D.E. Publicado em 30/01/2015 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0018530-88.2014.404.9999/SC
RELATORA | : | Juíza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | ARACI LAUERMANN ANDRIOLI |
ADVOGADO | : | Sandra Maria Barella Golin e outro |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE MODELO/SC |
EMENTA
ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ART. 203, INCISO V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. LEI 8.742/93 (LOAS). REQUISITOS. ORIENTAÇÃO DO STF.
1. A Constituição Federal exige apenas dois requisitos no tocante ao benefício assistencial de que trata o art. 203, V: (a) possuir o requerente deficiência incapacitante para a vida independente ou ser idoso, e (b) encontrar-se a família do requerente em situação de miserabilidade.
2. O requisito incapacidade para a vida independente (a) não exige que a pessoa possua uma vida vegetativa ou que seja incapaz de locomover-se; (b) não significa incapacidade para as atividades básicas do ser humano, tais como alimentar-se, fazer a higiene e vestir-se sozinho; (c) não impõe a incapacidade de expressar-se ou de comunicar-se; (d) não pressupõe dependência total de terceiros; (e) apenas indica que a pessoa deficiente não possui condições de autodeterminar-se completamente ou depende de algum auxílio, acompanhamento, vigilância ou atenção de outra pessoa, para viver com dignidade.
3. Segundo decidiu o Supremo Tribunal Federal em 18/04/2013 (RE 567.985/MT e RE 580.963/PR) é inconstitucional a definição da miserabilidade com base no critério de ¼ do salário mínimo (§ 3º do art. 20 da LOAS), devendo a condição socioeconômica do requerente, situação fática, ser aferida no caso concreto.
4. Na mesma ocasião o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do parágrafo único do artigo 34 da Lei 10.741/03 (Estatuto do Idoso). Segundo entendeu a Corte, restou caracterizada ofensa ao princípio da isonomia, pois aberta exceção para o recebimento de dois benefícios assistenciais por idosos, sem que contemplada a percepção conjunta de benefício de idoso com o de deficiente ou de qualquer outro previdenciário. Assim, incorreu o legislador em equívoco, pois, tratando-se de situações idênticas, deveria ser possível a exclusão do cômputo do benefício, independentemente de sua origem.
5. Comprovada a incapacidade para a vida independente e a situação de risco social em que vive, é devida a concessão do benefício assistencial à parte autora.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Colenda 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação e à remessa oficial, e determinar a implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 21 de janeiro de 2015.
Juíza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN
Relatora
Documento eletrônico assinado por Juíza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7233521v6 e, se solicitado, do código CRC ADE074A9. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Maria Isabel Pezzi Klein |
Data e Hora: | 22/01/2015 17:22 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0018530-88.2014.404.9999/SC
RELATORA | : | Juíza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | ARACI LAUERMANN ANDRIOLI |
ADVOGADO | : | Sandra Maria Barella Golin e outro |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE MODELO/SC |
RELATÓRIO
ARACI LAUERMANN ANDRIOLI ajuizou a presente ação ordinária contra o INSS, em 01/03/2012, objetivando a concessão de amparo social à pessoa portadora de deficiência, desde a data do requerimento administrativo (20/06/2011).
Em decisão saneadora, determinou-se a realização de perícia médica.
Realizadas duas perícias, a autora requereu a realização de outra perícia, agora para atestar incapacidade auditiva.
Realizada também esta última perícia, as partes foram intimadas.
Sentenciando, em 19/05/2014, o MM. Juízo a quo julgou procedente o pedido. É o seu dispositivo:
ANTE O EXPOSTO, julgo procedente o pedido inicial, para: a)condenar o réu ao pagamento, em favor da autora, do benefício da assistência social, previsto no art. 203, V, da CF e art. 2º, V, da Lei nº 8.742/93 da LOAS; b)condenar a autarquia ré ao pagamento das parcelas vencidas, desde a data do requerimento administrativo, que se deu em 20/06/2011.
As parcelas devidas serão acrescidas de juros e correção monetária de acordo com a Lei n.º 11.960, de 29/06/2009, publicada em 30/06/2009, que alterou o art. 1.º-F da Lei n.º 9.494/97, a qual estabelece para fins de atualização monetária e juros a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança.
Condeno o demandado ao pagamento de honorários, fixados em 10% sobre o valor da condenação na data desta sentença (Súmula 111 do STJ).
Custas pelo Instituto Nacional de Previdência Social, que gozará da isenção de 50%.
Sentença sujeita ao reexame necessário, que deverá ser realizado
pelo Tribunal Regional Federal da 4ª região.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Oportunamente, arquivem-se.
Irresignado, o INSS interpôs recurso de apelação, aduzindo que a parte autora não possui impedimento de longo prazo hábil ao preenchimento do requisito da deficiência incapacitante, previsto no § 2º do artigo 20 da Lei nº 8742/93, requerendo a reforma da sentença para a improcedência do pedido (fls. 151/155).
Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte, opinando o Ministério Público Federal pelo desprovimento do apelo do INSS.
É o relatório.
Juíza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN
Relatora
Documento eletrônico assinado por Juíza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7233519v3 e, se solicitado, do código CRC AD857A8C. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Maria Isabel Pezzi Klein |
Data e Hora: | 22/01/2015 17:22 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0018530-88.2014.404.9999/SC
RELATORA | : | Juíza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | ARACI LAUERMANN ANDRIOLI |
ADVOGADO | : | Sandra Maria Barella Golin e outro |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE MODELO/SC |
VOTO
Dos requisitos para concessão do beneficio assistencial
Segundo estabelece o artigo 203, "caput", e inciso V, da Constituição Federal, "a assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social", tendo por objetivos, dentre outros, "a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei".
Regulamentando o dispositivo constitucional, a Lei n.º 8.742, de 07/12/1003 (Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS), estabeleceu em seus artigos 20 e 38 (redação original):
"Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de 1 (um) salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 70 (setenta) anos ou mais e que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, entende-se como família o conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, desde que vivam sob o mesmo teto.
§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho.
§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
§ 4º O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo o da assistência médica.
§ 5º A situação de internado não prejudica o direito do idoso ou do portador de deficiência ao benefício.
§ 6º A deficiência será comprovada através de avaliação e laudo expedido por serviço que conte com equipe multiprofissional do Sistema Único de Saúde (SUS) ou do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), credenciados para esse fim pelo Conselho Municipal de Assistência Social."
Art. 38. A idade prevista no art. 20 desta lei reduzir-se-á, respectivamente, para 67 (sessenta e sete) e 65 (sessenta e cinco) anos após 24 (vinte e quatro) e 48 (quarenta e oito) meses do início da concessão.
No que toca ao benefício deferido com base no requisito etário, deve ser observado o art. 38 sofreu alteração com a edição da MP 1.599-39, de 1997, e reedições (convertida na Lei nº 9.720/98, a qual também alterou parcialmente a redação do artigo 20 da LOAS), tendo sido determinado simplesmente que a idade mínima seria reduzida para 67 anos a partir de 01/01/98.
Posteriormente, o artigo 34 da Lei nº 10.741, de 01/10/03 (Estatuto do idoso) com vigência a partir de 01/01/04), estabeleceu que a idade mínima para a obtenção do benefício passava a ser de 65 anos.
Por fim, ocorreu o advento das Leis 12.435, de 06/07/2011 (publicada no DOU de 07/07/2011) e 12.470, de 31/08/2011 (publicada no DOU de 01/09/2011). A primeira revogou o artigo 38 da LOAS (que já havia sido derrogado pelo Estatuto do Idoso); ambas alteraram a redação do artigo 20 do mesmo Diploma, deixando-a nos seguintes termos:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)
§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 4º O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os da assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 5º A condição de acolhimento em instituições de longa permanência não prejudica o direito do idoso ou da pessoa com deficiência ao benefício de prestação continuada. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 6º A concessão do benefício ficará sujeita à avaliação da deficiência e do grau de impedimento de que trata o § 2o, composta por avaliação médica e avaliação social realizadas por médicos peritos e por assistentes sociais do Instituto Nacional de Seguro Social - INSS. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)
§ 7º Na hipótese de não existirem serviços no município de residência do beneficiário, fica assegurado, na forma prevista em regulamento, o seu encaminhamento ao município mais próximo que contar com tal estrutura. (Incluído pela Lei nº 9.720, de 30.11.1998)
§ 8º A renda familiar mensal a que se refere o § 3o deverá ser declarada pelo requerente ou seu representante legal, sujeitando-se aos demais procedimentos previstos no regulamento para o deferimento do pedido.(Incluído pela Lei nº 9.720, de 30.11.1998)
§ 9º A remuneração da pessoa com deficiência na condição de aprendiz não será considerada para fins do cálculo a que se refere o § 3o deste artigo. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)
§ 10. Considera-se impedimento de longo prazo, para os fins do § 2o deste artigo, aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)
Percebe-se da disciplina legal que a concessão de benefício assistencial em princípio é cabível para as pessoas com deficiência ou com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais, desde que não possuam meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
Algumas observações são necessárias quanto aos requisitos legais.
No que toca à deficiência, estabelece o § 2º do artigo 20 da LOAS que deve ser entendida como aquela que acarreta "impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas", entendido o longo prazo, nos termos do § 10 do mesmo dispositivo, como "aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos".
O conceito de deficiência, saliente-se, está intimamente ligado ao impedimento efetivo ou potencial para o exercício de atividade que garanta a própria subsistência.
Com efeito, a lei, e bem assim sua respectiva interpretação, não podem conduzir a um conceito restritivo de deficiência, pois um dos objetivos constitucionais que deve servir de base à organização da seguridade social, é o da universalidade da cobertura e do atendimento (Constituição Federal, art. 194, parágrafo único, inciso I).
A propósito, constando do comando constitucional (art. 203 da CF) que a assistência social será prestada a quem dela necessitar, deve referida determinação ser observada como princípio hermenêutico ou, sob outro enfoque, como linha orientadora na interpretação dos demais dispositivos relativos à assistência social.
Não se pode perder de vista, ademais, que se trata o benefício de prestação continuada em discussão de direito fundamental, não só porque o art. 6º da Constituição Federal inclui entre os direitos sociais a assistência aos desamparados, mas principalmente porque o art. 203, inciso V, consagra expressamente a garantia de um salário mínimo mensal ao deficiente e ao idoso que se encontrem em situação de desamparo. E no âmbito das normas constitucionais definidoras de direitos fundamentais, pode-se afirmar a existência de uma eficácia vinculante para todos os poderes públicos.
Do que foi exposto, a interpretação da locução "pessoa portadora de deficiência" (inciso V do art. 203) deve ser feita em um sentido amplo, jamais restritivo.
Com efeito, se se exigisse que para perceber o benefício assistencial deveria a possuir deficiência que a incapacitasse não só para o exercício de atividade laboral, como para todos os atos da vida, aquele se subsumisse na primeira hipótese (deficiência incapacitante para o trabalho) mas não na segunda (deficiência incapacitante para todos os atos da vida) ficaria completamente desprotegido da seguridade social - pois, evidentemente, não teria condições de ser segurado da previdência social - , em afronta ao princípio da dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III), ao objetivo da seguridade social de universalidade da cobertura e do atendimento (CF, art. 194, parágrafo único, I) e à ampla garantia de prestação da assistência social (CF, art. 203, caput).
Assim, o requisito incapacidade para a vida independente (a) não exige que a pessoa possua uma vida vegetativa ou que seja incapaz de locomover-se; (b) não significa incapacidade para as atividades básicas do ser humano, tais como alimentar-se, fazer a higiene e vestir-se sozinho; (c) não impõe a incapacidade de expressar-se ou de comunicar-se; (d) não pressupõe dependência total de terceiros; (e) apenas indica que a pessoa deficiente não possui condições de autodeterminar-se completamente ou depende de algum auxílio, acompanhamento, vigilância ou atenção de outra pessoa, para viver com dignidade.
Nesse sentido o seguinte precedente do Superior Tribunal de Justiça:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ART. 20, § 2º DA LEI 8.742/93. PORTADOR DO VÍRUS HIV. INCAPACIDADE PARA O TRABALHO E PARA PROVER O PRÓPRIO SUSTENTO OU DE TÊ-LO PROVIDO PELA FAMÍLIA. LAUDO PERICIAL QUE ATESTA A CAPACIDADE PARA A VIDA INDEPENDENTE BASEADO APENAS NAS ATIVIDADES ROTINEIRAS DO SER HUMANO. IMPROPRIEDADE DO ÓBICE À PERCEPÇÃO DO BENEFÍCIO. RECURSO DESPROVIDO.
I - A pessoa portadora do vírus HIV, que necessita de cuidados frequentes de médico e psicólogo e que se encontra incapacitada, tanto para o trabalho, quanto de prover o seu próprio sustento ou de tê-lo provido por sua família - tem direito à percepção do benefício de prestação continuada previsto no art. 20 da Lei 8.742/93, ainda que haja laudo médico-pericial atestando a capacidade para a vida independente.
II - O laudo pericial que atesta a incapacidade para a vida laboral e a capacidade para a vida independente, pelo simples fato da pessoa não necessitar da ajuda de outros para se alimentar, fazer sua higiene ou se vestir, não pode obstar a percepção do benefício, pois, se esta fosse a conceituação de vida independente, o benefício de prestação continuada só seria devido aos portadores de deficiência tal, que suprimisse a capacidade de locomoção do indivíduo - o que não parece ser o intuito do legislador.
III - Recurso desprovido.
(STJ, 5ª Turma, RESP 360.202/AL, Rel. Min. Gilson Dipp, DJ 01-07-2002)
No que se refere ao requisito econômico, segundo a disciplina legal (§ 3º, do art. 20 da LOAS), considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo.
Ocorre que o Supremo Tribunal Federal, revendo a posição que tomou por ocasião da apreciação da ADI 1.232/DF, decidiu em julgamento ocorrido em 18/04/2013 (RE 567.985/MT e RE 580.963/PR), que fere a Constituição o critério da renda familiar mensal previsto no § 3º do artigo 20 da Lei 8.742/1993. Segundo a referida Corte, é inconstitucional a definição da miserabilidade com base no critério de ¼ do salário mínimo, devendo a condição socioeconômica do requerente, situação fática, ser aferida no caso concreto. A análise dos autos, portanto, é que vai determinar, no caso concreto, se o postulante de fato não possui meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família, o que deve ser aferido por todos os meios de prova admissíveis em direito, como a documental, testemunhal, e especialmente, mediante elaboração de laudo socioeconômico.
Deve ser salientado, ainda, no que toca ao requisito miserabilidade, que o Supremo Tribunal Federal, na mesma ocasião, declarou a inconstitucionalidade do parágrafo único do artigo 34 da Lei 10.741/03 (Estatuto do Idoso), o qual estabelece que o benefício assistencial já concedido a qualquer idoso membro da família "não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS". Segundo entendeu o Supremo Tribunal Federal, o parágrafo único do artigo 34 da Lei 10.741/03 violou o princípio da isonomia. Isso porque abriu exceção para o recebimento de dois benefícios assistenciais por idosos, mas não permitiu a percepção conjunta de benefício de idoso com o de deficiente ou de qualquer outro previdenciário. Assim, incorreu o legislador em equívoco, pois, tratando-se de situações idênticas, deveria ser possível a exclusão do cômputo do benefício, independentemente de sua origem.
Este Tribunal, a propósito, já vinha decidindo no sentido da desconsideração do interpretação restritiva do artigo 34, parágrafo único, do Estatuto do Idoso, como se percebe dos seguintes precedentes: Apelação Cível 5001120-20.2010.404.7202, 6ª. Turma, Relator Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle; Apelação Cível 5000629-13.2010.404.7202, 5ª. Turma, Relator Ricardo Teixeira do Valle Pereira; AC 0012386-06.2011.404.9999, 5ª Turma, Relator Rogério Favreto.
Do caso concreto
No presente caso, no que tange à análise da prova referente ao preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício postulado, a sentença da lavra do Juiz de Direito Wagner Luis Böing foi proferida nos seguintes termos:
A Constituição Federal, em seu art. 203, V, instituiu o benefício assistencial ao deficiente e ao idoso, independentemente de qualquer contribuição previdenciária, mediante a comprovação da ausência de condições de se prover a própria subsistência ou de tê-la provida por familiares.
Visando disciplinar os requisitos legais para a concessão do benefício, dispõe o art. 20 da Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS) que "o benefício de prestação continuada é a garantia de 1 salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 70 anos ou mais e que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família".
E, ainda, prevêem os parágrafos: "§ 2º - Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho"; "§ 3º - Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo"; "§ 4º - O
benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo o da assistência médica"; "§ 6º - A concessão do benefício ficará sujeita a exame médico pericial e laudo realizados pelos serviços de perícia médica do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS (com a redação dada pela Lei nº 9.720, de 30.11.1998)".
Dito isso, vê-se que a garantia constitucional do benefício assistencial de prestação continuada no valor de um salário mínimo pressupõe o preenchimento de dois requisitos. São eles:
1) a condição de deficiente (pessoa portadora de deficiência) ou idoso (idade igual ou maior que 65 anos redução do requisito etário pelo artigo 34 da Lei n. 10.741/2003) e;
2) miserabilidade (não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família).
A miserabilidade da autora não foi especificamente impugnada pela parte ré, que limitou-se à impugnação genérica.
No caso em comento, a autora mencionou que recebe, mensalmente o valor aproximado de R$ 80,00, e vive sozinha em casa cedida por terceiro. Fatos não impugnados pela ré.
Ademais, no julgamento do processo administrativo sequer foi discutida a miserabilidade da autora (fl. 27), restando incontroversa a sua situação de meserabilidade, pendendo como ponto controvertido somente a sua condição laboral.
A autora não preenche o requisito etário para ser considerada idosa, para tanto, sustenta ser incapaz de prover seu próprio sustento em razão de deficiência física.
Foram realizados três exames periciais: um para aferir incapacidade referente à déficit visual, um exame para aferir déficit auditivo e outro exame para aferir doenças de coluna.
O laudo pericial realizado em aparelho visual, atestou que a autora não encontra-se incapaz para o trabalho (fls. 87-90).
As outras duas perícias atestaram que a autora encontra-se parcial e permanentemente incapaz para o trabalho (fls. 95-97 e 132-134).
No exame realizado por médico ortopedista atestou-se que a autora "apresenta diagnóstico de artrose de coluna toraco-lombar, resultando em incapacidade laboral no presente momento". O experto atestou que "no momento, pela idade da periciada e pela qualificação profissional que ela possui, não entendo ser possível a reabilitação para outra atividade profissional" (fls. 96-97).
Já no exame realizado por médico otorrinolaringologista restou atestado que "a autora apresenta perda auditiva neurossensorial severa bilateralmente com redução da capacidade laboral". Disse que "a autora deve evitar laborar na presença de motores com ruído alto para não agravar a sua doença, assim como laborar sema presença de outras pessoas que possam alertá-la dos perigos expostos na agricultura" (fls. 132-133).
Muito embora os exames técnicos tenham atestado apenas a incapacidade parcial, levando em conta a idade já avançada da autora, bem como sua baixa escolaridade, tornando difícil a reabilitação em outra atividade, mostra-se aconselhável a concessão do benefício assistencial pleitado.
Nesse sentido, é o entendimento do Tribunal Regional da 4ª Região:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. CONCESSÃO. INCAPACIDADE PARCIAL PARA O TRABALHO E ESTADO DE MISERABILIDADE COMPROVADOS. SENTENÇA MANTIDA. ERRO MATERIAL. 1. Encontrando-se a parte autora incapacitada para o exercício de atividades que lhe garantam a subsistência, enquadra-se na acepção de pessoa com deficiência, prevista no § 2º do art. 20 da Lei nº 8.742-93, com a redação atual, pois enfrenta impedimentos de longo prazo, de natureza física que, em interação com diversas barreiras podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. Ainda que parcial a incapacidade, a autora faz jus ao benefício assistencial enquanto não recuperar sua capacidade laborativa e passar por um processo de reabilitação profissional que possibilite a sua inserção no mercado de trabalho. 2. Comprovada a incapacidade para o trabalho e o estado de miserabilidade, é de ser mantida a sentença que concedeu o benefício assistencial, desde a data do requerimento administrativo. 3. Corrigido, de ofício, erro material na sentença no tocante à data do protocolo administrativo. (TRF4, APELREEX 0014585-64.2012.404.9999, Sexta Turma, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 14/01/2013)
E também:
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. INCAPACIDADE PARA O TRABALHO E
IMPEDIMENTOS DE LONGO PRAZO DE NATUREZA FÍSICA. SITUAÇÃO DE RISCO SOCIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. 1. O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes
requisitos: a) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, consoante a redação original do art. 20 da LOAS, ou aquela pessoa que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, consoante a redação atual do referido dispositivo) ou idoso (neste caso, considerando-se, desde 1º de janeiro de 2004, a idade de 65 anos); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) do autor e de sua família. 2. A condição de deficiente restou comprovada por meio do perito judicial, que atestou que a autora está incapacitada parcial e permanentemente para serviços pesados, dentre os quais se inclui sua atividade habitual de agricultora, e, considerando sua idade e escolaridade, não pode ser reabilitada para o exercício de outras atividades. 3. A situação de desamparo necessária à concessão do benefício assistencial é presumida quando a renda familiar per capita for inferior ao valor de ¼ (um quarto) do salário mínimo. 4. Operando a devida subtração dos gastos despendidos em virtude da deficiência da parte autora certamente poucas condições financeiras restam à família do demandante para viver com dignidade, estando preenchido, dessa forma, o requisito da situação de hipossuficiência econômica. 5. Comprovado o preenchimento dos requisitos legais, deve ser concedido o benefício em favor da parte autora, desde a data da juntada do laudo socioeconômico. (TRF4, AC 2009.70.99.003610-2, Sexta Turma, Relator Celso Kipper, D.E. 24/04/2012).
Assim, pelos elementos constantes dos autos, conclui-se que os requisitos constitucionais encontram-se preenchidos, ou seja, a autora é portadora de deficiência e não possui meios de prover a sua própria subsistência.
Por conseguinte, comprovada a incapacidade da parte autora para o trabalho e para a vida independente, e não havendo controvérsia quanto à situação de risco social em que vive, é devido o benefício assistencial desde a data do requerimento administrativo, apresentado em 20/06/2011 (fl. 12), não merecendo reforma a sentença que julgou procedente o pedido.
Dos consectários
Segundo o entendimento das Turmas previdenciárias do Tribunal Regional Federal da 4ª Região estes são os critérios aplicáveis aos consectários:
a) CORREÇÃO MONETÁRIA:
A correção monetária, segundo o entendimento consolidado na 3ª Seção deste TRF4, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e jurisprudencialmente aceitos, quais sejam:
- ORTN (10/64 a 02/86, Lei nº 4.257/64);
- OTN (03/86 a 01/89, Decreto-Lei nº 2.284/86);
- BTN (02/89 a 02/91, Lei nº 7.777/89);
- INPC (03/91 a 12/92, Lei nº 8.213/91);
- IRSM (01/93 a 02/94, Lei nº 8.542/92);
- URV (03 a 06/94, Lei nº 8.880/94);
- IPC-r (07/94 a 06/95, Lei nº 8.880/94);
- INPC (07/95 a 04/96, MP nº 1.053/95);
- IGP-DI (05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6.º, da Lei n.º 8.880/94);
- INPC (a partir de 04/2006, conforme o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, combinado com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91, e REsp n.º 1.103.122/PR).
Entendia a 3ª Seção deste Tribunal que a contar de 30/06/2009, data em que passou a viger a Lei nº 11.960/09, de 29/06/2009, publicada em 30/06/2009 (a qual alterou o art. 1º-F da Lei nº 9.494/97), deveria haver, para fins de atualização monetária, a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, dos índices oficiais de remuneração básica aplicados à caderneta de poupança.
Não são aplicáveis, todavia, no que toca à correção monetária, os critérios previstos na Lei nº 11.960/2009, que modificou a redação do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, por conta de decisão proferida pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento das ADIs 4.357 e 4.425, que apreciou a constitucionalidade do artigo 100 da CF, com a redação que lhe foi dada pela EC 62/2006. Essa decisão proferida pela Corte Constitucional, além de declarar a inconstitucionalidade da expressão "na data de expedição do precatório", do §2º; dos §§ 9º e 10º; e das expressões "índice oficial de remuneração básica da caderneta de poupança" e "independente de sua natureza", do §12, todos do art. 100 da Constituição Federal de 1988, com a redação da Emenda Constitucional nº 62/2009, por arrastamento, também declarou inconstitucional o art. 1º-F da Lei nº 9.494, com a redação dada pelo art. 5º da Lei nº 11.960, de 29.07.2009 (atualização monetária pelo índice de remuneração da poupança).
Impõe-se, pois, a observância do que decidido com efeito erga omnes e eficácia vinculante pelo STF nas ADIs 4.357 e 4.425, restabelecendo-se, no que a sistemática anterior à Lei nº 11.960/09, ou seja, apuração de correção monetária pelo INPC.
A sentença deve ser adequada, quanto à correção monetária, aos critérios acima definidos. De fato, em razão do que decidido pelo Supremo Tribunal Federal, as disposições do art. 1º-F da Lei nº 9.494, com a redação dada pelo art. 5º da Lei nº 11.960/09, foram expungidas do ordenamento jurídico no que toca à correção monetária, a qual, como sabido, constitui acessório, sobre o qual pode e deve o órgão julgador deliberar. Eliminada do mundo jurídico uma norma legal em razão de manifestação do Supremo Tribunal Federal em ação direta de inconstitucionalidade, não pode subsistir decisão que a aplique, pois está em confronto com a Constituição Federal. Deve, portanto, haja vista os fundamentos constitucionais expostos, ser feita a adequação da correção monetária.
Irrelevante, registre-se, ausência de publicação dos acórdãos referentes às ADIs 4.357 e 4.425. Como já decidiu o plenário do STF ao apreciar o RE 634250AgR/PB, Rel. Min. Joaquim Barbosa, concluído o julgamento, viável "o cumprimento imediato da decisão, independente da publicação do acórdão." A propósito, o Supremo Tribunal Federal já está aplicando o precedente firmado no julgamento da ADIs mencionadas, como se percebe do seguinte precedente:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO - IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DO ÍNDICE OFICIAL DE REMUNERAÇÃO BÁSICA DA CADERNETA DE POUPANÇA COMO CRITÉRIO DE CORREÇÃO MONETÁRIA DOS DÉBITOS FAZENDÁRIOS SUJEITOS AO REGIME DE EXECUÇÃO INSCRITO NO ART. 100 DA CF/88 - DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE PARCIAL DO § 12 DO ART. 100 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA, NA REDAÇÃO DADA PELA EC Nº 62/2009 - DIRETRIZ JURISPRUDENCIAL FIRMADA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO.
(RE 747727AgR/SC. Relator(a): Min. CELSO DE MELLO. Julgamento: 06/08/2013. Órgão Julgador: Segunda Turma)
No corpo do voto proferido no RE 747727AgR/SC acima referido o Relator, Ministro Celso de Mello, consigna inclusive que o entendimento expresso nas ADIs já referidas "vem sendo observado em sucessivos julgamentos proferidos no âmbito do Supremo Tribunal Federal (RE 747.697/SC, Rel. Min. TEORI ZAVASCKI - RE 747.702/SC, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA - RE 747.706/SC, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA - RE 747.733/SC, Rel. Min. TEORI ZAVASCKI - RE 747.738/SC, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, v.g.)".
Registro, até para fim de prevenir possíveis embargos de declaração, que o afastamento de uma norma inconstitucional, com a aplicação correta do direito ao caso concreto, não caracteriza julgamento fora dos limites do pedido ou da devolução operada, ou muito menos pode, em tese, implicar, "reformatio in pejus", mormente no que toca a consectários, em relação aos quais sequer há necessidade de postulação da parte para que possa o Judiciário se manifestar.
A propósito, não há como se afirmar no caso em apreço a caracterização de "reformatio in pejus", pois esta constatação envolve avaliação da repercussão econômica do que decidido, e, no que toca ao índice de correção monetária, isso só é concretamente viável quando liquidado o julgado. Com efeito, a variação dos índices correção monetária é apurada mês a mês, mas a atualização monetária de determinado valor é feita com base em todo o período a ser considerado, de modo que não há como se afirmar aprioristicamente que a adoção deste ou daquele indexador em determinado período possa caracterizar prejuízo para uma das partes.
De qualquer sorte, para fins de prequestionamento, esclareço que esta decisão não caracteriza ofensa ao disposto nos 128, 460, 503 e 515, todos do CPC, e 27 da Lei nº 9.868/99, ou mesmo contraria a Súmula 45 do Superior Tribunal de Justiça.
Registro, por fim, que eventual alegação de desconformidade desta decisão com precedentes de outra Corte deve ser solvida pela via processual adequada.
b) JUROS DE MORA
Até 29/06/2009 os juros de mora, apurados a contar da data da citação, devem ser fixados à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de 30/06/2009, por força da Lei n.º 11.960, de 29/06/2009 (publicada em 30/06/2009), que alterou o art. 1.º-F da Lei n.º 9.494/97, para fins de apuração dos juros de mora haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice oficial aplicado à caderneta de poupança. Registre-se que a Lei 11.960/09, segundo o entendimento do STJ, tem natureza instrumental, devendo ser aplicada aos processos em tramitação (EREsp 1207197/RS. Relator Min. Castro Meira. Julgado em 18/05/2011).
Observo que as decisões tomadas pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no julgamento das ADIs 4.357 e 4.425 não interferiram com a taxa de juros aplicável às condenações da Fazenda Pública, consoante entendimento firmado no Superior Tribunal de Justiça a partir do julgamento do RESP 1.270.439. Com efeito, como consignado pela Ministra Eliana Calmon no julgamento do MS 18.217, "No julgamento do Resp 1.270.439/PR, sob a sistemática dos recursos repetitivos, esta Corte, diante da declaração de inconstitucionalidade parcial do art. 1º-F da Lei 9.494/99 no que concerne à correção monetária, ratificou o entendimento de que nas condenações impostas à Fazenda Pública após 29.06.2009, de natureza não tributária, os juros moratórios devem ser calculados com base na taxa de juros aplicáveis à caderneta de poupança".
c) HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS: devem ser fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência".
d) CUSTAS PROCESSUAIS: o INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS), isenções estas que não se aplicam quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (art. 33, p. único, da Lei Complementar estadual 156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
In casu, com relação aos juros de mora, aos honorários advocatícios e às custas processuais, a sentença está afeiçoada aos critérios adotados por esta Corte, não merecendo reforma no particular.
Da implantação do benefício
Assim decidiu a 3ª Seção deste Tribunal Regional Federal ao julgar em 09/08/07 a questão de ordem na apelação cível 2002.71.00.050349-7 (Rel. p/ acórdão Des. Federal Celso Kipper):
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. ART. 461 do CPC. TUTELA ESPECÍFICA. OBRIGAÇÃO DE FAZER. EFICÁCIA PREPONDERANTEMENTE MANDAMENTAL DO PROVIMENTO. CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO. POSSIBILIDADE. REQUERIMENTO DO SEGURADO. DESNECESSIDADE.
1. Atento à necessidade de aparelhar o processo de mecanismos preordenados à obtenção do resultado prático equivalente à situação jurídica que se verificaria caso o direito material tivesse sido observado espontaneamente pelo "devedor" através da realização da conduta imposta pelo direito material, o legislador, que já havia, na época da edição do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90) instituído a tutela específica do direito do "credor" de exigir o cumprimento dos deveres de fazer ou não fazer decorrentes de relação de consumo, inseriu no ordenamento processual positivo, por meio da alteração no art. 461 do Código de Processo Civil operada pela Lei 8.952/94, a tutela específica para o cumprimento dos deveres de fazer ou não fazer decorrentes das relações do direito material que não as de consumo.
2. A adoção da tutela específica pela reforma processual de 1994 do CPC veio para suprir, em parte, a morosidade judicial, na proporção em que busca dar ao cidadão aquilo e somente aquilo que lhe é devido, tirando o direito do plano genérico-abstrato da norma, conferindo-lhe efeitos concretos, com o fito de lhe garantir a mesma conseqüência do que aquela que seria obtida pelo adimplemento voluntário.
3. A sentença que concede um benefício previdenciário (ou assistencial), em regra, compõe-se de uma condenação a implantar o referido benefício e de outra ao pagamento das parcelas atrasadas. No tocante à determinação de implantação do benefício (para o futuro, portanto), a sentença é condenatória mandamental e será efetiva mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 461 do CPC, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo).
4. A respeito do momento a partir do qual se poderá tornar efetiva a sentença, na parte referente à implantação futura do benefício, a natureza preponderantemente mandamental da decisão não implica automaticamente o seu cumprimento imediato, pois há de se ter por referência o sistema processual do Código, não a Lei do Mandado de Segurança, eis que a apelação de sentença concessiva do benefício previdenciário será recebida em seu efeito devolutivo e suspensivo, nos termos do art. 520, caput, primeira parte, do CPC, motivo pelo qual a ausência de previsão de efeito suspensivo ex lege da apelação, em casos tais, traz por conseqüência a impossibilidade, de regra, do cumprimento imediato da sentença.
5. Situação diversa ocorre, entretanto, em segundo grau, visto que o acórdão que concede o benefício previdenciário, que esteja sujeito apenas a recurso especial e/ou recurso extraordinário, enseja o cumprimento imediato da determinação de implantar o benefício, ante a ausência, via de regra, de efeito suspensivo daqueles recursos, de acordo com o art. 542, § 2º, do CPC. Tal cumprimento não fica sujeito, pois, ao trânsito em julgado do acórdão, requisito imprescindível apenas para a execução da obrigação de pagar (os valores retroativamente devidos) e, consequentemente, para a expedição de precatório e de requisição de pequeno valor, nos termos dos parágrafos 1º, 1º-A e 3º do art. 100 da Constituição Federal.
6. O cumprimento imediato da tutela específica, diversamente do que ocorre no tocante à antecipação de tutela prevista no art. 273 do CPC, independe de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário, pois aquele é inerente ao pedido de que o réu seja condenado a conceder o benefício previdenciário, e o seu deferimento sustenta-se na eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 461 do CPC. Em suma, a determinação da implantação imediata do benefício contida no acórdão consubstancia, tal como no mandado de segurança, uma ordem (à autarquia previdenciária) e decorre do pedido de tutela específica (ou seja, o de concessão do benefício) contido na petição inicial da ação.
7. Questão de ordem solvida para que, no tocante à obrigação de implantar (para o futuro) o benefício previdenciário, seja determinado o cumprimento imediato do acórdão sujeito apenas a recurso especial e/ou extraordinário, independentemente de trânsito em julgado e de pedido específico da parte autora.
No caso dos autos, reconhecido o direito ao benefício, impõe-se a implantação.
A bem da celeridade processual, já que o INSS vem opondo embargos de declaração em todos os feitos nos quais determinada a implantação imediata do benefício, alegando, para fins de prequestionamento, violação dos 128 e 475-O, I, do CPC e 37 da Constituição Federal de 1988, abordo desde logo a matéria.
Não se cogita de ofensa aos artigos 128 e 475-O, I, do CPC, porque a hipótese, nos termos do precedente da 3ª Seção, não é de antecipação, de ofício, de atos executórios. A implantação do benefício decorre da natureza da tutela judicial deferida, como a propósito, está expresso na ementa da Questão de Ordem acima transcrita.
A invocação do artigo 37 da Constituição Federal, por outro lado, é despropositada. Sequer remotamente pode-se falar em ofensa ao princípio da moralidade na concessão de benefício previdenciário por autoridade judicial competente.
Desta forma, em vista da procedência do pedido e do que estabelecem os artigos 461 e 475-I, caput, bem como dos fundamentos expostos na questão de ordem cuja ementa foi acima transcrita, e inexistindo embargos infringentes, deve o INSS implantar o benefício em até 45 dias, conforme os parâmetros acima definidos, incumbindo ao representante judicial da autarquia que for intimado deste acórdão dar ciência à autoridade administrativa competente e tomar as demais providências necessárias ao cumprimento da tutela específica.
Dispositivo
Ante o exposto, voto no sentido de negar provimento à apelação e à remessa oficial, e determinar a implantação do benefício, nos termos da fundamentação.
Juíza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN
Relatora
Documento eletrônico assinado por Juíza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7233520v3 e, se solicitado, do código CRC F90B8D0F. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Maria Isabel Pezzi Klein |
Data e Hora: | 22/01/2015 17:22 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 21/01/2015
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0018530-88.2014.404.9999/SC
ORIGEM: SC 00002005520128240256
RELATOR | : | Juiza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN |
PRESIDENTE | : | Rogerio Favreto |
PROCURADOR | : | Dr. Claudio Dutra Fontella |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | ARACI LAUERMANN ANDRIOLI |
ADVOGADO | : | Sandra Maria Barella Golin e outro |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE MODELO/SC |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 21/01/2015, na seqüência 235, disponibilizada no DE de 08/01/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E À REMESSA OFICIAL, E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN |
VOTANTE(S) | : | Juiza Federal MARIA ISABEL PEZZI KLEIN |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO | |
: | Des. Federal LUIZ CARLOS DE CASTRO LUGON |
Lídice Peña Thomaz
Diretora de Secretaria
Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Diretora de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7311779v1 e, se solicitado, do código CRC F7BA3980. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Lídice Peña Thomaz |
Data e Hora: | 22/01/2015 16:00 |