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PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS RUÍDO E POEIRAS MINERAIS. AGENTE NOCIVO RUÍDO. MÉTODO DE AFERIÇÃO. MOTORISTA DE CAMINHÃO. PENOSIDADE. A...

Data da publicação: 28/05/2022, 15:00:59

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS RUÍDO E POEIRAS MINERAIS. AGENTE NOCIVO RUÍDO. MÉTODO DE AFERIÇÃO. MOTORISTA DE CAMINHÃO. PENOSIDADE. APOSENTADORIA ESPECIAL. CONCESSÃO. 1. O reconhecimento da especialidade e o enquadramento da atividade exercida sob condições nocivas são disciplinados pela lei em vigor à época em que efetivamente exercidos, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. 2. Até 28-04-1995 é admissível o reconhecimento da especialidade por categoria profissional ou por sujeição a agentes nocivos, admitindo-se qualquer meio de prova (exceto para ruído e calor); a partir de 29-04-1995 não mais é possível o enquadramento por categoria profissional, sendo necessária a comprovação da exposição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova até 05-03-1997 e, a partir de então, através de formulário embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica. 3. Tratando-se de agente nocivo ruído, quando não houver indicação da metodologia, ou for utilizada metodologia diversa daquela da FUNDACENTRO, o enquadramento deve ser analisado de acordo com a aferição do ruído que for apresentada no processo. Precedentes desta Corte Regional. 4. A exposição a poeiras minerais e a ruído em níveis superiores aos limites de tolerância vigentes à época da prestação do labor enseja o reconhecimento do tempo de serviço como especial. 5. Constatada a exposição do segurado motorista e ajudante de caminhão a condições laborais penosas, mediante perícia realizada em observância aos parâmetros fixados no julgamento do IAC n.º 5033888-90.2018.4.04.0000, possível o reconhecimento da especialidade do labor. 6. Comprovada a exposição do segurado a agente nocivo, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a especialidade do tempo de labor correspondente. 7. Implementados mais de 25 anos de tempo de atividade sob condições nocivas e cumprida a carência mínima, é devida a concessão do benefício de aposentadoria especial, a contar da data do requerimento administrativo, nos termos do § 2º do art. 57 c/c art. 49, II, da Lei n. 8.213/91. (TRF4, AC 5000225-87.2019.4.04.7123, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 20/05/2022)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000225-87.2019.4.04.7123/RS

RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

APELANTE: GETÚLIO DIAS DE SOUZA (AUTOR)

ADVOGADO: JOSELAINE BRESSA DALCIN (OAB RS036282)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação contra sentença publicada na vigência do Código de Processo Civil de 2015, com dispositivo de seguinte teor:

Em face do exposto JULGO PROCEDENTE o pedido, com base no artigo 487, I, do Código de Processo Civil, para:

a) DECLARAR a especialidade do tempo de serviço laborado entre 01/09/83 a 30/09/83, de 01/10/83 a 29/02/84, de 15/04/85 a 25/07/85, de 01/08/86 a 31/07/88, de 01/05/89 a 03/08/89, de 13/03/92 a 02/06/92, de 03/06/92 a 22/09/1999, de 09/05/2000 a 30/07/2010, de 01/05/11 a 11/11/11, de 12/11/11 a 02/02/17 e DETERMINAR a sua averbação como tal pelo INSS;

b) DETERMINAR a implantação de APOSENTADORIA ESPECIAL desde a DER, em 02/02/2017, com RMI nos moldes do art. 3º da Lei nº 9.876/99, a ser calculada pelo INSS;

c) CONDENAR o INSS ao pagamento das parcelas vencidas desde a DIB, corrigidas na forma da fundamentação.

As partes são isentas de custas (art. 4, I, da Lei 9.289/96). Despesas com perícia técnica a serem ressarcidas pelo INSS.

Em atenção aos vetores do artigo 85, §2º, I a IV, do Código de Processo Civil, fixo os honorários advocatícios, para pagamento pelo INSS, em 10% sobre o valor da condenação, na primeira faixa referida no §3º do mesmo dispositivo. Caso a condenação, por ocasião da liquidação, supere 200 salários-mínimos, o acréscimo deverá incidir no percentual mínimo quanto às faixas subsequentes, na forma do art. 85, §5º, do CPC.

Apelou o INSS sustentando não ter sido comprovado o exercício de labor especial nos períodos de 29/04/1995 a 22/09/1999 e de 09/05/2000 a 30/07/2010 e 01/05/2011 a 02/02/2017, em decorrência da ausência de previsão normativa e pelo fato de não ter sido observado a metodologia da NHO-01 da Fundacentro para aferição do ruído.

Com contrarrazões, subiram os autos ao Tribunal para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Juízo de admissibilidade

O apelo preenche os requisitos legais de admissibilidade.

MÉRITO

Não estando o feito submetido ao reexame necessário, a controvérsia no plano recursal restringe-se:

- ao reconhecimento do exercício de atividade especial nos períodos de 29/04/1995 a 22/09/1999 e de 09/05/2000 a 30/07/2010 e 01/05/2011 a 02/02/2017;

- à consequente concessão de aposentadoria especial, a contar da DER (31/10/2017).

Tempo de serviço especial

O tempo de serviço especial é disciplinado pela lei vigente à época em que exercido, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço, o segurado adquire o direito à sua contagem pela legislação então vigente, não podendo ser prejudicado pela lei nova, cuja previsão legislativa expressa se deu com a edição do Decreto n.º 4.827/03, que inseriu o § 1º no art. 70 do Decreto n.º 3.048/99. Nesse sentido é a orientação adotada pela Terceira Seção do Egrégio Superior Tribunal de Justiça (AR 3320/PR, Relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe 24/9/2008; EREsp 345554/PB, Relator Ministro José Arnaldo da Fonseca, DJ 8/3/2004; AGREsp 493.458/RS, Quinta Turma, Relator Ministro Gilson Dipp, DJU 23/6/2003; e REsp 491.338/RS, Sexta Turma, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, DJU 23/6/2003).

Isso assentado, e tendo em vista a diversidade de diplomas legais que se sucederam na disciplina da matéria, necessário definir qual a legislação aplicável ao caso concreto, ou seja, qual a legislação vigente quando da prestação da atividade pela parte autora.

Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema:

a) no período de trabalho até 28-04-1995, quando vigente a Lei n.º 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei n.º 8.213/91 (Lei de Benefícios), em sua redação original (arts. 57 e 58), possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade profissional enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial ou quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto quanto à exposição a ruído e calor, em que necessária sempre a aferição de seus níveis (decibéis/ºC IBUTG), por meio de parecer técnico trazido aos autos ou, simplesmente, referido no formulário padrão emitido pela empresa;

b) a partir de 29-04-1995, inclusive, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional - à exceção das atividades a que se refere a Lei 5.527/1968, cujo enquadramento por categoria deve ser feito até 13-10-1996, data imediatamente anterior à publicação da Medida Provisória 1.523, de 14-10-1996, que a revogou expressamente, de modo que, no interregno compreendido entre essas datas e 05-03-1997, em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei n.º 9.032/95 no art. 57 da Lei de Benefícios, necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico, ressalvados os agentes nocivos ruído e calor, em relação aos quais é imprescindível a realização de perícia técnica, conforme visto acima;

c) após 06-03-1997, quando vigente o Decreto n.º 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no art. 58 da Lei de Benefícios pela Lei n.º 9.528/97, passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.

Essa interpretação das sucessivas normas que regulam o tempo de serviço especial está conforme à jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (EDcl no REsp 415.298/SC, 5ª Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe 06/04/2009; AgRg no Ag 1053682/SP, 6ª Turma, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 08/09/2009; REsp 956.110/SP, 5ª Turma, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJ 22/10/2007; AgRg no REsp 746.102/SP, 6ª Turma, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 07/12/2009).

Observo, ainda, quanto ao enquadramento das categorias profissionais, que devem ser considerados os Decretos 53.831/1964 (Quadro Anexo - 2ª parte), 72.771/1973 (Quadro II do Anexo) e 83.080/1979 (Anexo II) até 28/4/1995, data da extinção do reconhecimento da atividade especial por presunção legal, ressalvadas as exceções acima mencionadas. Já para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos 53.831/1964 (Quadro Anexo - 1ª parte), 72.771/1973 (Quadro I do Anexo) e 83.080/1979 (Anexo I) até 5/3/1997, e os Decretos 2.172/1997 (Anexo IV) e 3.048/1999 a partir de 6/3/1997, ressalvado o agente nocivo ruído, ao qual se aplica também o Decreto 4.882/2003. Além dessas hipóteses de enquadramento, sempre possível também a verificação da especialidade da atividade no caso concreto, por meio de perícia técnica, nos termos da Súmula 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos (STJ, AGRESP 228832/SC, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, DJU de 30/6/2003).

Exame do tempo especial no caso concreto

Passo, então, ao exame do(s) período(s) controvertido(s) nesta ação, com base nos elementos contidos nos autos e na legislação de regência, para concluir pelo cabimento ou não do reconhecimento da natureza especial da atividade desenvolvida.

Período: a) 29/04/1995 a 22/09/1999, b) 09/05/2000 a 30/07/2010, c) 01/05/2011 a 02/02/2017

Empresa: a) Coop. Agroind. Alegrete Ltda., b) Aníbal Nascimento Brandão, c) L. Hartmann

Atividade/função: motorista de caminhão

Agente nocivo: poeiras minerais, penosidade e ruído de até 94,3 dB de 01/05/2011 a 02/02/2017

Prova: CTPS (evento 1, DOC9 - p. 16 e 17); LTCAT - Laudo técnico das condições ambientais do trabalho (evento 1, DOC9 - p. 42); laudo pericial judicial (evento 26, DOC1 e evento 61, DOC1).

Enquadramento legal: item 1.2.10 (poeiras minerais nocivas) do Anexo ao Decreto n.º 53.831/64 e item 1.2.12 (sílica, silicatos, carvão, cimento e amianto) do Anexo I do Decreto n.º 83.080/79; Súmula 198 do extinto TFR; ruído superior a 85 decibéis a partir de 19/11/2003: item 2.0.1 do Anexo IV do Decreto n. 3.048/1999 com a alteração introduzida pelo Decreto n. 4.882/2003

Conclusão: em relação ao agente nocivo poeiras minerais, possível o enquadramento no intervalo de 09/05/2000 a 30/07/2010. No período de 01/05/2011 a 02/02/2017, viável o enquadramento por ruído. No entanto, possível o reconhecimento da especialidade na integralidade do intervalo pela exposição à penosidade.

Sobre a possibilidade de reconhecimento de atividade especial em virtude do manuseio do agente nocivo cimento, já se manifestou esta Corte: REOAC n.º 0006085-38.2014.4.04.9999/RS, Des. Federal Salise Monteiro Sanchotene, 6ª Turma, D.E. 22/06/2017; AC n.º 0004027-91.2016.4.04.9999/SC, Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, Turma Regional Suplementar de Santa Catarina, D.E. 02/10/2017; REOAC n.º 5007277-47.2012.4.04.7102/RS, Rel. Juiz Federal Altair Antonio Gregório, 5ª Turma, julgado em 06/03/2018; dentre outros precedentes. Igualmente, a Terceira Seção deste Tribunal teve a oportunidade de se manifestar sobre o tema por ocasião do julgamento dos EIAC n.º 2000.04.01.034145-6/RS, Rel. o Des. Federal Celso Kipper, D.J.U. de 09/11/2005.

No julgamento proferido nos EI n. 2001.71.14.000772-3/RS, Relator Juiz Federal João Batista Lazzari, julgado em 02/07/2009, foi transcrito no voto vencedor trecho do laudo do perito judicial que atuou no feito. Foram arrolados pelo expert os efeitos à saúde que podem decorrer do manuseio do cimento:

"O cimento é um ligante hidráulico usado nas edificações e na Engenharia Civil. É um pó fino da moagem do clínquer (calcário + argila + gesso), cozido a altas temperaturas (1400ºC). Pode-se misturá-lo ao cal, areia e pedras de várias granulometrias para obter-se argamassa e concreto. O cimento tipo Portland é composto por silicatos e aluminatos de cálcio, óxidos de ferro e magnésio, álcalis e sulfatos. Aditivos ao cimento poderão ser: aceleradores e anticongelantes, antioxidantes, corantes, fungicidas, impermeabilizantes e plastificantes.

Dermatites de contato irritativas pelo cimento e poeiras do cimento sobre tegumento e conjuntivas:

- Dermatite de contato por irritação

- Dermatite de contato por irritação forte (queimadura pelo cimento)

- Dermatite de contato alérgica

- Hiperceratose-Hardening

- Hiperceratose Subungueal

- Paroníqueas

- Onicolises

- Sarnas dos Pedreiros

- Conjuntivites"

Evidenciados os possíveis efeitos deletérios à saúde do trabalhador que rotineiramente se expõe ao contato com o agente nocivo cimento, cujo composto é usualmente misturado com diversos materiais classificados como insalubres ao manuseio, é cabível o reconhecimento da natureza especial do labor.

Quanto ao método de aferição do agente nocivo ruído, esta Corte Regional tem posicionamento segundo o qual a utilização de metodologia diversa da prevista na NHO-01 da FUNDACENTRO não inviabiliza o reconhecimento da especialidade, bastando que a exposição esteja embasada em estudo técnico realizado por profissional habilitado para tanto (AC 5015224-47.2015.4.04.7200, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, em 19/09/2019; AC 5001695-25.2019.4.04.7101, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, em 06/08/2020; AC 5003527-77.2017.4.04.7129, QUINTA TURMA, Relatora GISELE LEMKE, em 08/07/2020).

No tocante à penosidade, vinha considerando inviável a comprovação da especialidade, em casos tais, por penosidade do labor, uma vez que inexistem critérios técnicos objetivos, estabelecidos em lei ou regulamento, aptos a indicar que elementos devem ser considerados como caracterizadores de atividade penosa na referida atividade. Sempre concluí que, não mais havendo hipótese de reconhecimento de tempo especial por categoria profissional, resultaria arbitrário ao Poder Judiciário definir que elementos caracterizariam a penosidade ou deixar essa avaliação para análise subjetiva de um técnico.

Contudo, analisando essa questão, a 3ª Seção desta Corte Regional, por maioria, no julgamento do Incidente de Assunção de Competência nº 5033888-90.2018.4.04.0000, concluído na sessão de 25/11/2020, fixou tese que passo a adotar, em homenagem à segurança jurídica, no seguinte sentido:

IAC TRF4 - TEMA 5: Deve ser admitida a possibilidade de reconhecimento do caráter especial das atividades de motorista ou de cobrador de ônibus em virtude da penosidade, ainda que a atividade tenha sido prestada após a extinção da previsão legal de enquadramento por categoria profissional pela Lei 9.032/1995, desde que tal circunstância seja comprovada por meio de perícia judicial individualizada, possuindo o interessado direito de produzir tal prova.

Eis o teor da ementa do referido julgamento:

PREVIDENCIÁRIO. INCIDENTE DE ASSUNÇÃO DE COMPETÊNCIA - IAC. TEMA TRF4 N.° 5. ATIVIDADE ESPECIAL. MOTORISTA OU COBRADOR DE ÔNIBUS. RECONHECIMENTO DA PENOSIDADE APÓS A EXTINÇÃO DA PREVISÃO LEGAL DE ENQUADRAMENTO POR CATEGORIA PROFISSIONAL PELA LEI 9.032/1995. POSSIBILIDADE.

1. O benefício de aposentadoria especial foi previsto pela primeira vez no ordenamento jurídico nacional em 1960, pela Lei Orgânica da Previdência Social, a Lei 3.087/1960, que instituiu o requisito de prestação de uma quantidade variável (15, 20 ou 25 anos) de tempo de contribuição em exercício de atividades insalubres, perigosas ou penosas.

2. Apesar de contar com previsão no próprio texto constitucional, que garante aos trabalhadores o pagamento do adicional correspondente na seara trabalhista (art. 7º, XXIII, CF/1988), até o presente momento não houve a regulamentação da penosidade, motivo pelo qual torna-se uma tarefa bastante difícil a obtenção de seu conceito.

3. Pela conjugação dos estudos doutrinários, das disposições legais e dos projetos legislativos existentes, é possível delimitar-se o conceito de penosidade como o desgaste à saúde do trabalhador ocorrido na prestação da atividade profissional, em virtude da necessidade de dispêndio de esforço excessivo, da necessidade de concentração permanente e contínua, e/ou da necessidade de manutenção constante de postura.

4. Não há discussões acerca da possibilidade de reconhecimento da penosidade nas situações previstas no Anexo IV do Decreto 53.831/1964, que configuram hipóteses de enquadramento por categoria profissional, admitido até a vigência da Lei 9.032/1995, sendo que as controvérsias ocorrem quanto à possibilidade de reconhecimento da penosidade nos intervalos posteriores a essa data.

5. O requisito exigido para o reconhecimento da especialidade do tempo de contribuição prestado a partir da vigência da Lei 9.032/1995 e até a superveniência da Emenda Constitucional 103/2019 - condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física - não exclui a possibilidade de inclusão de atividades exercidas em situação de periculosidade e penosidade.

6. Essa posição acabou sendo sancionada pelo STJ no julgamento do REsp 1.306.113/SC, admitido como recurso representativo de controvérsia repetitiva sob o Tema n° 534, em que, embora a questão submetida a julgamento fosse a possibilidade de configuração da especialidade do trabalho exposto ao agente perigoso eletricidade, a tese fixada ultrapassa os limites do agente eletricidade, e da própria periculosidade, permitindo o reconhecimento da especialidade do labor prestado sob exposição a outros fatores de periculosidade, à penosidade, e até mesmo a agentes insalubres não previstos em regulamento, desde que com embasamento “na técnica médica e na legislação correlata”.

7. Admitida a possibilidade de reconhecimento da penosidade após a vigência da Lei 9.032/1995, esse reconhecimento deve se dar com base em critérios objetivos analisados no caso concreto por meio de perícia técnica, uma vez que extinta a possibilidade de mero enquadramento por categoria profissional.

8. Tratando-se de circunstância que, embora possua previsão constitucional, carece de regulamentação legislativa, sequer é cogitada pelos empregadores na confecção dos formulários habitualmente utilizados para a comprovação de atividade especial, motivo pelo qual é necessário que os órgãos judiciais garantam o direito dos segurados à produção da prova da alegada penosidade. Ademais, considerando que a tese encaminhada por esta Corte vincula o reconhecimento da penosidade à identificação dessa circunstância por perícia técnica, essa constitui, então, o único meio de prova à disposição do segurado.

9. Tese fixada nos seguintes termos: deve ser admitida a possibilidade de reconhecimento do caráter especial das atividades de motorista ou de cobrador de ônibus em virtude da penosidade, ainda que a atividade tenha sido prestada após a extinção da previsão legal de enquadramento por categoria profissional pela Lei 9.032/1995, desde que tal circunstância seja comprovada por meio de perícia judicial individualizada, possuindo o interessado direito de produzir tal prova.

10. Cabendo ao órgão colegiado julgar também o recurso que dá origem à assunção de competência admitida, conforme disposto no art. 947, §2º do CPC, no caso concreto deve ser dado provimento à preliminar da parte autora para anular a sentença e determinar o retorno do feito ao Juízo de origem, para que se proceda à reabertura da instrução processual.

No voto condutor, da lavra do Exmo. Desembargador Federal João Batista Pinto Silveira, estabeleceram-se os parâmetros para a aferição da penosidade por meio de prova pericial:

2 - Dos critérios de reconhecimento da penosidade

Restringindo-me às atividades de motorista ou de cobrador de ônibus, que foi a delimitação estabelecida pela Terceira Seção desta Corte na proposição do presente incidente, e tendo como parâmetro a conceituação anteriormente exposta, em que se associa a penosidade à necessidade de realização de esforço fatigante, à necessidade de concentração permanente, e/ou à necessidade de manutenção de postura prejudicial à saúde, submeto à apreciação da Seção os seguintes parâmetros a serem observados pelos peritos judiciais na aferição da existência de eventual penosidade na prestação dessa atividade.

1. Análise do(s) veículo(s) efetivamente conduzido(s) pelo trabalhador. O perito deverá diligenciar junto à(s) empresa(s) empregadora(s) para descobrir a marca, o modelo e o ano de fabricação do(s) veículo(s) conduzido(s) e, de posse dessas informações, poderá analisar se existia ou não penosidade na atividade em razão da necessidade de realização de esforço fatigante, como, por exemplo, na condução do volante, na realização da troca das marchas, ou em outro procedimento objetivamente verificável. No caso dos motoristas de ônibus deverá ser averiguado se a posição do motor ficava junto à direção, ocasionando desconfortos ao trabalhador, como, por exemplo, vibrações, ruído e calor constantes (ainda que inferiores aos patamares exigidos para reconhecimento da insalubridade da atividade, mas elevados o suficiente para qualificar a atividade como penosa em virtude da constância da exposição), ou outro fator objetivamente verificável.

2. Análise dos trajetos. O profissional deverá identificar qual(is) a(s) linha(s) percorrida(s) pelo trabalhador e analisar se existia, nesse transcurso, penosidade em razão de o trajeto incluir localidades consideradas de risco em razão da alta incidência de assaltos ou outras formas de violência, ou ainda em razão de o trajeto incluir áreas de difícil acesso e/ou trânsito em razão de más condições de trafegabilidade, como, por exemplo, a ausência de pavimentação.

3. Análise das jornadas. Deverá o profissional aferir junto à empresa se, dentro da jornada laboral habitualmente desempenhada pelo trabalhador, era-lhe permitido ausentar-se do veículo, quando necessário à satisfação de suas necessidades fisiológicas.

Realizando o perito judicial a análise das atividades efetivamente desempenhadas pelo trabalhador com base nos critérios objetivos acima descritos, e detectando a existência, de forma habitual e permanente, de qualquer das circunstâncias elencadas, ou outra que, embora não aventada no presente julgamento, seja passível de expor trabalhador a desgaste considerado penoso, e desde que seja demonstrável mediante critérios objetivos, considero ser possível o reconhecimento da especialidade das atividades de motorista ou de cobrador de ônibus, independentemente da época em que prestada.

A ratio decidendi do voto condutor aponta que a ausência de regulamento legislativo sobre o conceito de penosidade na seara previdenciária não pode vir em desfavor dos segurados, por se tratar de condição especial que prejudica a saúde ou a integridade física do trabalhador. Assim, sendo a perícia o único meio de prova de que dispõe o segurado para comprovar as condições penosas de labor, e presentes os critérios definidos judicialmente, a prova técnica deve ser oportunizada.

O perito de confiança do juízo concluiu pela caracterização do labor como penoso em decorrência de acordo com os critérios fixados no julgamento do IAC nº 5033888-90.2018.4.04.0000 (evento 61, DOC1).

Dessa maneira, havendo comprovação pericial, com observância dos balizadores fixados por esta Corte no julgamento do IAC nº 5033888-90.2018.4.04.0000, da sujeição do autor a condições penosas de trabalho, bem como a ruído excessivo, fica caracterizada a especialidade do labor, pelo que deve ser mantida a sentença, no ponto.

Do direito à aposentadoria

Mantido o tempo de serviço, fica inalterada a sentença quanto ao preenchimento dos requisitos à aposentadoria.

Consectários e provimentos finais

- Correção monetária e juros de mora

A correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices:

- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei 8.880/94);

- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da Lei 8.213/91, na redação da Lei 11.430/06, precedida da MP 316, de 11/08/2006, e art. 31 da Lei 10.741/03, que determina a aplicação do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso).

- INPC ou IPCA em substituição à TR, conforme se tratar, respectivamente, de débito previdenciário ou não, a partir de 30/06/2009, diante da inconstitucionalidade do uso da TR, consoante decidido pelo STF no Tema 810 e pelo STJ no tema 905.

Os juros de mora, por sua vez, devem incidir a partir da citação.

Até 29-06-2009, já tendo havido citação, deve-se adotar a taxa de 1% ao mês a título de juros de mora, conforme o art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.

A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo percentual aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado, no ponto, constitucional pelo STF no RE 870947, decisão com repercussão geral.

Os juros de mora devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo legal em referência determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, AgRgno AgRg no Ag 1211604/SP).

Por fim, a partir de 09/12/2021, para fins de atualização monetária e juros de mora, deve incidir o artigo 3º da Emenda n. 113, segundo o qual, nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC), acumulado mensalmente.

Honorários advocatícios

Negado provimento ao recurso do INSS, deve ser observada, em cumprimento de sentença, a majoração de 50% da verba honorária fixada na origem, pela incidência do §11 do artigo 85 do CPC.

Tutela específica - implantação do benefício

Possível desde logo a determinação de implantação do benefício, sem prejuízo da respectiva cessação, caso o INSS verifique que o segurado permaneceu ou retornou ao exercício de atividade especial, nos termos da decisão do STF no tema 709.

Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados nos artigos 497 e 536 do NCPC, quando dirigidos à Administração Pública, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo, determino o cumprimento do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora, especialmente diante do seu caráter alimentar e da necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.

Resulta, todavia, facultada à parte autora a possibilidade de renúncia à implantação do benefício ora determinada.

Dados para cumprimento: (X) Concessão ( ) Restabelecimento ( ) Revisão

NB

180.098.503-4

Espécie

46 - aposentadoria especial

DIB

31/10/2017

DIP

No primeiro dia do mês da implantação do benefício

DCB

RMI

a apurar

Observações

Por fim, na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício ora deferido apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.

Requisite a Secretaria da 6ª Turma, à CEAB-DJ-INSS-SR3, o cumprimento da decisão e a comprovação nos presentes autos, no prazo de 20 (vinte) dias.

Conclusão

Adequados os critérios de juros de mora e de correção monetária. Honorários advocatícios majorados nos termos do §11 do artigo 85 do CPC. Nos demais pontos, mantida a sentença.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação do INSS e determinar a implantação do benefício, via CEAB.



Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003193797v21 e do código CRC ea3d2728.Informações adicionais da assinatura:
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5000225-87.2019.4.04.7123
40003193797.V21


Conferência de autenticidade emitida em 28/05/2022 12:00:58.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000225-87.2019.4.04.7123/RS

RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

APELANTE: GETÚLIO DIAS DE SOUZA (AUTOR)

ADVOGADO: JOSELAINE BRESSA DALCIN (OAB RS036282)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTEs NOCIVOs ruído e POEIRAS MINERAIS. AGENTE NOCIVO RUÍDO. MÉTODO DE AFERIÇÃO. MOTORISTA DE CAMINHÃO. PENOSIDADE. APOSENTADORIA ESPECIAL. CONCESSÃO.

1. O reconhecimento da especialidade e o enquadramento da atividade exercida sob condições nocivas são disciplinados pela lei em vigor à época em que efetivamente exercidos, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador.

2. Até 28-04-1995 é admissível o reconhecimento da especialidade por categoria profissional ou por sujeição a agentes nocivos, admitindo-se qualquer meio de prova (exceto para ruído e calor); a partir de 29-04-1995 não mais é possível o enquadramento por categoria profissional, sendo necessária a comprovação da exposição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova até 05-03-1997 e, a partir de então, através de formulário embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.

3. Tratando-se de agente nocivo ruído, quando não houver indicação da metodologia, ou for utilizada metodologia diversa daquela da FUNDACENTRO, o enquadramento deve ser analisado de acordo com a aferição do ruído que for apresentada no processo. Precedentes desta Corte Regional.

4. A exposição a poeiras minerais e a ruído em níveis superiores aos limites de tolerância vigentes à época da prestação do labor enseja o reconhecimento do tempo de serviço como especial.

5. Constatada a exposição do segurado motorista e ajudante de caminhão a condições laborais penosas, mediante perícia realizada em observância aos parâmetros fixados no julgamento do IAC n.º 5033888-90.2018.4.04.0000, possível o reconhecimento da especialidade do labor.

6. Comprovada a exposição do segurado a agente nocivo, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a especialidade do tempo de labor correspondente.

7. Implementados mais de 25 anos de tempo de atividade sob condições nocivas e cumprida a carência mínima, é devida a concessão do benefício de aposentadoria especial, a contar da data do requerimento administrativo, nos termos do § 2º do art. 57 c/c art. 49, II, da Lei n. 8.213/91.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e determinar a implantação do benefício, via CEAB, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 18 de maio de 2022.



Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003193798v8 e do código CRC 7ce4f1b1.Informações adicionais da assinatura:
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Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 11/05/2022 A 18/05/2022

Apelação Cível Nº 5000225-87.2019.4.04.7123/RS

RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

PRESIDENTE: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

PROCURADOR(A): ADRIANA ZAWADA MELO

APELANTE: GETÚLIO DIAS DE SOUZA (AUTOR)

ADVOGADO: JOSELAINE BRESSA DALCIN (OAB RS036282)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 11/05/2022, às 00:00, a 18/05/2022, às 14:00, na sequência 284, disponibilizada no DE de 02/05/2022.

Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO, VIA CEAB.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER

Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

PAULO ROBERTO DO AMARAL NUNES

Secretário



Conferência de autenticidade emitida em 28/05/2022 12:00:58.

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