| D.E. Publicado em 07/04/2015 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0024494-62.2014.404.9999/SC
RELATOR | : | Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
APELANTE | : | TAIONARA TEDESCO RIBEIRO |
ADVOGADO | : | Mauri Raul Costa Júnior |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
EMENTA
ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ART. 203, INCISO V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. LEI 8.742/93 (LOAS). REQUISITOS. ORIENTAÇÃO DO STF.
1. A Constituição Federal exige apenas dois requisitos no tocante ao benefício assistencial de que trata o art. 203, V: (a) possuir o requerente deficiência incapacitante para a vida independente ou ser idoso, e (b) encontrar-se a família do requerente em situação de miserabilidade.
2. O requisito incapacidade para a vida independente (a) não exige que a pessoa possua uma vida vegetativa ou que seja incapaz de locomover-se; (b) não significa incapacidade para as atividades básicas do ser humano, tais como alimentar-se, fazer a higiene e vestir-se sozinho; (c) não impõe a incapacidade de expressar-se ou de comunicar-se; (d) não pressupõe dependência total de terceiros; (e) apenas indica que a pessoa deficiente não possui condições de autodeterminar-se completamente ou depende de algum auxílio, acompanhamento, vigilância ou atenção de outra pessoa, para viver com dignidade.
3. Segundo decidiu o Supremo Tribunal Federal em 18/04/2013 (RE 567.985/MT e RE 580.963/PR) é inconstitucional a definição da miserabilidade com base no critério de ¼ do salário mínimo (§ 3º do art. 20 da LOAS), devendo a condição socioeconômica do requerente, situação fática, ser aferida no caso concreto.
4. Na mesma ocasião o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do parágrafo único do artigo 34 da Lei 10.741/03 (Estatuto do Idoso). Segundo entendeu a Corte, restou caracterizada ofensa ao princípio da isonomia, pois aberta exceção para o recebimento de dois benefícios assistenciais por idosos, sem que contemplada a percepção conjunta de benefício de idoso com o de deficiente ou de qualquer outro previdenciário. Assim, incorreu o legislador em equívoco, pois, tratando-se de situações idênticas, deveria ser possível a exclusão do cômputo do benefício, independentemente de sua origem.
5. Não comprovada no caso concreto a incapacidade ou sequer a situação de miserabilidade, não há que se falar em concessão do benefício assistencial.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Colenda 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 24 de março de 2015.
Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Relator
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RELATÓRIO
TAIONARA TEDESCO RIBEIRO, representada por seu genitor Antonio Claudir Ribeiro, ajuizou a presente ação ordinária contra o INSS, em 16/09/2011, objetivando a concessão de amparo social à pessoa portadora de deficiência, desde a data do requerimento administrativo.
Indeferida a antecipação de tutela e concedida a AJG (fl. 12).
Realizada perícia médica e socioeconômica, os respectivos laudos aportaram às fls. 87 e 92/97.
Sentenciando, em 15/08/2014, o MM. Juízo a quo julgou improcedente o pedido inicial. É o seu dispositivo:
Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado por Taionara Tedesco Ribeiro em face do Instituto Nacional do Seguro Social -INSS, e dou por resolvido o mérito, na forma do art. 269, I, do Código de Processo Civil.
Condeno a autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios ao procurador da Autarquia-ré, que fixo em R$ 800,00, cuja exigibilidade, por ser beneficiária da justiça gratuita, ficará suspensa enquanto não houver modificação de suas condições econômicas, pelo prazo de cinco anos, período após o qual se extinguirá a obrigação, conforme preconiza o art. 12, da Lei n. 1.060/50 (Nesse sentido: STJ, REsp. n. 73.840, de Minas Gerais, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, j. 21/11/95).
Oficie-se: a) à Secretaria Municipal de Saúde, para que assegure à requerente o acompanhamento de neurologista e psicólogo, ou psiquiatra se for o caso, conforme recomendação do perito médico judicial (quesito 4, f. 87); b) à Secretaria de Assistência Social, para que inclua a família em programas sociais do município.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Irresignada, a autora interpôs recurso de apelação. Em suas razões, sustenta que preenche os requisitos necessários à concessão do amparo postulado, requerendo a reforma da sentença para a procedência do pedido.
Sem contrarrazões, vieram os autos a esta Corte, opinando o Ministério Público Federal pelo não provimento da apelação.
É o relatório.
Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Relator
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VOTO
Dos requisitos para concessão do beneficio assistencial
Segundo estabelece o artigo 203, "caput", e inciso V, da Constituição Federal, "a assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social", tendo por objetivos, dentre outros, "a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei".
Regulamentando o dispositivo constitucional, a Lei n.º 8.742, de 07/12/1003 (Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS), estabeleceu em seus artigos 20 e 38 (redação original):
"Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de 1 (um) salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 70 (setenta) anos ou mais e que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, entende-se como família o conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, desde que vivam sob o mesmo teto.
§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho.
§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
§ 4º O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo o da assistência médica.
§ 5º A situação de internado não prejudica o direito do idoso ou do portador de deficiência ao benefício.
§ 6º A deficiência será comprovada através de avaliação e laudo expedido por serviço que conte com equipe multiprofissional do Sistema Único de Saúde (SUS) ou do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), credenciados para esse fim pelo Conselho Municipal de Assistência Social."
Art. 38. A idade prevista no art. 20 desta lei reduzir-se-á, respectivamente, para 67 (sessenta e sete) e 65 (sessenta e cinco) anos após 24 (vinte e quatro) e 48 (quarenta e oito) meses do início da concessão.
No que toca ao benefício deferido com base no requisito etário, deve ser observado o art. 38 sofreu alteração com a edição da MP 1.599-39, de 1997, e reedições (convertida na Lei nº 9.720/98, a qual também alterou parcialmente a redação do artigo 20 da LOAS), tendo sido determinado simplesmente que a idade mínima seria reduzida para 67 anos a partir de 01/01/98.
Posteriormente, o artigo 34 da Lei nº 10.741, de 01/10/03 (Estatuto do idoso) com vigência a partir de 01/01/04), estabeleceu que a idade mínima para a obtenção do benefício passava a ser de 65 anos.
Por fim, ocorreu o advento das Leis 12.435, de 06/07/2011 (publicada no DOU de 07/07/2011) e 12.470, de 31/08/2011 (publicada no DOU de 01/09/2011). A primeira revogou o artigo 38 da LOAS (que já havia sido derrogado pelo Estatuto do Idoso); ambas alteraram a redação do artigo 20 do mesmo Diploma, deixando-a nos seguintes termos:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)
§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 4º O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os da assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 5º A condição de acolhimento em instituições de longa permanência não prejudica o direito do idoso ou da pessoa com deficiência ao benefício de prestação continuada. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 6º A concessão do benefício ficará sujeita à avaliação da deficiência e do grau de impedimento de que trata o § 2o, composta por avaliação médica e avaliação social realizadas por médicos peritos e por assistentes sociais do Instituto Nacional de Seguro Social - INSS. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)
§ 7º Na hipótese de não existirem serviços no município de residência do beneficiário, fica assegurado, na forma prevista em regulamento, o seu encaminhamento ao município mais próximo que contar com tal estrutura. (Incluído pela Lei nº 9.720, de 30.11.1998)
§ 8º A renda familiar mensal a que se refere o § 3o deverá ser declarada pelo requerente ou seu representante legal, sujeitando-se aos demais procedimentos previstos no regulamento para o deferimento do pedido.(Incluído pela Lei nº 9.720, de 30.11.1998)
§ 9º A remuneração da pessoa com deficiência na condição de aprendiz não será considerada para fins do cálculo a que se refere o § 3o deste artigo. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)
§ 10. Considera-se impedimento de longo prazo, para os fins do § 2o deste artigo, aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)
Percebe-se da disciplina legal que a concessão de benefício assistencial em princípio é cabível para as pessoas com deficiência ou com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais, desde que não possuam meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
Algumas observações são necessárias quanto aos requisitos legais.
No que toca à deficiência, estabelece o § 2º do artigo 20 da LOAS que deve ser entendida como aquela que acarreta "impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas", entendido o longo prazo, nos termos do § 10 do mesmo dispositivo, como "aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos".
O conceito de deficiência, saliente-se, está intimamente ligado ao impedimento efetivo ou potencial para o exercício de atividade que garanta a própria subsistência.
Com efeito, a lei, e bem assim sua respectiva interpretação, não podem conduzir a um conceito restritivo de deficiência, pois um dos objetivos constitucionais que deve servir de base à organização da seguridade social, é o da universalidade da cobertura e do atendimento (Constituição Federal, art. 194, parágrafo único, inciso I).
A propósito, constando do comando constitucional (art. 203 da CF) que a assistência social será prestada a quem dela necessitar, deve referida determinação ser observada como princípio hermenêutico ou, sob outro enfoque, como linha orientadora na interpretação dos demais dispositivos relativos à assistência social.
Não se pode perder de vista, ademais, que se trata o benefício de prestação continuada em discussão de direito fundamental, não só porque o art. 6º da Constituição Federal inclui entre os direitos sociais a assistência aos desamparados, mas principalmente porque o art. 203, inciso V, consagra expressamente a garantia de um salário mínimo mensal ao deficiente e ao idoso que se encontrem em situação de desamparo. E no âmbito das normas constitucionais definidoras de direitos fundamentais, pode-se afirmar a existência de uma eficácia vinculante para todos os poderes públicos.
Do que foi exposto, a interpretação da locução "pessoa portadora de deficiência" (inciso V do art. 203) deve ser feita em um sentido amplo, jamais restritivo.
Com efeito, se se exigisse que para perceber o benefício assistencial deveria a possuir deficiência que a incapacitasse não só para o exercício de atividade laboral, como para todos os atos da vida, aquele se subsumisse na primeira hipótese (deficiência incapacitante para o trabalho) mas não na segunda (deficiência incapacitante para todos os atos da vida) ficaria completamente desprotegido da seguridade social - pois, evidentemente, não teria condições de ser segurado da previdência social - , em afronta ao princípio da dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III), ao objetivo da seguridade social de universalidade da cobertura e do atendimento (CF, art. 194, parágrafo único, I) e à ampla garantia de prestação da assistência social (CF, art. 203, caput).
Assim, o requisito incapacidade para a vida independente (a) não exige que a pessoa possua uma vida vegetativa ou que seja incapaz de locomover-se; (b) não significa incapacidade para as atividades básicas do ser humano, tais como alimentar-se, fazer a higiene e vestir-se sozinho; (c) não impõe a incapacidade de expressar-se ou de comunicar-se; (d) não pressupõe dependência total de terceiros; (e) apenas indica que a pessoa deficiente não possui condições de autodeterminar-se completamente ou depende de algum auxílio, acompanhamento, vigilância ou atenção de outra pessoa, para viver com dignidade.
Nesse sentido o seguinte precedente do Superior Tribunal de Justiça:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ART. 20, § 2º DA LEI 8.742/93. PORTADOR DO VÍRUS HIV. INCAPACIDADE PARA O TRABALHO E PARA PROVER O PRÓPRIO SUSTENTO OU DE TÊ-LO PROVIDO PELA FAMÍLIA. LAUDO PERICIAL QUE ATESTA A CAPACIDADE PARA A VIDA INDEPENDENTE BASEADO APENAS NAS ATIVIDADES ROTINEIRAS DO SER HUMANO. IMPROPRIEDADE DO ÓBICE À PERCEPÇÃO DO BENEFÍCIO. RECURSO DESPROVIDO.
I - A pessoa portadora do vírus HIV, que necessita de cuidados frequentes de médico e psicólogo e que se encontra incapacitada, tanto para o trabalho, quanto de prover o seu próprio sustento ou de tê-lo provido por sua família - tem direito à percepção do benefício de prestação continuada previsto no art. 20 da Lei 8.742/93, ainda que haja laudo médico-pericial atestando a capacidade para a vida independente.
II - O laudo pericial que atesta a incapacidade para a vida laboral e a capacidade para a vida independente, pelo simples fato da pessoa não necessitar da ajuda de outros para se alimentar, fazer sua higiene ou se vestir, não pode obstar a percepção do benefício, pois, se esta fosse a conceituação de vida independente, o benefício de prestação continuada só seria devido aos portadores de deficiência tal, que suprimisse a capacidade de locomoção do indivíduo - o que não parece ser o intuito do legislador.
III - Recurso desprovido.
(STJ, 5ª Turma, RESP 360.202/AL, Rel. Min. Gilson Dipp, DJ 01-07-2002)
No que se refere ao requisito econômico, segundo a disciplina legal (§ 3º, do art. 20 da LOAS), considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo.
Ocorre que o Supremo Tribunal Federal, revendo a posição que tomou por ocasião da apreciação da ADI 1.232/DF, decidiu em julgamento ocorrido em 18/04/2013 (RE 567.985/MT e RE 580.963/PR), que fere a Constituição o critério da renda familiar mensal previsto no § 3º do artigo 20 da Lei 8.742/1993. Segundo a referida Corte, é inconstitucional a definição da miserabilidade com base no critério de ¼ do salário mínimo, devendo a condição socioeconômica do requerente, situação fática, ser aferida no caso concreto. A análise dos autos, portanto, é que vai determinar, no caso concreto, se o postulante de fato não possui meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família, o que deve ser aferido por todos os meios de prova admissíveis em direito, como a documental, testemunhal, e especialmente, mediante elaboração de laudo socioeconômico.
Deve ser salientado, ainda, no que toca ao requisito miserabilidade, que o Supremo Tribunal Federal, na mesma ocasião, declarou a inconstitucionalidade do parágrafo único do artigo 34 da Lei 10.741/03 (Estatuto do Idoso), o qual estabelece que o benefício assistencial já concedido a qualquer idoso membro da família "não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS". Segundo entendeu o Supremo Tribunal Federal, o parágrafo único do artigo 34 da Lei 10.741/03 violou o princípio da isonomia. Isso porque abriu exceção para o recebimento de dois benefícios assistenciais por idosos, mas não permitiu a percepção conjunta de benefício de idoso com o de deficiente ou de qualquer outro previdenciário. Assim, incorreu o legislador em equívoco, pois, tratando-se de situações idênticas, deveria ser possível a exclusão do cômputo do benefício, independentemente de sua origem.
Este Tribunal, a propósito, já vinha decidindo no sentido da desconsideração do interpretação restritiva do artigo 34, parágrafo único, do Estatuto do Idoso, como se percebe dos seguintes precedentes: Apelação Cível 5001120-20.2010.404.7202, 6ª. Turma, Relator Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle; Apelação Cível 5000629-13.2010.404.7202, 5ª. Turma, Relator Ricardo Teixeira do Valle Pereira; AC 0012386-06.2011.404.9999, 5ª Turma, Relator Rogério Favreto.
Do caso concreto
No presente caso, no que tange à análise da prova referente ao requisito socioeconômico e à incapacidade da parte autora, a sentença da lavra da Juíza de Direito Lívia Francio Rocha Cobalchini foi proferida nos seguintes termos:
Trata-se de ação ordinária proposta por Taionara Tedesco Ribeiro, representada por seu genitor Antonio Claudir Ribeiro, em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, objetivando a concessão do benefício assistencial de amparo ao deficiente.
O benefício de amparo assistencial ao idoso e à pessoa portadora de deficiência foi instituído pela Constituição Federal de 1988, assegurando o pagamento de "um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovarem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei" (art. 203, V).
Até regulamentação por Lei específica, o benefício foi assegurado pelo art. 139 da Lei n. 8.213/91, nominado "renda mensal vitalícia", com caráter ainda previdenciário, porquanto dependente de filiação à Previdência Social ou exercício de atividade remunerada abrangida pelo Regime Geral de Previdência Social.
Com o advento da Lei Orgânica da Assistência Social, Lei n. 8.742/93, a prestação deixou de ser benefício previdenciário, tornando-se responsabilidade da Assistência Social, assegurada no art. 20:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um saláriomínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
§ 1o Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
§ 2o Para efeito de concessão deste benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
§ 3o Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo.
Verifica-se, portanto, que para obtenção do benefício de prestação continuada, a partir da Lei n. 8.742/93, pressupõe-se o preenchimento dos seguintes pressupostos: a) qualificação da pessoa como portadora de deficiência ou como idoso; e b) a impossibilidade de prover a sua manutenção por si ou por sua família.
Observa-se que inexiste impedimento à concessão do benefício assistencial de prestação continuada a menor de idade, conforme já decidiu a 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:
"Ao contrário, a assistência social a crianças e adolescentes é prioritária em nosso País, à luz do art. 203, incisos I e II, da Constituição Federal.
Se o menor é deficiente, a proteção social é reforçada, conforme os incisos IV e V do mesmo artigo. Em matéria de assistência social, à vista do princípio da dignidade da pessoa humana, fundamento do Estado Democrático de Direito (CF, art. 1º, III), não é possível interpretação restritiva contrária aos que a Constituição e a lei manifestamente buscaram proteger. (AC nº 0006201-83.2010.404.9999, 6ª Turma deste Tribunal, Rel. Des. Federal Celso Kipper, DE 01-02-11).
Outrossim, a concessão do benefício assistencial a pessoa menor, está prevista no Decreto n. 6.214/07, que regulamenta o benefício de prestação continuada da assistência social devido à pessoa com deficiência, e em seu art. 4º, § 1º, com redação dada pelo Decreto n. 7.617/11, prescreve:
§ 1o Para fins de reconhecimento do direito ao Benefício de Prestação Continuada às crianças e adolescentes menores de dezesseis anos de idade, deve ser avaliada a existência da deficiência e o seu impacto na limitação do desempenho de atividade e restrição da participação social, compatível com a idade.
Assim, na concessão do benefício assistencial ao menor, deve ser levada em consideração a existência de deficiência, e as consequências na limitação do desempenho e restrição na participação comunitária e social, conforme a sua idade, e não propriamente as condições para o trabalho.
O que deve-se levar em consideração, no momento, é se a deficiência da criança, associada às condições econômico-finaceiras da família, impõe à criança e ao núcleo familiar limitações para o alcance de meios de se auto gerir e desenvolver.
Neste sentido, vale transcrever o acórdão:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ART. 203 DA CF/88 E ART. 20, § 3º, DA LEI Nº 8.742/93. MENOR IMPÚBERE PORTADOR
DE "DEGENERAÇÃO DE RETINA BILATERAL". RENDA FAMILIAR PER CAPITA. EXCEDIMENTO AO LIMITE LEGAL. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE.
O benefício assistencial, quando concedido a menor deficiente, que necessite de cuidados especiais, em verdade não está sendo concedido única e exclusivamente a este menor e a seu interesse, senão que ao conjunto familiar em que inserido, responsável pela sua manutenção. Cuida-se, isto sim, de complementação da renda familiar destinada a possibilitar meios de sobrevivência mínima a quem não dispõe de condições financeiras e ainda precisa conviver com problema de saúde de um dos membros da família. Compensa os demais familiares pela impossibilidade de se dedicarem com exclusividade aos seus trabalhos, comprometidos com a necessária atenção ao menor deficiente.
O excedimento mínimo ao limite fixado no art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93 (1/4 do salário mínimo) não desautoriza o deferimento do benefício assistencial ao requerente inválido. Hipótese em que se prestigia o princípio da razoabilidade.
Comprovada a deficiência incapacitante, inclusive para a vida independente, aliada ao estado de miserabilidade indispensável à obtenção da renda mensal assistencial, deve ser concedido o benefício assistencial. (Tribunal Regional Federal da 4ª Região. Apelação cível. Processo n. 200170100014738.
Data da decisão: 02/04/2003. Relator: Paulo Afonso Brum Vaz) [grifei].
No caso em exame, entretanto, segundo conclui-se da perícia médica judicial, a autora não é portadora de deficiência propriamente.
Segundo o perito, a autora "apresenta raras crises mal definidas de perda da consciência, 'quando fica irritada'. Tomografia de crânio normal e EEG inespecífico" (quesito 1, f. 87). Outrossim, "não está incapacitada para a vida independente, e para o exercício de atividades da vida diária" (quesito 2.1, f. 87).
Outrossim, conclui-se do estudo social realizado, que embora a as condições econômicas da família não sejam favoráveis, a autora frequenta o ensino regular, "Taionara é uma menina aparentemente normal, brinca, corre, estuda,
interage com seus pares", necessitando apenas de medicação de uso contínuo e
cuidados constantes (f. 96).
Extrai-se ainda do Estudo Social realizado (fls. 92-97):
[...] Na escola apresenta dificuldades na aprendizagem, mas consegue acompanhar a turma. Suas notas variam entre 06 e 07. É uma aluna tida
problema, tem dificuldades de relacionamento, tanto na escola quanto em casa.
Conforme entrevista, Taionara reconhece que é muito revoltada, não respeita os pais, briga bastante. Diz ter lapsos de memória, referindo-se que esquece tudo o que aprende. Conta que até a noite lembra o que estudou no dia, mas na manhã seguinte já não lembra mais.
Faz tratamento com o neurologista, Dr. Nabil Bittar de caçador, o qual lhe receitou o medicamento Torval de uso contínuo, indicado para tratamento de epilepsia.
Os pais demonstram preocupação com a filha, acreditando que a agressividade e a revolta está ligada a doença. Procuram vigiá-la constantemente, bem como poupa-la de qualquer aborrecimento que possa influenciar uma possível crise.
Segundo informações prestadas pela família e corroboradas pela escola,
Taionara frequenta o ensino regular, estando a cursar o 8º ano do ensino
fundamental. Aparentemente, é uma adolescente normal, conversa, possui entendimento das coisas, socializa-se com seus pares, apesar de ser pouco comunicativa." (f. 94).
Outrossim, em que pese a epilepsia, também diagnosticada pelo perito judicial, "não foi diagnosticada como epilepsia grave ou incapacitante" (quesito 5, f. 87).
Destarte, não há indicativos de que a doença caracterize deficiência, tampouco que em razão dela a autora sofra restrições de natureza cognitiva, de entendimento ou convivência comunitária. Os problemas apontados pelos pais dizem muito mais com sua personalidade do que com a doença.
Desse modo, o caso em exame não é para concessão de benefício assistencial, mas de inclusão da família em políticas sociais públicas.
Como demonstrado na sentença com propriedade, não há prova de situação de miserabilidade ou muito menos de incapacidade da parte autora. Assim, deve ser mantida a decisão recorrida, a qual julgou improcedente o pedido de benefício assistencial.
Dispositivo
Ante o exposto, voto no sentido de negar provimento à apelação, nos termos da fundamentação.
Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 24/03/2015
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0024494-62.2014.404.9999/SC
ORIGEM: SC 05000758320118240088
RELATOR | : | Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
PRESIDENTE | : | Rogerio Favreto |
PROCURADOR | : | Dr. Eduardo Lorenzoni |
APELANTE | : | TAIONARA TEDESCO RIBEIRO |
ADVOGADO | : | Mauri Raul Costa Júnior |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 24/03/2015, na seqüência 163, disponibilizada no DE de 10/03/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO | |
: | Des. Federal LUIZ CARLOS DE CASTRO LUGON |
Lídice Peña Thomaz
Diretora de Secretaria
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