Apelação Cível Nº 5013831-56.2020.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
APELANTE: NICE DA SILVA DE OLIVEIRA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Trata-se de ação em que a parte autora objetiva a concessão de aposentadoria rural por idade, em face do exercício de atividades rurais como boia-fria.
Sentenciando, em 22/06/2020, a MMª Juíza extinguiu o processo sem resolução de mérito, em face da ausência de início de prova material, condenando a parte autora ao pagamento de custas e honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da causa, cuja exigibilidade fica suspensa em face da concessão de AJG.
Irresignada, apela a autora, alegando, preliminarmente, a necessidade da anulação da sentença em razão do cerceamento de defesa ocorrido ao indeferir a oitiva das testemunhas, pois inexiste coisa julgada, assim como listipendência. Afirma que existem provas materiais nos autos que comprovam o trabalho rural do demandante.
Sem contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
De fato, em consulta ao sistema verifica-se que a ação nº 0000104-61.2018.8.16.0156, que veiculou pedido idêntico ao destes autos, encontra-se ainda pendente de recurso aos tribunais superiores.
Ademais, a parte autora pretende utilizar neste feito o mesmo requerimento administrativo, indeferido pelo INSS em 2017, que deu origem à referida ação judicial. Não houve um novo pedido junto à Autarquia previdenciária, com apresentação de documentos complementares, o que viria a caracterizar a ausência de interesse de agir, uma vez que sequer houve contestação de mérito.
Por oportuno, a fim de evitar tautologia, transcrevo os fundamentos da sentença, os quais adoto como razões de decidir:
"[...] II – FUNDAMENTAÇÃO
A litispendência, na forma do disposto no inciso V, § 3º do art. 485, do CPC/2015, ocorre quando for repetida demanda idêntica a outra que se encontre em curso.
A ação será considerada idêntica à outra quando apresentarem as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido (art. 337, § 2º do CPC/2015).
A ação nº 0000104-61.2018.8.16.0156 foi ajuizada pela autora, em face do mesmo réu e com fundamento no mesmo processo administrativo que entendeu pelo não deferimento do benefício de aposentadoria por idade rural.
Na Apelação Cível nº 5002582-45.2019.4.04.9999, o TRF4 entendeu que processo deveria sem extinto, pois carente de documentos essenciais à sua propositura. Sobre esse ponto em específico, não foi interposto qualquer recurso. Portanto, trata-se de matéria preclusa.
Todavia, há recurso pendente de julgamento em relação ao pedido de devolução dos valores recebidos pela autora a título de antecipação dos efeitos da tutela. O processo foi suspenso na forma dos Arts. 1.030, III, e 1.040 do CPC/2015.
Não é possível prever quando o curso da ação 0000104- 61.2018.8.16.0156 chegará ao fim, com o trânsito em julgado. Apesar de restar clara a existência de duas ações idênticas, necessário reconhecer que a ausência de conteúdo probatório mínimo para instruir a petição inicial naqueles autos é matéria preclusa. O mérito do pedido feito nos autos 0000104- 61.2018.8.16.0156 jamais será apreciado.
Em meu entendimento, à luz do princípio da inafastabilidade do provimento jurisdicional e do acesso à justiça, a presente ação não deve ser extinta pela litispendência alegada em contestação.
Todavia, devemos nos atentar à realidade singular experimentada em processos de matéria previdenciária. Na ação anterior restou sedimentado que os documentos que integraram o Processo Administrativo NB 181.901.342-9 são insuficientes a instruir o pedido de aposentadoria por idade, na forma do Art. 320, do CPC.
Nesta nova ação a parte autora se serve do mesmo processo administrativo para demonstrar seu interesse. Para corrigir o vício apontado nos autos nº 0000104- 61.2018.8.16.0156, juntou os documentos de mov. 1.12. Tais documentos, obviamente, não integraram o processo administrativo que justifica o pedido da autora.
Por conseguinte, na via administrativa, o INSS jamais teve a oportunidade de analisar sua força probante. O STF já pacificou o entendimento que em relação aos requerimentos afetos ao âmbito de administração da autarquia previdenciária denominada INSS, o indeferimento administrativo relativo a matéria efetivamente enfrentada, é condição necessária ao interesse processual. Leia-se:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO E INTERESSE EM AGIR. 1. A instituição de condições para o regular exercício do direito de ação é compatível com o art. 5º, XXXV, da Constituição. Para se caracterizar a presença de interesse em agir, é preciso haver necessidade de ir a juízo. 2. A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas. 3. A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado. 4. Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo – salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração –, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão. 5. Tendo em vista a prolongada oscilação jurisprudencial na matéria, inclusive no Supremo Tribunal Federal, deve-se estabelecer uma fórmula de transição para lidar com as ações em curso, nos termos a seguir expostos. 6. Quanto às ações ajuizadas até a conclusão do presente julgamento (03.09.2014), sem que tenha havido prévio requerimento administrativo nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (i) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (ii) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão; (iii) as demais ações que não se enquadrem nos itens (i) e (ii) ficarão sobrestadas, observando-se a sistemática a seguir. 7. Nas ações sobrestadas, o autor será intimado a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção do processo. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado a se manifestar acerca do pedido em até 90 dias, prazo dentro do qual a Autarquia deverá colher todas as provas eventualmente necessárias e proferir decisão. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o interesse em agir e o feito deverá prosseguir. 8. Em todos os casos acima – itens (i), (ii) e (iii) –, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais. 9. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento, reformando-se o acórdão recorrido para determinar a baixa dos autos ao juiz de primeiro grau, o qual deverá intimar a autora – que alega ser trabalhadora rural informal – a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado para que, em 90 dias, colha as provas necessárias e profira decisão administrativa, considerando como data de entrada do requerimento a data do início da ação, para todos os efeitos legais. O resultado será comunicado ao juiz, que apreciará a subsistência ou não do interesse em agir.(RE 631240, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 03/09/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-220 DIVULG 07-11-2014 PUBLIC 10-11-2014)
Assim, os novos documentos não poderiam ser considerados nesse processo, sob pena de impor ao INSS condenação com base em provas que não lhe foram apresentadas antes, contrariando o julgado pelo STF. Sendo assim, com base no NB 181.901.342-9 (DER: 28/07/2017), imperioso reconhecer que a petição inicial, novamente, não vem instruída com os documentos indispensáveis à propositura da ação. Sendo assim, deve ser o processo extinto sem resolução do mérito, possibilitando a propositura de nova demanda nos termos do Art. 486, § 1º, do CPC. Tal conclusão se baseia no julgado do STJ:
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 543-C DO CPC. RESOLUÇÃO No. 8/STJ. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL APTA A COMPROVAR O EXERCÍCIO DA ATIVIDADE RURAL. CARÊNCIA DE PRESSUPOSTO DE CONSTITUIÇÃO E DESENVOLVIMENTO VÁLIDO DO PROCESSO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO, DE MODO QUE A AÇÃO PODE SER REPROPOSTA, DISPONDO A PARTE DOS ELEMENTOS NECESSÁRIOS PARA COMPROVAR O SEU DIREITO. RECURSO ESPECIAL DO INSS DESPROVIDO. 1. Tradicionalmente, o Direito Previdenciário se vale da processualística civil para regular os seus procedimentos, entretanto, não se deve perder de vista as peculiaridades das demandas previdenciárias, que justificam a flexibilização da rígida metodologia civilista, levando-se em conta os cânones constitucionais atinentes à Seguridade Social, que tem como base o contexto social adverso em que se inserem os que buscam judicialmente os benefícios previdenciários. 2. As normas previdenciárias devem ser interpretadas de modo a favorecer os valores morais da Constituição Federal/1988, que prima pela proteção do Trabalhador Segurado da Previdência Social, motivo pelo qual os pleitos previdenciários devem ser julgados no sentido de amparar a parte hipossuficiente e que, por esse motivo, possui proteção legal que lhe garante a flexibilização dos rígidos institutos processuais. Assim, deve-se procurar encontrar na hermenêutica previdenciária a solução que mais se aproxime do caráter social da Carta Magna, a fim de que as normas processuais não venham a obstar a concretude do direito fundamental à prestação previdenciária a que faz jus o segurado. 3. Assim como ocorre no Direito Sancionador, em que se afastam as regras da processualística civil em razão do especial garantismo conferido por suas normas ao indivíduo, deve-se dar prioridade ao princípio da busca da verdade real, diante do interesse social que envolve essas demandas. 4. A concessão de benefício devido ao trabalhador rural configura direito subjetivo individual garantido constitucionalmente, tendo a CF/88 dado primazia à função social do RGPS ao erigir como direito fundamental de segunda geração o acesso à Previdência do Regime Geral; sendo certo que o trabalhador rural, durante o período de transição, encontra-se constitucionalmente dispensado do recolhimento das contribuições, visando à universalidade da cobertura previdenciária e a inclusão de contingentes desassistidos por meio de distribuição de renda pela via da assistência social. 5. A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa. 6. Recurso Especial do INSS desprovido. (REsp 1352721/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL, julgado em 16/12/2015, DJe 28/04/2016).
Tendo em vista a ausência de início de prova material, na forma dos dispositivos legais mencionados, bem como do amparo jurisprudencial acima citado, entendo pela extinção do feito sem resolução do mérito.
Nessa linha, realizado requerimento administrativo, cujo indeferimento por parte da Autarquia originou uma ação judicial, que foi extinta sem julgamento do mérito, deveria a parte autora ter juntado documentos complementares e requerido novamente o benefício ao INSS, antes de ingressar com outra ação judicial.
Assim, deve ser mantida a sentença, não merecendo acolhida a apelação.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).
Aplica-se, portanto, em razão da atuação do advogado da parte em sede recursal, o comando do §11 do referido artigo, que determina a majoração dos honorários fixados anteriormente, pelo trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º e os limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º do art. 85.
Confirmada a sentença no mérito, majoro a verba honorária, elevando-a de 10% para 15% (quinze por cento) sobre o valor da causa, cuja exigibilidade fica suspensa em face da concessão de AJG.
PREQUESTIONAMENTO
Restam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pelas partes.
CONCLUSÃO
Apelação improvida e honorários majorados.
DISPOSITIVO
Ante ao exposto, voto por negar provimento à apelação.
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Apelação Cível Nº 5013831-56.2020.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
APELANTE: NICE DA SILVA DE OLIVEIRA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. TRABALHADOR RURAL. AJUIZAMENTO DE AÇÃO ANTERIOR. NOVO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. AUSENCIA.
1. Indeferido o beneficio pela Autarquia previdenciária e ajuizada ação que foi extinta sem julgamento do mérito, a parte autora deve complementar a documentação e reiterar o pedido junto ao INSS antes de ingressar com nova ação judicial, sob pena de restar caracterizada ausência de interesse de agir.
2.Verba honorária majorada em razão do comando inserto no § 11 do art. 85 do CPC/
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 09 de março de 2021.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 02/03/2021 A 09/03/2021
Apelação Cível Nº 5013831-56.2020.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
PRESIDENTE: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
PROCURADOR(A): SERGIO CRUZ ARENHART
APELANTE: NICE DA SILVA DE OLIVEIRA
ADVOGADO: FÁBIO ROBERTO BITENCOURT QUINATO (OAB PR034848)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 02/03/2021, às 00:00, a 09/03/2021, às 16:00, na sequência 71, disponibilizada no DE de 19/02/2021.
Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
SUZANA ROESSING
Secretária
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