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PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. SEGURADO ESPECIAL. CUMPRIMENTO DOS REQUISITOS. INÍCIO DE PROVA. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS. CUST...

Data da publicação: 07/07/2020, 08:36:39

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. SEGURADO ESPECIAL. CUMPRIMENTO DOS REQUISITOS. INÍCIO DE PROVA. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS. CUSTAS. 1. Defere-se aposentadoria rural por idade ao segurado que cumpre os requisitos previstos no inciso VII do artigo 11, no parágrafo 1º do artigo 48, e no artigo 142, tudo da Lei 8.213/1991. 2. Preenchido o requisito etário, e comprovada a carência exigida ainda que de forma não simultânea, é devido o benefício. 3. Para a comprovação do exercício da atividade rural exige-se início de prova, não havendo a necessidade da prova material cobrir todo o período de carência, desde que a prova oral corrobore todo o período alegado, suprindo as lacunas da prova documental. 4. Definição da correção monetária diferida para a fase de execução. Juros de mora desde a citação, conforme o art. 5º da Lei 11.960/2009, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei 9.494/1997. 5. O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (inc. I do art. 4º da Lei 9.289/1996) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigos 2º, parágrafo único, e 5º, I da Lei Estadual 14.634/2014). 6. Determinada a imediata implantação do benefício. (TRF4 5019525-74.2018.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relatora GISELE LEMKE, juntado aos autos em 29/11/2019)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação/Remessa Necessária Nº 5019525-74.2018.4.04.9999/RS

RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE

APELANTE: ENI SALETE BONADIMAN

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de ação previdenciária ajuizada na justiça estadual por ENI SALETE BONADIMAN, nascida em 28/02/1960, contra o INSS em 01/06/2015, pretendendo concessão de aposentadoria rural por idade.

O juízo de origem assim descreveu os contornos da lide:

Trata-se de ação para fins de concessão de aposentadoria por idade rural proposta por ENI SALETE BONADIMAN em face de INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO – INSS em que alega por ser segurada especial, requereu, administrativamente, a concessão do benefício de aposentadoria por idade em 02/03/22015, o qual não foi concedido em razão de não haver comprovação de que efetivamente exercia atividade agrícola. Afirmou que as provas são totalmente contrárias às alegações da autarquia. Requereu o benefício da gratuidade judiciária e a procedência da ação e condenação do réu à concessão do benefício. Juntou Documentos (fls. 06/75).

Deferida a gratuidade judiciária e determinada a justificação administrativa (fls. 76/77).

Justificação administrativa às fls. 81/91.

A autora requereu a procedência dos pedidos, em razão do conteúdo da JA. Ainda, informou que não possui interesse na produção de outras provas (fl. 93).

Citado (fl. 94), o réu apresentou contestação às fls. 95/99 em que alega que a autora não juntou aos autos prova material hábil a comprovar o labor rural exercido em regime de economia familiar, no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, em tempo equivalente à carência. Referiu que a prova material é escassa para o período de 1993 a 2001, no qual seu esposo teria trabalhado em atividade urbana. Requereu a improcedência dos pedidos. Juntou documentos (fls. 100/107).

A autora apresentou réplica às fls. 109/110, em que refere que a prova apresentada é hábil como início de prova material e capaz de comprovar a qualidade de segurada especial da autora. Quanto ao fato de seu esposo haver trabalhado em atividade urbana, por curto período de tempo, não é óbice para o indeferimento do benefício.

Promoção Ministerial pela não intervenção às fls. 111/111v.

Pelo juízo, foi determinada a intimação do réu, acerca do interesse na produção de outras provas (fl. 112).

Intimado, o INSS informou não possuir interesse na produção de outras provas (fl. 112v).

Declarada encerrada a instrução (fl. 113).

A autora reportou suas alegações finais às manifestações de fls. 93, 109/110 (fl. 115).

Pelo réu, alegações finais remissivas (fl. 115v).

(...)

A sentença (Evento 3 - SENT19), datada de 16/11/2017, julgou procedente o pedido, reconhecendo o trabalho rural em regime de economia familiar da parte autora nos período de 1983 a 1993, 2002, 2006 e de 2009 a 2014, condenando o INSS a conceder à parte autora a aposentadoria rural por idade a contar da DER (02/03/2015), com a correção e juros definidos no artigo 5º da Lei 11.960/2009, que deu nova redação ao art.1º-F da Lei 9.494/1997. Condenou também o INSS ao pagamento de custas pela metade (excetuada a taxa judiciária, cuja isenção foi estabelecida pela Lei Estadual 8.960/1989), despesas judiciárias e honorários advocatícios, estes fixados em 10% do valor das parcelas vencidas até a data da publicação da sentença. Submeteu, finalmente, a sentença à remessa oficial.

Apelou a parte autora (Evento 3 - APELAÇÃO20). Em suas razões, requereu o reconhecimento dos períodos de atividade rural não reconhecidos pela sentença (1994 a 2001, 2003 a 2005, 2007 a 2008 e 2015). Requereu, também, para o caso do provimento do recurso, que seja deferida a tutela específica, nos termos dos artigos 461 do CPC/1973 e 497 do CPC/2015.

Também apelou o INSS (Evento 3 - APELAÇÃO21). Em suas razões, alegou a autarquia que a parte autora não cumpriu os 180 meses de carência necessários para a concessão do benefício pleiteado. Nesse sentido, argumenta que verificou-se a descontinuidade do labor rurícula da autora no intervalo de 1993 a 2002, de 2002 a 2006 e de 2006 a 2009, fatores este que afastariam a condição de segurada especial da demandante durante o período de carência e que impediriam a concessão da aposentadoria pleiteada. Para o caso de manutenção do mérito da sentença, requereu a isenção de custas e suscitou, ainda, o prequestionamento dos dispositivos legais e constitucionais mencionados no recurso.

Com contrarrazões da parte autora (Evento 3 - CONTRAZ23), vieram os autos a este Tribunal.

VOTO

DO REEXAME NECESSÁRIO

O juízo de origem submeteu a sentença ao reexame necessário.

A presente demanda possui valor líquido e certo sendo inaplicável a disciplina da Súmula nº 490 do Superior Tribunal de Justiça.

Por outro lado, o art. 496, §3º, I, do Código de Processo Civil/2015, dispensa a submissão da sentença ao duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a 1.000 (mil) salários mínimos para a União e suas respectivas autarquias e fundações de direito público.

Diante da nova disposição legal sobre o tema, solicitou-se à Divisão de Cálculos Judiciais - DICAJ informações. A DICAJ por sua vez explicitou que, para que uma condenação previdenciária atingisse o valor de 1.000 salários mínimos, necessário seria que a RMI fosse fixada no valor teto dos benefícios previdenciários, bem como abrangesse um período de 10 (dez) anos entre a DIB e a prolação da sentença.

No caso concreto, é possível concluir com segurança absoluta que o limite de 1.000 salários mínimos não seria alcançado pelo montante da condenação, uma vez que a DIB do benefício é 02/03/2015 e a sentença é datada de 16/11/2017.

Assim sendo, não conheço da remessa necessária.

Observo que a necessidade de se analisar o conceito de sentença ilíquida em conformidade com as disposições do Novo CPC é objeto da Nota Técnica n.º 03, emitida pelo Centro de Inteligência da Justiça Federal.

Outrossim, havendo impugnação específica sobre o ponto, oportuniza-se à parte a apresentação de memória de cálculo do montante que entender devido, como forma de instruir eventual recurso interposto, o qual será considerado apenas para a análise do cabimento ou não da remessa necessária.

Destarte, passo à análise da matéria objeto do recurso interposto.

DA APOSENTADORIA RURAL POR IDADE

Economia familiar - considerações gerais

O benefício de aposentadoria por idade do trabalhador rural qualificado como segurado especial em regime de economia familiar (inc. VII do art. 11 da Lei 8.213/1991), é informado pelo disposto nos §§ 1º e 2º do art. 48, no inc. II do art. 25, no inc. III do art. 26 e no inc. I do art. 39, tudo da Lei 8.213/1991. São requisitos para obter o benefício:

1) implementação da idade mínima (cinquenta e cinco anos para mulheres, e sessenta anos para homens);

2) exercício de atividade rural por tempo igual ao número de meses correspondente à carência exigida, ainda que a atividade seja descontínua.

Não se exige prova do recolhimento de contribuições (TRF4, Terceira Seção, EINF 0016396-93.2011.404.9999, rel. Celso Kipper, D.E. 16/04/2013; TRF4, EINF 2007.70.99.004133-2, Terceira Seção, rel. Luís Alberto D'azevedo Aurvalle, D.E. 23/04/2011).

A renovação do Regime Geral de Previdência Social da Lei 8.213/1991 previu regra de transição em favor do trabalhador rural, no art. 143:

Art. 143. O trabalhador rural ora enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social, na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do art. 11 desta Lei, pode requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de vigência desta Lei, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência do referido benefício.

Complementando o art. 143 na disciplina da transição de regimes, o art. 142 da Lei 8.213/1991 estabeleceu que para o segurado inscrito na Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, bem como para o trabalhador e o empregador rural cobertos pela Previdência Social Rural, a carência das aposentadorias por idade, por tempo de serviço e especial obedecerá a uma tabela de redução de prazos de carência no período de 1991 a 2010, levando-se em conta o ano em que o segurado implementou todas as condições necessárias à obtenção do benefício.

O ano de referência de aplicação da tabela do art. 142 da Lei 8.213/1991 será aquele em que o segurado completou a idade mínima para haver o benefício, desde que, até então, já disponha de tempo rural correspondente aos prazos de carência previstos. É irrelevante que o requerimento de benefício seja apresentado em anos posteriores ou que na data do requerimento o segurado não esteja mais trabalhando, devendo ser preservado o direito adquirido quando preenchidos todos os requisitos, segundo a legislação em vigor à época em que estes requisitos foram atendidos (§ 1º do art. 102 da Lei 8.213/1991).

Pode acontecer, todavia, que o segurado complete a idade mínima mas não tenha o tempo de atividade rural exigido, observada a tabela do art. 142 da Lei 8.213/1991. Nesse caso, a verificação do tempo de atividade rural necessária ao cumprimento da carência equivalente para obter o benefício não poderá mais ser feita com base no ano em que implementada a idade mínima, mas sim nos anos subsequentes, de acordo com a tabela mencionada, com exigências progressivas.

Ressalvam-se os casos em que o requerimento administrativo e a implementação da idade mínima tenham ocorrido antes de 31/08/1994 (vigência da MP 598/1994, convertida na Lei 9.063/1995, que alterou o art. 143 da Lei 8.213/1991), nos quais o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural anterior ao requerimento por um período de cinco anos (sessenta meses), não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei 8.213/1991.

A disposição contida no art. 143 da Lei 8.213/1991, exigindo que a atividade rural deva ser comprovada em período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada a favor do segurado. A regra atende às situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente comprovar trabalho rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser temperada em função do disposto no § 1º do art. 102 da Lei 8.213/1991 e, principalmente, em proteção ao direito adquirido. Se o requerimento datar de tempo consideravelmente posterior à implementação das condições, e a prova for feita, é admissível a concessão do benefício.

Em qualquer caso, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo (STF, Plenário, RE 631240/MG, rel. Roberto Barroso, j. 03/09/2014).

O tempo de trabalho rural deve ser demonstrado com, pelo menos, um início de prova material contemporânea ao período a ser comprovado, complementada por prova testemunhal idônea. Não é admitida a prova exclusivamente testemunhal, a teor do § 3º do art. 55 da Lei 8.213/1991, preceito jurisprudencialmente ratificado pelo STJ na Súmula 149 e no julgamento do REsp nº 1.321.493/PR (STJ, 1ª Seção, rel. Herman Benjamin, j. 10/10/2012, em regime de "recursos repetitivos" do art. 543-C do CPC1973). Embora o art. 106 da Lei 8.213/1991 relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo (STJ, Quinta Turma, REsp 612.222/PB, rel. Laurita Vaz, j. 28/04/2004, DJ 07/06/2004, p. 277).

Não se exige, por outro lado, prova documental contínua da atividade rural, ou em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, mas início de prova material (notas fiscais, talonário de produtor, comprovantes de pagamento do Imposto Territorial Rural (ITR) ou prova de titularidade de imóvel rural, certidões de casamento, de nascimento, de óbito, certificado de dispensa de serviço militar, quaisquer registros em cadastros diversos) que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar:

[...] considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ [...]

(STJ, Primeira Seção, REsp 1321493/PR, rel. Herman Benjamin, j. 10out.2012, DJe 19/12/2012)

Quanto à questão da contemporaneidade da prova documental com o período relevante para apuração de carência, já decidiu este Tribunal que: A contemporaneidade entre a prova documental e o período de labor rural equivalente à carência não é exigência legal, de forma que podem ser aceitos documentos que não correspondam precisamente ao intervalo necessário a comprovar. Precedentes do STJ (TRF4, Sexta Turma, REOAC 0017943-66.2014.404.9999, rel. João Batista Pinto Silveira, D.E. 14/08/2015).

Os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando dos pais ou cônjuge, consubstanciam início de prova material do trabalho rural, já que o §1º do art. 11 da Lei de Benefícios define como sendo regime de economia familiar o exercido pelos membros da família "em condições de mútua dependência e colaboração". Via de regra, os atos negociais são formalizados em nome do pater familias, que representa o grupo familiar perante terceiros, função esta, exercida em geral entre os trabalhadores rurais, pelo genitor ou cônjuge masculino. Nesse sentido, a propósito, preceitua a Súmula 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:

Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental", e já consolidado na jurisprudência do STJ: "A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido da admissibilidade de documentos em nome de terceiros como início de prova material para comprovação da atividade rural (STJ, Quinta Turma, REsp 501.009/SC, rel. Arnaldo Esteves Lima, j. 20/11/2006, DJ 11/12/2006, p. 407).

Importante, ainda, ressaltar que o fato de um dos membros da família exercer atividade outra que não a rural também não descaracteriza automaticamente a condição de segurado especial de quem postula o benefício. A hipótese fática do inc. VII do art. 11 da Lei 8.213/1991, que utiliza o conceito de economia familiar, somente será descaracterizada se comprovado que a remuneração proveniente do trabalho urbano do membro da família dedicado a outra atividade que não a rural seja tal que dispense a renda do trabalho rural dos demais para a subsistência do grupo familiar:

PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. SEGURADA ESPECIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. O exercício de atividade urbana por um dos componentes do grupo familiar não afasta, por si só, a qualidade de segurado especial dos demais membros, se estes permanecem desenvolvendo atividade rural, em regime de economia familiar. Para a descaracterização daquele regime, é necessário que o trabalho urbano importe em remuneração de tal monta que dispense o labor rural dos demais para o sustento do grupo. Precedentes do STJ.

(TRF4, Terceira Seção, EINF 5009250-46.2012.404.7002, rel. Rogerio Favreto, juntado aos autos em 12/02/2015)

O INSS alega com frequência que os depoimentos e informações tomados na via administrativa apontam para a ausência de atividade rural no período de carência. As conclusões adotadas pelo INSS no âmbito administrativo devem ser corroboradas pela prova produzida em Juízo. No caso de haver conflito entre as provas colhidas na via administrativa e as tomadas em juízo, deve-se ficar com estas últimas, uma vez que produzidas com as cautelas legais, garantindo-se o contraditório: "A prova judicial, produzida com maior rigorismo, perante a autoridade judicial e os advogados das partes, de forma imparcial, prevalece sobre a justificação administrativa" (TRF4, Quinta Turma, APELREEX 0024057-21.2014.404.9999, rel. Taís Schilling Ferraz, D.E. 25jun.2015). Dispondo de elementos que impeçam a pretensão da parte autora, cabe ao INSS produzir em Juízo a prova adequada, cumprindo o ônus processual descrito no inc. II do art. 373 do CPC2015 (inc. II do art. 333 do CPC1973).

DO CASO CONCRETO

Introdução

Como pode ser visto no relatório, o centro da controvérsia são os períodos de atividade rural não reconhecidos pela sentença. O juízo de origem reconheceu apenas os períodos nos quais havia comprovação documental, porém deferiu a aposentadoria pleiteada porque a soma dos períodos reconhecidos ultrapassava o tempo de carência necessário, aplicando a hipóse da possibilidade da descontinuidade do exercício da atividade rural referida no tópico que tratou das condições gerais para a concessão da aposentadoria por idade rural.

A parte autora requereu o reconhecimento de todo o período de atividade rural alegado, ou seja de 1983 até a DER (02/03/2015).

O INSS, por sua vez, alega que os períodos nos quais a parte autora não comprovou a atividade rural descaracterizam a sua condição de segurada especial e, consequentemente, impedem a concessão do benefício pleiteado na inicial.

Saliento que não há necessidade de analisar os períodos nos quais foi reconhecido o exercício da atividade rural. Cabe ao presente recurso, basicamente, analisar a possibilidade do reconhecimento ou não dos períodos de atividade rural não reconhecidos na sentença e, com base nesta avaliação, definir a procedência ou não de ambos recursos.

Da comprovação do exercício da atividade rural durante o período de carência.

Como visto no tópico que tratou das condições gerais para a concessão da aposentadoria rural por idade, não há a necessidade de o segurado demonstrar documentalmente todo o período de atividade rural alegado, mas sim apresentar início de prova devidamente corroborado pela prova testemunhal.

No caso concreto não há dúvida que há início de prova em relação ao período requerido. Nesse sentido, a parte autora juntou aos autos certidão de casamento com o Sr. Joacir Bonadiman, onde este consta como agricultor (Evento 3 - ANEXOSPET4, p. 10); matrícula do imóvel rural chácara 107, da 1ª Secção Planalto (Evento 3 - ANEXOSPET4, p. 16 a 19); notas de produtor rural e contranotas em seu nome e de seu esposo, dos anos de 1985/1986, 1988/1993, 2002, 2006, 2009/2010, 2012/2014 (Evento 3 - ANEXOSPET4, p. 20 a 52). Dessa forma, faz-se necessário analisar se a prova testemunhal confirma integralmente o tempo de exercício de atividade rural alegado.

No caso concreto, a oitiva das testemunhas deu-se durante a justificação administrativa, que foi anexada aos autos pelo INSS (Evento 3 - PET8). Nesta, constata-se que foram inquiridas três testemunhas em 25/11/2015, sendo os depoimentos reduzidos a termo (Evento 3 - PET8, p. 2 a 5).

As testemunhas inquiridas - Constante Guralski, Valdecir Três e Ércio Moresco - foram unânimes em afirmar que conhecem a parte autora há pelo menos 30 e que esta sempre trabalhou na lavoura, descrevendo em detalhes as atividades rurais realizadas pela parte autora e seu marido, assegurando que nunca contrataram mão de obra terceirizada nem arrendaram ou cederam parte das suas terras. Dessa forma, percebe-se que a prova oral corroborou todo o período de atividade rural alegado, preenchendo as lacunas da prova documental.

Dessa forma, deve ser dado provimento ao recurso da parte autora, determinando a averbação dos períodos de atividade rural não reconhecidos pela sentença no interregno entre 1983 e a data do requerimento administrativo (02/03/2015). Consequentemente, deve ser desprovido o recurso do INSS, haja vista que, com o reconhecimento integral do período alegado pela parte autora, não há mais lacunas sem comprovação do exercício de atividade rural durante o tempo de carência.

DOS CONSECTÁRIOS

Correção monetária

A sentença definiu que a correção monetária e os juros devem dar-se nos temos do artigo 5º da Lei 11.960/2009, que deu nova redação ao art.1º-F da Lei 9.494/1997.

Não se desconhece o recente julgado do STF, ocorrido em 03/10/2019, rejeitando os embargos de declaração opostos no RE 870.947/SE (Tema 810 do STF). Todavia, permanece pendente de julgamento no STJ a discussão da aplicabilidade do art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, com a redação dada pela Lei nº 11.960/2009, em relação às condenações impostas à Fazenda Pública, em julgamento submetido à sistemática de recursos repetitivos sob o Tema 905 (REsp 1.495.146/MG, REsp 1.492.221/PR, REsp 1.495.144/RS - Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Primeira Seção, j. em 22/02/2018), restando indefinida, ainda, a questão referente ao índice de atualização monetária aplicável aos débitos de natureza previdenciária a contar de 30/06/2009.

Em face dessa incerteza, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os artigos 4º, 6º e 8º do Código de Processo Civil de 2015, mostra-se adequado e racional diferir para a fase de execução a solução em definitivo acerca dos critérios de correção, ocasião em que, possivelmente, a questão já terá sido dirimida pelos Tribunais Superiores, o que conduzirá à observância pelos julgadores da solução uniformizadora.

A fim de evitar novos recursos, inclusive na fase de cumprimento de sentença, e anteriormente à solução definitiva sobre o tema, a alternativa é que o cumprimento do julgado se inicie adotando-se os índices da Lei 11.960/2009, inclusive para fins de expedição de precatório ou RPV pelo valor incontroverso, diferindo para momento posterior ao julgamento pelos Tribunais Superiores a decisão do Juízo de origem sobre a existência de diferenças remanescentes, a serem requisitadas caso outro índice venha a ter sua aplicação legitimada.

Assim, deve ser diferida de ofício a definição do índice da correção monetária para a fase de execução da sentença.

Juros de mora

A partir de 30/06/2009, os juros incidem, de uma só vez, a contar da citação, de acordo com os juros aplicáveis à caderneta de poupança, conforme o art. 5º da Lei 11.960/2009, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei n.º 9.494/1997.

Este foi o entendimento da sentença, motivo pelo qual permanece intocada no ponto.

Custas

A sentença condenou o INSS ao pagamento de custas. Em seu apelo, a autarquia requereu a sua completa isenção.

O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (inc. I do art. 4º da Lei 9.289/1996) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigos 2º, parágrafo único, e 5º, I da Lei Estadual 14.634/2014).

Dessa forma, deve ser dado parcial provimento ao recurso em relação ao ponto.

Honorários advocatícios

A sentença fixou os honorários advocatícios em 10% do valor da condenação. A determinação da sentença não destoa do entendimento deste Tribunal, motivo pelo qual deve ser mantida.

Considerando o disposto no art. 85, § 11, NCPC, e que está sendo dado provimento ao recurso do INSS, ainda que parcial, não é o caso de serem majorados os honorários fixados na sentença, eis que, conforme entendimento desta Turma, "a majoração dos honorários advocatícios fixados na decisão recorrida só tem lugar quando o recurso interposto pela parte vencida é integralmente desprovido; havendo o provimento, ainda que parcial, do recurso, já não se justifica a majoração da verba honorária" (TRF4, APELREEX n.º 5028489-56.2018.4.04.9999/RS, Relator Osni Cardoso Filho, julgado em 12/02/2019).

Tutela Específica

Em seu recurso, a parte autora requereu o deferimento da tutela específica nos termos dos artigos 461 do CPC/1973 e 497 do CPC/2015.

Considerando os termos do art. 497 do CPC, que repete dispositivo constante do art. 461 do Código de Processo Civil/1973, e o fato de que, em princípio, a presente decisão não está sujeita a recurso com efeito suspensivo (Questão de Ordem na AC nº 2002.71.00.050349-7/RS - Rel. p/ acórdão Desemb. Federal Celso Kipper, julgado em 09/08/2007 - 3ª Seção), o presente julgado deverá ser cumprido de imediato quanto à implantação do benefício postulado, observando-se o prazo de 45 dias.

Faculta-se ao beneficiário manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.

Dessa forma, deve ser dado provimento ao recurso da parte autora em relação ao ponto.

DO PREQUESTIONAMENTO

Em suas razões de apelação, o INSS suscitou o prequestionamento dos dispositivos legais e constitucionais levantados. Assim, com a finalidade específica de possibilitar o acesso às instâncias superiores, explicito que o presente acórdão, ao equacionar a lide como o fez, não violou nem negou vigência dos dispositivos constitucionais e/ou legais mencionados no recurso, os quais dou por prequestionados.

CONCLUSÃO

Em conformidade com a fundamentação acima, deve-se:

1. Não conhecer a remessa oficial;

2. Negar provimento ao apelo do INSS no que diz respeito ao mérito ação, mantendo o dispositivio da sentença que condenou o INSS à concessão do benefício pleiteado a partir da DER (02/03/2015);

3. Dar provimento ao recurso da parte autora, reformando a sentença no sentido de determinar a averbação dos períodos de atividade rural não reconhecidos na sentença no interregno entre 1983 e a DER;

4. Dar parcial provimento ao apelo do INSS no que diz respeito às custas, nos termos dos consectários;

5. Diferir de ofício a definição dos índices de correção monetária para a fase de execução, mantendo, até a decisão final sobre o tema, os índices do art. 5º da Lei 11.960/2009, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei n.º 9.494/1997, nos termos dos consectários.

5. Determinar a imediata implantação do benefício, nos termos da tutela específica.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto por não conhecer a remessa oficial, dar provimento à apelação da parte autora e parcial provimento à apelação do INSS.



Documento eletrônico assinado por GISELE LEMKE, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001443296v15 e do código CRC c773c477.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): GISELE LEMKE
Data e Hora: 11/11/2019, às 15:31:43


5019525-74.2018.4.04.9999
40001443296.V15


Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 05:36:39.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação/Remessa Necessária Nº 5019525-74.2018.4.04.9999/RS

RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE

APELANTE: ENI SALETE BONADIMAN

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: OS MESMOS

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. SEGURADO ESPECIAL. CUMPRIMENTO DOS REQUISITOS. INÍCIO DE PROVA. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS. CUSTAS.

1. Defere-se aposentadoria rural por idade ao segurado que cumpre os requisitos previstos no inciso VII do artigo 11, no parágrafo 1º do artigo 48, e no artigo 142, tudo da Lei 8.213/1991.

2. Preenchido o requisito etário, e comprovada a carência exigida ainda que de forma não simultânea, é devido o benefício.

3. Para a comprovação do exercício da atividade rural exige-se início de prova, não havendo a necessidade da prova material cobrir todo o período de carência, desde que a prova oral corrobore todo o período alegado, suprindo as lacunas da prova documental.

4. Definição da correção monetária diferida para a fase de execução. Juros de mora desde a citação, conforme o art. 5º da Lei 11.960/2009, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei 9.494/1997.

5. O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (inc. I do art. 4º da Lei 9.289/1996) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigos 2º, parágrafo único, e 5º, I da Lei Estadual 14.634/2014).

6. Determinada a imediata implantação do benefício.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, não conhecer da remessa oficial, dar provimento à apelação da parte autora e parcial provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 26 de novembro de 2019.



Documento eletrônico assinado por GISELE LEMKE, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001443297v4 e do código CRC 213769bb.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): GISELE LEMKE
Data e Hora: 28/11/2019, às 15:7:50


5019525-74.2018.4.04.9999
40001443297 .V4


Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 05:36:39.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Ordinária DE 26/11/2019

Apelação/Remessa Necessária Nº 5019525-74.2018.4.04.9999/RS

RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE

PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

PROCURADOR(A): CÍCERO AUGUSTO PUJOL CORRÊA

APELANTE: ENI SALETE BONADIMAN

ADVOGADO: RICARDO ZILIO POTRICH (OAB RS066681)

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

APELADO: OS MESMOS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 26/11/2019, às 13:30, na sequência 227, disponibilizada no DE de 08/11/2019.

Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NÃO CONHECER DA REMESSA OFICIAL, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal GISELE LEMKE

Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE

Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO

LIDICE PEÑA THOMAZ

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 05:36:39.

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