| D.E. Publicado em 07/04/2015 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0014848-67.2010.404.9999/SC
RELATOR | : | Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
APELANTE | : | EMILLY PACHECO |
ADVOGADO | : | Odirlei de Oliveira e outros |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
EMENTA
ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ART. 203, INCISO V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. LEI 8.742/93 (LOAS). REQUISITOS. ORIENTAÇÃO DO STF.
1. A Constituição Federal exige apenas dois requisitos no tocante ao benefício assistencial de que trata o art. 203, V: (a) possuir o requerente deficiência incapacitante para a vida independente ou ser idoso, e (b) encontrar-se a família do requerente em situação de miserabilidade.
2. O requisito incapacidade para a vida independente (a) não exige que a pessoa possua uma vida vegetativa ou que seja incapaz de locomover-se; (b) não significa incapacidade para as atividades básicas do ser humano, tais como alimentar-se, fazer a higiene e vestir-se sozinho; (c) não impõe a incapacidade de expressar-se ou de comunicar-se; (d) não pressupõe dependência total de terceiros; (e) apenas indica que a pessoa deficiente não possui condições de autodeterminar-se completamente ou depende de algum auxílio, acompanhamento, vigilância ou atenção de outra pessoa, para viver com dignidade.
3. Segundo decidiu o Supremo Tribunal Federal em 18/04/2013 (RE 567.985/MT e RE 580.963/PR) é inconstitucional a definição da miserabilidade com base no critério de ¼ do salário mínimo (§ 3º do art. 20 da LOAS), devendo a condição socioeconômica do requerente, situação fática, ser aferida no caso concreto.
4. Na mesma ocasião o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do parágrafo único do artigo 34 da Lei 10.741/03 (Estatuto do Idoso). Segundo entendeu a Corte, restou caracterizada ofensa ao princípio da isonomia, pois aberta exceção para o recebimento de dois benefícios assistenciais por idosos, sem que contemplada a percepção conjunta de benefício de idoso com o de deficiente ou de qualquer outro previdenciário. Assim, incorreu o legislador em equívoco, pois, tratando-se de situações idênticas, deveria ser possível a exclusão do cômputo do benefício, independentemente de sua origem.
5. Não comprovada no caso concreto a situação de miserabilidade, não há que se falar em concessão do benefício assistencial.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Colenda 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 24 de março de 2015.
Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Relator
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7396928v2 e, se solicitado, do código CRC 791129C3. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Ricardo Teixeira do Valle Pereira |
| Data e Hora: | 25/03/2015 17:17 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0014848-67.2010.404.9999/SC
RELATOR | : | Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
APELANTE | : | EMILLY PACHECO |
ADVOGADO | : | Odirlei de Oliveira e outros |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
RELATÓRIO
EMILLLY PACHECO, representada por sua genitora, Andressa Spindola, ajuizou ação ordinária contra o INSS, em 29/04/2010, objetivando a concessão de benefício assistencial.
Instada a comprovar ter requerido administrativamente o benefício pretendido, a autora informou não o ter requerido na seara administrativa, sustentando a dispensabilidade de tal procedimento (fls. 40/41 e 43).
Sentenciando em 17/08/2010, o MM. Juízo a quo indeferiu a petição inicial, nos termos do artigo 295, III, do CPC e, em conseqüência, julgou extinto o processo, sem julgamento do mérito, com fulcro no artigo 267, I, do CPC (fls. 44/46).
Irresignada, a autora interpôs recurso de apelação, sustentando a desnecessidade de prévio pedido administrativo de benefício previdenciário como caracterização de interesse de agir, requerendo a reforma da sentença para a procedência do pedido contido na exordial (fls. 50/55).
Com as contrarrazões (fls. 61/66), subiram os autos a este Tribunal, opinando o Ministério Público Federal pelo provimento do recurso de apelação (fls. 69/71).
Na sessão de 25/01/2011, esta 5ª Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso (fls. 72/75).
O Ministério Público Federal interpôs recurso especial, o qual foi provido pela Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, para reformar o acórdão recorrido, anulando a sentença e determinando o retorno dos autos ao Juízo de primeira instância, a fim de que fosse retomado o regular processamento do feito.
Após o retorno dos autos à origem, o INSS foi citado e apresentou contestação refutando a pretensão da parte autora (fls. 121/166).
Determinada a realização de estudo social e perícia médica, os laudos respectivos aportaram às fls. 174/178 e 200/203.
Sentenciando, em 19/09/2014, o MM. Juízo a quo julgou improcedente o pedido inicial, condenando a parte autora ao pagamento das custas e dos honorários advocatícios, estes fixados em R$500,00 (quinhentos reais), verbas cuja exigibilidade suspendeu em face do reconhecimento do direito à AJG (fls. 212/213).
Irresignada, a autora interpôs recurso de apelação. Em suas razões, sustenta que preenche o requisito econômico necessário à concessão do amparo, além da incapacidade para a vida independente, requerendo a reforma da sentença para a procedência do pedido (fls. 216/222).
Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte, opinando o Ministério Público Federal pelo provimento da apelação.
É o relatório.
Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Relator
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7396926v5 e, se solicitado, do código CRC 1A9BCC9A. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Ricardo Teixeira do Valle Pereira |
| Data e Hora: | 25/03/2015 17:17 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0014848-67.2010.404.9999/SC
RELATOR | : | Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
APELANTE | : | EMILLY PACHECO |
ADVOGADO | : | Odirlei de Oliveira e outros |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
VOTO
Dos requisitos para concessão do beneficio assistencial
Segundo estabelece o artigo 203, "caput", e inciso V, da Constituição Federal, "a assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social", tendo por objetivos, dentre outros, "a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei".
Regulamentando o dispositivo constitucional, a Lei n.º 8.742, de 07/12/1003 (Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS), estabeleceu em seus artigos 20 e 38 (redação original):
"Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de 1 (um) salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 70 (setenta) anos ou mais e que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, entende-se como família o conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, desde que vivam sob o mesmo teto.
§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho.
§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
§ 4º O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo o da assistência médica.
§ 5º A situação de internado não prejudica o direito do idoso ou do portador de deficiência ao benefício.
§ 6º A deficiência será comprovada através de avaliação e laudo expedido por serviço que conte com equipe multiprofissional do Sistema Único de Saúde (SUS) ou do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), credenciados para esse fim pelo Conselho Municipal de Assistência Social."
Art. 38. A idade prevista no art. 20 desta lei reduzir-se-á, respectivamente, para 67 (sessenta e sete) e 65 (sessenta e cinco) anos após 24 (vinte e quatro) e 48 (quarenta e oito) meses do início da concessão.
No que toca ao benefício deferido com base no requisito etário, deve ser observado o art. 38 sofreu alteração com a edição da MP 1.599-39, de 1997, e reedições (convertida na Lei nº 9.720/98, a qual também alterou parcialmente a redação do artigo 20 da LOAS), tendo sido determinado simplesmente que a idade mínima seria reduzida para 67 anos a partir de 01/01/98.
Posteriormente, o artigo 34 da Lei nº 10.741, de 01/10/03 (Estatuto do idoso) com vigência a partir de 01/01/04), estabeleceu que a idade mínima para a obtenção do benefício passava a ser de 65 anos.
Por fim, ocorreu o advento das Leis 12.435, de 06/07/2011 (publicada no DOU de 07/07/2011) e 12.470, de 31/08/2011 (publicada no DOU de 01/09/2011). A primeira revogou o artigo 38 da LOAS (que já havia sido derrogado pelo Estatuto do Idoso); ambas alteraram a redação do artigo 20 do mesmo Diploma, deixando-a nos seguintes termos:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)
§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 4º O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os da assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 5º A condição de acolhimento em instituições de longa permanência não prejudica o direito do idoso ou da pessoa com deficiência ao benefício de prestação continuada. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 6º A concessão do benefício ficará sujeita à avaliação da deficiência e do grau de impedimento de que trata o § 2o, composta por avaliação médica e avaliação social realizadas por médicos peritos e por assistentes sociais do Instituto Nacional de Seguro Social - INSS. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)
§ 7º Na hipótese de não existirem serviços no município de residência do beneficiário, fica assegurado, na forma prevista em regulamento, o seu encaminhamento ao município mais próximo que contar com tal estrutura. (Incluído pela Lei nº 9.720, de 30.11.1998)
§ 8º A renda familiar mensal a que se refere o § 3o deverá ser declarada pelo requerente ou seu representante legal, sujeitando-se aos demais procedimentos previstos no regulamento para o deferimento do pedido.(Incluído pela Lei nº 9.720, de 30.11.1998)
§ 9º A remuneração da pessoa com deficiência na condição de aprendiz não será considerada para fins do cálculo a que se refere o § 3o deste artigo. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)
§ 10. Considera-se impedimento de longo prazo, para os fins do § 2o deste artigo, aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)
Percebe-se da disciplina legal que a concessão de benefício assistencial em princípio é cabível para as pessoas com deficiência ou com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais, desde que não possuam meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
Algumas observações são necessárias quanto aos requisitos legais.
No que toca à deficiência, estabelece o § 2º do artigo 20 da LOAS que deve ser entendida como aquela que acarreta "impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas", entendido o longo prazo, nos termos do § 10 do mesmo dispositivo, como "aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos".
O conceito de deficiência, saliente-se, está intimamente ligado ao impedimento efetivo ou potencial para o exercício de atividade que garanta a própria subsistência.
Com efeito, a lei, e bem assim sua respectiva interpretação, não podem conduzir a um conceito restritivo de deficiência, pois um dos objetivos constitucionais que deve servir de base à organização da seguridade social, é o da universalidade da cobertura e do atendimento (Constituição Federal, art. 194, parágrafo único, inciso I).
A propósito, constando do comando constitucional (art. 203 da CF) que a assistência social será prestada a quem dela necessitar, deve referida determinação ser observada como princípio hermenêutico ou, sob outro enfoque, como linha orientadora na interpretação dos demais dispositivos relativos à assistência social.
Não se pode perder de vista, ademais, que se trata o benefício de prestação continuada em discussão de direito fundamental, não só porque o art. 6º da Constituição Federal inclui entre os direitos sociais a assistência aos desamparados, mas principalmente porque o art. 203, inciso V, consagra expressamente a garantia de um salário mínimo mensal ao deficiente e ao idoso que se encontrem em situação de desamparo. E no âmbito das normas constitucionais definidoras de direitos fundamentais, pode-se afirmar a existência de uma eficácia vinculante para todos os poderes públicos.
Do que foi exposto, a interpretação da locução "pessoa portadora de deficiência" (inciso V do art. 203) deve ser feita em um sentido amplo, jamais restritivo.
Com efeito, se se exigisse que para perceber o benefício assistencial deveria a possuir deficiência que a incapacitasse não só para o exercício de atividade laboral, como para todos os atos da vida, aquele se subsumisse na primeira hipótese (deficiência incapacitante para o trabalho) mas não na segunda (deficiência incapacitante para todos os atos da vida) ficaria completamente desprotegido da seguridade social - pois, evidentemente, não teria condições de ser segurado da previdência social - , em afronta ao princípio da dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III), ao objetivo da seguridade social de universalidade da cobertura e do atendimento (CF, art. 194, parágrafo único, I) e à ampla garantia de prestação da assistência social (CF, art. 203, caput).
Assim, o requisito incapacidade para a vida independente (a) não exige que a pessoa possua uma vida vegetativa ou que seja incapaz de locomover-se; (b) não significa incapacidade para as atividades básicas do ser humano, tais como alimentar-se, fazer a higiene e vestir-se sozinho; (c) não impõe a incapacidade de expressar-se ou de comunicar-se; (d) não pressupõe dependência total de terceiros; (e) apenas indica que a pessoa deficiente não possui condições de autodeterminar-se completamente ou depende de algum auxílio, acompanhamento, vigilância ou atenção de outra pessoa, para viver com dignidade.
Nesse sentido o seguinte precedente do Superior Tribunal de Justiça:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ART. 20, § 2º DA LEI 8.742/93. PORTADOR DO VÍRUS HIV. INCAPACIDADE PARA O TRABALHO E PARA PROVER O PRÓPRIO SUSTENTO OU DE TÊ-LO PROVIDO PELA FAMÍLIA. LAUDO PERICIAL QUE ATESTA A CAPACIDADE PARA A VIDA INDEPENDENTE BASEADO APENAS NAS ATIVIDADES ROTINEIRAS DO SER HUMANO. IMPROPRIEDADE DO ÓBICE À PERCEPÇÃO DO BENEFÍCIO. RECURSO DESPROVIDO.
I - A pessoa portadora do vírus HIV, que necessita de cuidados frequentes de médico e psicólogo e que se encontra incapacitada, tanto para o trabalho, quanto de prover o seu próprio sustento ou de tê-lo provido por sua família - tem direito à percepção do benefício de prestação continuada previsto no art. 20 da Lei 8.742/93, ainda que haja laudo médico-pericial atestando a capacidade para a vida independente.
II - O laudo pericial que atesta a incapacidade para a vida laboral e a capacidade para a vida independente, pelo simples fato da pessoa não necessitar da ajuda de outros para se alimentar, fazer sua higiene ou se vestir, não pode obstar a percepção do benefício, pois, se esta fosse a conceituação de vida independente, o benefício de prestação continuada só seria devido aos portadores de deficiência tal, que suprimisse a capacidade de locomoção do indivíduo - o que não parece ser o intuito do legislador.
III - Recurso desprovido.
(STJ, 5ª Turma, RESP 360.202/AL, Rel. Min. Gilson Dipp, DJ 01-07-2002)
No que se refere ao requisito econômico, segundo a disciplina legal (§ 3º, do art. 20 da LOAS), considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo.
Ocorre que o Supremo Tribunal Federal, revendo a posição que tomou por ocasião da apreciação da ADI 1.232/DF, decidiu em julgamento ocorrido em 18/04/2013 (RE 567.985/MT e RE 580.963/PR), que fere a Constituição o critério da renda familiar mensal previsto no § 3º do artigo 20 da Lei 8.742/1993. Segundo a referida Corte, é inconstitucional a definição da miserabilidade com base no critério de ¼ do salário mínimo, devendo a condição socioeconômica do requerente, situação fática, ser aferida no caso concreto. A análise dos autos, portanto, é que vai determinar, no caso concreto, se o postulante de fato não possui meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família, o que deve ser aferido por todos os meios de prova admissíveis em direito, como a documental, testemunhal, e especialmente, mediante elaboração de laudo socioeconômico.
Deve ser salientado, ainda, no que toca ao requisito miserabilidade, que o Supremo Tribunal Federal, na mesma ocasião, declarou a inconstitucionalidade do parágrafo único do artigo 34 da Lei 10.741/03 (Estatuto do Idoso), o qual estabelece que o benefício assistencial já concedido a qualquer idoso membro da família "não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS". Segundo entendeu o Supremo Tribunal Federal, o parágrafo único do artigo 34 da Lei 10.741/03 violou o princípio da isonomia. Isso porque abriu exceção para o recebimento de dois benefícios assistenciais por idosos, mas não permitiu a percepção conjunta de benefício de idoso com o de deficiente ou de qualquer outro previdenciário. Assim, incorreu o legislador em equívoco, pois, tratando-se de situações idênticas, deveria ser possível a exclusão do cômputo do benefício, independentemente de sua origem.
Este Tribunal, a propósito, já vinha decidindo no sentido da desconsideração do interpretação restritiva do artigo 34, parágrafo único, do Estatuto do Idoso, como se percebe dos seguintes precedentes: Apelação Cível 5001120-20.2010.404.7202, 6ª. Turma, Relator Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle; Apelação Cível 5000629-13.2010.404.7202, 5ª. Turma, Relator Ricardo Teixeira do Valle Pereira; AC 0012386-06.2011.404.9999, 5ª Turma, Relator Rogério Favreto.
Do caso concreto
No presente caso, no que tange à análise da prova referente ao requisito socioeconômico e à incapacidade da parte autora, a sentença da lavra do Juiz de Direito Letícia Pavei Cachoeira foi proferida nos seguintes termos:
Para a obtenção do benefício assistencial, faz-se necessário que o interessado preencha os seguintes requisitos: a) ser portador de deficiência ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais (art. 34 da Lei nº 10.741/03); b) encontrar-se impossibilitado de prover, com o seu labor, os meios necessários à sua manutenção ou de tê-la provida por sua família (inteligência do art. 203, inciso V, da Constituição Federal); c) não receber benefício, nem estar vinculado a qualquer regime de previdência (art. 20, §4º, da lei 8.742/93).
No caso dos autos, os requisitos estatuídos nas alíneas "a" e "c" supracitadas mostram-se preenchidos, não se podendo falar o mesmo acerca do item "b" acima referido.
O legislador ordinário, quando da elaboração da Lei nº 8.742/93, no § 3º do art. 20, optou por estabelecer um critério objetivo consistente na comprovação de renda familiar mensal inferior a ¼ do salário mínimo per capita.
Vale destacar, neste ponto, que a utilização de tal critério foi considerado inconstitucional pelo STF, que, no julgamento da Reclamação 4374, reconheceu a inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da Lei Orgânica da Assistência Social (Lei 8.742/1993), por considerar que esse critério está defasado para caracterizar a situação de miserabilidade.
Diante das decisões proferidas pelo STF nos autos da Reclamação nº 4374 e do Recurso Extraordinário nº 567985, vale transcrever o recente julgado do e. TRF da 4ª Região sobre o tema:
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. INCAPACIDADE PARA O TRABALHO E PARA A VIDA INDEPENDENTE. SITUAÇÃO DE RISCO SOCIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. 1. O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: a) condição de deficiente (pessoa que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condição com as demais pessoas) ou idoso (neste caso, considerando-se, desde 1º de janeiro de 2004, a idade de 65 anos); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família. 2. A incapacidade para o trabalho e para a vida independente restou comprovada por meio de perícia judicial. 3. In casu, considerando o número de membros da família da parte autora e a renda mensal familiar apurada no estudo socioeconômico, a renda mensal per capita é superior a ¼ do salário mínimo, mas inferior a meio salário mínimo, valor este que, segundo entendimento do Supremo Tribunal Federal (Reclamação n. 4374 e RE n. 567985), seria razoável para ser utilizado como referência para aferição da renda familiar per capita. Não obstante isso, a situação de risco social ainda poderia ser demonstrada por outros meios de prova, segundo precedente do STJ (REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009). 4. Comprovado o preenchimento dos requisitos legais, deve ser concedido o benefício em favor da parte autora, desde a data do indeferimento administrativo (30-03-2009), como postulado na inicial. 5. Preenchidos os requisitos exigidos pelo art. 273 do CPC - verossimilhança do direito alegado e fundado receio de dano irreparável -, é cabível a antecipação dos efeitos da tutela. (TRF4, AC 0010460-53.2012.404.9999, Sexta Turma, Relator Celso Kipper, D.E. 07/08/2013) grifo não constante do original
A propósito, do benefício pretendido vale referir o seguinte julgado:
" (...) Para fins de reconhecimento do direito ao Benefício de Prestação Continuada às crianças e adolescentes menores de dezesseis anos de idade,deve ser avaliada a existência da deficiência e o seu impacto na limitação do desempenho de atividade e restrição da participação social, compatível com a idade, sendo dispensável proceder à avaliação da incapacidade para o trabalho, mas, não é só. O benefício será igualmente devido na situação em que a deficiência do menor gere significativo impacto econômico no seu grupo familiar, o que pode ocorrer basicamente por duas formas, quais sejam, pela exigência de dispêndios incompatíveis com a condição social da família, como com remédios ou tratamentos médicos, ou pela afetação na sua capacidade de angariar renda, como quando limita ou impossibilita algum de seus membros produtivos de trabalhar pelos cuidados necessários à deficiência do menor (...)" (TNU , Relator: JUIZ FEDERAL MANOEL ROLIM CAMPBELL PENNA, Data de Julgamento: 13/09/2010).
No caso dos autos, contudo, verifico que a autora, apesar das dificuldades financeiras familiares enfrentadas, não é economicamente hipossuficiente a ponto de gerar o direito à concessão do benefício ora pleiteado.
Isso porque, em que pese o laudo pericial de fls. 200/203 concluir que a autora é portadora de deficiência visual incapacitante (item 8 de fl. 202), extrai-se do estudo social de fls. 174/178 que: " A família em tela recebe auxílio do Poder Público em relação ao tratamento médico da criança". O documento informa que a família é composta pela autora e sua genitora, as quais vivem com uma renda de R$ 678,00 percebidos pela genitora e também com o valor de R$ 200,00 pagos a título de pensão pelo seu genitor, totalizando, assim R$ 878,00.
O mesmo estudo diz que a autora vive feliz, pratica atividades, estuda, vive em boas condições de habitação, que o tratamento médico é custeado pelo Poder Público e, acima de tudo, demonstra claramente que a situação de vida da autora não afeta a capacidade dos pais de angariar renda, a fim de prover o sustento da família.
Assim, tem-se que as necessidades vitais básicas da autora encontram-se preenchidas, não merecendo prosperar o pedido de concessão de benefício assistencial.
Como demonstrado na sentença com propriedade, não há prova da situação de miserabilidade da família da parte autora. Assim, deve ser mantida a decisão recorrida, a qual julgou improcedente o pedido de benefício assistencial.
Dispositivo
Ante o exposto, voto no sentido de negar provimento à apelação, nos termos da fundamentação.
Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Relator
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7396927v2 e, se solicitado, do código CRC DAA88457. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Ricardo Teixeira do Valle Pereira |
| Data e Hora: | 25/03/2015 17:17 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 24/03/2015
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0014848-67.2010.404.9999/SC
ORIGEM: SC 00005824120108240087
RELATOR | : | Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
PRESIDENTE | : | Rogerio Favreto |
PROCURADOR | : | Dr. Eduardo Lorenzoni |
APELANTE | : | EMILLY PACHECO |
ADVOGADO | : | Odirlei de Oliveira e outros |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 24/03/2015, na seqüência 164, disponibilizada no DE de 10/03/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO | |
: | Des. Federal LUIZ CARLOS DE CASTRO LUGON |
Lídice Peña Thomaz
Diretora de Secretaria
| Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Diretora de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7443162v1 e, se solicitado, do código CRC ABBF533A. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Lídice Peña Thomaz |
| Data e Hora: | 25/03/2015 09:03 |
