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Apelação/Remessa Necessária Nº 5003791-83.2018.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARCOS GILMAR MEINEN ZUGE
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação de sentença (Evento 3, 'Sent28') publicada na vigência do CPC/2015 em que o magistrado a quo julgou procedente o pedido para, reconhecendo a especialidade do labor prestado nos períodos 02/05/1988 a 01/10/1992, 01/11/1994 a 31/03/05 e 22/05/09 a 29/05/2009 e 02/10/1992 a 20/04/1994, conceder o benefício de Aposentadoria Especial à parte autora, condenando o Instituto Previdenciário ao pagamento das parcelas vencidas, a partir da data do requerimento na esfera administrativa, em 14/07/14, atualizadas e acrescidas de juros moratórios, bem como dos honorários advocatícios (10% sobre o valor das prestações vencidas até a data da sentença) e das custas processuais pela metade.
A sentença também antecipou a tutela, com a determinação de imediata implantação do benefício.
O INSS recorre (Evento 3, 'Apelação29') postulando a reforma da sentença. Preliminarmente, requer seja atribuído efeito suspensivo ao recurso interposto e a submissão do feito ao reexame necessário. No mérito, sustenta (a) a impossibilidade de reconhecimento da especialidade do trabalho com cimento (álcalis cáusticos) e (b) que a exposição a agentes químicos, no trabalho do autor como metalúrgico, não ocorreu de forma habitual e permanente, além de os documentos apresentados não referirem a concentração dos agentes químicos. Subsidiariamente, requer a alteração do marco inicial do benefício para a data do afastamento do segurado de seu labor sob condições especiais - DAT, e a incidência plena da Lei n.º 11.960/09 no que refere à forma de cálculo dos juros e da correção monetária das parcelas devidas.
Processados, e também por força de remessa oficial, subiram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
Da remessa necessária
Inicialmente, cumpre referir que, conforme assentado pelo STJ, a lei vigente à época da prolação da sentença recorrida é a que rege o cabimento da remessa oficial (REsp 642.838/SP, rel. Min. Teori Zavascki).
As decisões proferidas sob a égide do CPC de 1973, sujeitavam-se a reexame obrigatório caso condenassem a Fazenda Pública ou em face dela assegurassem direito controvertido de valor excedente a 60 salários mínimos. O CPC de 2015, contudo, visando à racionalização da proteção do interesse público que o instituto ora em comento representa, redefiniu os valores a partir dos quais terá cabimento o reexame obrigatório das sentenças, afastando aquelas demandas de menor expressão econômica, como a generalidade das ações previdenciárias. Assim, as sentenças proferidas contra a Fazenda Pública na vigência do CPC de 2015 somente estarão sujeitas a reexame caso a condenação ou o proveito econômico deferido à outra parte seja igual ou superior a mil salários mínimos.
Considerando que o valor do salário de benefício concedido no RGPS não será superior ao limite máximo do salário de contribuição na data de início do benefício (art. 29, §2.º, da Lei n.º 8.213/91), o qual atualmente equivale a R$5.839,45 (Portaria n.º 09/2019, do Ministério da Economia), e considerando, ainda, que nas lides previdenciárias o pagamento das parcelas em atraso restringe-se ao período não atingido pela prescrição, qual seja, os últimos 5 anos contados retroativamente a partir da data do ajuizamento da ação (art. 103, parágrafo único, da Lei n.º 8.213/91), é forçoso reconhecer que, mesmo na hipótese em que a RMI do benefício deferido na sentença seja fixada no teto máximo, o valor da condenação, ainda que acrescida de correção monetária e juros de mora, não excederá o montante exigível para a admissibilidade do reexame necessário.
Necessário ainda acrescentar que as sentenças previdenciárias não carecem de liquidez quando fornecem os parâmetros necessários para a obtenção desse valor mediante simples cálculo aritmético, o que caracteriza como líquida a decisão, para fins de aferição da necessidade de reexame obrigatório.
No caso, considerando a DIB e a data da sentença, verifica-se de plano, não se tratar de hipótese para o conhecimento do reexame obrigatório, portanto, não conheço da remessa necessária.
Da prescrição quinquenal
O parágrafo único do art. 103 da Lei 8213/91 (redação dada pela Lei 9.528/97) dispõe sobre a prescrição quinquenal das parcelas de benefícios não reclamados nas épocas próprias, podendo, inclusive, ser reconhecida, de ofício.
No caso, não tendo transcorrido lapso superior a cinco anos entre o requerimento administrativo (14/07/14) e o ajuizamento da ação (16/12/2014), não há parcelas atingidas pela prescrição.
DA ATIVIDADE ESPECIAL
O reconhecimento da especialidade de determinada atividade é disciplinado pela lei em vigor à época em que efetivamente exercida, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, sem a incidência retroativa de uma lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
Nesse sentido, aliás, é a orientação adotada pela Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (AR n.º 3320/PR, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe de 24.09.2008; EREsp n.º 345554/PB, Rel. Ministro José Arnaldo da Fonseca, DJ de 08.03.2004; AGREsp n.º 493.458/RS, Quinta Turma, Rel. Ministro Gilson Dipp, DJU de 23.06.2003; e REsp n.º 491.338/RS, Sexta Turma, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, DJU de 23.06.2003), que passou a ter expressa previsão legislativa com a edição do Decreto n.º 4.827/2003, o qual alterou a redação do art. 70, §1.º, do Decreto n.º 3.048/99.
Feita essa consideração e tendo em vista a diversidade de diplomas legais que se sucederam na disciplina da matéria, necessário inicialmente definir qual a legislação aplicável ao caso concreto, ou seja, qual a legislação vigente quando da prestação da atividade pela parte autora.
Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema sub judice:
a) no período de trabalho até 28.04.1995, quando vigente a Lei n.º 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei n.º 8.213/91 (Lei de Benefícios), em sua redação original (arts. 57 e 58), possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial ou quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto para os agentes nocivos ruído, frio e calor (STJ, AgRg no REsp n.º 941885/SP, Quinta Turma, Rel. Ministro Jorge Mussi, DJe de 04.08.2008; e STJ, REsp n.º 639066/RJ, Quinta Turma, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJ de 07.11.2005), em que necessária a mensuração de seus níveis por meio de perícia técnica, carreada aos autos ou noticiada em formulário emitido pela empresa, a fim de se verificar a nocividade ou não desses agentes;
b) a partir de 29.04.1995, inclusive, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional - à exceção daquelas a que se refere a Lei n.º 5.527/68, cujo enquadramento por categoria deve ser feito até 13.10.1996, dia anterior à publicação da Medida Provisória n.º 1.523, que revogou expressamente a Lei em questão - de modo que, no interregno compreendido entre 29.04.1995 (ou 14.10.1996) e 05.03.1997, em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei n.º 9.032/95 no art. 57 da Lei de Benefícios, necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, suficiente, para tanto, a apresentação de formulário padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico, ressalvados os agentes nocivos ruído, frio e calor, conforme visto acima;
c) a partir de 06.03.1997, data da entrada em vigor do Decreto n.º 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no art. 58 da Lei de Benefícios pela Medida Provisória n.º 1.523/96 (convertida na Lei n.º 9.528/97), passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.
d) a partir de 01.01.2004, o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) passou a ser documento indispensável para a análise do período cuja especialidade for postulada (art. 148 da Instrução Normativa n.º 99 do INSS, publicada no DOU de 10.12.2003). Tal documento substituiu os antigos formulários (SB-40, DSS-8030, ou DIRBEN-8030) e, desde que devidamente preenchido, inclusive com a indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais e pela monitoração biológica, exime a parte da apresentação do laudo técnico em juízo.
Para fins de enquadramento das categorias profissionais, devem ser considerados os Decretos n.º 53.831/64 (Quadro Anexo - 2.ª parte), n.º 72.771/73 (Quadro II do Anexo) e n.º 83.080/79 (Anexo II) até 28.04.1995, data da extinção do reconhecimento da atividade especial por presunção legal, ressalvadas as exceções acima mencionadas. Já para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos n.º 53.831/64 (Quadro Anexo - 1.ª parte), n.º 72.771/73 (Quadro I do Anexo) e n.º 83.080/79 (Anexo I) até 05.03.1997 e, a partir de então, os Decretos n.º 2.172/97 (Anexo IV) e n.º 3.048/99, ressalvado o agente nocivo ruído, ao qual se aplica também o Decreto n.º 4.882/03. Além dessas hipóteses de enquadramento, sempre possível também a verificação da especialidade da atividade por meio de perícia técnica, nos termos da Súmula n.º 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos (STJ, AGRESP n.º 228832/SC, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, DJU de 30.06.2003).
Ainda para fins de reconhecimento da atividade como especial, cumpre referir que a habitualidade e a permanência do tempo de trabalho em condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física, referidas no artigo 57, § 3.º, da Lei n.º 8.213/91 não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho. Deve ser interpretada no sentido de que tal exposição deve ser ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina laboral, e não de ocorrência eventual, ocasional. Exegese diversa levaria à inutilidade da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho, e em muitas delas a exposição em tal intensidade seria absolutamente impossível. A propósito do tema, vejam-se os seguintes precedentes da Terceira Seção deste Tribunal: EINF n.º 0003929-54.2008.404.7003, de relatoria do Desembargador Federal Néfi Cordeiro, D.E. 24.10.2011; EINF n.º 2007.71.00.046688-7, Terceira Seção, Relator Celso Kipper, D.E. 07.11.2011.
Ademais, conforme o tipo de atividade, a exposição ao respectivo agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta ser reconhecida como especial, tendo em vista que a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes à atividade, sendo inaceitável que se retire do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (TRF4, EINF 2005.72.10.000389-1, Terceira Seção, minha Relatoria, D.E. 18.05.2011; TRF4, EINF 2008.71.99.002246-0, Terceira Seção, Relator Luís Alberto D' Azevedo Aurvalle, D.E. 08.01.2010).
Quanto aos agentes nocivos químicos, os riscos ocupacionais gerados independem da análise quantitativa de sua concentração ou da intensidade máxima e mínima no ambiente de trabalho, dado que são caracterizados pela avaliação qualitativa. Ao contrário do que ocorre com alguns agentes agressivos, como, v.g., o ruído, calor, frio ou eletricidade, que exigem sujeição a determinados patamares para ser configurada a nocividade do labor, no caso dos tóxicos orgânicos e inorgânicos, os Decretos que regem a matéria não trazem a mesma exigência para fins previdenciários, pois a exposição habitual, rotineira, a tais fatores insalutíferos é suficiente para tornar o trabalhador vulnerável a doenças ou acidentes. Nessa linha:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ATIVIDADES ESPECIAIS. LEGISLAÇÃO APLICÁVEL. CONVERSÃO PARCIAL. CONCESSÃO. CONSECTÁRIOS LEGAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. TUTELA ESPECÍFICA. IMPLANTAÇÃO IMEDIATA DO BENEFÍCIO. 1. A Lei nº 9.711/98 e o Regulamento Geral da Previdência Social aprovado pelo Decreto nº 3.048/99, resguardam o direito adquirido de os segurados terem convertido o tempo de serviço especial em comum, até 28-05-1998, observada, para fins de enquadramento, a legislação vigente à época da prestação do serviço. 2. A Lei nº 9.711/98 e o Regulamento Geral da Previdência Social aprovado pelo Decreto nº 3.048/99, resguardam o direito adquirido de os segurados terem convertido o tempo de serviço especial em comum, até 28-05-1998, observada, para fins de enquadramento, a legislação vigente à época da prestação do serviço. 3. Até 28-04-1995 é admissível o reconhecimento da especialidade por categoria profissional ou por sujeição a agentes nocivos, aceitando-se qualquer meio de prova (exceto para ruído); a partir de 29-04-1995 não mais é possível o enquadramento por categoria profissional, devendo existir comprovação da sujeição a agentes nocivos por qualquer meio de prova até 05-03-1997 e, a partir de então e até 28-05-1998, por meio de formulário embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica. 4. Ao contrário do que ocorre com alguns agentes agressivos, como, v.g., o ruído, calor, frio ou eletricidade, que exigem sujeição a determinados patamares para que configurada a nocividade do labor, no caso dos tóxicos orgânicos e inorgânicos, os Decretos que regem a matéria não trazem a mesma exigência, ao contrário do que ocorre na seara trabalhista, motivo pelo qual a apontada análise quantitativa não se faz necessária. 5. Desempenhada a função insalutífera apenas de modo eventual, ou seja, somente em determinadas ocasiões, por curto intervalo temporal (uma hora por dia a cada duas semanas), não se tratando, pois, de submissão aos agentes do modo diuturno, constante ou efetivo, tem-se como decorrência a inviabilidade de que reconhecida as condições prejudiciais à sua saúde. 6. A insalubridade, penosidade ou periculosidade decorrem das condições em que é desenvolvido o trabalho, independentemente do seu enquadramento nos decretos que relacionam as atividades especiais, os quais são meramente exemplificativos. Concluindo o perito judicial pela insalubridade em face do contato habitual e permanente com os agentes nocivos químicos, é de ser reconhecida a especialidade o trabalho de parte do período postulado. (...) (TRF4, APELREEX 2002.70.05.008838-4, Quinta Turma, Relator Hermes Siedler da Conceição Júnior, D.E. 10.05.2010)
Do caso em análise
É de se referir, inicialmente, o reconhecimento administrativo da especialidade do labor da parte autora nos intervalos 01/04/05 a 21/05/09 e 01/02/10 a 07/07/14, trabalho este realizado na mesma empresa em que prestado os demais intervalos que serão analisados.
O período controverso em que se pretende o reconhecimento da atividade como especial está assim detalhado:
Período: | 02/05/1988 a 01/10/1992, 01/11/1994 a 31/03/05 e 22/05/09 a 29/05/2009. |
Empresa: | Rudi Roni Reips. (Comércio de baterias) |
Função: | Metalúrgico. |
Agente nocivo: | Agentes químicos (ácido sulfúrico, chumbo, óleos minerais). Oxiacetileno. Fumos metálicos (trabalho com solda). |
Enquadramento legal: | Agentes químicos: códigos 1.2.11 do Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64 (tóxicos orgânicos), 1.2.10 do Anexo I do Decreto n.º 83.080/79 (hidrocarbonetos e outros compostos de carbono) e 1.0.19 do Anexo IV do Decreto nº 2.172/97 e do Anexo IV do Decreto n° 3.048/99 (outras substâncias químicas). Oxiacetileno. Fumos metálicos: Código 1.1.4 do Anexo do Decreto nº 53.831/64 (soldadores com oxiacetilênio), no código 1.2.11 do Anexo I do Decreto nº 83.080/79 (solda elétrica e a oxiacetileno - fumos metálicos) e no código 17 do Anexo II do Decreto nº 2.172/97 (soldagem acetilênica). Até 05/03/1997, quando entrou em vigência o Decreto nº 2.172/97, é possível o reconhecimento da especialidade por enquadramento pela função de soldador nos termos do código 1.1.4 do Anexo do Decreto nº 53.831/64 e no código 1.2.11 do Anexo I do Decreto nº 83.080/79. |
Meio de prova: | CTPS (Evento 3, ‘Anexos Pet4’, fls. 10-15). PPP (Evento 3, ‘Anexos Pet4’, fls. 24-27, 32-39, 46-47 e 51-52). Laudo técnico (Evento 3, ‘Anexos Pet4’, fls. 48-50 e 53-94). Laudo técnico judicial (Evento 3, ‘LaudPeri24’). |
Conclusão: | Foi devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial pela parte autora no período antes indicado em virtude de sua exposição, de forma habitual e permanente, aos agentes agressivos acima mencionados.
Afasta-se a irresignação trazida na apelação, com relação à quantificação dos agentes químicos porque, como acima observado, o critério é qualitativo. |
Período: | 02/10/1992 a 20/04/1994. |
Empresa: | Rudi Roni Reips. |
Função: | Servente. (Construção civil) |
Agente nocivo: | Cimento. |
Enquadramento legal: | Cimento: código 1.2.10 do Quadro Anexo do Decreto 53.831/64 (sílica, carvão, cimento, asbesto e talco) e código 1.2.12 do Anexo I do Decreto 83.080/79 (sílica, silicatos, carvão, cimento e amiantos), bem como item "fabricação e transporte de cal e cimento nas fases de grande exposição a poeiras" da relação de atividades de insalubridade de grau mínimo do grupo "operações diversas" do Anexo 13 (Agentes químicos) da Norma Regulamentadora 15 do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). |
Meio de prova: | CTPS (Evento 3, ‘Anexos Pet4’, fls. 10-15). PPP (Evento 3, ‘Anexos Pet4’, fls. 28-31). Laudo técnico judicial (Evento 3, ‘LaudPeri24’). |
Conclusão: | Foi devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial pela parte autora no período antes indicado em virtude de sua exposição, de forma habitual e permanente, ao agente agressivo cimento. Registre-se que o reconhecimento da atividade especial em virtude da exposição do trabalhador ao cimento não fica limitada somente a fabricação desse produto, mas também pode ocorrer em razão do seu manuseio rotineiro e habitual, recorrente nas atividades de pedreiro e mestre de obras, tendo em vista a nocividade da sua composição, altamente prejudicial à saúde. Com efeito o cimento se compõe, basicamente, de cal (CaO) que figura numa porcentagem de 60 a 67%, proveniente na maior parte da decomposição do carbonato de cálcio, de sílica (SiO2), de 17 a 25% e de alumina (Al2O3), entre 3 e 8%, contendo, ainda Fe2O3, SO3, MgO, K2O, Na2O, Mn3O3, P2O5 e Ti2O2, em menores quantidades, em conformidade com sua composição química descrita na obra Concreto de cimento, de E.G. Petrucci, São Paulo, 1968, p. 3-5, neste sentido a jurisprudência dominante deste Tribunal (AC 2005.72.01.052195-5/SC, Relator Desembargador Federal Victor Luiz dos Santos Laus, 6.ª Turma/TRF4, DJU 27/9/2007 e EIAC 2000.04.01.034145-6/RS, Relator Desembargador Federal Celso Kipper, 3.ª Seção D.J.U. 9/11/2005) e do Superior Tribunal de Justiça (REsp 354737/ RS, Relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, 6.ª Turma, DJE 9/12/2008). |
Assim, tenho como caracterizada a especialidade do trabalho nos intervalos 02/05/1988 a 01/10/1992, 01/11/1994 a 31/03/05 e 22/05/09 a 29/05/2009 e 02/10/1992 a 20/04/1994, correspondente a 16 anos, 04 mês e 28 dias.
Dos Equipamentos de Proteção Individual
A discussão acerca da higidez do PPP para comprovação da eficácia dos Equipamentos de Proteção Individual, com a consequente neutralização dos agentes nocivos, é objeto do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas - IRDR - n.º 15 desta Corte (AC 5054341-77.2016.4.04.0000/SC). Todavia, não se aplica ao caso a determinação de sobrestamento do feito contida no voto do Relator para admissão do referido incidente, em razão de o mérito da questão já ter sido julgado por esta 3.ª Seção, em 22.11.2017, com o estabelecimento da seguinte tese jurídica: a mera juntada do PPP referindo a eficácia do EPI não elide o direito do interessado em produzir prova em sentido contrário. Ainda que a decisão não tenha transitado em julgado, porquanto pende de apreciação de embargos de declaração, não há impedimento à aplicação da tese fixada por este Regional em razão da não interposição e/ou admissão de Recurso Especial ou Extraordinário.
Ademais, as circunstâncias do presente caso não admitem a possibilidade de afastamento do caráter especial das atividades desempenhadas pela parte autora.
Com efeito, a utilização de EPIs é irrelevante para os períodos laborados até 03 de dezembro de 1998, data da publicação da MP 1.729/98, convertida na Lei 9.732/98, que alterou o § 2.º do artigo 58 da Lei 8.213/91, determinando que o laudo técnico contenha informação sobre a existência de tecnologia de proteção individual que diminua a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância e recomendação sobre a sua adoção pelo estabelecimento respectivo.
No caso, embora haja períodos posteriores a data acima mencionada, também quanto a eles não há que se falar em afastamento da especialidade em razão de EPIs, uma vez que há no laudo pericial informação relativa a não comprovação de sua efetiva e correta utilização, de modo que não houve o afastamento da nocividade dos agentes agressivos verificados na atividade periciada.
Por fim, quanto aos agentes químicos, considero ser insuficiente para garantir a efetiva neutralização dos agentes insalubres a mera aposição de um "S", indicativo de sim, no campo pertinente da seção de registros ambientais do PPP, quando desacompanhada da efetiva comprovação de que tais equipamentos foram realmente utilizados pelo trabalhador, de forma habitual e permanente, durante toda a contratualidade, bem como quando desacompanhada da comprovação de que a empresa forneceu programa de treinamento dos trabalhadores quanto à correta utilização desses dispositivos, e orientação sobre suas limitações, nos termos estabelecidos pela NR 9 do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).
Necessário esclarecer que a utilização de cremes de proteção, ainda que devidamente aprovados pelo Ministério do Trabalho e Emprego, não possui o condão de neutralizar a ação dos agentes nocivos a que estava exposta a parte autora. Com efeito, tais cremes são conhecidos como "luvas invisíveis" e são utilizados por permitir que o trabalhador não perca o tato e a movimentação. Exatamente em decorrência dessas características, na prática, é quase inviável ao trabalhador a avaliação do nível de proteção a que está sujeito, considerando o desgaste natural da camada protetora por eles oferecida, em virtude do manuseio de equipamentos e de ferramentas, da fricção das mãos com objetos e roupas e mesmo do suor, aspectos ínsitos à prestação laboral em análise. Desse modo, torna-se, praticamente impossível a manutenção de uma camada protetiva contínua e homogênea, refutando-se a afirmação de que a utilização apenas de cremes de proteção, mesmo que de forma adequada, possui o condão de neutralizar a ação de agentes nocivos químicos.
Em caso análogo, este Regional já deixou assentado que o simples fornecimento pelo empregador de cremes de proteção para mãos não exclui a hipótese de exposição do trabalhador aos agentes químicos nocivos à saúde. (REOAC 0005443-36.2012.404.9999, Quinta Turma, Relator Juiz Federal Luiz Antonio Bonat, D.E. 05.10.2016). Ademais, Havendo dúvida razoável sobre a eficácia do EPI para neutralizar a nocividade da exposição do segurado aos hidrocarbonetos, incide a segunda parte da primeira tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal no Tema 555 de repercussão geral ("em caso de divergência ou dúvida sobre a real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, a premissa a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial"). (APELREEX 5011077-31.2013.404.7108, Sexta Turma, Relator (Auxílio Vânia) Juiz Federal Hermes da Conceição Jr., juntado aos autos em 23.10.2015).
O mesmo se diga em relação aos óculos de proteção e guardapó. Não se pode olvidar que os óleos de origem mineral são substâncias consideradas insalubres, por conterem Hidrocarbonetos Aromáticos Policíclicos, cuja principal via de absorção é a pele, podendo causar danos ao organismo que vão além de patologias epidérmicas, pois, conforme o posicionamento desta Turma, 'o contato com esses agentes (graxas, óleos minerais, hidrocarbonetos aromáticos, combustíveis, solventes, inseticidas, etc.) é responsável por frequentes dermatoses profissionais, com potencialidade de ocasionar afecções inflamatórias e até câncer cutâneo em número significativo de pessoas expostas, em razão da ação irritante da pele, com atuação paulatina e cumulativa, bem como irritação e dano nas vias respiratórias quando inalados e até efeitos neurológicos, quando absorvidos e distribuídos através da circulação do sangue no organismo. Isto para não mencionar problemas hepáticos, pulmonares e renais' (TRF4, APELREEX 0002033-15.2009.404.7108, Sexta Turma, Relator Celso Kipper, D.E. 12.07.2011) - sublinhado.
Com efeito, o Ministério do Trabalho e Emprego editou a Portaria Interministerial 9, de 07.12.2014, publicando a Lista Nacional de Agentes Cancerígenos para Humanos, sendo que arrolado no Grupo 1 - Agentes confirmados como carcinogênicos para humanos, encontram-se listados "óleos minerais (não tratados ou pouco tratados)".
O art. 68, § 4.º, do Decreto 3048/99 traz a seguinte disposição:
Art. 68. A relação dos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, considerados para fins de concessão de aposentadoria especial, consta do Anexo IV. (...) § 4º. A presença no ambiente de trabalho, com possibilidade de exposição a ser apurada na forma dos §§ 2.º e 3.º, de agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos em humanos, listados pelo Ministério do Trabalho e Emprego, será suficiente para a comprovação de efetiva exposição do trabalhador. (Redação dada pelo Decreto n.º 8.123, de 2013)
O art. 284, parágrafo único, da IN 77/2015 do INSS, por sua vez, prevê:
Art. 284. Para caracterização de período especial por exposição ocupacional a agentes químicos e a poeiras minerais constantes do Anexo IV do RPS, a análise deverá ser realizada: I - até 5 de março de 1997, véspera da publicação do Decreto nº 2.172, de 5 de março de 1997, de forma qualitativa em conformidade com o código 1.0.0 do quadro anexo ao Decretos nº 53.831, de 25 de março de 1964 ou Código 1.0.0 do Anexo I do Decreto nº 83.080, de 1979, por presunção de exposição; II - a partir de 6 de março de 1997, em conformidade com o Anexo IV do RBPS, aprovado pelo Decreto nº 2.172, de 5 de março de 1997, ou do RPS, aprovado pelo Decreto nº 3.048, de 1999, dependendo do período, devendo ser avaliados conformes os Anexos 11, 12, 13 e 13-A da NR-15 do MTE; e III - a partir de 01 de janeiro de 2004 segundo as metodologias e os procedimentos adotados pelas NHO-02, NHO-03, NHO-04 e NHO-07 da FUNDACENTRO., sendo facultado à empresa a sua utilização a partir de 19 de novembro de 2003, data da publicação do Decreto nº 4.882, de 2003. Parágrafo único. Para caracterização de períodos com exposição aos agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos em humanos, listados na Portaria Interministerial n° 9 de 07 de outubro de 2014, Grupo 1 que possuem CAS e que estejam listados no Anexo IV do Decreto nº 3.048, de 1999, será adotado o critério qualitativo, não sendo considerados na avaliação os equipamentos de proteção coletiva e ou individual, uma vez que os mesmos não são suficientes para elidir a exposição a esses agentes, conforme parecer técnico da FUNDACENTRO, de 13 de julho de 2010 e alteração do § 4.° do art. 68 do Decreto n.º 3.048, de 1999
Fonte de custeio
No tocante à concessão do benefício sem a correspondente fonte de custeio, transcreve-se trecho do bem lançado voto do Des. Federal Celso Kipper (Apelação Cível n.º 0014748-78.2011.404.9999/RS), que bem traduz o entendimento desta Corte acerca da questão em debate:
"(...) A teor do art. 195, § 5º, da Constituição Federal, nenhum benefício da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total.
No entanto, para a concessão de aposentadoria especial ou conversão de tempo exercido sob condições especiais em tempo de trabalho comum, previstas nos artigos 57 e 58 da Lei de benefícios, existe específica indicação legislativa de fonte de custeio: o parágrafo 6º do mesmo art. 57 supracitado, combinado com o art. 22, inc. II, da Lei n. 8.212/91, os quais possuem o seguinte teor:
"Art. 57 - (...)
§ 6º - O benefício previsto neste artigo será financiado com os recursos provenientes da contribuição de que trata o inc. II do art. 22 da Lei 8.212, de 24/07/91, cujas alíquotas serão acrescidas de 12, 9 ou 6 pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após 15, 20 ou 25 anos de contribuição, respectivamente.
Art. 22 - (...)
II - para o financiamento do benefício previsto nos arts. 57 e 58 da Lei 8.213/91, e daqueles concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho, sobre o total das remunerações pagas ou creditadas, no decorrer do mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos:
a) 1% para as empresas em cuja atividade preponderante o risco de acidentes do trabalho seja considerado leve;
b) 2% para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja considerado médio;
c) 3% para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja considerado grave."
Não vejo óbice ao fato de a lei indicar como fonte do financiamento da aposentadoria especial e da conversão de tempo especial em comum as contribuições a cargo da empresa, pois o art. 195, caput e incisos, da Constituição Federal, dispõe que a seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e, dentre outras ali elencadas, das contribuições sociais do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei.
Por fim, ressalto que, a rigor, sequer haveria, no caso, necessidade de específica indicação legislativa da fonte de custeio, uma vez que se trata de benefício previdenciário previsto pela própria Constituição Federal (art. 201, § 1º c/c art. 15 da EC n. 20/98), hipótese em que sua concessão independe de identificação da fonte de custeio (STF, RE n. 220.742-6, Segunda Turma, Rel. Ministro Néri da Silveira, julgado em 03-03-1998; RE n. 170.574, Primeira Turma, Rel. Ministro Sepúlveda Pertence, julgado em 31-05-1994; AI n. 614.268 AgR, Primeira Turma, Rel. Ministro Ricardo Lewandowski, julgado em 20-11-2007; ADI n. 352-6, Plenário, Rel. Ministro Sepúlveda Pertence, julgada em 30-10-1997; RE n. 215.401-6, Segunda Turma, Rel. Ministro Néri da Silveira, julgado em 26-08-1997; AI n. 553.993, Rel. Ministro Joaquim Barbosa, decisão monocrática, DJ de 28-09-2005), regra esta dirigida à legislação ordinária posterior que venha a criar novo benefício ou a majorar e estender benefício já existente."
Da concessão do benefício
Dirimida a questão acerca da comprovação do tempo de serviço controvertido, cabe a análise do direito à aposentadoria pretendida.
Para fazer jus à Aposentadoria Especial deve a parte autora preencher os requisitos previstos no art. 57 da Lei 8213/91, quais sejam, a carência de 180 contribuições, ressalvado o direito de incidência da tabela do art. 142 da referida lei àqueles segurados inscritos na Previdência Social Urbana até 24.07.1991 e o tempo de trabalho sujeito a condições prejudiciais à sua saúde ou à sua integridade física durante 15, 20 ou 25 anos, portanto, descabe a conversão de tempo de serviço especial em comum.
A carência foi devidamente cumprida e quanto ao tempo de contribuição, somando-se os períodos especiais judicialmente admitidos ao tempo especial já reconhecido na via administrativa (01/04/05 a 21/05/09 e 01/02/10 a 07/07/14 - Evento 3, 'AnexosPet4', fl. 100), a parte autora demonstra ter trabalhado em atividades especiais por 25 anos, 01 mês e 10 dias, o que lhe garante o direito à Aposentadoria Especial, a contar da data do requerimento administrativo, em 14/07/14, sem a incidência do fator previdenciário, conforme determina o art. 29, II, da Lei 8.213/91.
Da Continuidade da Atividade Especial
A Corte Especial deste Tribunal (Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade n.º 5001401-77.2012.404.0000, Rel. Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, julgado em 24.05.2012) decidiu pela inconstitucionalidade do § 8.º do art. 57 da Lei de Benefícios, (a) por afronta ao princípio constitucional que garante o livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão (art. 5.º, XIII, da Constituição Federal de 1988; (b) porque a proibição de trabalho perigoso ou insalubre existente no art. 7.º, XXXIII, da Constituição Federal de 1988, só se destina aos menores de dezoito anos, não havendo vedação ao segurado aposentado; e (c) porque o art. 201, § 1.º, da Carta Magna de 1988, não estabelece qualquer condição ou restrição ao gozo da aposentadoria especial, assegurada, portanto, à parte autora a possibilidade de continuar exercendo atividades laborais sujeitas a condições nocivas após a implantação do benefício.
Ressalta-se que não se desconhece que a questão relativa à possibilidade de percepção do benefício da aposentadoria especial na hipótese em que o segurado permanece no exercício de atividades laborais nocivas à saúde teve a repercussão geral reconhecida pelo STF no julgamento do RE 788.092/SC, posteriormente substituído pelo RE 791.961/PR (Tema 709). Não se desconhece, também, das razões proferidas pelo ilustre relator, Min. Dias Toffoli, no despacho que reconheceu a existência da repercussão geral da matéria, no sentido da constitucionalidade da regra insculpida no § 8.º do art. 57 da Lei 8.213/1991. Entretanto, pelos fundamentos acima declinados, mantenho a decisão da Corte Especial deste Regional até que haja o pronunciamento definitivo pela Suprema Corte.
Considerando a decisão do STF proferida em Questão de Ordem no RE 966.177/RS, em que essa Corte entendeu que a suspensão do processamento prevista no artigo 1.035, § 5.º, do CPC/2015 não é consequência automática e necessária do reconhecimento da repercussão geral, mas sim ato discricionário do relator do recurso extraordinário paradigma, e considerando que não houve, até o presente momento, decisão nesse sentido por parte do relator do recurso paradigma da matéria discutida nos presentes autos, não é o caso de suspensão da tramitação deste feito.
Assim, cumpridas as exigências do artigo 57 da Lei n.º 8.213/91, deve o INSS conceder o benefício ora pretendido à parte autora, independente do afastamento do trabalho.
Nega-se provimento à apelação, no ponto.
Dos consectários
Correção Monetária
A correção monetária, segundo o entendimento consolidado na 3ª Seção deste TRF4, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos seguintes índices oficiais:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94;
- INPC a partir de 04/2006, de acordo com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91, sendo que o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, determina a aplicabilidade do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso.
A incidência da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública foi afastada pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 870947, com repercussão geral, tendo-se determinado, no recurso paradigma a utilização do IPCA-E, como já havia sido determinado para o período subsequente à inscrição em precatório, por meio das ADIs 4.357 e 4.425.
Interpretando a decisão do STF, e tendo presente que o recurso paradigma que originou o precedente tratava de condenação da Fazenda Pública ao pagamento de débito de natureza não previdenciária (benefício assistencial), o Superior Tribunal de Justiça, em precedente também vinculante (REsp 1495146), distinguiu, para fins de determinação do índice de atualização aplicável, os créditos de natureza previdenciária, para estabelecer que, tendo sido reconhecida a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização, deveria voltar a incidir, em relação a tal natureza de obrigação, o índice que reajustava os créditos previdenciários anteriormente à Lei 11.960/09, ou seja, o INPC.
Importante ter presente, para a adequada compreensão do eventual impacto sobre os créditos dos segurados, que os índices em referência - INPC e IPCA-E tiveram variação praticamente idêntica no período transcorrido desde julho de 2009 até setembro de 2017, quando julgado o RE 870947, pelo STF (IPCA-E: 64,23%; INPC 63,63%), de forma que a adoção de um ou outro índice nas decisões judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação.
A conjugação dos precedentes acima resulta na aplicação do INPC aos benefícios previdenciários, a partir de abril 2006, reservando-se a aplicação do IPCA-E aos benefícios de natureza assistencial.
Em data de 24 de setembro de 2018, o Ministro Luiz Fux, relator do RE 870947 (tema 810), deferiu efeito suspensivo aos embargos de declaração opostos pela Fazenda Pública, por considerar que a imediata aplicação da decisão daquela Corte, frente à pendência de pedido de modulação de efeitos, poderia causar prejuízo "às já combalidas finanças públicas".
Em face do efeito suspensivo deferido pelo STF sobre o próprio acórdão, e considerando que a correção monetária é questão acessória no presente feito, bem como que o debate remanescente naquela Corte Suprema restringe-se à modulação dos efeitos da decisão de inconstitucionalidade, impõe-se desde logo, inclusive em respeito à decisão também vinculante do STJ, no tema 905, o estabelecimento do índice aplicável – INPC para os benefícios previdenciários e IPCA-E para os assistenciais -, cabendo, porém, ao juízo de origem observar, na fase de cumprimento do presente julgado, o que vier a ser deliberado nos referidos embargos declaratórios.
Por fim, cumpre referir que é desnecessário o trânsito em julgado dos RE 579.431 e RE 870.947 para que o juízo da execução determine a adoção do INPC como índice de correção monetária.
Nesse sentido, inclusive, vêm decidindo as duas Turmas do STF (RE 1035126 AgR-ED e RE 935448 AgR).
Nega-se provimento à apelação, no ponto.
Juros de mora
Os juros de mora devem incidir a partir da citação.
Até 29/06/2009, os juros de mora devem incidir à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo percentual aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado hígido pelo STF no RE 870947, com repercussão geral reconhecida. Os juros devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, 5ª Turma, AgRgno AgRg no Ag 1211604/SP, Rel. Min. Laurita Vaz).
Dou provimento à apelação, no tópico.
Das Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento das custas em processos afetos à competência delegada, tramitados na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, de acordo com o disposto no art. 5.º, I, da Lei Estadual n.º 14.634/14, que institui a Taxa Única de Serviços Judiciais desse Estado, ressalvando-se que tal isenção não a exime da obrigação de reembolsar eventuais despesas judiciais feitas pela parte vencedora (parágrafo único, do art. 5.º). Salienta-se, ainda, que nessa taxa única não estão incluídas as despesas processuais mencionadas no parágrafo único, do art. 2.º, da referida Lei, tais como remuneração de peritos e assistentes técnicos, despesas de condução de oficiais de justiça, entre outras.
Da Verba Honorária
Nas ações previdenciárias os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência".
No tocante ao cabimento da majoração da verba honorária, conforme previsão do parágrafo 11 do art. 85 do CPC/2015, devem ser adotados, simultaneamente, os critérios estabelecidos pela Segunda Seção do STJ no julgamento do AgInt nos EREsp nº 1.539.725 – DF (DJe: 19/10/2017), a seguir relacionados:
a) vigência do CPC/2015 quando da publicação da decisão recorrida, ou seja, ela deve ter sido publicada a partir de 18/03/2016;
b) não conhecimento integralmente ou desprovimento do recurso, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente;
c) existência de condenação da parte recorrente ao pagamento de honorários desde a origem no feito em que interposto o recurso.
No referido julgado ainda ficaram assentadas as seguintes orientações:
- somente haverá majoração da verba honorária quando o recurso não conhecido ou desprovido inaugurar uma nova instância recursal, de modo que aqueles recursos que gravitam no mesmo grau de jurisdição, como os embargos de declaração e o agravo interno, não ensejam a aplicação da regra do parágrafo 11 do art. 85 do CPC/2015;
- da majoração dos honorários sucumbenciais não poderá resultar extrapolação dos limites previstos nos §§ 2º e 3º do art. 85 do CPC/2015;
- é dispensada a configuração do trabalho adicional do advogado da parte recorrida na instância recursal para que tenha ensejo a majoração dos honorários, o que será considerado, no entanto, para a quantificação de tal verba;
- quando for devida a majoração da verba honorária, mas, por omissão, não tiver sido aplicada no julgamento do recurso, poderá o colegiado arbitrá-la ex officio, por se tratar de matéria de ordem pública, que independe de provocação da parte, não se verificando reformatio in pejus.
No caso concreto não estão preenchidos todos os requisitos acima elencados, não sendo devida, portanto, a majoração da verba honorária.
Da tutela específica
Considerando os termos do art. 497 do CPC/2015, que repete dispositivo constante do art. 461 do Código de Processo Civil/1973, e o fato de que, em princípio, a presente decisão não está sujeita a recurso com efeito suspensivo (Questão de Ordem na AC 2002.71.00.050349-7/RS - Rel. p/ acórdão Desembargador Federal Celso Kipper, julgado em 09.08.2007 - 3.ª Seção), o presente julgado deverá ser cumprido de imediato quanto à implantação do benefício concedido em favor da parte autora, no prazo de 45 dias.
A implantação do benefício já havia sido determinada em função da antecipação dos efeitos da tutela, e fica mantida, agora por força da tutela específica.
Dispositivo
Frente ao exposto, voto por não conhecer da remessa oficial, dar parcial provimento ao recurso (exclusivamente com relação à forma de cálculo dos juros de mora) e determinar o cumprimento imediato do acórdão quanto à implantação do benefício.
Documento eletrônico assinado por JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001004614v22 e do código CRC 1b1a804f.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação/Remessa Necessária Nº 5003791-83.2018.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARCOS GILMAR MEINEN ZUGE
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS. PERMANÊNCIA NA ATIVIDADE ESPECIAL APÓS A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO. consectários. TUTELA ESPECÍFICA.
1. Apresentada a prova necessária a demonstrar o exercício de atividade sujeita a condições especiais, conforme a legislação vigente na data da prestação do trabalho, o respectivo tempo de serviço especial deve ser reconhecido.
2. O trabalhador que rotineiramente, em razão de suas atividades profissionais, expõe-se ao contato com cimento, cujo composto é usualmente misturado a diversos materiais classificados como insalubres ao manuseio, faz jus ao reconhecimento da natureza especial do labor.
3. Quanto aos agentes químicos, considero ser insuficiente para garantir a efetiva neutralização dos agentes insalubres a mera aposição de um "S", indicativo de sim, no campo pertinente da seção de registros ambientais do PPP, quando desacompanhada da efetiva comprovação de que tais equipamentos foram realmente utilizados pelo trabalhador, de forma habitual e permanente, durante toda a contratualidade, bem como quando desacompanhada da comprovação de que a empresa forneceu programa de treinamento dos trabalhadores quanto à correta utilização desses dispositivos, e orientação sobre suas limitações, nos termos estabelecidos pela NR 9 do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).
4. Cumprida a carência e demonstrado o tempo de serviço especial por 15, 20 ou 25 anos, conforme a atividade exercida pelo segurado, é devida à parte autora a concessão de aposentadoria especial.
5. A Corte Especial deste Tribunal reconheceu a inconstitucionalidade do § 8.º do art. 57 da LBPS (IAC 5001401-77.2012.404.0000), sendo assegurada à parte autora a possibilidade de continuar exercendo atividades laborais sujeitas a condições nocivas após a implantação do benefício.
6. O Supremo Tribunal Federal reconheceu no RE 870947, com repercussão geral, a inconstitucionalidade do uso da TR. O Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1495146, em precedente também vinculante, e tendo presente a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização monetária, distinguiu os créditos de natureza previdenciária, em relação aos quais, com base na legislação anterior, determinou a aplicação do INPC, daqueles de caráter administrativo, para os quais deverá ser utilizado o IPCA-E. Estando pendentes embargos de declaração no STF para decisão sobre eventual modulação dos efeitos da inconstitucionalidade do uso da TR, impõe-se fixar desde logo os índices substitutivos, resguardando-se, porém, a possibilidade de terem seu termo inicial definido na origem, em fase de cumprimento de sentença.
7. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29-06-2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o percentual aplicado à caderneta de poupança.
8. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 497 do CPC/15, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, não conhecer da remessa oficial, dar parcial provimento ao recurso (exclusivamente com relação à forma de cálculo dos juros de mora) e determinar o cumprimento imediato do acórdão quanto à implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 22 de maio de 2019.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 29/04/2019
Apelação/Remessa Necessária Nº 5003791-83.2018.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PROCURADOR(A): ALEXANDRE AMARAL GAVRONSKI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARCOS GILMAR MEINEN ZUGE
ADVOGADO: MAURO AMARAL BRUM (OAB RS018436)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 29/04/2019, na sequência 258, disponibilizada no DE de 15/04/2019.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
ADIADO O JULGAMENTO, PARA A SESSÃO DO DIA 15.05.2019.
PAULO ROBERTO DO AMARAL NUNES
Secretário
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 22/05/2019
Apelação/Remessa Necessária Nº 5003791-83.2018.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARCOS GILMAR MEINEN ZUGE
ADVOGADO: MAURO AMARAL BRUM (OAB RS018436)
Certifico que este processo foi incluído no 1º Aditamento do dia 22/05/2019, na sequência 499, disponibilizada no DE de 09/05/2019.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA, DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NÃO CONHECER DA REMESSA OFICIAL, DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO (EXCLUSIVAMENTE COM RELAÇÃO À FORMA DE CÁLCULO DOS JUROS DE MORA) E DETERMINAR O CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO QUANTO À IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Votante: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
Votante: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
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