APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5038088-98.2014.4.04.7108/RS
RELATOR | : | PAULO AFONSO BRUM VAZ |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | LUIZ CARLOS DA SILVA |
ADVOGADO | : | AIRTOM PACHECO PAIM JUNIOR |
APELADO | : | OS MESMOS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL CONFIGURADA. APOSENTADORIA ESPECIAL.
1. Até 28/04/1995 é admissível o reconhecimento da especialidade por categoria profissional ou por sujeição a agentes nocivos, aceitando-se qualquer meio de prova (exceto para ruído); a partir de 29/04/1995 não mais é possível o enquadramento por categoria profissional, devendo existir comprovação da sujeição a agentes nocivos por qualquer meio de prova até 05/03/1997 e, a partir de então, por meio de formulário embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.
2. Trabalho em locais de armazenagem de químicos inflamáveis/explosivos é de se computar como especial, em face da sujeição aos riscos naturais da estocagem de combustível no local. Inteligência da Súmula 198 do TFR.
3. Comprovado o exercício de atividade especial por mais de 25 anos, a parte autora faz jus à concessão da aposentadoria especial.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao apelo da parte autora, negar provimento ao apelo do INSS e à remessa oficial, determinando a implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 18 de outubro de 2016.
Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8592726v3 e, se solicitado, do código CRC BD21502F. | |
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| Signatário (a): | Paulo Afonso Brum Vaz |
| Data e Hora: | 19/10/2016 13:54 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5038088-98.2014.4.04.7108/RS
RELATOR | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | LUIZ CARLOS DA SILVA |
ADVOGADO | : | AIRTOM PACHECO PAIM JUNIOR |
APELADO | : | OS MESMOS |
RELATÓRIO
Trata-se de recurso interposto pelo INSS (evento 34) e pela parte autora (evento 33) contra sentença, publicada em 24/03/2015, que julgou parcialmente procedente o pedido formulado na inicial, nos seguintes termos:
Ante o exposto, julgo parcialmente procedentes os pedidos formulados na presente ação, resolvendo o mérito da demanda, nos termos do art. 269, inciso I, do CPC, para o fim de:
(a) reconhecer a especialidade do labor prestado no(s) período(s) de 17/05/1982 a 11/01/1991 e, assim, determinar a sua averbação pela Autarquia;
(b) condenar o INSS a implantar o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, na forma do artigo 201, § 7º, inciso I, da CRFB, com DIB em 04/09/2013 (DER, bem como ao pagamento das parcelas vencidas a partir da DIB, devidamente corrigidas na forma da fundamentação.
Condeno o INSS ao pagamento dos honorários advocatícios, os quais fixo em 10% do valor das parcelas vencidas até a prolação desta sentença, conforme Súmula 111 do STJ.
Sem custas, a teor do art. 4º da Lei nº 9.289/96.
Sentença sujeita a reexame necessário (Súmula nº 490 do STJ).
Em homenagem aos princípios da instrumentalidade, celeridade e economia processual, eventuais apelações interpostas pelas partes restarão recebidas no duplo efeito (art. 520, caput, do CPC), salvo nas hipóteses de intempestividade e, se for o caso, ausência de preparo, que serão oportunamente certificadas pela Secretaria.
Interposto(s) o(s) recurso(s), caberá à Secretaria, mediante ato ordinatório, abrir vista à parte contrária para contrarrazões, e, na sequência, remeter os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região, sendo que esta última medida deverá ser tomada independentemente da interposição de recurso voluntário, por força da remessa de ofício.
Sentença publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se.
O INSS destaca que: a) Houve condenação ao reconhecimento de atividade especial, no período de 17/05/1982 a 11/01/1991. Contudo, o laudo utilizado se mostra imprestável como prova da nocividade da atividade, sobretudo no que diz respeito à pressão sonora e ao calor, pois carrega o vício da extemporaneidade e não retratam as reais condições de trabalho da parte autora nos períodos postulados; b) no Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), a empresa informa o código "0" no campo "GFIP", o que equivale dizer que não recolhe o adicional relativo aos riscos de acidente do trabalho, não podendo ser reconhecida a respectiva atividade especial sem a devida fonte de custeio; c) pela eventualidade, requer que os efeitos financeiros sejam reconhecidos a partir da citação; d) quanto aos juros e correção monetária requer a aplicação do disposto no artigo 1º-F da lei 9.494/97, com redação dada pela lei 11.960/2009.
A parte autora, por sua vez, busca o acolhimento do Agravo Retido relativo à realização de prova oral e pericial laborado na empresa Oscar Kunz S/A no período de 14/01/1991 a 17/08/1998 para provar que exercia sua atividade laboral junto ao depósito de inflamáveis e na empresa IFFormas Indústria de Componentes para Calçados Ltda. no período de 01/10/1998 a 04/09/2013 tirava diesel do caminhão para abastecimento do gerador. Ademais, requer a reforma da sentença nos seguintes pontos: a) Os períodos de 14/01/1991 a 17/08/1998 (Oscar Kunz S/A) e 01/10/1998 a 04/09/2013 (IFFormas Indústria de Componentes para Calçados Ltda.) devem ser considerados especiais em razão da periculosidade (anexo II da NR 16); b) os juros moratórios devem ser fixados 12% ao ano, em face do caráter alimentar das prestações, desde a citação, nos termos da súmula 75 do TRF4.
Foram apresentadas contrarrazões (eventos 38 e 40).
O feito foi convertido em diligência, sendo determinada a produção de prova pericial relativamente à alegada especialidade do labor nas empresas apontadas (evento 23).
O laudo foi acostado no evento 59.
Aberta vista às partes, apenas o autor acostou petição no evento 60.
É o relatório.
VOTO
Remessa Oficial
Conheço da remessa necessária, visto que sua dispensa apenas tem lugar quando a sentença líquida veicular condenação não excedente a 60 (sessenta) salários mínimos (STJ, Súmula nº 490, EREsp nº 600.596, Corte Especial, Relator Ministro Teori Albino Zavascki, DJ 23/11/2009).
Saliente-se, por oportuno, que não incide o limite de 1.000 (mil) salários mínimos previsto no art. 496, § 3º, inciso I, do NCPC, porquanto a r. sentença foi proferida antes de 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016), conforme prevê expressamente o artigo 14 do NCPC [A norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada].
Agravo retido
Tendo em vista que o feito foi convertido em diligência, tendo sido produzida prova pericial relativa ao labor especial nas empresas Oscar Kunz S/A e IFFormas Indústria de Componentes para Calçados Ltda., reputo prejudicado o agravo retido, por perda de objeto.
Atividade especial
A natureza da atividade é qualificada pela lei vigente à época da prestação do serviço, sem aplicação retroativa de norma ulterior que nesse sentido não haja disposto (RE 174.150-3/RJ, Rel. Min. Octávio Gallotti, DJ 18/08/2000). Também por força do princípio tempus regit actum, o modo de comprovação da atividade especial é orientado pela lei vigente ao tempo da prestação do serviço. A partir dessa premissa geral, articulam-se as seguintes diretrizes para o presente julgado:
a) Para as atividades exercidas até 28/04/1995, véspera da vigência da Lei nº 9.032/95, é possível o reconhecimento do tempo de atividade especial pelo pertencimento a determinada categoria profissional ou pela exposição aos agentes nocivos, nos termos previstos pelos decretos regulamentares. Por outro lado, em razão do caráter protetivo do trabalhador, é de ser reconhecida a natureza qualificada da atividade ainda que as condições que prejudicam sua saúde ou integridade física não se encontrem expressas em determinado regulamento (inteligência da Súmula 198 do extinto TFR).
b) Após a vigência da Lei nº 9.032/95, em 29/04/1995, a concessão da aposentadoria especial pressupõe a comprovação pelo segurado, do tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física (Lei 8.213/91, art. 57, § 3º). Sem embargo, "Para a caracterização da especialidade não se reclama exposição às condições insalubres durante todos os momentos da prática laboral, sendo suficiente que o trabalhador, em cada dia de labor, esteja exposto a agentes nocivos em período razoável da jornada (salvo exceções,v.g., periculosidade)" (TRF4, EINF 0010314-72.2009.404.7200, 3ª Seção, Rel. Des. Celso Kipper, D.E. 07/11/2011).
c) Para as atividades desempenhadas a partir de 06/03/1997, com a vigência do Decreto nº 2.172, a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos se dá mediante formulário, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho (Lei 8.213/91, art. 58, §1º) (TRF4, AC 2002.71.07.001611-3, 5ª Turma, Rel. Des. Celso Kipper, D.E. 07/07/2008).
d) Em relação aos agentes nocivos físicos ruído, frio e calor, é necessária a apresentação de laudo técnico independentemente do período de prestação da atividade, dada a necessidade de medição da intensidade desses agentes nocivos. De qualquer modo, a partir de 01/01/2004, é suficiente a apresentação de Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, elaborado conforme as exigências legais (TRF4, EINF 0010314-72.2009.404.7200, 3ª Seção, Rel. Des. Celso Kipper, D.E. 07/11/2011).
e) A extemporaneidade do laudo pericial não lhe retira a força probatória, em face da presunção de conservação do anterior estado de coisas, que deve operar desde que não evidenciada a alteração das condições de trabalho. A rigor, dada a evolução das normas de proteção ao trabalhador e em face das inovações tecnológicas, é plausível a tese de que, à época da prestação do serviço, as condições ambientais eram ainda mais ofensivas à saúde do trabalhador (TRF4, EINF 0031711-50.2005.404.7000, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon, D.E. 08/08/2013).
f) O limite de tolerância para ruído é de 80 dB(A) até 05/03/1997; 90 dB(A) de 06/03/1997 a 18/11/2003; e 85 dB(A) a partir de 19/11/2003 (STJ, REsp 1398260/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014, julgamento proferido de acordo com a sistemática de representativo de controvérsia - CPC, art. 543-C).
g) Quanto aos efeitos da utilização de equipamento de proteção individual, "Se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial". Todavia, "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria" (ARE 664335, Rel. Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, j. 04/12/2014, DJ 12/02/2015). Deve-se observar, contudo, que a adoção de EPI não deve ser considerada para fins de caracterização da atividade especial em tempo anterior a 03/12/1998, visto que esta exigência apenas foi disposta pela MP 1.729/98, convertida na Lei 9.732/89 (IN INSS/PRES 77/2015, art. 279, §6º).
h) A lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à época da prestação do serviço (STJ, EDcl no R Esp 1310034/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 26/11/2014, DJ 02/02/2015, julgamento proferido de acordo com a sistemática de representativo de controvérsia - CPC, art. 543-C). Dessa forma, é possível a conversão do tempo especial em comum mesmo para as atividades exercidas anteriormente à vigência da Lei 6.887/80, ao passo que a conversão do tempo comum em especial é apenas possível para o segurado que cumpriu os requisitos para aposentadoria especial até a vigência da Lei 9.032/95.
i) Cabe destacar, no que tange aos agentes químicos constantes no anexo 13 da NR-15, que os riscos ocupacionais gerados não requerem a análise quantitativa de sua concentração ou intensidade máxima e mínima no ambiente de trabalho, dado que são caracterizados pela avaliação qualitativa. Ao contrário do que ocorre com alguns agentes agressivos, como, v.g., o ruído, calor, frio ou eletricidade, que exigem sujeição a determinados patamares para que reste configurada a nocividade do labor, no caso dos tóxicos orgânicos e inorgânicos, a exposição habitual, rotineira, a tais fatores insalutíferos é suficiente para tornar o trabalhador vulnerável a doenças ou acidentes. (APELREEX 2002.70.05.008838-4, Quinta Turma, Relator Hermes Siedler da Conceição Júnior, D.E. 10/05/2010; EINF 5000295-67.2010.404.7108, Terceira Seção, Relator p/ Acórdão Luiz Carlos de Castro Lugon, 04/02/2015).
Exame do tempo especial no caso concreto
Período: 17/05/1982 a 17/08/98
Empresa: OSCAR KUNZ S/A IND. COM.
Atividade/função: Serviços gerais (acabamento), Almoxarife (almoxarifado), Almoxarife Comprador (almoxarifado).
Agente nocivo: periculosidade.
Enquadramento legal: periculosidade: Anexo 2, da NR-16, aprovada pela Portaria MTB n.º 3.214, de 08-06-1978, do Ministério do Trabalho, que dispõe sobre as Atividades e Operações Perigosas com Inflamáveis, mormente, nos seus itens 1, alínea "m", e 3, alínea "q", súmula 198 do TFR.
Prova: CTPS (flS. 14/15 PROCADM1 - E07), PPP (fls. 25/26 PROCADM1 - E07), Laudo técnico (fls. 22/41 PROCADM1 - E07).
Com efeito, a prova carreada aos autos, em especial o PPP emitido pela empresa, autoriza o reconhecimento da especialidade em razão do agente ruído, no período de 17/05/1982 a 11/01/1991 (ruído superior a 80 dB(A). Alega o INSS que o PPP foi preenchido com base em laudo extemporâneo.
Quanto à impossibilidade de utilização de laudo extemporâneo, a jurisprudência dominante entende que o fato de o laudo apresentado ter sido feito posteriormente à época da prestação do serviço não lhe retira a força probatória.
Isso porque, uma vez constatada a presença de agentes nocivos no ambiente de labor em data posterior à de sua prestação, mesmo com as inovações tecnológicas e de medicina e segurança do trabalho que atenuam a nocividade, reputa-se que à época da atividade a exposição era igual ou até maior (Processo nº 200204010489225/RS. Tribunal Regional da 4ª Região. Quinta Turma. Relator: Celso Kipper. D.E. Data: 21/06/2007).
Ou seja, com o devir do tempo, com a usual modernização de maquinário e o incremento de regras de segurança no trabalho, a tendência é diminuir ou anular os efeitos dos agentes agressores, até porque há interesse fiscal e trabalhista dos empregadores.
No período posterior a 11/01/1991, o autor passou a laborar no Setor de Almoxarifado, onde havia armazenada grande quantidade de óleo diesel. O laudo pericial judicial elaborado na empresa atestou que "no Setor de Almoxarifado na Função de Almoxarife/Comprador nas atividades de receber mercadorias, encaminhar as prateleiras, liberar requisição e acompanhar outros materiais, Tinha acesso ao depósito de inflamáveis e ao tanque de abastecimento do gerador para inspeções de estoques. Acompanhava o abastecimento do tanque de óleo pelo caminhão, mas de modo intermitente. O abastecimento do gerador com óleo diesel era realizado de modo habitual. (...) Quanto a Periculosidade a Norma Regulamentadora número 16 do Ministério do Trabalho impõe o limite mínimo de 200 litros no caso de transporte, e atividade e operações perigosas ao ter acesso ao depósito de inflamáveis para laborar no seu interior como para conferências de estoques. No caso da bomba de abastecimento de óleo diesel para o gerador a atividade era acompanha pelo Autor junto ao motorista do caminhão similar a um frentista, correndo os mesmos riscos pela quantidade óleo no tanque de abastecimento do gerador com capacidade de 5.000 litros. A atividade de abastecer o gerador com óleo diesel era realizada de modo habitual e permanente. (...) Esteve exposto a Periculosidade, a Norma Regulamentadora número 16 do Ministério do Trabalho ao realizar atividades e operações perigosas ao ter acesso ao depósito de inflamáveis para laborar no seu interior para conferências de estoques. No caso da bomba de abastecimento de óleo diesel para o gerador a atividade era acompanha pelo Autor junto ao motorista do caminhão atividade similar a um frentista, correndo os mesmos riscos pela quantidade óleo no tanque de abastecimento do gerador. A atividade de abastecer o gerador com óleo diesel ocorria de modo habitual e permanente."
Efetivamente, não se pode deixar de considerar o aspecto peculiar da periculosidade que decorre do trabalho envolvendo produtos químicos altamente inflamáveis e explosivos como a gasolina, o álcool e óleo diesel, cujo manuseio deve observar estritamente normas e padrões específicos de segurança e proteção.
A jurisprudência deste Tribunal já se firmou no sentido de que, ainda que não haja previsão expressa em normas específicas, tratando-se de periculosidade, basta que o segurado esteja submetido a um trabalho de risco.
Acerca do assunto, elucidativas as considerações tecidas pelo eminente Des. Federal João Batista Pinto Silveira por ocasião do julgamento da REOAC n.º 2008.71.14.001086-8, 6ª Turma, Unânime, Unânime, D.E. 05/03/2010), in verbis:
"Outrossim oportuno transcrever excerto do estabelecido no Anexo 2, da NR-16, aprovada pela Portaria MTB n.º 3.214, de 08-06-1978, do Ministério do Trabalho, que dispõe sobre as Atividades e Operações Perigosas com Inflamáveis, mormente, nos seus itens 1, alínea "m", e 3, alínea "q", que dispõem sobre as atividades ou operações perigosas e as áreas de risco:
ANEXO 2
ATIVIDADES E OPERAÇÕES PERIGOSAS COM INFLAMÁVEIS
1. São consideradas atividades ou operações perigosas, conferindo aos trabalhadores que se dedicam a essas atividades ou operações, bem como aqueles que operam na área de risco adicional de 30 (trinta) por cento, as realizadas:(...).
m - nas operações em postos de serviço e bombas de abastecimento de inflamáveis líquidos envolvendo o operador de bomba e trabalhadores que operam na área de risco.(...).
3. São consideradas áreas de risco:(...).
q - Abastecimento de inflamáveis. Toda a área de operação, abrangendo, no mínimo, círculo com raio de 7,5 metros com centro no ponto de abastecimento e o círculo com raio de 7,5 metros com centro na bomba de abastecimento da viatura e faixa de 7,5 metros de largura para ambos os lados da máquina. (...).
Destaco, ainda, que é ínsito o risco potencial de acidente em se tratando de agente periculoso, ou seja, nos casos em que é suficiente a sujeição ao risco de acidente ou dano que possa causar-lhe prejuízos à integridade física, sendo desnecessária a exposição habitual e permanente.
Equipamento de Proteção Individual (EPI): Destaco que o laudo pericial judicial refere que não era fornecido EPI.
Conclusão: o agente nocivo é elencado como especial e a prova é adequada. Portanto, é cabível o reconhecimento da natureza especial do labor, devendo ser confirmada a sentença no ponto.
Período: De 01/10/1998 a 04/09/2013
Empresa: IF Formas Ind. de Componentes para Calçados Ltda
Atividade/função: Comprador / Amoxarife - Setor de compras
Prova: CTPS (fl. 15 PROCADM1 - E07), PPP (fls. 42/43 PROCADM1 - E07), Laudo técnico (fl. 46 PROCADM1 - E07) e Laudo Pericial Judicial (evento 59).
O laudo pericial judicial elaborado na empresa atestou que " IF Formas Ind. de Comp. para Calçados Ltda.: trabalhou no período de 01/10/1998 a 04/09/2013 no Setor de Compras na Função de Comprador nas atividades de abastecer a fábrica com produtos, controlar, receber mercadorias, conferir e organizar o almoxarifado, etiquetar prateleiras com indicações. Controlava o recebimento do caminhão diesel para abastecimento do gerador verificando a quantidade recebida e inspecionando e acompanhando o abastecimento junto ao tanque de combustível. Atividade realizada de modo intermitente. O abastecimento dos geradores com a bomba de óleo diesel era realizado de modo habitual. (...) Esteve exposto a Periculosidade, a Norma Regulamentadora número 16 do Ministério do Trabalho ao realizar atividades e operações perigosas ao ter acesso ao depósito de inflamáveis para laborar no seu interior para conferências de estoques. No caso da bomba de abastecimento de óleo diesel para o gerador a atividade era acompanha pelo Autor junto ao motorista do caminhão atividade similar a um frentista, correndo os mesmos riscos pela quantidade óleo no tanque de abastecimento do gerador. A atividade de abastecer o gerador com óleo diesel ocorria de modo habitual e permanente."
A atividade deve ser considerada especial, por exposição à periculosidade, conforme os fundamentos já declinados acima.
Equipamento de Proteção Individual (EPI): Destaco que o laudo pericial judicial refere que não era fornecido EPI.
Conclusão: o agente nocivo é elencado como especial e a prova é adequada. Portanto, é cabível o reconhecimento da natureza especial do labor, devendo ser confirmada a sentença no ponto.
Da suposta ausência de contribuição adicional como óbice ao reconhecimento da atividade especial. A inexistência de correlação com o princípio da precedência do custeio (CF/88, art. 195, §5º)
O INSS alega que não houve o recolhimento das contribuições previdenciárias na forma do art. 57, §§ 6º e 7º, da Lei nº 8.213/91, porquanto o campo 13.7 do PPP (Código GFIP), referente ao código para fins de pagamento, ou de não pagamento, pela empresa, da contribuição adicional para custeio da aposentadoria especial, também chamada de Adicional do RAT (Riscos Ambientais do Trabalho), foi preenchido com o número "1", indicador da inexistência de exposição ao agente nocivo pela utilização de EPI. Sem razão.
O argumento não prospera. É absolutamente inadequado aferir-se a existência de um direito previdenciário a partir da forma como resta formalizada determinada obrigação fiscal por parte da empresa empregadora. Pouco importa, em verdade, se a empresa entendeu ou não caracterizada determinada atividade como especial. A realidade precede à forma. Se os elementos técnicos contidos nos autos demonstram a natureza especial da atividade, não guardam relevância a informação da atividade na GFIP ou a ausência de recolhimento da contribuição adicional por parte da empresa empregadora.
O que importa é que a atividade é, na realidade, especial. Abre-se ao Fisco, diante de tal identificação, a adoção das providências relativas à arrecadação das contribuições que entende devidas. O raciocínio é análogo às situações de trabalho informal pelo segurado empregado (sem anotação em carteira ou sem recolhimento das contribuições previdenciárias). A discrepância entre a realidade e o fiel cumprimento das obrigações fiscais não implicará, jamais, a negação da realidade, mas um ponto de partida para os procedimentos de arrecadação fiscal e imposição de penalidades correspondentes.
De outro lado, consubstancia grave equívoco hermenêutico condicionar-se o reconhecimento de um direito previdenciário à existência de uma específica contribuição previdenciária. Mais precisamente, inadequada é a compreensão que condiciona o reconhecimento da atividade especial às hipóteses que fazem incidir previsão normativa específica de recolhimento de contribuição adicional (art. 57, §§ 6º e 7º, da Lei nº 8.213/91). E a ausência de contribuição específica não guarda relação alguma com o princípio da precedência do custeio (CF/88, art. 195, §5º).
Note-se, quanto ao particular, que a contribuição adicional apenas foi instituída pela Lei 9.732/98, quase quatro décadas após a instituição da aposentadoria especial pela Lei 3.807/60. Além disso, as empresas submetidas ao regime simplificado de tributação (SIMPLES), como se sabe, não estão sujeitas ao recolhimento da contribuição adicional e essa condição não propicia sequer cogitação de que seus empregados não façam jus à proteção previdenciária diferenciada ou de que a concessão de aposentadoria especial a eles violaria o princípio constitucional da precedência do custeio. E isso pelo simples motivo de que ela decorre, dita proteção à saúde do trabalhador, da realidade das coisas vis a vis a legislação protetiva - compreendida desde uma perspectiva constitucional atenta à eficácia vinculante dos direitos fundamentais sociais. O que faz disparar a proteção previdenciária é a realidade de ofensa à saúde do trabalhador, verificada no caso concreto, e não a existência de uma determinada regra de custeio. Deve-se, aqui também, prestigiar a realidade e a necessidade da proteção social correlata, de modo que a suposta omissão ou inércia do legislador, quanto à necessidade de uma contribuição específica, não implica a conclusão de que a proteção social, plenamente justificável, estaria a violar o princípio da precedência do custeio.
Conclusão quanto ao tempo de atividade especial
Devem ser reconhecidos como atividade especial os períodos de 17/05/1982 a 17/08/1998 e 01/10/1998 a 04/09/2013, totalizando 31 anos, 02 meses e 05 dias.
Direito da parte no caso concreto
No caso dos autos, diante do tempo especial reconhecido em juízo, tem-se que a parte autora, por ocasião do requerimento administrativo, contava com 31 anos, 02 meses e 05 dias de tempo atividade especial.
Por essa razão, faz jus à implementação do benefício de aposentadoria especial desde a data do requerimento administrativo (DER - 04/09/2013), bem como ao recebimento das parcelas vencidas desde então.
Dos consectários
Correção Monetária e Juros
Não obstante a determinação do artigo 491 do NCPC no sentido de que "na ação relativa à obrigação de pagar quantia, ainda que formulado pedido genérico, a decisão definirá desde logo a extensão da obrigação, o índice de correção monetária, a taxa de juros, o termo inicial de ambos e a periodicidade da capitalização dos juros, se for o caso", tal deliberação resta inviabilizada, neste momento, em razão da pendência do julgamento das ADIs 4.357 e 4.425 pelo STF e dos recursos representativos de controvérsia (Resp 1495146/MG, 1495144/RS e 1492221/PR) pelo STJ (Tema 905).
Por conseguinte, ainda que o percentual de juros e o índice de correção monetária devam ser aqueles constantes da legislação em vigor em cada período em que ocorreu a mora da Fazenda Pública (INSS), difere-se, excepcionalmente, para a fase de execução a forma de cálculo dos consectários legais, restando prejudicado o recurso e/ou remessa necessária, no ponto, nos termos da deliberação proferida pelo STJ (EDcl no MS 14.741/DF , Rel. Ministro JORGE MUSSI, Terceira Seção, DJe 15/10/2014).
Honorários Advocatícios
Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência".
Saliente-se, por oportuno, que não incide a sistemática dos honorários prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida antes de 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016), conforme prevê expressamente o artigo 14 do NCPC [A norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada].
Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS), isenções estas que não se aplicam quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que, no Estado de Santa Catarina (art. 33, par. único, da Lei Complementar estadual 156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
Implantação do benefício
Reconhecido o direito da parte, impõe-se a determinação para a imediata implantação do benefício, nos termos do art. 497 do NCPC [Art. 497. Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente.] e da jurisprudência consolidada da Colenda Terceira Seção desta Corte (QO-AC nº 2002.71.00.050349-7, Rel. p/ acórdão Des. Federal Celso Kipper). Dessa forma, deve o INSS implantar o benefício em até 45 dias, conforme os parâmetros acima definidos, incumbindo ao representante judicial da autarquia que for intimado dar ciência à autoridade administrativa competente e tomar as demais providências necessárias ao cumprimento da tutela específica.
Conclusão
- Agravo retido julgado prejudicado, por perda de objeto;
- Recurso da parte autora parcialmente acolhido, para reconhecer como especiais os períodos de 17/05/1982 a 17/08/1998 e 01/10/1998 a 04/09/2013, totalizando 31 anos, 02 meses e 05 dias.
- Diante do tempo especial reconhecido em juízo, tem-se que a parte autora, por ocasião do requerimento administrativo, contava com 31 anos, 02 meses e 05 dias de tempo atividade especial. Por essa razão, faz jus à implementação do benefício de aposentadoria especial desde a data do requerimento administrativo (DER - 04/09/2013), bem como ao recebimento das parcelas vencidas desde então.
- negado provimento ao apelo do INSS e à remessa oficial.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao apelo da parte autora, negar provimento ao apelo do INSS e à remessa oficial, determinando a implantação do benefício, nos termos da fundamentação.
Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 18/10/2016
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5038088-98.2014.4.04.7108/RS
ORIGEM: RS 50380889820144047108
RELATOR | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dra. Márcia Neves Pinto |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | LUIZ CARLOS DA SILVA |
ADVOGADO | : | AIRTOM PACHECO PAIM JUNIOR |
APELADO | : | OS MESMOS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 18/10/2016, na seqüência 277, disponibilizada no DE de 27/09/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DA PARTE AUTORA, NEGAR PROVIMENTO AO APELO DO INSS E À REMESSA OFICIAL, DETERMINANDO A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
: | Juíza Federal ANA PAULA DE BORTOLI | |
: | Juiz Federal HERMES S DA CONCEIÇÃO JR |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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