra testemunha, sr. Francisco Antônio Teodolino. Primeiro porque este último, sr. Francisco, deixa entrever que trabalhou com a Autora até ela cessar suas atividades, o que afirma ter ocorrido dois anos antes da audiência (ou seja, parou de trabalhar em 2015). Segundo, porque, aparentemente, parece que o aparente problema do depoimento do sr. Antônio, se deve ao fato de que ele mesmo parou de trabalhar em 2007 e, assim, não teria condições precisas de afirmar sobre a atividade laboral da Autora a partir de então.
Tendo em conta todo esse conjunto probatório, calha lembrar, conforme já apontado em tópico anterior, entende a jurisprudência que, relativamente aos boias frias, dada sua dificuldade em possuir documentos que provem essa condição, a exigência do início de prova material fica um pouco mais mitigada, podendo ser acolhida, mesmo que contemple, apenas, parte do período a ser considerado, desde que complementada por idônea e robusta prova testemunhal, o que é o caso dos autos.
Com efeito, considerando-se o conjunto probatório, verifica-se a existência de início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea, a demonstrarem que a Autora exerceu atividade rural, como boia fria, no período de 1995 a 2015, ou seja, 240 meses.
Conforme a tabela constante no artigo 142 da Lei 8.213/91, para o ano de 2015, exige-se, a título de carência, 180 meses de atividade rural. No caso, a Autora completou 55 anos de idade em 19.8.2013, momento em que contava, conforme as provas dos autos, com 240 meses de atividade rural como boia fria e que, nesse momento, ainda estava na ativa.
Logo, a Autora preencheu os requisitos necessários para a obtenção do benefício de aposentadoria rural por idade, razão pela qual mantenho a sentença.
V - Prequestionamento
Em arremate, consigno que o enfrentamento das questões suscitadas em grau recursal, assim como a análise da legislação aplicável, são suficientes para prequestionar junto às instâncias Superiores os dispositivos que as fundamentam. Assim, deixo de aplicar os dispositivos legais ensejadores de pronunciamento jurisdicional distinto do que até aqui foi declinado. Desse modo, evita-se a necessidade de oposição de embargos de declaração tão somente para este fim, o que evidenciaria finalidade procrastinatória do recurso, passível de cominação de multa (artigo 538 do antigo CPC).
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação do INSS.
Desembargador Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 28/08/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5031673-54.2017.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00034913820168160097
RELATOR | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
PRESIDENTE | : | Luiz Fernando Wowk Penteado |
PROCURADOR | : | Dr. Sérgio Cruz Arenhart |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | MANOELA IUSA DA SILVA |
ADVOGADO | : | ANDRÉ LUÍS PEREIRA BICHARA |
: | PAULO PEREIRA BICHARA | |
: | MONICA MARIA PEREIRA BICHARA |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 28/08/2017, na seqüência 143, disponibilizada no DE de 15/08/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE |
: | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA | |
: | Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO |
Suzana Roessing
Secretária de Turma
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| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Suzana Roessing |
| Data e Hora: | 29/08/2017 17:13 |
