APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5000742-58.2010.4.04.7107/RS
RELATOR | : | GISELE LEMKE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | LUIS CARLOS SOARES BROCKER |
ADVOGADO | : | IMILIA DE SOUZA |
APELADO | : | OS MESMOS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. CONVERSÃO DO TEMPO COMUM EM ESPECIAL - PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS APÓS A VIGÊNCIA DA LEI Nº 9.032/95 - IMPOSSIBILIDADE. TEMPO INSUFICIENTE PARA APOSENTADORIA ESPECIAL. AVERBAÇÃO. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA.
1. O reconhecimento da especialidade e o enquadramento da atividade exercida sob condições nocivas são disciplinados pela lei em vigor à época em que efetivamente exercidos, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador.
2. O Superior Tribunal de Justiça, em julgamento no regime do art. 543-C do CPC, estabeleceu que a lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à época da prestação do serviço (STJ, Primeira Seção no regime do art. 543-C do CPC, EDcl no REsp 1310034/PR, rel. Herman Benjamin, j. 26/11/2014, DJe de 02/02/2015). O preceito é aplicável aos que preencheram as condições para aposentadoria especial após a edição da Lei 9.032/1995, e, portanto, não se beneficiam da conversão do tempo de serviço comum em especial para fins de aposentadoria.
3. Não cumpridos todos os requisitos para a concessão do benefício, a parte autora tem direito à averbação dos períodos reconhecidos.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à remessa oficial, dar provimento à apelação do INSS e negar provimento à apelação do autor, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 24 de abril de 2018.
Juíza Federal Gisele Lemke
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Juíza Federal Gisele Lemke, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9339709v5 e, se solicitado, do código CRC 8C0CB65F. | |
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| Signatário (a): | Gisele Lemke |
| Data e Hora: | 26/04/2018 16:29 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5000742-58.2010.4.04.7107/RS
RELATOR | : | GISELE LEMKE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | LUIS CARLOS SOARES BROCKER |
ADVOGADO | : | IMILIA DE SOUZA |
APELADO | : | OS MESMOS |
RELATÓRIO
Trata-se de ação pelo rito ordinário proposta por LUIS CARLOS SOARES BROCKER (59 anos) contra o INSS, postulando a concessão de aposentadoria especial desde a DER (27/04/2006), mediante o reconhecimento de alegada especialidade de labor desenvolvido nos períodos de 08/07/1975 a 26/02/1976, de 03/05/1978 a 02/01/1979 e de 08/07/1980 a 07/10/1981 (Reichert Calçados), de 03/05/1976 a 07/12/1976 (Strassburger S.A), de 24/05/1979 a 23/08/1979 e de 20/04/1983 a 13/08/1986 (Schimidt Calçados), de 12/03/1980 a 01/07/1980 e de 03/11/1981 a 10/03/1983 (Fillis S.A), de 02/01/1991 a 28/05/1991 (Calçados Juçara), de 06/08/1991 a 08/02/2000 (Ortopé) e de 10/09/2001 a 27/04/2006 (Werner Calçados), somados à conversão de períodos urbanos comuns. Alternativamente, requer a possibilidade de reafirmação da DER a fim de que lhe seja concedida a aposentadoria especial.
A sentença, prolatada em 26/09/2012 (evento 83), foi proferida nos seguintes termos:
a) extinguir, sem resolução do mérito, o pedido de conversão de tempo comum para especial do período de 08/10/1973 a 08/10/1973, ante a falta de interesse de agir (art. 267, VI, do CPC);
b) condenar o INSS a reconhecer a especialidade das atividades exercidas pelo autor nos períodos de 08/07/1975 a 26/02/1976 (Reichert Calçados), de 03/05/1976 a 07/12/1976 (Strassburger), de 24/05/1979 a 23/08/1979 (Schimidt Ltda.), de 12/03/1980 a 01/07/1980 (Fillis S.A), de 08/07/1980 a 07/10/1981 (Reichert Calçados), de 03/11/1981 a 10/03/1983 (Fillis S.A), de 20/04/1983 a 13/08/1986 (Schimidt Ltda.), de 02/01/1991 a 28/05/1991 (Calçados Juçara) e de 06/08/1991 a 05/03/1997 (Ortopé), os quais deverão ser averbados e convertidos em tempo de serviço comum pelo multiplicador 1,40;
c) reconhecer - para a hipótese de novo pedido de concessão do benefício de aposentadoria especial - o direito do autor à conversão de tempo comum para especial dos intervalos compreendidos entre 13/07/1977 e 04/11/1977 (Schimitt Metalúrgica), 15/12/1977 e 26/04/1978 (Cícero Ltda.), 08/10/1979 e 03/03/1980 (Brusius) e 19/11/1990 e 18/12/1990 (Calçados Supimpa), mediante aplicação do fator 0,71.
Ante a sucumbência recíproca, reputo compensados os honorários advocatícios.
Caberá a ambas as partes, de forma igual, o ressarcimento dos valores adiantados ao perito, a título de honorários (evento 74). Fica suspensa, no entanto, a execução referente à metade devida pelo autor, em razão da concessão do benefício da assistência judiciária gratuita (evento 03). Decorrido o prazo para interposição de recursos voluntários, com ou sem aproveitamento, remetam-se os autos à Superior Instância para reexame necessário.
Apela o INSS, pela impossibilidade da conversão do tempo comum em especial.
Apela o autor, pelo reconhecimento da especialidade dos períodos de 06/03/1997 a 08/02/2000 e 10/09/2001 a 27/04/2006, face à exposição a hidrocarbonetos, a manutenção da possibilidade de conversão inversa, ou, subsidiariamente, a contagem de período posterior à DER, visando a concessão de aposentadoria especial.
Com contrarrazões, e em razão da remessa oficial, subiram os autos.
Nesta instância, intimado a se manifestar, juntou o autor documentos para reafirmação da DER
É o relatório.
VOTO
REMESSA OFICIAL
Processo submetido ao reexame necessário.
MÉRITO
Os pontos controvertidos no plano recursal restringem-se:
- ao reconhecimento do exercício de atividade especial, nos períodos de 08/07/1975 a 26/02/1976, de 03/05/1978 a 02/01/1979 e de 08/07/1980 a 07/10/1981 (Reichert Calçados), de 03/05/1976 a 07/12/1976 (Strassburger S.A), de 24/05/1979 a 23/08/1979 e de 20/04/1983 a 13/08/1986 (Schimidt Calçados), de 12/03/1980 a 01/07/1980 e de 03/11/1981 a 10/03/1983 (Fillis S.A), de 02/01/1991 a 28/05/1991 (Calçados Juçara), de 06/08/1991 a 08/02/2000 (Ortopé) e de 10/09/2001 a 27/04/2006 (Werner Calçados);
- à possibilidade de converter períodos de tempo comum em especial;
- à consequente concessão de aposentadoria especial;
- à possibilidade de reafirmação da DER.
TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL
Segundo orientação adotada pela Terceira Seção do STJ, o tempo de serviço especial disciplina-se pela lei vigente à época em que exercido o labor, passando a integrar o patrimônio jurídico do trabalhador como direito adquirido (AGRESP 493.458/RS, Rel. Min. Gilson Dipp, 5ª Turma, DJU 23/06/2003, e REsp 491.338/RS, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, 6ª Turma, DJU 23/06/2003).
Portanto, uma vez prestado o serviço, o segurado adquire o direito à sua contagem pela legislação então vigente, não podendo ser prejudicado pela lei nova e, ante a diversidade de diplomas legais que se sucederam na disciplina da matéria, torna-se necessário definir qual a legislação aplicável ao caso concreto. Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema sub judice:
a) no período de trabalho até 28/04/1995, quando vigente a Lei n.º 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações, e, posteriormente, a Lei n.º 8.213/91 (Lei de Benefícios), em sua redação original (arts. 57 e 58), é possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade profissional enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial, ou mesmo quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto para ruído, em que necessária sempre a aferição do nível de decibéis por meio de parecer técnico trazido aos autos, ou simplesmente por referência no formulário padrão emitido pela empresa;
b) a partir de 29/04/1995, inclusive, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional, de modo que, no interregno compreendido entre esta data e 05/03/1997, em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei n.º 9.032/95, no art. 57 da Lei de Benefícios, passou a ser necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico;
c) após 06/03/1997, a partir da vigência do Decreto n.º 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no art. 58 da Lei de Benefícios pela Lei n.º 9.528/97, passou-se a exigir, para fins de reconhecimento do tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.
Tal interpretação das sucessivas normas que regulam o tempo de serviço especial está conforme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (EDcl no REsp 415.298/SC, 5ª Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe 06/04/2009; AgRg no Ag 1053682/SP, 6ª Turma, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 08/09/2009; REsp 956.110/SP, 5ª Turma, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, DJ 22/10/2007; AgRg no REsp 746.102/SP, 6ª Turma, Rel. Min. Og Fernandes, DJe 07/12/2009).
Agente Nocivo Ruído
Especificamente quanto ao agente nocivo ruído, a comprovação da especialidade da atividade laboral pressupõe a existência de parecer técnico atestando a exposição do segurado a níveis de pressão sonora acima dos limites de tolerância.
Referidos limites foram estabelecidos, sucessivamente, no Quadro Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, o Anexo IV do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, e o Anexo IV do Decreto nº 3.048, de 06/05/1999, alterado pelo Decreto nº 4.882, de 18/11/2003, os quais consideram insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 80, 85 e 90 decibéis, de acordo com os Códigos 1.1.6, 1.1.5, 2.0.1 e 2.0.1, respectivamente.
Quanto ao período anterior a 05/03/1997, já foi pacificado pela Seção Previdenciária desta Corte (EIAC 2000.04.01.134834-3/RS, Rel. Desembargador Federal Paulo Afonso Brum Vaz, DJU, Seção 2, de 19/02/2003, p. 485) e também pelo INSS, na esfera administrativa (Instrução Normativa nº 57/2001 e posteriores), que são aplicáveis, concomitantemente, para fins de enquadramento, os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, até 05/03/1997, data imediatamente anterior à publicação do Decreto nº 2.172/97. Desse modo, até então, é considerada nociva à saúde a atividade sujeita a ruídos superiores a 80 decibéis, conforme previsto no Código 1.1.6 do Anexo ao Decreto nº 53.831/64.
Com a edição do Decreto nº 2.172/97, em 06/03/1997, o nível de ruído até 90 decibéis passou a ser considerado salubre (Código 2.0.1 do Anexo IV), sendo tal limite minorado para 85 decibéis a contar da vigência do Decreto nº 4.882/03, de 19/11/2003 (art. 2º).
No dia 14/05/2014, o Colendo Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo, julgou o Recurso Especial nº 1.398.260-PR, estabelecendo o seguinte:
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO RETROATIVA DO DECRETO 4.882/2003 PARA RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008-STJ).
O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6/3/1997 a 18/11/2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB. De início, a legislação que rege o tempo de serviço para fins previdenciários é aquela vigente à época da prestação, matéria essa já abordada de forma genérica em dois recursos representativos de controvérsias, submetidos ao rito do art. 543-C do CPC (REsp 1.310.034-PR, Primeira Seção, DJe 19/12/2012 e REsp 1.151.363-MG, Terceira Seção, DJe 5/4/2011). Ademais, o STJ, no âmbito de incidente de uniformização de jurisprudência, também firmou compreensão pela impossibilidade de retroagirem os efeitos do Decreto 4.882/2003. (Pet 9.059-RS, Primeira Seção, DJe 9/9/2013). Precedentes citados: AgRg no REsp 1.309.696-RS, Primeira Turma, DJe 28/6/2013; e AgRg no REsp 1.352.046-RS, Segunda Turma, DJe 8/2/2013. REsp 1.398.260-PR, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 14/5/2014.
Nesse contexto, devem ser adotados os seguintes níveis de ruído para fins de reconhecimento do tempo de serviço especial: igual ou superior a 80 decibéis até a edição do Decreto n° 2.172/1997; igual ou superior a 90 decibéis entre a vigência do Decreto n° 2.172/1997 e a edição do Decreto n° 4.882/2003; igual ou superior a 85 decibéis após a entrada em vigor do Decreto n° 4.882/2003.
Agentes Químicos
A exigência de explicitação da composição e concentração dos agentes químicos a que o segurado estava exposto não encontra respaldo na legislação previdenciária, a qual reconhece a especialidade do labor quando existe contato com agentes químicos nocivos à saúde, elencados na legislação de regência. Nesse sentido, os Embargos Infringentes de nº 5004090-13.2012. 404.7108 (3ª Seção, Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, por unanimidade, Sessão de 05/12/2013).
Equipamento de Proteção Individual - EPI
A utilização de Equipamentos de Proteção Individual (EPI) é irrelevante para o reconhecimento das condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador, da atividade exercida no período anterior a 03 de dezembro de 1998, data da entrada em vigor da MP n.º 1.729/98, convertida na Lei 9.732/1998, através da qual passou a existir a exigência de o laudo técnico conter informações sobre a existência de tecnologia de proteção individual eficaz para diminuir a intensidade do agente nocivo a limites de tolerância e recomendação do empregador para o uso.
Quanto à matéria relativa ao uso de EPI, o Colendo Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral (ARE 664335, Relator Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 04/12/2014, Acórdão Eletrônico DJE-029 Divulgação 11/02/2015 Publicação 12/02/2015), firmou as seguintes teses:
1 - o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial;
2 - na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.
Como se vê, considerado o período a partir de 03 de dezembro de 1998, a desconfiguração da natureza especial da atividade, em decorrência do uso de EPIs, é admissível desde que haja prova hábil afirmando inequivocamente que a sua utilização pelo trabalhador reduziu efetivamente os efeitos nocivos do agente agressivo a níveis toleráveis, ou os neutralizou.
O questionamento sobre a suficiência do mero preenchimento dos campos específicos, no PPP, onde simplesmente são respondidas as perguntas "EPI eficaz?" e "EPC eficaz?" para a caracterização da especialidade ou não da atividade, provocou a discussão estabelecida no IRDR 15, na 3ª Seção desta Corte, o qual teve o mérito julgado em sessão de 22/11/2017, sendo assim ementado:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS. EPI. NEUTRALIZAÇÃO DOS AGENTES NOCIVOS. PROVA. PPP. PERÍCIA.
1. O fato de serem preenchidos os específicos campos do PPP com a resposta 'S' (sim) não é, por si só, condição suficiente para se reputar que houve uso de EPI eficaz e afastar a aposentadoria especial.
2. Deve ser propiciado ao segurado a possibilidade de discutir o afastamento da especialidade por conta do uso do EPI, como garantia do direito constitucional à participação do contraditório.
3. Quando o LTCAT e o PPP informam não ser eficaz o EPI, não há mais discussão, isso é, há a especialidade do período de atividade.
4. No entanto, quando a situação é inversa, ou seja, a empresa informa no PPP a existência de EPI e sua eficácia, deve se possibilitar que tanto a empresa quanto o segurado, possam questionar - no movimento probatório processual - a prova técnica da eficácia do EPI.
5. O segurado pode realizar o questionamento probatório para afastar a especialidade da eficácia do EPI de diferentes formas: A primeira (e mais difícil via) é a juntada de uma perícia (laudo) particular que demonstre a falta de prova técnica da eficácia do EPI - estudo técnico-científico considerado razoável acerca da existência de dúvida científica sobre a comprovação empírica da proteção material do equipamento de segurança. Outra possibilidade é a juntada de uma prova judicial emprestada, por exemplo, de processo trabalhista onde tal ponto foi questionado.
5. Entende-se que essas duas primeiras vias sejam difíceis para o segurado, pois sobre ele está todo o ônus de apresentar um estudo técnico razoável que aponte a dúvida científica sobre a comprovação empírica da eficácia do EPI.
6. Uma terceira possibilidade será a prova judicial solicitada pelo segurado (após analisar o LTCAT e o PPP apresentados pela empresa ou INSS) e determinada pelo juiz com o objetivo de requisitar elementos probatórios à empresa que comprovem a eficácia do EPI e a efetiva entrega ao segurado.
7. O juízo, se entender necessário, poderá determinar a realização de perícia judicial, a fim de demonstrar a existência de estudo técnico prévio ou contemporâneo encomendado pela empresa ou pelo INSS acerca da inexistência razoável de dúvida científica sobre a eficácia do EPI. Também poderá se socorrer de eventuais perícias existentes nas bases de dados da Justiça Federal e Justiça do Trabalho.
8. Não se pode olvidar que determinada situações fáticas, nos termos do voto, dispensam a realização de perícia, porque presumida a ineficácia dos EPI´s.
A tese do IRDR 15, resumindo o pensamento idealizado no julgamento, foi firmada no sentido de que "a mera juntada do PPP referindo a eficácia do EPI não elide o direito do interessado em produzir prova em sentido contrário".
Portanto, todos os aspectos supramencionados devem ser observados para avaliação da eficácia da utilização dos EPIs na elisão dos efeitos danosos dos agentes nocivos para a caracterização ou não do tempo especial.
Do Perfil Profissiográfico Previdenciário
Para validade da utilização do formulário Perfil Profissiográfico Previdenciário, este deve ter sido produzido com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho, o qual deve figurar como responsável técnico. Esta Corte firmou entendimento no sentido de que presume-se, ainda que de forma relativa, que o referido documento guarda fidelidade em relação às informações extraídas do laudo técnico (TRF4, APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0010952-16.2010.404.9999, 6ª Turma, Rel. Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, POR UNANIMIDADE, D.E. 27/05/2011; TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 0017107-59.2015.4.04.9999, 5ª Turma, Rel. Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ, POR UNANIMIDADE, D.E. 22/06/2017).
COMPROVAÇÃO DA ESPECIALIDADE
Mantenho a sentença por seus próprios fundamentos na parte em que reconheceu o exercício de atividade especial de 08/07/1975 a 26/02/1976, 03/05/1976 a 07/12/1976, 24/05/1979 a 23/08/1979, 12/03/1980 a 01/07/1980, 08/07/1980 a 07/10/1981, 03/11/1981 a 10/03/1983, 20/04/1983 a 13/08/1986, 02/01/1991 a 28/05/1991 e de 06/08/1991 a 05/03/1997, uma vez que restou comprovada a exposição ao agente nocivo ruído em limites superiores ao previsto pela legislação aplicável nos períodos laborados, afastando aqueles lapsos em que a exposição restou abaixo desses níveis. Veja-se que o magistrado fundamentou sua decisão baseado nos formulários apresentados (PROCADM9 e PROCADM10, evento 01) e laudo técnico pericial judicial (LAUDO, evento 51), afastando os períodos em que a exposição foi aquém dos limites .
No que tange ao agente físico ruído, não é possível descaracterizar a especialidade em razão de EPIs. Isso porque, conforme tese fixada pelo STF no julgamento do ARE 664.335, "hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria", uma vez que "a potência do som em tais ambientes causa danos ao organismo que vão muito além daqueles relacionados à perda das funções auditivas".
A apelante pretende, todavia, o reconhecimento do exercício de atividade especial de 06/03/1997 a 08/02/2000 e 10/09/2001 a 27/04/2006, alegando a exposição a agentes químicos. Ocorre que devem ser adotadas as informações constantes do laudo pericial judicial em detrimento das demais provas, uma vez que foi elaborado por perito de confiança do Juízo, equidistante dos interesses das partes, adequadamente embasado e suficientemente fundamentado, onde se fez constar que não havia exposição a outros agentes nocivos a ensejar o enquadramento da atividade como especial. Ademais, frise-se que o IRDR n° 15/trf4 (5054341-77.2016.4.04.0000/SC) passou a exigir prova hábil à comprovação da eficácia dos EPIs para elidir os demais agentes nocivos.
Assim, uma vez que o reconhecimento da atividade especial foi feito em conformidade com a jurisprudência deste Tribunal, entendo que merece ser confirmada a sentença no tocante ao reconhecimento da especialidade dos períodos 08/07/1975 a 26/02/1976, 03/05/1976 a 07/12/1976, 24/05/1979 a 23/08/1979, 12/03/1980 a 01/07/1980, 08/07/1980 a 07/10/1981, 03/11/1981 a 10/03/1983, 20/04/1983 a 13/08/1986, 02/01/1991 a 28/05/1991 e de 06/08/1991 a 05/03/1997.
APOSENTADORIA ESPECIAL - REQUISITOS
A aposentadoria especial, prevista no art. 57 da Lei nº 8.213/91, é devida ao segurado que, além da carência, tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física durante 15, 20 ou 25 anos.
Em se tratando de aposentadoria especial, portanto, não há conversão de tempo de serviço especial em comum, visto que o que enseja a outorga do benefício é o labor, durante todo o período mínimo exigido na norma em comento (15, 20, ou 25 anos), sob condições nocivas.
CONVERSÃO DE TEMPO COMUM EM ESPECIAL
Até 27/10/1995 a legislação do Regime Geral de Previdência Social admitia conversão do tempo de serviço comum em especial para cumprimento dos requisitos da aposentadoria especial, conforme a redação original do § 3º do art. 57 da Lei 8.213/1991. Essa vantagem foi excluída pela vigência da Lei 9.032/1995 (TRF4, Sexta Turma, APELREEX 2009.70.01.002087-6, rel. Celso Kipper, D.E. de 17/12/2009; TRF4, Sexta Turma, APELREEX 2008.70.09.002222-2, rel. João Batista Pinto Silveira, D.E. de 14/10/2009).
O Superior Tribunal de Justiça, em julgamento no regime do art. 543-C do CPC, estabeleceu que a lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à época da prestação do serviço (STJ, Primeira Seção no regime do art. 543-C do CPC, EDcl no REsp 1310034/PR, rel. Herman Benjamin, j. 26nov.2014, DJe de 02/02/2015). O preceito é aplicável aos que preencheram as condições para aposentadoria especial após a edição da Lei 9.032/1995, e portanto não se beneficiam da conversão do tempo de serviço comum em especial para fins de aposentadoria.
Dessa forma, não é possível a conversão de tempo comum em especial nesta hipótese, razão porque deve ser reformada a sentença quanto ao ponto. Resta inviável, então, a concessão de aposentadoria especial, pois o autor completa apenas 13 anos, 08 meses e 13 dias de tempo especial.
Reafirmação da DER
Não se olvida que esta Corte admite a reafirmação da DER em sede judicial, mesmo de ofício, questão que restou pacificada pela 3ª Seção, que admitiu que os fatos supervenientes ao ajuizamento da ação devem ser avaliados no momento do julgamento, inclusive em grau recursal.
Contudo, em que pese o autor ter juntado documentos (evento 16 desta instância) para ver possibilitado novo cômputo de tempo especial, todos os formulários trazidos comprovam a exposição ao agente nocivo ruído em intensidade inferior ao limite imposto após a entrada em vigor do Decreto n° 4.882/2003, de 85 decibéis (item 2.0.1 do Anexo IV do Decreto n.º 3.048/99, com a alteração introduzida pelo Decreto n.º 4.882/2003).
Somente o PPP3, Calçados Joice Ltda., faz menção a exposição à agentes químicos no período de 12/11/2007 a 25/04/2008. Ocorre que, além da já citada exigência imposta pelo o IRDR n° 15/TRF4 (prova hábil à comprovação da eficácia dos EPIs para elidir os demais agentes nocivos), o lapso em questão não seria suficiente a ensejar a pleiteada aposentadoria, mesmo com a eventual reafirmação da DER.
Cumpre referir que a prova emprestada (LAUDO7), laudo formulado para outros em período diverso, não pode se sobrepor àquele requisitado pelo juízo destes autos.
Dessa forma, reformada a sentença para afastar a possibilidade de conversão do tempo comum em especial, resta somente oportunizar a averbação do tempo especial reconhecido nesta ação, nos períodos de 08/07/1975 a 26/02/1976, 03/05/1976 a 07/12/1976, 24/05/1979 a 23/08/1979, 12/03/1980 a 01/07/1980, 08/07/1980 a 07/10/1981, 03/11/1981 a 10/03/1983, 20/04/1983 a 13/08/1986, 02/01/1991 a 28/05/1991 e de 06/08/1991 a 05/03/1997.
CONSECTÁRIOS
Mantidos os consectários na forma da sentença.
Saliente-se que não incide a sistemática dos honorários prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida antes de 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016), conforme prevê expressamente o artigo 14 do NCPC [A norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada].
CONCLUSÃO
Dado parcial provimento à remessa oficial e provimento à apelação do INSS, para afastar a possibilidade de conversão de tempo comum em especial.
Negado provimento à apelação do autor, condena-se o INSS a averbar como de atividade especial 08/07/1975 a 26/02/1976, 03/05/1976 a 07/12/1976, 24/05/1979 a 23/08/1979, 12/03/1980 a 01/07/1980, 08/07/1980 a 07/10/1981, 03/11/1981 a 10/03/1983, 20/04/1983 a 13/08/1986, 02/01/1991 a 28/05/1991 e de 06/08/1991 a 05/03/1997.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à remessa oficial, dar provimento à apelação do INSS e negar provimento à apelação do autor.
Juíza Federal Gisele Lemke
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 24/04/2018
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5000742-58.2010.4.04.7107/RS
ORIGEM: RS 50007425820104047107
RELATOR | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
PRESIDENTE | : | Luiz Carlos Canalli |
PROCURADOR | : | Dra. Carmem Elisa Hessel |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | LUIS CARLOS SOARES BROCKER |
ADVOGADO | : | IMILIA DE SOUZA |
APELADO | : | OS MESMOS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 24/04/2018, na seqüência 403, disponibilizada no DE de 05/04/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO À REMESSA OFICIAL, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO AUTOR.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
VOTANTE(S) | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
: | Des. Federal LUIZ CARLOS CANALLI | |
: | Juíza Federal ANA PAULA DE BORTOLI |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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