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PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS. NÍVEIS DE CONCENTRAÇÃO DOS AGENTES QUÍMICOS. MOTORISTA E COBRADOR DE ÔNIBUS. PENOSIDADE. APOSENTADORIA P...

Data da publicação: 23/08/2024, 07:00:56

PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS. NÍVEIS DE CONCENTRAÇÃO DOS AGENTES QUÍMICOS. MOTORISTA E COBRADOR DE ÔNIBUS. PENOSIDADE. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CONCESSÃO. 1. O reconhecimento da especialidade e o enquadramento da atividade exercida sob condições nocivas são disciplinados pela lei em vigor à época em que efetivamente exercidos, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. 2. Até 28-04-1995 é admissível o reconhecimento da especialidade por categoria profissional ou por sujeição a agentes nocivos, admitindo-se qualquer meio de prova (exceto para ruído e calor); a partir de 29-04-1995 não mais é possível o enquadramento por categoria profissional, sendo necessária a comprovação da exposição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova até 05-03-1997 e, a partir de então, através de formulário embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica. 3. A exposição à umidade e álcalis cáusticos enseja o reconhecimento do tempo de serviço como especial. 4. Os riscos ocupacionais gerados pela exposição a agentes químicos não dependem, segundo os normativos aplicáveis, de análise quanto ao grau ou intensidade de exposição no ambiente de trabalho para a configuração da nocividade e reconhecimento da especialidade do labor para fins previdenciários. 5. Constatada a exposição do segurado motorista e cobrador de ônibus, bem como de motorista e ajudante de caminhão, a condições laborais penosas, mediante perícia realizada em observância aos parâmetros fixados no julgamento do IAC n.º 5033888-90.2018.4.04.0000, possível o reconhecimento da especialidade do labor. 6. A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física referidas no artigo 57, § 3º, da Lei 8.213/91 não pressupõem a submissão contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho. Não se interpreta como ocasional, eventual ou intermitente a exposição ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho. Precedentes desta Corte. 7. Preenchidos os requisitos legais, tem o segurado direito à obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição. (TRF4, AC 5000889-65.2022.4.04.7139, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 15/08/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000889-65.2022.4.04.7139/RS

RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: MARINO BOFF (AUTOR)

ADVOGADO(A): TUANNE PINTO JACOB (OAB RS101312)

ADVOGADO(A): ALZIRA PEREIRA SCHARDOSIM (OAB RS110500)

ADVOGADO(A): ALISSON DA ROSA BENCKE (OAB RS130610)

ADVOGADO(A): LUIZA PEREIRA SCHARDOSIM DE BARROS

RELATÓRIO

Trata-se de ação previdenciária ajuizada em 30/11/2022 contra o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, postulando a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, desde a DER (03/09/2018, 14/04/2021 ou 14/02/2022), mediante o reconhecimento do períodos de labor rural de 06/07/1975 a 30/09/1988, e da especialidade das atividades desenvolvidas nos períodos de 01/10/1988 a 20/01/1996, 01/08/2003 a 30/03/2006, 02/01/2007 a 31/07/2010 e 01/09/2010 a 01/01/2011, devidamente convertidos em tempo de serviço comum pelo fator 1,4. Subsidiariamente, pediu a reafirmação da DER. O autor pediu, ainda, a condenação do INSS ao pagamento de danos morais.

O juízo a quo, em sentença publicada em 15/03/2024, julgou parcialmente procedentes os pedidos, reconhecendo o exercício do labor rural no período de 01/03/1986 a 30/09/1988, e a especialidade das atividades desenvolvidas nos períodos de 01/10/1988 a 28/04/1995, 29/04/1995 a 20/01/1996, 02/01/2007 a 31/07/2010, 01/08/2003 a 30/03/2006 e de 01/09/2010 a 01/01/2011, convertidos em tempo de serviço comum pelo fator 1,4, e determinando ao INSS a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição em favor da parte autora, desde a DER (03/09/2018). Condenou o INSS ao pagamento das parcelas vencidas, atualizadas monetariamente e acrescidas de juros de mora, estes desde a citação. Diante da sucumbência recíproca, condenou as partes ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre os valores vencidos até a data da sentença, à razão de 50% cada, mas suspensa a exigibilidade em relação ao autor por ser beneficiário da justiça gratuita.

Apelou o INSS sustentando não ter sido comprovado o exercício de labor especial nos períodos de 29/04/1995 a 20/01/1996, 02/01/2007 a 31/07/2010, 01/08/2003 a 30/03/2006 e de 01/09/2010 a 01/01/2011, uma vez que não é possível o reconhecimento da atividade especial para os períodos posteriores à data de emissão do PPP, não é possível computar como especial o período de afastamento do trabalho em razão de benefício por incapacidade, não há previsão legal para enquadramento por penosidade, o enquadramento por umidade só é possível para atividades ou operações realizadas de modo habitual e permanente em locais alagados ou encharcados, e é necessária a comprovação da composição e nível de concentração dos agentes químicos.

Com contrarrazões, subiram os autos ao Tribunal para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Juízo de admissibilidade

O apelo não merece conhecimento, por falta de interesse recursal, quanto à (im)possibilidade de computar como especial período de afastamento do trabalho em razão de benefício por incapacidade, uma vez que não há comprovação de que o autor tenha percebido benefício por incapacidade nem há determinação de cômputo na sentença.

MÉRITO

Não estando o feito submetido ao reexame necessário, a controvérsia no plano recursal restringe-se:

- ao reconhecimento da especialidade das atividades desenvolvidas nos períodos de 29/04/1995 a 20/01/1996, 02/01/2007 a 31/07/2010, 01/08/2003 a 30/03/2006 e de 01/09/2010 a 01/01/2011;

- à consequente concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, a contar da DER (03/09/2018).

Da atividade especial

A r. sentença proferida pela MM. JuízaFederal Mariana Camargo Contessa bem analisou as questões controvertidas, devendo ser mantida por seus próprios fundamentos, os quais adoto como razões de decidir, in verbis:

- Períodos de 29/04/1995 a 20/01/1996 e 02/01/2007 a 31/07/2010, empresa Mampituba Ltda.

Segundo anotações da CTPS7 (Ev. 01, p. 3/4), o autor laborou na função de cobrador de ônibus, no interregno de 01/10/1988 a 20/01/1996.

O INSS reconheceu, administrativamente, a especialidade da função desenvolvida no período de 01/10/1988 a 28/04/1995 (NB 190.253.079-6, DER 14/02/2022), conforme RDCTC (Ev. 01, PROCADM11, p. 196/198). Diante disso, entendo que operou-se a chamada "Coisa Julgada Administrativa".

A decisão administrativa que reconhece algum tempo de contribuição faz o que se convencionou denominar de "coisa julgada administrativa", somente podendo ser alterada caso as razões que a embasaram se alterem - sempre de maneira justificada. Nesse sentido:

DIREITO PREVIDENCIÁRIO. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. RESTABELECIMENTO DE BENEFÍCIO CESSADO PELO INSS. FRAUDE NÃO EVIDENCIADA. REVALORAÇÃO DE PROVA. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. LEI 11.960/2009. DIFERIMENTO PARA EXECUÇÃO. 1. Omissis. 2. A Administração, em atenção ao princípio da legalidade, tem o poder-dever de anular seus próprios atos quando eivados de vícios que os tornem ilegais (Súmulas 346 e 473 do STF). 3. Nos processos de restabelecimento de benefício previdenciário, compete ao INSS o ônus de provar a ocorrência de fraude ou ilegalidade no ato concessório de aposentadoria, pois tal ato se reveste de presunção de legitimidade. 4. O cancelamento de benefício previdenciário fundado tão-somente em nova valoração da prova e/ou mudança de critério interpretativo da norma, salvo comprovada fraude e má-fé, atenta contra o princípio da segurança das relações jurídicas e contra a coisa julgada administrativa. 5. É devido o restabelecimento do benefício cessado, observada a prescrição quinquenal. 6. 7. Omissis (TRF4, APELREEX 0020635-72.2013.404.9999, SEXTA TURMA, Relatora MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO, D.E. 09/03/2017) (grifou-se)

PREVIDENCIÁRIO. LEGITIMIDADE PASSIVA. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO. COISA JULGADA ADMINISTRATIVA. RETROAÇÃO. FUNGIBILIDADE EM MATÉRIA PREVIDENCIÁRIA. TERMO INICIAL. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. TUTELA ESPECIFICA. 1. 3. Omissis. 4. Quanto ao tempo de serviço consubstanciado nas contribuições previdenciárias recolhidas, tenho que a sua admissão para a concessão de Aposentadoria em requerimento administrativo mais recente, faz com que seja estendido o seu cômputo para postulação de Aposentadorias pretéritas, como decorrência da coisa julgada administrativa. Representa direito emergente do tempo de serviço do segurado aceito na via administrativa, que deverá ser contado para a concessão dos benefícios previdenciários quando cabíveis. 5. 9. Omissis. (TRF4, AC 5058508-94.2013.404.7000, SEXTA TURMA, Relator (AUXILIO SALISE) ÉZIO TEIXEIRA, juntado aos autos em 01/03/2017) (grifou-se)

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. COISA JULGADA ADMINISTRATIVA. OCORRÊNCIA. RESTABELECIMENTO. REPETIÇÃO DE VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE. IMPOSSIBILIDADE. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DIFERIMENTO. 1. A existência de "coisa julgada administrativa", decorrente do formal reconhecimento pelo INSS do labor exercido pela parte autora, para fins de tempo de serviço, a partir de documentos válidos e valorados como suficientes à época, impede que se reaprecie a situação, sob pena de violação à natureza jurídica. Mera mudança de interpretação ou de critério de análise de provas por parte da Administração não afeta situação jurídica regularmente constituída. 2. 4. Omissis. (TRF4 5011409-49.2014.404.7112, QUINTA TURMA, Relator (AUXÍLIO PAULO AFONSO) TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 06/09/2016) (grifou-se)

Com efeito, o tempo de labor como motorista de caminhão (ou ajudante de caminhão) ou motorista de ônibus (ou cobrador de ônibus) é enquadrável como especial por categoria profissional independentemente da demonstração de exposição a agentes nocivos até 28/04/1995 conforme códigos 2.4.4 do Anexo do Decreto nº 53.831/1964 e 2.4.2 do Anexo II do Decreto nº 83.080/1979. Após 29/04/1995, só se admite o enquadramento quando comprovada a efetiva exposição a agentes em patamares considerados nocivos pela legislação de regência.

No caso dos autos, realizada perícia judicial (Ev. 83), foi relatado pelo expert que o autor desempenhava as seguintes atividades:

2.1. Empresa Mampituba Ltda. Atuou no período entre 01/10/1988 a 20/01/1996 e 02/01/2007 a 31/07/2010 na atividade de cobrador, em veículo de transporte de passageiros, motorização Mercedes-Benz dianteira, sem ar condicionado, carroceria Marcopolo, em pé, realizando a cobrança de passagens e sinalizando os pontos de parada ao motorista. Os trajetos percorridos eram linhas locais entre os municípios de Torres e Arroio do Sal, percorrendo a estrada Interpraias e estradas municipais locais, ruas nas localidades compreendidas no trecho, alternando entre vias de piso pavimentado, paralelepípedo e chão batido. Jornada de 44h semanais, sujeita a prorrogação nos meses de verão. No período entre as viagens na sede da empresa realizava o intervalo para alimentação e no tempo restante executava limpeza interna e externa do veículo. As necessidades fisiológicas do autor eram realizadas durante a parada ao final do trecho em rodoviárias ou na sede da empresa.

Por sua vez, o laudo foi conclusivo no sentido de que "o autor realizou atividades penosas nos períodos designados para apuração no processo" (p. 3 e 7):

Verificam-se esforços fatigantes associados aos agentes ambientais identificados, potencializados pelo trabalho contínuo por horas na posição em pé. A estes somam-se as condições precárias de trafegabilidade em vias não pavimentadas e locais de difícil acesso, bem como sujeitos ao estresse diário e vulnerabilidade quanto à situações de violência, em jornadas habitualmente estendidas em regime de horas extraordinárias. De acordo com Marques1 (2007, p. 64), o conceito de trabalho penoso está relacionado à exaustão, ao incômodo, à dor, ao desgaste, à concentração excessiva e à imutabilidade das tarefas desempenhadas que aniquilam o interesse, que leva o trabalhador ao exaurimento de suas energias, extinguindolhe o prazer entre a vida laboral e as atividades a serem executadas gerando sofrimento, que pode ser revelado pelos dois grandes sintomas: insatisfação e a ansiedade. Citando ainda Marques (2007, p. 98), [...] a atividade laboral penosa traz consigo a constituição e a manifestação do desgaste mental e/ou físico. O ritmo de trabalho acelerado, a ausência de pausas para descanso, a concessão incorreta de folgas e as condições ambientais no local de trabalho acarretam desgaste, porque não há repouso físico e mental adequado [...]. Complementado, Martinez2 (2007, p. 24) define que atividade penosa é “todo esforço físico produtor de desgaste no organismo, de ordem orgânica ou psicológica, em razão da repetição de gestos, condições agravantes, pressões ou tensões próximas do indivíduo”.

Em relação à penosidade/periculosidade, embora não encontre guarida na legislação previdenciária, houve o julgamento pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região do Incidente de Assunção de Competência - IAC nº 5, o TRF 4ª Região, fixou a seguinte tese:

Deve ser admitida a possibilidade de reconhecimento do caráter especial das atividades de motorista ou de cobrador de ônibus em virtude da penosidade, ainda que a atividade tenha sido prestada após a extinção da previsão legal de enquadramento por categoria profissional pela Lei 9.032/1995, desde que tal circunstância seja comprovada por meio de perícia judicial individualizada, possuindo o interessado direito de produzir tal prova.

Segue ementa do julgado:

PREVIDENCIÁRIO. INCIDENTE DE ASSUNÇÃO DE COMPETÊNCIA - IAC. TEMA TRF4 N.° 5. ATIVIDADE ESPECIAL. MOTORISTA OU COBRADOR DE ÔNIBUS. RECONHECIMENTO DA PENOSIDADE APÓS A EXTINÇÃO DA PREVISÃO LEGAL DE ENQUADRAMENTO POR CATEGORIA PROFISSIONAL PELA LEI 9.032/1995. POSSIBILIDADE. 1. O benefício de aposentadoria especial foi previsto pela primeira vez no ordenamento jurídico nacional em 1960, pela Lei Orgânica da Previdência Social, a Lei 3.087/1960, que instituiu o requisito de prestação de uma quantidade variável (15, 20 ou 25 anos) de tempo de contribuição em exercício de atividades insalubres, perigosas ou penosas. 2. Apesar de contar com previsão no próprio texto constitucional, que garante aos trabalhadores o pagamento do adicional correspondente na seara trabalhista (art. 7º, XXIII, CF/1988), até o presente momento não houve a regulamentação da penosidade, motivo pelo qual torna-se uma tarefa bastante difícil a obtenção de seu conceito. 3. Pela conjugação dos estudos doutrinários, das disposições legais e dos projetos legislativos existentes, é possível delimitar-se o conceito de penosidade como o desgaste à saúde do trabalhador ocorrido na prestação da atividade profissional, em virtude da necessidade de dispêndio de esforço excessivo, da necessidade de concentração permanente e contínua, e/ou da necessidade de manutenção constante de postura. 4. Não há discussões acerca da possibilidade de reconhecimento da penosidade nas situações previstas no Anexo IV do Decreto 53.831/1964, que configuram hipóteses de enquadramento por categoria profissional, admitido até a vigência da Lei 9.032/1995, sendo que as controvérsias ocorrem quanto à possibilidade de reconhecimento da penosidade nos intervalos posteriores a essa data. 5. O requisito exigido para o reconhecimento da especialidade do tempo de contribuição prestado a partir da vigência da Lei 9.032/1995 e até a superveniência da Emenda Constitucional 103/2019 - condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física - não exclui a possibilidade de inclusão de atividades exercidas em situação de periculosidade e penosidade. 6. Essa posição acabou sendo sancionada pelo STJ no julgamento do REsp 1.306.113/SC, admitido como recurso representativo de controvérsia repetitiva sob o Tema n° 534, em que, embora a questão submetida a julgamento fosse a possibilidade de configuração da especialidade do trabalho exposto ao agente perigoso eletricidade, a tese fixada ultrapassa os limites do agente eletricidade, e da própria periculosidade, permitindo o reconhecimento da especialidade do labor prestado sob exposição a outros fatores de periculosidade, à penosidade, e até mesmo a agentes insalubres não previstos em regulamento, desde que com embasamento "na técnica médica e na legislação correlata". 7. Admitida a possibilidade de reconhecimento da penosidade após a vigência da Lei 9.032/1995, esse reconhecimento deve se dar com base em critérios objetivos analisados no caso concreto por meio de perícia técnica, uma vez que extinta a possibilidade de mero enquadramento por categoria profissional. 8. Tratando-se de circunstância que, embora possua previsão constitucional, carece de regulamentação legislativa, sequer é cogitada pelos empregadores na confecção dos formulários habitualmente utilizados para a comprovação de atividade especial, motivo pelo qual é necessário que os órgãos judiciais garantam o direito dos segurados à produção da prova da alegada penosidade. Ademais, considerando que a tese encaminhada por esta Corte vincula o reconhecimento da penosidade à identificação dessa circunstância por perícia técnica, essa constitui, então, o único meio de prova à disposição do segurado. 9. Tese fixada nos seguintes termos: deve ser admitida a possibilidade de reconhecimento do caráter especial das atividades de motorista ou de cobrador de ônibus em virtude da penosidade, ainda que a atividade tenha sido prestada após a extinção da previsão legal de enquadramento por categoria profissional pela Lei 9.032/1995, desde que tal circunstância seja comprovada por meio de perícia judicial individualizada, possuindo o interessado direito de produzir tal prova. 10. Cabendo ao órgão colegiado julgar também o recurso que dá origem à assunção de competência admitida, conforme disposto no art. 947, §2º do CPC, no caso concreto deve ser dado provimento à preliminar da parte autora para anular a sentença e determinar o retorno do feito ao Juízo de origem, para que se proceda à reabertura da instrução processual. (TRF4 5033888-90.2018.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 27/11/2020) (grifou-se)

Portanto, entendo que restou comprovado que no desempenho de suas funções, nos períodos de 29/04/1995 a 20/01/1996 e de 02/01/2007 a 31/07/2010, a parte autora esteve exposta a agente nocivo à saúde - penosidade.

Assim, o pedido é procedente, no ponto.

- Período de 01/08/2003 a 30/03/2006, na empresa B.S Proteinas Ltda. Para provar suas alegações, o autor juntou aos autos do processo administrativo e/ou judicial a seguinte documentação:

- CTPS: Ev. 1 - P9, p. 74; Ev. 1 - P10, p. 76; CTPS: Ev. 1- P11, p. 11;

- Laudo similar: Laudo Técnico Pericial de Insalubridade Ev. 1- LAUDO13, p. 3/7 (atividade analisada: recolher pedaços de raspa previdamente recortados, do chão e os transportara para o varal de secagem, antes, também manualmente, jogava cal em torno da peça de raspas - atividade habitual: manuseio de raspa de pele) - laudo referente reclamatória trabalhista 00574200902312002

- Perícia similar: Ev. 1- LAUDO14, p. 1/17- Snackdog Proteínas Ltda e outros. - manipulação de couros - função Auxiliar de Fábrica

- Prova de baixa/inatividade empregador: Ev. 1 - OUT12, p. 1/2

Segundo anotações da CTPS, o autor laborou na função de auxiliar de serviços gerais.

A parte autora comprovou que o ex-empregador está inativo, de modo que viável a utilização de prova emprestada, consubstansiada em laudo cuja perícia foi realizada na mesma empresa para a qual o segurado prestou serviços.

Conforme reclamatória trabalhista autuada sob o nº 574/2009, que tramitou na Vara do Trabalho de Araranguá-SC (Ev. 1- LAUDO13, p. 3/7), foram analisadas as seguintes funções:

A atividade habitual realizada pelo autor Sr. Valmir Matos Marcolino, consistia em manualmente recolher os pedaços de raspa previamente recordados, do chão e os transportava para varal de secagem, antes, também manualmente, jogava cal em torno da peça de respas. Após a secagem o requerente as transportava para dentro do pavilhão, e elas iam para o processo seguinte. O requerente utilizava botina de PVC e luva em suas atividades habituais.

O expert relatou, ainda:

Foi solicitado a empresa ré, BS Proteínas, que apresentasse o Laudo Técnico das Condições Ambientais de Trabalho - LTCAT, o PPRA - Programa de Prevenção de Riscos Ambientais, o PCMSO - Programa de Controle Médico e Saúde Ocupacional e o comprovante de fornecimento e treinamento relativo a EPI´s - Equipamento de Proteção Individual, da época em que atuou o requerente. A empresa não tinha disponível tais documentos.

O laudo foi conclusivo no seguinte sentido:

As atividades executadas pelo requerente Sr. Valmir Matos Marcolino na empresa ré, BS Proteínas Ltda, de Passo de Torres SC, gerou ao requerente a necessidade do contato habitual com produto cáustico (cal), e o manuseio de produtos com umidade excessiva, sem proteção adequada, expondo o trabalhador a riscos a sua saúde. Com isto o requerente Sr. Valmir Matos Marcolino, tinha suas atividades executadas em condições insalubre, grau médio, conforme rege a NR-15 da Lei nº 6.514 de 22 de dezembro de 1977, no anexo nº 10 "Umidade" e no anexo nº 13 "manuseio de álcalis cáusticos". Em avaliação qualitativa.

Assim, tem-se que aperícia técnica demonstra à exposição ao(s) agente(s) Físico: umidade e Químicos: álcalis cáusticos. Dessa forma, entendo configurada a especialidade do período em tela, sendo o pedido procedente, no ponto.

- Período de 01/09/2010 a 01/01/2011, empresa L.B. Agência de Viagens e Turismo Ltda – ME.

Segundo anotações da CTPS7 (Ev. 01, p. 5), o autor laborou na função de cobrador de ônibus.

Com efeito, o tempo de labor como motorista de caminhão (ou ajudante de caminhão) ou motorista de ônibus (ou cobrador de ônibus) é enquadrável como especial por categoria profissional independentemente da demonstração de exposição a agentes nocivos até 28/04/1995 conforme códigos 2.4.4 do Anexo do Decreto nº 53.831/1964 e 2.4.2 do Anexo II do Decreto nº 83.080/1979. Após 29/04/1995, só se admite o enquadramento quando comprovada a efetiva exposição a agentes em patamares considerados nocivos pela legislação de regência.

No caso dos autos, realizada perícia judicial (Ev. 83), foi relatado pelo expert que o autor desempenhava as seguintes atividades:

2.2 L.B. Agência de Viagens e Turismo Ltda. - ME Atividade de cobrador de ônibus, entre 01/09/2010 e 01/01/2011, em rotas urbanas, vias municipais pavimentadas e não pavimentadas, em veículo com motorização dianteira Mercedes-Benz e carroceria Marcopolo, sem arcondicionado. Linhas urbanas Torres - Vila São João, Torres – Paraíso e Torres - Morro Azul. O autor fazia a cobrança de passagens, auxiliava passageiros com dificuldades de locomoção no embarque e desembarque. Utilizava sanitários junto à rodoviárias ou sede da empresa no início e fim da jornada. Sua jornada de trabalho era de 44 horas semanais, 6 dias por semana, sujeita a prorrogação nos meses de verão. As necessidades fisiológicas do autor eram realizadas durante a parada ao final do trecho em rodoviárias ou na sede da empresa.

Por sua vez, o laudo foi conclusivo no sentido de que "o autor realizou atividades penosas nos períodos designados para apuração no processo" (p. 3 e 7):

Verificam-se esforços fatigantes associados aos agentes ambientais identificados, potencializados pelo trabalho contínuo por horas na posição em pé. A estes somam-se as condições precárias de trafegabilidade em vias não pavimentadas e locais de difícil acesso, bem como sujeitos ao estresse diário e vulnerabilidade quanto à situações de violência, em jornadas habitualmente estendidas em regime de horas extraordinárias. De acordo com Marques1 (2007, p. 64), o conceito de trabalho penoso está relacionado à exaustão, ao incômodo, à dor, ao desgaste, à concentração excessiva e à imutabilidade das tarefas desempenhadas que aniquilam o interesse, que leva o trabalhador ao exaurimento de suas energias, extinguindolhe o prazer entre a vida laboral e as atividades a serem executadas gerando sofrimento, que pode ser revelado pelos dois grandes sintomas: insatisfação e a ansiedade. Citando ainda Marques (2007, p. 98), [...] a atividade laboral penosa traz consigo a constituição e a manifestação do desgaste mental e/ou físico. O ritmo de trabalho acelerado, a ausência de pausas para descanso, a concessão incorreta de folgas e as condições ambientais no local de trabalho acarretam desgaste, porque não há repouso físico e mental adequado [...]. Complementado, Martinez2 (2007, p. 24) define que atividade penosa é “todo esforço físico produtor de desgaste no organismo, de ordem orgânica ou psicológica, em razão da repetição de gestos, condições agravantes, pressões ou tensões próximas do indivíduo”.

Em relação à penosidade/periculosidade, embora não encontre guarida na legislação previdenciária, houve o julgamento pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região do Incidente de Assunção de Competência - IAC nº 5, o TRF 4ª Região, fixou a seguinte tese:

Deve ser admitida a possibilidade de reconhecimento do caráter especial das atividades de motorista ou de cobrador de ônibus em virtude da penosidade, ainda que a atividade tenha sido prestada após a extinção da previsão legal de enquadramento por categoria profissional pela Lei 9.032/1995, desde que tal circunstância seja comprovada por meio de perícia judicial individualizada, possuindo o interessado direito de produzir tal prova.

Segue ementa do julgado:

PREVIDENCIÁRIO. INCIDENTE DE ASSUNÇÃO DE COMPETÊNCIA - IAC. TEMA TRF4 N.° 5. ATIVIDADE ESPECIAL. MOTORISTA OU COBRADOR DE ÔNIBUS. RECONHECIMENTO DA PENOSIDADE APÓS A EXTINÇÃO DA PREVISÃO LEGAL DE ENQUADRAMENTO POR CATEGORIA PROFISSIONAL PELA LEI 9.032/1995. POSSIBILIDADE. 1. O benefício de aposentadoria especial foi previsto pela primeira vez no ordenamento jurídico nacional em 1960, pela Lei Orgânica da Previdência Social, a Lei 3.087/1960, que instituiu o requisito de prestação de uma quantidade variável (15, 20 ou 25 anos) de tempo de contribuição em exercício de atividades insalubres, perigosas ou penosas. 2. Apesar de contar com previsão no próprio texto constitucional, que garante aos trabalhadores o pagamento do adicional correspondente na seara trabalhista (art. 7º, XXIII, CF/1988), até o presente momento não houve a regulamentação da penosidade, motivo pelo qual torna-se uma tarefa bastante difícil a obtenção de seu conceito. 3. Pela conjugação dos estudos doutrinários, das disposições legais e dos projetos legislativos existentes, é possível delimitar-se o conceito de penosidade como o desgaste à saúde do trabalhador ocorrido na prestação da atividade profissional, em virtude da necessidade de dispêndio de esforço excessivo, da necessidade de concentração permanente e contínua, e/ou da necessidade de manutenção constante de postura. 4. Não há discussões acerca da possibilidade de reconhecimento da penosidade nas situações previstas no Anexo IV do Decreto 53.831/1964, que configuram hipóteses de enquadramento por categoria profissional, admitido até a vigência da Lei 9.032/1995, sendo que as controvérsias ocorrem quanto à possibilidade de reconhecimento da penosidade nos intervalos posteriores a essa data. 5. O requisito exigido para o reconhecimento da especialidade do tempo de contribuição prestado a partir da vigência da Lei 9.032/1995 e até a superveniência da Emenda Constitucional 103/2019 - condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física - não exclui a possibilidade de inclusão de atividades exercidas em situação de periculosidade e penosidade. 6. Essa posição acabou sendo sancionada pelo STJ no julgamento do REsp 1.306.113/SC, admitido como recurso representativo de controvérsia repetitiva sob o Tema n° 534, em que, embora a questão submetida a julgamento fosse a possibilidade de configuração da especialidade do trabalho exposto ao agente perigoso eletricidade, a tese fixada ultrapassa os limites do agente eletricidade, e da própria periculosidade, permitindo o reconhecimento da especialidade do labor prestado sob exposição a outros fatores de periculosidade, à penosidade, e até mesmo a agentes insalubres não previstos em regulamento, desde que com embasamento "na técnica médica e na legislação correlata". 7. Admitida a possibilidade de reconhecimento da penosidade após a vigência da Lei 9.032/1995, esse reconhecimento deve se dar com base em critérios objetivos analisados no caso concreto por meio de perícia técnica, uma vez que extinta a possibilidade de mero enquadramento por categoria profissional. 8. Tratando-se de circunstância que, embora possua previsão constitucional, carece de regulamentação legislativa, sequer é cogitada pelos empregadores na confecção dos formulários habitualmente utilizados para a comprovação de atividade especial, motivo pelo qual é necessário que os órgãos judiciais garantam o direito dos segurados à produção da prova da alegada penosidade. Ademais, considerando que a tese encaminhada por esta Corte vincula o reconhecimento da penosidade à identificação dessa circunstância por perícia técnica, essa constitui, então, o único meio de prova à disposição do segurado. 9. Tese fixada nos seguintes termos: deve ser admitida a possibilidade de reconhecimento do caráter especial das atividades de motorista ou de cobrador de ônibus em virtude da penosidade, ainda que a atividade tenha sido prestada após a extinção da previsão legal de enquadramento por categoria profissional pela Lei 9.032/1995, desde que tal circunstância seja comprovada por meio de perícia judicial individualizada, possuindo o interessado direito de produzir tal prova. 10. Cabendo ao órgão colegiado julgar também o recurso que dá origem à assunção de competência admitida, conforme disposto no art. 947, §2º do CPC, no caso concreto deve ser dado provimento à preliminar da parte autora para anular a sentença e determinar o retorno do feito ao Juízo de origem, para que se proceda à reabertura da instrução processual. (TRF4 5033888-90.2018.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 27/11/2020) (grifou-se)

Portanto, entendo que restou comprovado que no desempenho de suas funções, a parte autora esteve exposta a agente nocivo à saúde - penosidade.

Umidade

Quanto à umidade, a legislação previdenciária previa, até 05/03/1997, a natureza especial da atividade exposta ao agente nocivo descrito no item 1.1.3 do Decreto nº 53.831/64 (operações em locais com umidade excessiva, capaz de ser nociva à saúde e proveniente de fontes artificiais; trabalhos em contato direto e permanente com água - lavadores, tintureiros, operários nas salinas e outros). A partir de então, o reconhecimento da especialidade deve ter por base a previsão da Súmula 198 do TFR, segundo a qual é possível a verificação da especialidade da atividade por meio de perícia técnica que constate que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa.

Consta dos autos que, no período de 01/08/2003 a 30/03/2006, o autor trabalhou na empresa B.S Proteínas Ltda. (evento 1 - CTPS7, p. 4), na função de auxiliar de serviços gerais, e os laudos periciais judiciais por similaridade emprestados (evento 1 - laudo13 e laudo14) demonstram que a atividade exercida era insalubre, em decorrência do ambiente encharcado em que desenvolvidas as atividades laborais, sendo possível o reconhecimento da especialidade na integralidade do período, pela exposição ao agente nocivo umidade. Os laudos demonstram, ainda, exposição a álcalis cáusticos.

Níveis de concentração dos agentes químicos

Os riscos ocupacionais gerados pela exposição a agentes químicos - tóxicos orgânicos e inorgânicos - , diferentemente do que ocorre com alguns agentes agressivos, como ruído, calor, frio ou eletricidade, não dependem, segundo os normativos aplicáveis, de análise quanto ao grau ou intensidade de exposição no ambiente de trabalho para a configuração da nocividade e reconhecimento da especialidade do labor para fins previdenciários, especificamente quando o contato é MANUAL e não apenas AÉREO.

Penosidade

Quanto à penosidade, a 3ª Seção desta Corte Regional, por maioria, no julgamento do Incidente de Assunção de Competência nº 5033888-90.2018.4.04.0000, concluído na sessão de 25/11/2020, fixou a seguinte tese:

IAC TRF4 - TEMA 5: Deve ser admitida a possibilidade de reconhecimento do caráter especial das atividades de motorista ou de cobrador de ônibus em virtude da penosidade, ainda que a atividade tenha sido prestada após a extinção da previsão legal de enquadramento por categoria profissional pela Lei 9.032/1995, desde que tal circunstância seja comprovada por meio de perícia judicial individualizada, possuindo o interessado direito de produzir tal prova.

No voto condutor, da lavra do Exmo. Desembargador Federal João Batista Pinto Silveira, estabeleceram-se os parâmetros para a aferição da penosidade por meio de prova pericial, derivados da análise do(s) veículo(s) efetivamente conduzido(s) pelo trabalhador, dos trajetos percorridos e da jornada laboral:

1. Análise do(s) veículo(s) efetivamente conduzido(s) pelo trabalhador. O perito deverá diligenciar junto à(s) empresa(s) empregadora(s) para descobrir a marca, o modelo e o ano de fabricação do(s) veículo(s) conduzido(s) e, de posse dessas informações, poderá analisar se existia ou não penosidade na atividade em razão da necessidade de realização de esforço fatigante, como, por exemplo, na condução do volante, na realização da troca das marchas, ou em outro procedimento objetivamente verificável. No caso dos motoristas de ônibus deverá ser averiguado se a posição do motor ficava junto à direção, ocasionando desconfortos ao trabalhador, como, por exemplo, vibrações, ruído e calor constantes (ainda que inferiores aos patamares exigidos para reconhecimento da insalubridade da atividade, mas elevados o suficiente para qualificar a atividade como penosa em virtude da constância da exposição), ou outro fator objetivamente verificável. (Grifei)

2. Análise dos trajetos. O profissional deverá identificar qual(is) a(s) linha(s) percorrida(s) pelo trabalhador e analisar se existia, nesse transcurso, penosidade em razão de o trajeto incluir localidades consideradas de risco em razão da alta incidência de assaltos ou outras formas de violência, ou ainda em razão de o trajeto incluir áreas de difícil acesso e/ou trânsito em razão de más condições de trafegabilidade, como, por exemplo, a ausência de pavimentação. (Grifei)

3. Análise das jornadas. Deverá o profissional aferir junto à empresa se, dentro da jornada laboral habitualmente desempenhada pelo trabalhador, era-lhe permitido ausentar-se do veículo, quando necessário à satisfação de suas necessidades fisiológicas.

Realizando o perito judicial a análise das atividades efetivamente desempenhadas pelo trabalhador com base nos critérios objetivos acima descritos, e detectando a existência, de forma habitual e permanente, de qualquer das circunstâncias elencadas, ou outra que, embora não aventada no presente julgamento, seja aferível de forma objetiva e passível de expor trabalhador a desgaste considerado penoso, considero ser possível o reconhecimento da especialidade das atividades de motorista ou de cobrador de ônibus, independentemente da época em que prestada.

No caso dos autos, na prova pericial elaborada conforme parâmetros fixados no julgamento do referido Incidente de Assunção de Competência, o perito de confiança do juízo concluiu pela caracterização do labor como penoso em decorrência de riscos ergonômicos e estresse e vulnerabilidade quanto a situações de violência em jornadas estendidas em regime de horas extras (evento 83).

Dessa maneira, havendo comprovação pericial, com observância dos balizadores fixados por esta Corte no julgamento do IAC nº 5033888-90.2018.4.04.0000, da sujeição do autor a condições penosas de trabalho, impõe-se o reconhecimento da especialidade do labor desempenhado nos períodos de 29/04/1995 a 20/01/1996, 02/01/2007 a 31/07/2010 e 01/09/2010 a 01/01/2011, merecendo confirmação a sentença no ponto.

Intermitência na exposição aos agentes nocivos

A exigência de comprovação da exposição habitual e permanente do segurado a agentes nocivos para fins de caracterização da especialidade de suas atividades foi introduzida pela Lei n.º 9.032/95, razão pela qual, para períodos anteriores a 28-04-1995, a questão perde relevância.

Em relação aos intervalos posteriores a 28/04/1995, registro que a habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física referidas no artigo 57, § 3º, da Lei 8.213/91, com a redação dada pela Lei n.º 9.032/95, não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, devendo ser interpretada no sentido de que tal exposição é ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho, e não de ocorrência eventual, ocasional. Exegese diversa levaria à inutilidade da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho e, em muitas delas, a exposição em tal intensidade seria absolutamente impossível. A propósito do tema, os seguintes precedentes da Terceira Seção deste Tribunal: EINF n. 0003929-54.2008.404.7003, Terceira Seção, Rel. Des. Federal Rogério Favreto, D.E. 24/10/2011; EINF n. 2007.71.00.046688-7, Terceira Seção, Relator Des. Federal Celso Kipper, D.E. 07/11/2011.

Ademais, conforme o tipo de atividade, a exposição ao respectivo agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta à concessão de aposentadoria especial, tendo em vista que a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes à atividade, não sendo razoável que se retire do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (TRF4, EINF n. 2005.72.10.000389-1, Terceira Seção, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 18/05/2011; TRF4, EINF n. 2008.71.99.002246-0, Terceira Seção, Relator Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 08/01/2010).

Deve-se lembrar, ainda, que o Decreto nº 4.882/03 alterou o Decreto nº 3.048/99, o qual, para a aposentadoria especial, em seu art. 65, passou a considerar trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais, aquele cuja exposição ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço, o que ocorre no caso vertente.

Direito à aposentadoria no caso concreto

Mantida a sentença em relação à especialidade do labor, impõe-se sua manutenção também quanto ao reconhecimento do direito da parte autora à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, desde a DER.

Dessa forma, cumprindo com os requisitos tempo de serviço e carência, a parte autora tem direito:

- à implementação do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição desde a data do requerimento;

- ao pagamento das parcelas vencidas.

Transcorridos menos de cinco anos entre a DER (03/09/2018) e o ajuizamento da demanda (30/11/2022), não incide, no caso, a prescrição quinquenal.

Consectários e provimentos finais

- Correção monetária e juros de mora

A correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices:

- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei 8.880/94);

- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da Lei 8.213/91, na redação da Lei 11.430/06, precedida da MP 316, de 11/08/2006, e art. 31 da Lei10.741/03, que determina a aplicação do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso).

- INPC ou IPCA em substituição à TR, conforme se tratar, respectivamente, de débito previdenciário ou não, a partir de 30/06/2009, diante da inconstitucionalidade do uso da TR, consoante decidido pelo STF no Tema 810 e pelo STJ no tema 905.

Os juros de mora, por sua vez, devem incidir a partir da citação.

Até 29-06-2009, já tendo havido citação, deve-se adotar a taxa de 1% ao mês a título de juros de mora, conforme o art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.

A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo percentual aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado, no ponto, constitucional pelo STF no RE 870947, decisão com repercussão geral.

Os juros de mora devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo legal em referência determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, AgRgno AgRg no Ag 1211604/SP).

Por fim, a partir de 09/12/2021, para fins de atualização monetária e juros de mora, deve incidir o artigo 3º da Emenda n. 113, segundo o qual, nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC), acumulado mensalmente.

Honorários advocatícios

Negado provimento ao recurso do INSS, deve ser observada, em cumprimento de sentença, a majoração de 50% da verba honorária fixada na origem, pela incidência do §11 do artigo 85 do CPC.

Tutela específica - implantação do benefício

Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados nos artigos 497 e 536 do CPC, quando dirigidos à Administração Pública, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo, determino o cumprimento do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora, especialmente diante do seu caráter alimentar e da necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.

Resulta, todavia, facultada à parte autora a possibilidade de renúncia à implantação do benefício ora determinada.

TABELA PARA CUMPRIMENTO PELA CEAB
CUMPRIMENTOImplantar Benefício
NB1873819070
ESPÉCIEAposentadoria por Tempo de Contribuição
DIB03/09/2018
DIPPrimeiro dia do mês da decisão que determinou a implantação/restabelecimento do benefício
DCB
RMIA apurar
OBSERVAÇÕES

Por fim, na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício ora deferido apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.

Requisite a Secretaria da 6ª Turma, à CEAB-DJ-INSS-SR3, o cumprimento da decisão e a comprovação nos presentes autos, no prazo de 20 (vinte) dias.

Conclusão

Apelação parcialmente conhecida e, nessa extensão, desprovida. Honorários advocatícios majorados nos termos do §11 do artigo 85 do CPC.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto por conhecer em parte da apelação do INSS e, nessa extensão, negar-lhe provimento e determinar a implantação do benefício, via CEAB.



Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004575400v10 e do código CRC 823201ed.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): TAIS SCHILLING FERRAZ
Data e Hora: 15/8/2024, às 18:6:35


5000889-65.2022.4.04.7139
40004575400.V10


Conferência de autenticidade emitida em 23/08/2024 04:00:55.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000889-65.2022.4.04.7139/RS

RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: MARINO BOFF (AUTOR)

ADVOGADO(A): TUANNE PINTO JACOB (OAB RS101312)

ADVOGADO(A): ALZIRA PEREIRA SCHARDOSIM (OAB RS110500)

ADVOGADO(A): ALISSON DA ROSA BENCKE (OAB RS130610)

ADVOGADO(A): LUIZA PEREIRA SCHARDOSIM DE BARROS

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS. NÍVEIS DE CONCENTRAÇÃO DOS AGENTES QUÍMICOS. MOTORISTA E COBRADOR DE ÔNIBUS. PENOSIDADE. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CONCESSÃO.

1. O reconhecimento da especialidade e o enquadramento da atividade exercida sob condições nocivas são disciplinados pela lei em vigor à época em que efetivamente exercidos, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador.

2. Até 28-04-1995 é admissível o reconhecimento da especialidade por categoria profissional ou por sujeição a agentes nocivos, admitindo-se qualquer meio de prova (exceto para ruído e calor); a partir de 29-04-1995 não mais é possível o enquadramento por categoria profissional, sendo necessária a comprovação da exposição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova até 05-03-1997 e, a partir de então, através de formulário embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.

3. A exposição à umidade e álcalis cáusticos enseja o reconhecimento do tempo de serviço como especial.

4. Os riscos ocupacionais gerados pela exposição a agentes químicos não dependem, segundo os normativos aplicáveis, de análise quanto ao grau ou intensidade de exposição no ambiente de trabalho para a configuração da nocividade e reconhecimento da especialidade do labor para fins previdenciários.

5. Constatada a exposição do segurado motorista e cobrador de ônibus, bem como de motorista e ajudante de caminhão, a condições laborais penosas, mediante perícia realizada em observância aos parâmetros fixados no julgamento do IAC n.º 5033888-90.2018.4.04.0000, possível o reconhecimento da especialidade do labor.

6. A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física referidas no artigo 57, § 3º, da Lei 8.213/91 não pressupõem a submissão contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho. Não se interpreta como ocasional, eventual ou intermitente a exposição ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho. Precedentes desta Corte.

7. Preenchidos os requisitos legais, tem o segurado direito à obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, conhecer em parte da apelação do INSS e, nessa extensão, negar-lhe provimento e determinar a implantação do benefício, via CEAB, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 14 de agosto de 2024.



Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004575401v6 e do código CRC 3afdd2d5.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): TAIS SCHILLING FERRAZ
Data e Hora: 15/8/2024, às 18:6:35


5000889-65.2022.4.04.7139
40004575401 .V6


Conferência de autenticidade emitida em 23/08/2024 04:00:55.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 07/08/2024 A 14/08/2024

Apelação Cível Nº 5000889-65.2022.4.04.7139/RS

RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

PRESIDENTE: Desembargador Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO

PROCURADOR(A): CARLOS EDUARDO COPETTI LEITE

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: MARINO BOFF (AUTOR)

ADVOGADO(A): TUANNE PINTO JACOB (OAB RS101312)

ADVOGADO(A): ALZIRA PEREIRA SCHARDOSIM (OAB RS110500)

ADVOGADO(A): ALISSON DA ROSA BENCKE (OAB RS130610)

ADVOGADO(A): KAROLINE SCHARDOSIM DOS SANTOS (OAB RS121459)

ADVOGADO(A): LUIZA PEREIRA SCHARDOSIM DE BARROS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 07/08/2024, às 00:00, a 14/08/2024, às 16:00, na sequência 541, disponibilizada no DE de 29/07/2024.

Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER EM PARTE DA APELAÇÃO DO INSS E, NESSA EXTENSÃO, NEGAR-LHE PROVIMENTO E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO, VIA CEAB.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

Votante: Desembargador Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO

Votante: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA

LIDICE PENA THOMAZ

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 23/08/2024 04:00:55.

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