Apelação Cível Nº 5055775-15.2014.4.04.7100/RS
RELATORA: Juíza Federal ANA CRISTINA MONTEIRO DE ANDRADE SILVA
APELANTE: AMARILDO CENTENO GUIMARAES (AUTOR)
ADVOGADO(A): VILMAR LOURENÇO (OAB RS033559)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: OS MESMOS
RELATÓRIO
Trata-se de apelação contra sentença publicada na vigência do Código de Processo Civil de 2015, com dispositivo de seguinte teor:
Ante o exposto, no mérito, AFASTO a prescrição quinquenal e JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos com fundamento do art. 487, I, do CPC, para condenar o INSS a:
a) RECONHECER como submetidas a condições especiais as atividades desempenhadas nos períodos de 30/05/1985 a 07/04/1988 (SEG Serviços Especiais Segurança Transporte Valores S/A), de 17/06/1988 a 30/12/1988 (Agentes Agência de Segurança Ltda.), de 09/01/1989 a 09/03/1995 (Prosegur Brasil S.A Transportes de Valores e Segurança) e de 19/09/1995 a 19/02/2014 (Transportes Coletivos Trevo S.A), convertendo para atividade comum pelo multiplicador 1,4;
b) CONCEDER o benefício de aposentadoria, especial ou por tempo de contribuição a contar da DER, à opção da parte autora;
c) PAGAR as prestações vencidas até a implantação do benefício, deduzidos os valores pagos desde a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição deferida no curso do processo (NB 190.831.489-0, DIB 22/04/2022), a qual deverá ser cancelada por ocasião da implantação do novo benefício, atualizadas desde o vencimento até o efetivo pagamento e acrescidas de juros de mora nos termos da fundamentação;
d) PAGAR honorários advocatícios ao procurador da parte adversa, fixados nos percentuais mínimos dos incisos do §3º e observado o §5º, do art. 85 c/c art. 86, ambos do CPC sobre o montante em que foi sucumbente, considerando, inclusive, as verbas alcançadas administrativamente (Tema 1050 STJ) e excluídas as prestações vincendas a contar da prolação desta sentença (Súmula 111 do STJ, reafirmada no Tema 1105 do STJ), tendo em conta a impossibilidade de compensação das verbas (CPC, art. 85, §14).
e) RESSARCIR à Justiça Federal o valor pago a título de honorários periciais (evento 95);
f) ELABORAR o cálculo dos valores devidos, no prazo assinalado após o trânsito em julgado, em face da maior facilidade para tanto, já que detém toda a documentação e terá que calcular montante mensal do benefício.
Condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios ao procurador da parte adversa quanto ao ponto em que restou vencida (condenação em danos morais), fixados no percentual mínimo do §2º do art. 85 c/c art. 86 do CPC sobre tal montante, cuja execução fica suspensa, nos termos do disposto no art. 98, §3º, do CPC.
Custas divididas entre as partes na proporção da sucumbência, ficando suspenso o seu pagamento em relação à parte autora, por ser beneficiária da gratuidade da justiça, e sendo o INSS isento do seu pagamento (art. 4º, I, da Lei n. 9.289/96).
Providos os embargos de declaração da parte autora, nos seguintes termos:
1. AMARILDO CENTENO GUIMARÃES opôs embargos de declaração à sentença proferida no evento 99, afirmando, em síntese, a existência de omissão quanto ao estabelecido pelo tema 1018 do STJ.
Intimada, a autarquia apresentou manifestação em
.Conclusos vieram os autos.
2. Os embargos são tempestivos.
No termos do art. 1.022 do Código de Processo Civil, os embargos de declaração têm cabimento quando houver, na sentença ou no acórdão, obscuridade ou contradição, omissão ou erro material.
No caso em exame, assiste razão ao embargante, devendo ser sanada a omissão quanto ao tema 1018 do STJ.
A sentença do evento 99 reconheceu a possibilidade de concessão do benefício de aposentadoria, especial ou por tempo de contribuição a contar da DER, à opção da parte autora.
Assim, faculta-se ao demandante a opção pelo melhor benefício dentre os indicados neste julgamento, inclusive com a observância do Tema 1018 dos Recursos Repetitivos, no qual firmada a seguinte tese:
O segurado tem direito de opção pelo benefício mais vantajoso concedido administrativamente, no curso de ação judicial em que se reconheceu benefício menos vantajoso. Em cumprimento de sentença, o segurado possui o direito à manutenção do benefício previdenciário concedido administrativamente no curso da ação judicial e, concomitantemente, à execução das parcelas do benefício reconhecido na via judicial, limitadas à data de implantação daquele conferido na via administrativa.
3. Ante o exposto, ACOLHO os embargos de declaração, a fim de sanar a omissão apontada na sentença do evento 99, retificando o item "c" do dispositivo, que passa a ter a seguinte redação:
[...]
DISPOSITIVO
c) PAGAR as prestações vencidas até a implantação do benefício, deduzidos os valores pagos desde a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição deferida no curso do processo (NB 190.831.489-0, DIB 22/04/2022), observando-se o estabelecido no tema 1018 do STJ, por ocasião do julgado, atualizadas desde o vencimento até o efetivo pagamento e acrescidas de juros de mora nos termos da fundamentação;
[...]
Sem sucumbência.
Publique-se. Intimem-se.
Apelou o INSS sustentando não ter sido comprovado o exercício de labor especial nos períodos de 30/05/1985 a 07/04/1988, de 17/06/1988 a 30/12/1988, de 09/01/1989 a 09/03/1995 e de 19/09/1995 a 19/02/2014, em razão de não ser possível o reconhecimento da especialidade da profissão de vigia ou vigilante por analogia à função de guarda; em face de não ter havido exposição habitual e permanente a agentes nocivos e porquanto não haver a possibilidade de caracterização da natureza especial do labor por conta da penosidade.
Com contrarrazões, subiram os autos ao Tribunal para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
O apelo preenche os requisitos legais de admissibilidade.
Mérito
Não estando o feito submetido ao reexame necessário, a controvérsia no plano recursal restringe-se:
- ao reconhecimento da especialidade das atividades desenvolvidas nos períodos de 30/05/1985 a 07/04/1988, de 17/06/1988 a 30/12/1988, de 09/01/1989 a 09/03/1995 e de 19/09/1995 a 19/02/2014;
- à consequente concessão de aposentadoria por tempo de contribuição ou de aposentadoria especial, a contar da DER (31/03/2014).
Tempo de serviço especial
O tempo de serviço especial é disciplinado pela lei vigente à época em que exercido, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço, o segurado adquire o direito à sua contagem pela legislação então vigente, não podendo ser prejudicado pela lei nova, cuja previsão legislativa expressa se deu com a edição do Decreto n.º 4.827/03, que inseriu o § 1º no art. 70 do Decreto n.º 3.048/99. Nesse sentido é a orientação adotada pela Terceira Seção do Egrégio Superior Tribunal de Justiça (AR 3320/PR, Relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe 24/9/2008; EREsp 345554/PB, Relator Ministro José Arnaldo da Fonseca, DJ 8/3/2004; AGREsp 493.458/RS, Quinta Turma, Relator Ministro Gilson Dipp, DJU 23/6/2003; e REsp 491.338/RS, Sexta Turma, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, DJU 23/6/2003).
Isso assentado, e tendo em vista a diversidade de diplomas legais que se sucederam na disciplina da matéria, necessário definir qual a legislação aplicável ao caso concreto, ou seja, qual a legislação vigente quando da prestação da atividade pela parte autora.
Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema:
a) no período de trabalho até 28-04-1995, quando vigente a Lei n.º 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei n.º 8.213/91 (Lei de Benefícios), em sua redação original (arts. 57 e 58), possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade profissional enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial ou quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto quanto à exposição a ruído e calor, em que necessária sempre a aferição de seus níveis (decibéis/ºC IBUTG), por meio de parecer técnico trazido aos autos ou, simplesmente, referido no formulário padrão emitido pela empresa;
b) a partir de 29-04-1995, inclusive, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional - à exceção das atividades a que se refere a Lei 5.527/1968, cujo enquadramento por categoria deve ser feito até 13-10-1996, data imediatamente anterior à publicação da Medida Provisória 1.523, de 14-10-1996, que a revogou expressamente, de modo que, no interregno compreendido entre essas datas e 05-03-1997, em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei n.º 9.032/95 no art. 57 da Lei de Benefícios, necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico, ressalvados os agentes nocivos ruído e calor, em relação aos quais é imprescindível a realização de perícia técnica, conforme visto acima;
c) após 06-03-1997, quando vigente o Decreto n.º 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no art. 58 da Lei de Benefícios pela Lei n.º 9.528/97, passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.
Essa interpretação das sucessivas normas que regulam o tempo de serviço especial está conforme à jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (EDcl no REsp 415.298/SC, 5ª Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe 06/04/2009; AgRg no Ag 1053682/SP, 6ª Turma, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 08/09/2009; REsp 956.110/SP, 5ª Turma, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJ 22/10/2007; AgRg no REsp 746.102/SP, 6ª Turma, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 07/12/2009).
Observo, ainda, quanto ao enquadramento das categorias profissionais, que devem ser considerados os Decretos 53.831/1964 (Quadro Anexo - 2ª parte), 72.771/1973 (Quadro II do Anexo) e 83.080/1979 (Anexo II) até 28/4/1995, data da extinção do reconhecimento da atividade especial por presunção legal, ressalvadas as exceções acima mencionadas. Já para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos 53.831/1964 (Quadro Anexo - 1ª parte), 72.771/1973 (Quadro I do Anexo) e 83.080/1979 (Anexo I) até 5/3/1997, e os Decretos 2.172/1997 (Anexo IV) e 3.048/1999 a partir de 6/3/1997, ressalvado o agente nocivo ruído, ao qual se aplica também o Decreto 4.882/2003. Além dessas hipóteses de enquadramento, sempre possível também a verificação da especialidade da atividade no caso concreto, por meio de perícia técnica, nos termos da Súmula 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos (STJ, AGRESP 228832/SC, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, DJU de 30/6/2003).
Exame do tempo especial no caso concreto
Passo, então, ao exame do(s) período(s) controvertido(s) nesta ação, com base nos elementos contidos nos autos e na legislação de regência, para concluir pelo cabimento ou não do reconhecimento da natureza especial da atividade desenvolvida.
Períodos: a) 30/05/1985 a 07/04/1988; b) 17/06/1988 a 30/12/1988; c) 09/01/1989 a 09/03/1995
Empresas: a) Seg Serviços Especiais Segurança Transporte Valores S/A; b) Agentes Agência de Segurança Ltda.; c) Prosegur Brasil S.A Transportes de Valores e Segurança
Atividade/função: vigilante
Categoria profissional: guarda
Provas: CTPS (
- p. 02/03); PPP - Perfil profissiográfico previdenciário ( - p. 01)Enquadramento legal: Anexo ao Decreto n° 53.831/64, item 2.5.7
Conclusão: acrescente-se que a jurisprudência da 3ª Seção desta Corte já firmou entendimento no sentido de que até 28-04-1995 é possível o reconhecimento da especialidade da profissão de vigia ou vigilante por analogia à função de guarda, tida por perigosa (código 2.5.7 do Quadro Anexo ao Decreto n.º 53.831/64), independentemente de o segurado portar arma de fogo no exercício de sua jornada laboral (EIAC n.º 1999.04.01.082520-0, Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, DJU 10-04-2002, Seção 2, pp. 425-427).
A exigência de comprovação da exposição habitual e permanente do segurado a agentes nocivos para fins de caracterização da especialidade de suas atividades foi introduzida pela Lei n.º 9.032/95, razão pela qual, para períodos anteriores a 28-04-1995, a questão perde relevância.
Em relação aos intervalos posteriores a 28/04/1995, registro que a habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física referidas no artigo 57, § 3º, da Lei 8.213/91, com a redação dada pela Lei n.º 9.032/95, não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, devendo ser interpretada no sentido de que tal exposição é ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho, e não de ocorrência eventual, ocasional. Exegese diversa levaria à inutilidade da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho e, em muitas delas, a exposição em tal intensidade seria absolutamente impossível. A propósito do tema, os seguintes precedentes da Terceira Seção deste Tribunal: EINF n. 0003929-54.2008.404.7003, Terceira Seção, Rel. Des. Federal Rogério Favreto, D.E. 24/10/2011; EINF n. 2007.71.00.046688-7, Terceira Seção, Relator Des. Federal Celso Kipper, D.E. 07/11/2011.
Ademais, conforme o tipo de atividade, a exposição ao respectivo agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta à concessão de aposentadoria especial, tendo em vista que a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes à atividade, não sendo razoável que se retire do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (TRF4, EINF n. 2005.72.10.000389-1, Terceira Seção, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 18/05/2011; TRF4, EINF n. 2008.71.99.002246-0, Terceira Seção, Relator Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 08/01/2010).
Deve-se lembrar, ainda, que o Decreto nº 4.882/03 alterou o Decreto nº 3.048/99, o qual, para a aposentadoria especial, em seu art. 65, passou a considerar trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais, aquele cuja exposição ao agente nocivo seja indissociável da produção do bem ou da prestação do serviço, o que ocorre no caso vertente.
Período: 19/09/1995 a 19/02/2014
Empresa: Transportes Coletivos Trevo S.A
Atividade/função: motorista de ônibus
Agente nocivo: penosidade
Provas: PPP - Perfil profissiográfico previdenciário (
- p. 02); laudo pericial judicial ( )Enquadramento legal: Súmula 198 do TFR.
Conclusão: quanto à penosidade, a 3ª Seção desta Corte Regional, por maioria, no julgamento do Incidente de Assunção de Competência nº 5033888-90.2018.4.04.0000, concluído na sessão de 25/11/2020, fixou a seguinte tese:
IAC TRF4 - TEMA 5: Deve ser admitida a possibilidade de reconhecimento do caráter especial das atividades de motorista ou de cobrador de ônibus em virtude da penosidade, ainda que a atividade tenha sido prestada após a extinção da previsão legal de enquadramento por categoria profissional pela Lei 9.032/1995, desde que tal circunstância seja comprovada por meio de perícia judicial individualizada, possuindo o interessado direito de produzir tal prova.
No voto condutor, da lavra do Exmo. Desembargador Federal João Batista Pinto Silveira, estabeleceram-se os parâmetros para a aferição da penosidade por meio de prova pericial, derivados da análise do(s) veículo(s) efetivamente conduzido(s) pelo trabalhador, dos trajetos percorridos e da jornada laboral:
1. Análise do(s) veículo(s) efetivamente conduzido(s) pelo trabalhador. O perito deverá diligenciar junto à(s) empresa(s) empregadora(s) para descobrir a marca, o modelo e o ano de fabricação do(s) veículo(s) conduzido(s) e, de posse dessas informações, poderá analisar se existia ou não penosidade na atividade em razão da necessidade de realização de esforço fatigante, como, por exemplo, na condução do volante, na realização da troca das marchas, ou em outro procedimento objetivamente verificável. No caso dos motoristas de ônibus deverá ser averiguado se a posição do motor ficava junto à direção, ocasionando desconfortos ao trabalhador, como, por exemplo, vibrações, ruído e calor constantes (ainda que inferiores aos patamares exigidos para reconhecimento da insalubridade da atividade, mas elevados o suficiente para qualificar a atividade como penosa em virtude da constância da exposição), ou outro fator objetivamente verificável. (Grifei)
2. Análise dos trajetos. O profissional deverá identificar qual(is) a(s) linha(s) percorrida(s) pelo trabalhador e analisar se existia, nesse transcurso, penosidade em razão de o trajeto incluir localidades consideradas de risco em razão da alta incidência de assaltos ou outras formas de violência, ou ainda em razão de o trajeto incluir áreas de difícil acesso e/ou trânsito em razão de más condições de trafegabilidade, como, por exemplo, a ausência de pavimentação. (Grifei)
3. Análise das jornadas. Deverá o profissional aferir junto à empresa se, dentro da jornada laboral habitualmente desempenhada pelo trabalhador, era-lhe permitido ausentar-se do veículo, quando necessário à satisfação de suas necessidades fisiológicas.
Realizando o perito judicial a análise das atividades efetivamente desempenhadas pelo trabalhador com base nos critérios objetivos acima descritos, e detectando a existência, de forma habitual e permanente, de qualquer das circunstâncias elencadas, ou outra que, embora não aventada no presente julgamento, seja aferível de forma objetiva e passível de expor trabalhador a desgaste considerado penoso, considero ser possível o reconhecimento da especialidade das atividades de motorista ou de cobrador de ônibus, independentemente da época em que prestada.
No caso dos autos, o perito de confiança do juízo concluiu pela caracterização do labor como penoso, em face das condições que encontrou:
"Análise do Veículo
Motor dianteiro, vibração no motor (VCI – abaixo LT e VMB acima dos LT), calor (mesmo abaixo dos limites), ruído do motor e do ambiente externo (abaixo dos LT), bancos sem regulagem de altura e posição, sem regulagem no volante, câmbio manual, sem ar condicionado.
Análise do Trajeto
(...) declarou que houve 04 de assaltos durante o período laborado (...), e houve (sic) outras formas de violência como xingamentos e reclamações do passageiros.
As localidades dos trajetos são consideradas excesso de trânsito nos centros urbanos o qual o autor trabalhou.
Análise da Jornada
Não permitido ausentar-se do veículo, quando necessário à satisfação de suas necessidades fisiológicas, indo quando possível, nas paradas e finais de linha, (...).
Outros pontos identificados durante a Perícia
Concentração permanente no trânsito, manutenção da postura corporal (sentado), 05 acidente com colisão (...)
7 – CONCLUSÃO FINAL
Com fundamento nas informações colhidas com a entrevista com o autor, inspeção ao local de trabalho, onde o mesmo laborou, como faculta o §3º do Artigo 473 no Novo Código de Processo Civil, conclui-se que houve exposição de modo habitual e permanente, em condições nocivas à saúde, caracterizando como insalubre, penosa e atividade especial, conforme avaliações apresentadas nos item 6.1, 6.2 e 6.3 de acordo com a Legislação Previdenciária."
Dessa maneira, havendo comprovação pericial, com observância dos balizadores fixados por esta Corte no julgamento do IAC nº 5033888-90.2018.4.04.0000, da sujeição do autor a condições penosas de trabalho, impõe-se o reconhecimento da especialidade do labor desempenhado no período de 19/09/1995 a 19/02/2014, merecendo ser mantida a sentença no ponto.
Do direito à aposentadoria
Mantido o tempo de serviço, fica inalterada a sentença quanto ao direito ao benefício.
Transcorridos menos de cinco anos entre a DER (31/03/2014) e o ajuizamento da demanda (05/08/2014), não incide, no caso, a prescrição quinquenal.
Da necessidade de afastamento da atividade especial
No julgamento do Tema 709, em sede de embargos de declaração julgados em 23/02/2021, o STF fixou a seguinte tese:
"I) É constitucional a vedação de continuidade da percepção de aposentadoria especial se o beneficiário permanece laborando em atividade especial ou a ela retorna, seja essa atividade especial aquela que ensejou a aposentação precoce ou não.
II) Nas hipóteses em que o segurado solicitar a aposentadoria e continuar a exercer o labor especial, a data de início do benefício será a data de entrada do requerimento, remontando a esse marco, inclusive, os efeitos financeiros. Efetivada, contudo, seja na via administrativa, seja na judicial, a implantação do benefício, uma vez verificada a continuidade ou o retorno ao labor nocivo, cessará o pagamento do benefício previdenciário em questão"
Definida, em decisão com efeitos vinculantes, a questão da constitucionalidade da norma que veda a percepção de aposentadoria especial pelo segurado que permanece em atividade classificada como especial ou que a ela retorna, e estabelecida a eficácia da decisão, impõe-se assegurar à Autarquia previdenciária a possibilidade de proceder à verificação quanto à permanência do segurado no exercício de atividade classificada como especial ou quanto ao seu retorno. Uma vez verificada a continuidade ou o retorno do labor especial, poderá cessar (suspender) o pagamento do benefício previdenciário em questão, sem prejuízo do pagamento dos valores vencidos desde o termo inicial do benefício até a data da cessação.
Ressalte-se que, nos casos específicos de profissionais de saúde constantes do rol do art. 3º-J, da Lei nº 13.979/2020, e que estejam trabalhando diretamente no combate à epidemia do COVID-19, ou prestando serviços de atendimento a pessoas atingidas pela doença em hospitais ou instituições congêneres, públicos ou privados, encontram-se suspensos os efeitos do decidido pelo STF no caso, nos termos da decisão liminar proferida pelo Exmo. Min. Relator Dias Toffoli. Em tais casos, deverá ser observado pelo juízo de origem, oportunamente, o que vier a ser decidido pelo tribunal superior quanto ao ponto.
Honorários advocatícios
Negado provimento ao recurso do INSS, deve ser observada, em cumprimento de sentença, a majoração de 50% da verba honorária fixada na origem, pela incidência do §11 do artigo 85 do CPC.
Tutela específica - implantação do benefício
Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados nos artigos 497 e 536 do NCPC, quando dirigidos à Administração Pública, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo, determino o cumprimento do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora, especialmente diante do seu caráter alimentar e da necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.
Resulta, todavia, facultada à parte autora a possibilidade de renúncia à implantação do benefício ora determinada.
TABELA PARA CUMPRIMENTO PELA CEAB | |
---|---|
CUMPRIMENTO | Implantar Benefício |
NB | 1681358473 |
ESPÉCIE | Aposentadoria Especial |
DIB | 31/03/2014 |
DIP | Primeiro dia do mês da decisão que determinou a implantação/restabelecimento do benefício |
DCB | |
RMI | A apurar |
OBSERVAÇÕES | Autor tem direito à aposentadoria por tempo de contribuição ou à aposentadoria especial, devendo optar. |
Por fim, na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício ora deferido apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.
Requisite a Secretaria da 6ª Turma, à CEAB-DJ-INSS-SR3, o cumprimento da decisão e a comprovação nos presentes autos, no prazo de 20 (vinte) dias.
Conclusão
Honorários advocatícios majorados nos termos do §11 do artigo 85 do CPC. Nos demais pontos, mantida a sentença.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação do INSS e determinar a implantação do benefício, via CEAB.
Documento eletrônico assinado por ANA CRISTINA MONTEIRO DE ANDRADE SILVA, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004307709v22 e do código CRC ec9a75f0.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ANA CRISTINA MONTEIRO DE ANDRADE SILVA
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Apelação Cível Nº 5055775-15.2014.4.04.7100/RS
RELATORA: Juíza Federal ANA CRISTINA MONTEIRO DE ANDRADE SILVA
APELANTE: AMARILDO CENTENO GUIMARAES (AUTOR)
ADVOGADO(A): VILMAR LOURENÇO (OAB RS033559)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: OS MESMOS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. CATEGORIA PROFISSIONAL. VIGIA. motorista de ônibus. penosidade. habitualidade e permanência. DIREITO AO BENEFÍCIO MAIS VANTAJOSO.
1. O reconhecimento da especialidade e o enquadramento da atividade exercida sob condições nocivas são disciplinados pela lei em vigor à época em que efetivamente exercidos, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador.
2. Até 28-04-1995 é admissível o reconhecimento da especialidade por categoria profissional ou por sujeição a agentes nocivos, admitindo-se qualquer meio de prova (exceto para ruído e calor); a partir de 29-04-1995 não mais é possível o enquadramento por categoria profissional, sendo necessária a comprovação da exposição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova até 05-03-1997 e, a partir de então, através de formulário embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.
3. As atividades de vigia exercidas até 28/04/1995 devem ser reconhecidas como especiais em decorrência do enquadramento por categoria profissional previsto à época da realização do labor.
4. Constatada a exposição do segurado motorista de ônibus a condições laborais penosas, mediante perícia realizada em observância aos parâmetros fixados no julgamento do IAC n.º 5033888-90.2018.4.04.0000, possível o reconhecimento da especialidade do labor.
5. A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física referidas no artigo 57, § 3º, da Lei 8.213/91 não pressupõem a submissão contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho. Não se interpreta como ocasional, eventual ou intermitente a exposição ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho. Precedentes desta Corte.
6. Comprovada a exposição do segurado a agente nocivo penosidade, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a especialidade do tempo de labor correspondente.
7. Preenchidos os requisitos legais para mais de um benefício, o segurado tem direito à opção mais vantajosa.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e determinar a implantação do benefício, via CEAB, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 21 de fevereiro de 2024.
Documento eletrônico assinado por ANA CRISTINA MONTEIRO DE ANDRADE SILVA, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004307710v9 e do código CRC 658aa758.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ANA CRISTINA MONTEIRO DE ANDRADE SILVA
Data e Hora: 22/2/2024, às 17:21:55
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 14/02/2024 A 21/02/2024
Apelação Cível Nº 5055775-15.2014.4.04.7100/RS
RELATORA: Juíza Federal ANA CRISTINA MONTEIRO DE ANDRADE SILVA
PRESIDENTE: Desembargador Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
PROCURADOR(A): FLÁVIO AUGUSTO DE ANDRADE STRAPASON
APELANTE: AMARILDO CENTENO GUIMARAES (AUTOR)
ADVOGADO(A): VILMAR LOURENÇO (OAB RS033559)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: OS MESMOS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 14/02/2024, às 00:00, a 21/02/2024, às 16:00, na sequência 88, disponibilizada no DE de 31/01/2024.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO, VIA CEAB.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal ANA CRISTINA MONTEIRO DE ANDRADE SILVA
Votante: Juíza Federal ANA CRISTINA MONTEIRO DE ANDRADE SILVA
Votante: Desembargador Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
Votante: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA
LIDICE PENA THOMAZ
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 01/03/2024 08:02:17.