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Apelação Cível Nº 5021960-16.2021.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APELANTE: LUIS VILMAR GEYER
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Cuida-se de apelações interpostas de sentença cujo dispositivo foi assim proferido (evento 27):
(...)
Diante do exposto, PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por LUIS VILMAR GEYER em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL para:
a) EXTINGUIR o feito em relação ao período compreendido entre 0/09/1990 a 28/04/1995, na forma do artigo 485, IV, do CPC.
b) RECONHECER o período de labor urbano entre 31/07/2013 a 09/09/2013.
c) RECONHECER exercício de atividade especial nos períodos de 29/04/1995 A 16/12/2003 e 12/06/2006 a 18/09/2013, com a posterior conversão pelo fator 1,4;
d) CONCEDER à parte autora o benefício de APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO, nos termos da fundamentação, desde a data da DER – 09/09/2013;
e) CONDENAR o requerido ao pagamento ao demandante das prestações VENCIDAS, monetariamente atualizadas desde o vencimento até o efetivo pagamento, com juros de mora a partir da citação, em parcela única, nos termos da fundamentação, e VINCENDAS. As parcelas vencidas deverão ser corrigidas pela variação do ORTN (10/64 a 02/86, Lei 4.257/64), OTN (03/86 a 01/89, Decreto-Lei 2.284/86, de 03/86 a 01/89), BTN (02/89 a 02/91, Lei 7.777/89), INPC (03/91 a 12/92, Lei 8.213/91), IRSM (01/93 a 02/94, Lei 8.542/92), URV (03 a 06/94, Lei 8.880/94), IPC-r (07/94 a 06/95, Lei 8.880/94), INPC (07/95 a 04/96, MP 1.053/95), IGP-DI (05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei 9.711/98, combinado com o art. 20, §§ 5º e 6.º, da Lei 8.880/94) e, a partir de abril de 2006, do INPC (art. 41-A da Lei 8.213/91 c/c art. 4º da Lei 11.430/06); acrescido de juros moratórios de 1% ao mês, a contar da citação; observada a prescrição quinquenal; a contar de 01-07-2009, para fins de juros haverá a incidência dos juros aplicados à caderneta de poupança.
O benefício deverá ser implantado no prazo máximo de 30 (trinta) dias, contados do trânsito em julgado.
Ante o decaimento mínimo, CONDENO o réu ao pagamento dos honorários advocatícios, que fixo em 15% sobre o valor da condenação, incidindo tão-somente sobre as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença (Súmula 76 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região), excluídas as parcelas vincendas (Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça). O INSS fica isento do pagamento das custas processuais, na forma do artigo 5º, inciso I, da Lei Estadual 11.634/2014, bem como do entendimento jurisprudencial (TRF4 5000552-37.2019.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 01/07/2020).
Dispensada remessa necessária, uma vez que o valor da condenação não ultrapassa mil salários mínimos (art. 496, § 3, I, do Código de Processo Civil).
P.R.I.
O INSS recorre postulando a reforma da sentença (evento 31). Impugna o reconhecimento da especialidade dos períodos de 29/04/1995 a 16/12/2003 e 12/06/2006 a 18/09/2013, sob o argumento de que a penosidade não seria considerada agente nocivo para fins de reconhecimento da atividade especial de motorista. Aduz a necessidade de comprovação da habitualidade e permanência na exposição a agente nocivo para que seja possível o enquadramento da atividade como especial. Assim não sendo entendido, requer a fixação dos honorários advocatícios no patamar de 10% sobre o valor da condenação, considerando as parcelas atrasadas até a sentença, nos termos da reiterada jurisprudência deste Regional.
A parte autora, em seu apelo (evento 35), postula o reconhecimento e a averbação do labor rural nos intervalos de 29/04/1970 a 30/11/1978 e 17/06/1979 a 15/08/1979 ao tempo de contribuição, inclusive para efeitos de carência.
Regularmente processados, subiram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
O apelo preenche os requisitos legais de admissibilidade.
Da remessa necessária
Considerando a DIB e a data da sentença verifica-se de plano não se tratar de hipótese para o conhecimento do reexame obrigatório, portanto, correta a sentença que não submeteu o feito à remessa necessária.
Do erro material da sentença
Cumpre, de início, observar a ocorrência de erro material na parte dispositiva do julgado, a ser corrigido de ofício, uma vez que exsurge expresso da fundamentação ter o sentenciante concedido o benefício a contar da data do requerimento administrativo, o qual, foi efetivado em 18/09/2013 (evento 5 - INIC2, pág. 13), e não em 09/09/2013, como constou no dispositivo, que ora se corrige.
Da questão controversa
A questão controversa dos presentes autos na fase recursal cinge-se:
- ao reconhecimento do exercício de atividade rural em regime de economia familiar no período de 29/04/1970 a 30/11/1978 e de 17/06/1979 a 15/08/1979;
- a possibilidade de reconhecimento da especialidade das atividades desenvolvidas de 29/04/1995 a 16/12/2003 e 12/06/2006 a 18/09/2013, frente à legislação previdenciária aplicável à espécie, com a consequente concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, a contar da data do requerimento administrativo (18/09/2013);
- aos honorários advocatícios.
DA ATIVIDADE RURAL
Entende-se por "regime de economia familiar", nos termos da Lei 8.213/91, art. 11, § 1.º, "a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados".
No que concerne à prova do tempo de serviço exercido nesse tipo de atividade, se deve observar a regra do art. 55, § 3.º, da LB: "a comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento".
Para a análise do início de prova material, associo-me aos seguintes entendimentos:
Súmula n.º 73 deste Regional: Admite-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental.
Súmula n.º 149 do STJ: A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de beneficio previdenciário.
Súmula n.º 577 do STJ: É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório.
A contagem do tempo de serviço rural em regime de economia familiar prestado por menor de 14 anos é devida. Conforme entende o STJ, a legislação, ao vedar o trabalho infantil do menor de 14 anos, teve por escopo a sua proteção, tendo sido estabelecida a proibição em benefício do menor e não em seu prejuízo, aplicando-se o princípio da universalidade da cobertura da Seguridade Social (AR n.º 3.629/RS, Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe 9.9.2008; EDcl no REsp n.º 408.478/RS, Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJ 5.2.2007; AgRg no REsp n.º 539.088/RS, Ministro Felix Fischer, DJ 14/6/2004). No mesmo sentido é a Súmula 05 da TNU dos JEF.
A formação de início razoável de prova material sem a apresentação de notas fiscais de produtor rural em nome próprio é possível. Com efeito, a efetiva comprovação da contribuição é flexibilizada pelo fato de o art. 30, III, da Lei 8.212/91 atribuir a responsabilidade de recolher à empresa que participa da negociação dos produtos referidos nas notas fiscais de produtor, seja na condição de adquirente, consumidora, consignatária ou se trate de cooperativa. Nesse caso, a contribuição especificada não guarda relação direta com a prestação de serviço rural em família, motivo pelo qual se pode reconhecer o respectivo tempo ainda que ausentes notas fiscais de produtor rural como início de prova material.
A existência de início de prova material, todavia, não é garantia de obtenção do tempo de serviço postulado. A prova testemunhal é de crucial importância para que se confirme a atividade e seu respectivo lapso temporal, complementando os demais elementos probatórios.
No que respeita a não exigência de contribuições para a averbação do tempo de serviço do segurado especial, a questão deve ser analisada sob o prisma constitucional, uma vez que em seu texto foi prevista a unificação da Previdência Social, outorgando a qualidade de segurado do RGPS aos trabalhadores rurais.
Em consonância está o § 2.º, do art. 55, da Lei 8.213/91 que previu a possibilidade de que o tempo de serviço rural dos segurados especiais fosse computado independentemente do recolhimento de contribuições ou indenização:
"O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência conforme dispuser o Regulamento."
Tal entendimento foi esposado pelo Supremo Tribunal Federal na decisão liminar da ADIN 1664-4-DF. Assim, desde que devidamente comprovado, o tempo de serviço que o segurado trabalhou em atividade rural poderá ser utilizado para fins de qualquer aposentadoria por tempo de serviço independentemente de contribuições.
Também devem ser observados os precedentes vinculantes, conforme estipula o art. 927 do CPC/2015. Do STJ, temos as seguintes teses firmadas:
Tema 644 - Concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição a trabalhador urbano mediante o cômputo de atividade rural
"Não ofende o § 2.º do art. 55 da Lei 8.213/91 o reconhecimento do tempo de serviço exercido por trabalhador rural registrado em carteira profissional para efeito de carência, tendo em vista que o empregador rural, juntamente com as demais fontes previstas na legislação de regência, eram os responsáveis pelo custeio do fundo de assistência e previdência rural (FUNRURAL). (REsp 1352791/SP)
Tema 554 - Abrandamento da prova para configurar tempo de serviço rural do "boia-fria"
"O STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal. (REsp 1321493/PR)
Tema 532: O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ).
Tema 638: Reconhecimento de período de trabalho rural anterior ao documento mais antigo juntado como início de prova material. Súmula 577).
Tema 533: A extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana.
Do caso concreto
Visando à demonstração do exercício da atividade rural, a parte autora juntou aos autos os seguintes documentos (Evento 5, INIC2, fls. 15 a 25 e INIC3, fls. 1 a 14):
a) Declaração do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de São Sebastião do Caí em nome do Avô do Autor, comprovando que foi associado ao sindicato no período de 1967 a 1981;
b) Lembrança de Batismo do Autor, que comprova que ele e seus pais viviam em São Sebastião do Caí em 1958;
c) Atestado de Frequência da Escola Estadual de Ensino Fundamental José Bennemann comprovando que o Autor frequentou a escola até o ano de 1973 em São Sebastião do Caí;
d) Lembrança de Crisma do Autor que comprova que residia em São Sebastião do Caí em 1976;
e) Recibo de Entrega do Incra em nome do Avô do Autor comprovando a entrega de declaração para cadastro de imóvel rural em 1978;
f) Certidão de casamento do Autor, celebrado em 1981, na qual consta que ele exercia a profissão de agricultor;
g) Certidão do Tabelionato de Notas de São Sebastião do Caí, no qual menciona a atividade de agricultor no Autor no ano de 1981;
h) Declaração no Sindicado Dos Trabalhadores Rurais de São Sebastião do Caí que comprova que o Autor era associado ao sindicado no período de 1983 a 1992, onde desempenhou suas atividades agrícolas na localidade de Campestre 1º Distrito, São Sebastião do Caí - RS.
A prova testemunhal (Evento 5, INIC4, fls. 7 a 9) confirmou o trabalho em regime de economia familiar no período pretendido.
Desse modo, a partir dos documentos acostados aos autos, os quais constituem início de prova material, corroborados pelo depoimento testemunhal, foi devidamente comprovado o trabalho agrícola desenvolvido pela parte autora, de 29/04/1970 a 30/11/1978 e de 17/06/1979 a 15/08/1979, totalizando 08 anos, 09 meses e 01 dia, devendo o INSS averbar esse período como tempo de serviço para todos os fins, exceto carência e contagem recíproca com outro regime que não o RGPS.
Assim, dou parcial provimento ao recurso da parte autora, alterando a sentença, no ponto.
DA ATIVIDADE ESPECIAL
O reconhecimento da especialidade de determinada atividade é disciplinado pela lei em vigor à época em que efetivamente exercida, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, sem a incidência retroativa de uma lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
Nesse sentido, aliás, é a orientação adotada pela Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (AR n.º 3320/PR, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe de 24.09.2008; EREsp n.º 345554/PB, Rel. Ministro José Arnaldo da Fonseca, DJ de 08.03.2004; AGREsp n.º 493.458/RS, Quinta Turma, Rel. Ministro Gilson Dipp, DJU de 23.06.2003; e REsp n.º 491.338/RS, Sexta Turma, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, DJU de 23.06.2003), que passou a ter expressa previsão legislativa com a edição do Decreto n.º 4.827/2003, o qual alterou a redação do art. 70, §1.º, do Decreto n.º 3.048/99.
Feita essa consideração e tendo em vista a diversidade de diplomas legais que se sucederam na disciplina da matéria, necessário inicialmente definir qual a legislação aplicável ao caso concreto, ou seja, qual a legislação vigente quando da prestação da atividade pela parte autora.
Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema sub judice:
a) no período de trabalho até 28.04.1995, quando vigente a Lei n.º 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei n.º 8.213/91 (Lei de Benefícios), em sua redação original (arts. 57 e 58), possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial ou quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto para os agentes nocivos ruído, frio e calor (STJ, AgRg no REsp n.º 941885/SP, Quinta Turma, Rel. Ministro Jorge Mussi, DJe de 04.08.2008; e STJ, REsp n.º 639066/RJ, Quinta Turma, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJ de 07.11.2005), em que necessária a mensuração de seus níveis por meio de perícia técnica, carreada aos autos ou noticiada em formulário emitido pela empresa, a fim de se verificar a nocividade ou não desses agentes;
b) a partir de 29.04.1995, inclusive, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional - à exceção daquelas a que se refere a Lei n.º 5.527/68, cujo enquadramento por categoria deve ser feito até 13.10.1996, dia anterior à publicação da Medida Provisória n.º 1.523, que revogou expressamente a Lei em questão - de modo que, no interregno compreendido entre 29.04.1995 (ou 14.10.1996) e 05.03.1997, em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei n.º 9.032/95 no art. 57 da Lei de Benefícios, necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, suficiente, para tanto, a apresentação de formulário padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico, ressalvados os agentes nocivos ruído, frio e calor, conforme visto acima;
c) a partir de 06.03.1997, data da entrada em vigor do Decreto n.º 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no art. 58 da Lei de Benefícios pela Medida Provisória n.º 1.523/96 (convertida na Lei n.º 9.528/97), passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.
d) a partir de 01.01.2004, o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) passou a ser documento indispensável para a análise do período cuja especialidade for postulada (art. 148 da Instrução Normativa n.º 99 do INSS, publicada no DOU de 10.12.2003). Tal documento substituiu os antigos formulários (SB-40, DSS-8030, ou DIRBEN-8030) e, desde que devidamente preenchido, inclusive com a indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais e pela monitoração biológica, exime a parte da apresentação do laudo técnico em juízo.
Para fins de enquadramento das categorias profissionais, devem ser considerados os Decretos n.º 53.831/64 (Quadro Anexo - 2.ª parte), n.º 72.771/73 (Quadro II do Anexo) e n.º 83.080/79 (Anexo II) até 28.04.1995, data da extinção do reconhecimento da atividade especial por presunção legal, ressalvadas as exceções acima mencionadas. Já para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos n.º 53.831/64 (Quadro Anexo - 1.ª parte), n.º 72.771/73 (Quadro I do Anexo) e n.º 83.080/79 (Anexo I) até 05.03.1997 e, a partir de então, os Decretos n.º 2.172/97 (Anexo IV) e n.º 3.048/99, ressalvado o agente nocivo ruído, ao qual se aplica também o Decreto n.º 4.882/03. Além dessas hipóteses de enquadramento, sempre possível também a verificação da especialidade da atividade por meio de perícia técnica, nos termos da Súmula n.º 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos (STJ, AGRESP n.º 228832/SC, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, DJU de 30.06.2003).
Ainda para fins de reconhecimento da atividade como especial, deve ser referido que a habitualidade e a permanência do tempo de trabalho em condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física, referidas no artigo 57, § 3.º, da Lei n.º 8.213/91 não pressupõem a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho. Deve ser interpretada no sentido de que tal exposição deve ser ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina laboral, e não de ocorrência eventual, ocasional. Exegese diversa levaria à inutilidade da norma protetiva, pois em raras atividades a sujeição direta ao agente nocivo se dá durante toda a jornada de trabalho, e em muitas delas a exposição em tal intensidade seria absolutamente impossível. A propósito do tema, vejam-se os seguintes precedentes da Terceira Seção deste Tribunal: EINF n.º 0003929-54.2008.404.7003, de relatoria do Desembargador Federal Néfi Cordeiro, D.E. 24.10.2011; EINF n.º 2007.71.00.046688-7, Terceira Seção, Relator Celso Kipper, D.E. 07.11.2011.
Ademais, conforme o tipo de atividade, a exposição ao respectivo agente nocivo, ainda que não diuturna, configura atividade apta ser reconhecida como especial, tendo em vista que a intermitência na exposição não reduz os danos ou riscos inerentes à atividade, sendo inaceitável que se retire do trabalhador o direito à redução do tempo de serviço para a aposentadoria, deixando-lhe apenas os ônus da atividade perigosa ou insalubre (TRF4, EINF 2005.72.10.000389-1, Terceira Seção, minha Relatoria, D.E. 18.05.2011; TRF4, EINF 2008.71.99.002246-0, Terceira Seção, Relator Luís Alberto D' Azevedo Aurvalle, D.E. 08.01.2010).
Importante ressaltar que a extemporaneidade do laudo pericial não lhe retira a força probatória, em face da presunção de conservação do anterior estado de coisas, que deve operar desde que não evidenciada a alteração das condições de trabalho. A rigor, dada a evolução das normas de proteção ao trabalhador e em face das inovações tecnológicas, é plausível a tese de que, à época da prestação do serviço, as condições ambientais eram ainda mais ofensivas à saúde do trabalhador (TRF4, EINF 0031711-50.2005.404.7000, Terceira Seção, Relator Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon, D.E. 08.08.2013).
Cumpre dizer que o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP foi criado pela Lei 9.528/97 (que sucedeu as MPs 1.523/96 e 1.596/97), a qual inseriu o § 4.º ao art. 58 da Lei 8.213/91, visando à substituição dos antigos formulários SB-40, DISES BE 5235, DSS 8030 e DIRBEN 8030 na comprovação do labor em condições especiais. Somente com o advento do Decreto 4.032/01, que deu nova redação aos §§ 2.º e 6.º, e inseriu o § 8.º, todos ao art. 68 do Decreto 3.048/99, porém, é que se definiu o conceito legal do PPP: "considera-se perfil profissiográfico previdenciário, para os efeitos do § 6.º, o documento histórico-laboral do trabalhador, segundo modelo instituído pelo INSS, que, entre outras informações, deve conter registros ambientais, resultados de monitoração biológica e dados administrativos".
De acordo com o § 2.º do Decreto 3.048/99, com a redação do Decreto 4.032/01, a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita mediante a apresentação do perfil profissiográfico previdenciário, elaborado conforme determinação do Instituto Nacional do Seguro Social. Já a Instrução Normativa 84/02 - IN/INSS, ao regulamentar a questão, no art. 187, §1º, estabeleceu que: "O PPP deve ser elaborado pela empresa com base no LTCAT (Laudo Técnico de Condições Ambientais do Trabalho) e assinado pelo representante legal da empresa ou seu preposto, indicando o nome do médico do trabalho e do engenheiro de segurança do trabalho, em conformidade com o dimensionamento do SESMT". Não é demais lembrar que a elaboração de Laudo Técnico de Condições Ambientais do Trabalho - LTCAT é obrigação da empresa, devendo ser disponibilizado à Previdência Social, bem como deve ser anualmente revisado, ocasião em que também se atualiza o Perfil profissiográfico Previdenciário - PPP (arts. 154, 155, 160, 162 e 187, § 2º, da IN/INSS 84/02).
Do exposto, infere-se que o perfil profissiográfico previdenciário supre, para fins de inativação, a necessidade de apresentação de formulário específico e de laudo técnico, unindo-os em um único documento. Por tal razão entende-se que, uma vez identificado, no documento, o engenheiro ou perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, é possível a sua utilização para comprovação da atividade especial, em substituição ao laudo pericial. Como afirma Wladimir Novaez Martinez: "Com o modelo da IN 84/02 (Anexo XV), ele [o PPP] passou a existir formalmente a partir daí, diferindo dos formulários que a prática havia sugerido ou criado e inserindo mais informações das condições laborais (acostando-se, pois, ao laudo técnico e, de certa forma, o suprindo)". (in PPP na aposentadoria especial. São Paulo: LTr, 2003. p. 17)
No mesmo sentido, a jurisprudência (grifadas):
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OBSCURIDADE. CONTRADIÇÃO. RUÍDO. SEM LAUDO. AGENTES QUÍMICOS. PARCIALMENTE ACOLHIDOS. 1. O perfil profissiográfico previdenciário elaborado conforme as exigências legais, supre a juntada aos autos do laudo técnico. 2. Considera-se especial o período trabalhado sob a ação de agentes químicos, conforme o D. 53.831/64, item 1.2.9. (AC 2008.03.99.032757-4/SP, TRF da 3.ª Região, Décima Turma, Unânime, Relatora Juíza Giselle França, DJF3 24.09.2008).
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. CONVERSÃO DE TEMPO ESPECIAL EM COMUM. SOLDADOR, VIGIA E TRABALHADOR EXPOSTO A RUÍDO. * Omissis. * O perfil profissiográfico previdenciário - PPP, elaborado com base em laudo técnico pericial, a ser mantido pela empresa nos termos da lei 9032/95 supre a juntada aos autos do laudo, pois consigna detalhadamente as suas conclusões. (AC 2007.03.99.028576-9/SP, TRF da 3.ª Região, Décima Turma, Unânime, Relatora Juíza Louise Filgueiras, DJU 09.01.2008).
Cumpre ressaltar que as perícias realizadas por similaridade ou por aferição indireta das circunstâncias de trabalho têm sido amplamente aceitas em caso de impossibilidade da coleta de dados in loco para a comprovação da atividade especial. Nesse sentido, vejam-se os seguintes precedentes desta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. CONVERSÃO DO TEMPO ESPECIAL EM COMUM. PERÍCIA INDIRETA OU POR SIMILITUDE CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. (...) 3. A perícia técnica deve ser realizada de forma indireta, em empresa similar àquela em que laborou o segurado, quando não há meio de reconstituir as condições físicas do local de trabalho em face do encerramento das suas atividades. (...) (AC 2003.70.00.036701-4/PR, TRF-4, Sexta Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, DE 14.09.2007)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. TRABALHO DESENVOLVIDO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. PROVAS PERICIAL E TESTEMUNHAL. 1. Esta Corte tem entendimento firmado no sentido de ser possível a realização de prova pericial indireta, em empresa similar a que laborava o autor. 2. Descabe a produção de prova testemunhal no presente caso, sobretudo por tratar a hipótese do reconhecimento da especialidade do trabalho desenvolvido pelo segurado, fato que depende de conhecimento técnico para sua correta apuração. (...) (AI 2005.04.01.034174-0, Quinta Turma, Rel. Luiz Antonio Bonat, publicado em18.01.2006)
PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. APOSENTADORIA ESPECIAL. PERÍCIA INDIRETA. POSSIBILIDADE. 1. É admitida a perícia indireta como meio de prova diante da impossibilidade da coleta de dados in loco, para a comprovação da atividade especial. (...) (AI 2002.04.01.049099-9, Sexta Turma, Rel. José Paulo Baltazar Júnior, publicado em 16.03.2005)
Especificamente quanto ao agente nocivo ruído, o Quadro Anexo do Decreto n.º 53.831, de 25.03.1964, o Anexo I do Decreto n.º 83.080, de 24.01.1979, o Anexo IV do Decreto n.º 2.172, de 05.03.1997, e o Anexo IV do Decreto n.º 3.048, de 06.05.1999, alterado pelo Decreto n.º 4.882, de 18.11.2003, consideram insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 80, 85 e 90 decibéis, de acordo com os Códigos 1.1.6, 1.1.5, 2.0.1 e 2.0.1:
- Até 05.03.97: Anexo do Decreto n.º 53.831/64 (Superior a 80 dB) e Anexo I do Decreto n.º 83.080/79 (Superior a 90 dB).
- De 06.03.97 a 06.05.99: Anexo IV do Decreto n.º 2.172/97 (Superior a 90 dB).
- De 07.05.99 a 18.11.2003 Anexo IV do Decreto n.º 3.048/99, na redação original (Superior a 90 dB).
- A partir de 19.11.2003: Anexo IV do Decreto n.º 3.048/99 com a alteração introduzida pelo Decreto n.º 4.882/2003 (Superior a 85 dB).
Embora a redução posterior do nível de ruído admissível como prejudicial à salubridade tecnicamente faça presumir ser ainda mais gravosa a situação prévia (a evolução das máquinas e das condições de trabalho tendem a melhorar as condições de trabalho), pacificou o Superior Tribunal de Justiça que devem limitar o reconhecimento da atividade especial os estritos parâmetros legais vigentes em cada época (REsp 1333511 - CASTRO MEIRA, e REsp 1381498 - MAURO CAMPBELL).
Revisando a jurisprudência desta Corte, providência do colegiado para a segurança jurídica da final decisão esperada, passou-se a adotar o critério da Corte Superior, de modo que é tida por especial a atividade exercida com exposição a ruídos superiores a 80 decibéis até a edição do Decreto 2.171/1997. Após essa data, o nível de ruído considerado prejudicial é o superior a 90 decibéis. Com a entrada em vigor do Decreto 4.882, em 18.11.2003, o limite de tolerância ao agente físico ruído foi reduzido para 85 decibéis (AgRg no REsp 1367806, Relator Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, vu 28/05/2013), desde que aferidos esses níveis de pressão sonora por meio de perícia técnica, trazida aos autos ou noticiada no preenchimento de formulário expedido pelo empregador.
Quanto aos agentes químicos, segundo o código 1.0.0 do Anexo IV do Decreto 3.048/99, como regra geral, o que determina o direito ao benefício é a exposição do trabalhador ao agente nocivo presente no ambiente de trabalho e no processo produtivo, em nível de concentração superior aos limites de tolerância estabelecidos. Não obstante, conforme o art. 278, § 1.º, inciso I, da IN INSS/PRES 77/15, mantida, neste item, pela subsequente IN 85/16, a avaliação continua sendo qualitativa no caso do benzeno (Anexo 13-A da NR-15) e dos agentes químicos previstos, simultaneamente, no Anexo IV do Decreto 3.048/99 e no Anexo 13 da NR-15, como é o caso dos hidrocarbonetos aromáticos. De fato, relativamente aos agentes químicos constantes no Anexo 13 da NR-15, os riscos ocupacionais gerados não requerem a análise quantitativa de sua concentração ou intensidade máxima e mínima no ambiente de trabalho, dado que são caracterizados pela avaliação qualitativa. Ao contrário do que ocorre com alguns agentes agressivos, como, v.g., o ruído, calor, frio ou eletricidade, que exigem sujeição a determinados patamares para que reste configurada a nocividade do labor, no caso dos tóxicos orgânicos e inorgânicos, a exposição habitual, rotineira, a tais fatores insalutíferos é suficiente para tornar o trabalhador vulnerável a doenças ou acidentes (APELREEX nº 2002.70.05.008838-4, Relator Juiz Federal Hermes Siedler da Conceição Júnior, Quinta Turma, D.E. 10.05.2010; EINF 5000295-67.2010.404.7108, Relator p/ Acórdão Desembargador Federal Luiz Carlos de Castro Lugon, Terceira Seção, julgado em 11.12.2014).
Do caso em análise
O período controverso em que se pretende o reconhecimento da atividade como especial está assim detalhado:
Período(s): | a) 29/04/1995 a 16/12/2003; b) 12/06/2006 a 18/09/2013. |
Empresa: | a) Paulo Renato Carvalho; b) Transportadora Nossa Senhora de Caravaggio Ltda. |
Função: | a) Motorista; b) Motorista Caminhão Tanque. |
Atividades: | a) Motorista de caminhão Truck. Conduzia o caminhão, ajudava na carga e descarga das mercadorias. Era responsável pela manutenção do caminhão;b) Operou em atividade de motorista de caminhão. Realizou transporte de líquidos combustíveis inflamáveis. Realizou transportes até posto de gasolina, desde o depósito de inflamáveis. Consertou bombas para o posto de gasolina. Transportou produtos químicos até a cidade de Belo Horizonte, como produtos de curtume e líquidos inflamáveis derivados de petróleo. |
Agente(s) nocivo(s): | Ruído de 88,6 dB(A), penosidade e periculosidade, conforme Laudo Pericial Judicial. |
Enquadramento legal: | Ruído: códigos 1.1.6 do Quadro Anexo do Decreto n.º 53.831/64 e 1.1.5 do Anexo I do Decreto n.º 83.080/79 (ruído acima de 80 dB(A), limite vigente nos intervalos anteriores a 06.03.1997); código 2.0.1 do Anexo IV do Decreto n.º 3.048/99, com a redação original (ruído acima de 90 dB(A), limite vigente nos intervalos entre 06.03.1997 e 18.11.2003) e mesmo dispositivo com a alteração introduzida pelo Decreto n.º 4.882/2003 (ruído acima de 85 dB(A), limite vigente nos intervalos posteriores a 18.11.2003).
Penosidade: conforme estabelecido pela 3ª Seção deste Tribunal, no julgamento do IAC TRF4 n.° 5, processo 50338889020184040000, o risco de violência física caracteriza a penosidade das atividades de motorista ou cobrador de ônibus, que deve ser admitida com base na Súmula nº 198 do TFR.
Periculosidade por exposição a inflamáveis: item "i" (transporte de inflamáveis líquidos e gasosos liquefeitos em caminhão-tanque) do Anexo II (Atividades e Operações Perigosas com Inflamáveis) da Norma Regulamentadora 16 do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). |
Meios de prova: | CTPS (evento 5, INIC1, fls. 24 a 26 e INIC2, fls. 01 a 03); DSS-8030 (evento 5, INIC4, fl. 11); PPP (evento 5, INIC4, fl. 12/15); Laudo Pericial Judicial (evento 6, RÉPLICA4, fls. 03 a 15). |
Conclusão: | Conforme o Laudo judicial acostado nos autos (evento 6, RÉPLICA4), é possível o enquadramento da atividade do autor em especial em todos períodos controversos. Em que pese o referido Laudo tenha sido omisso quanto a empresa Paulo Renato Carvalho, este também deve ser aplicado ao período laborado pelo autor nesta empresa, pois, conforme o próprio perito, em e-mail (evento 6, RÉPLICA4, fl. 23), foi entendido que "o item 7 do parecer técnico do laudo original é pertinente e aplicável a exposição do autor junto a empresa Paulo Renato Carvalho."
Assim constou no item 7 do parecer técnico do Laudo Pericial Judicial (evento 6, RÉPLICA4):
(...)
7 - PARECER TÉCNICO
Pelo exposto neste Laudo, verificou-se exposição Penosa e Especial ao reclamante nos seguintes casos:
Constata-se que o autor esteve exposto a Atividade de Trabalho Especial Penosa conforme o Decreto 53.831 de 1964 no seu item 2.4.4 nos seguintes períodos.
Constata-se que o autor esteve exposto a Atividade de Trabalho Periculosa conforme o Artigo 193 da Consolidação das Leis do Trabalho CLT, para o Agente roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial.
Agente ruído conforme item 1.1.6 do decreto 53831/64 e item 2.0.1 do decreto 3048/99 atualizado pelo decreto 4882/03.
Desse modo, foi devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial pela parte autora nos períodos antes indicados em virtude de sua exposição, de forma habitual e permanente, aos agentes agressivos acima mencionados.
Assim, nego provimento ao recurso do INSS, mantendo a sentença, no ponto. |
Da penosidade
No presente feito é controvertida a possibilidade de reconhecimento da especialidade dos períodos de desempenho de atividade de motorista ou cobrador de ônibus prestados após 28/04/1995, data de início da vigência da Lei 9.032/1995, que extinguiu a possibilidade reconhecimento de atividade especial por simples enquadramento de categoria profissional.
Essa questão foi objeto do IAC TRF4 n.° 5, processo n.° 50338889020184040000, no qual a Terceira Seção deste Tribunal, em sessão de julgamento concluída em 25/11/2020, fixou tese favorável ao reconhecimento do caráter especial das atividades de motorista ou de cobrador de ônibus em virtude da penosidade, mesmo após a extinção da previsão legal de enquadramento por categoria profissional pela Lei 9.032/1995. Transcrevo a tese firmada:
Deve ser admitida a possibilidade de reconhecimento do caráter especial das atividades de motorista ou de cobrador de ônibus em virtude da penosidade, ainda que a atividade tenha sido prestada após a extinção da previsão legal de enquadramento por categoria profissional pela Lei 9.032/1995, desde que tal circunstância seja comprovada por meio de perícia judicial individualizada, possuindo o interessado direito de produzir tal prova.
Transcrevo também a ementa do referido julgamento, de minha relatoria, em razão de sintetizar toda a questão objeto do debate:
PREVIDENCIÁRIO. INCIDENTE DE ASSUNÇÃO DE COMPETÊNCIA - IAC. TEMA TRF4 N.° 5. ATIVIDADE ESPECIAL. MOTORISTA OU COBRADOR DE ÔNIBUS. RECONHECIMENTO DA PENOSIDADE APÓS A EXTINÇÃO DA PREVISÃO LEGAL DE ENQUADRAMENTO POR CATEGORIA PROFISSIONAL PELA LEI 9.032/1995. POSSIBILIDADE.
1. O benefício de aposentadoria especial foi previsto pela primeira vez no ordenamento jurídico nacional em 1960, pela Lei Orgânica da Previdência Social, a Lei 3.087/1960, que instituiu o requisito de prestação de uma quantidade variável (15, 20 ou 25 anos) de tempo de contribuição em exercício de atividades insalubres, perigosas ou penosas.
2. Apesar de contar com previsão no próprio texto constitucional, que garante aos trabalhadores o pagamento do adicional correspondente na seara trabalhista (art. 7º, XXIII, CF/1988), até o presente momento não houve a regulamentação da penosidade, motivo pelo qual torna-se uma tarefa bastante difícil a obtenção de seu conceito.
3. Pela conjugação dos estudos doutrinários, das disposições legais e dos projetos legislativos existentes, é possível delimitar-se o conceito de penosidade como o desgaste à saúde do trabalhador ocorrido na prestação da atividade profissional, em virtude da necessidade de dispêndio de esforço excessivo, da necessidade de concentração permanente e contínua, e/ou da necessidade de manutenção constante de postura.
4. Não há discussões acerca da possibilidade de reconhecimento da penosidade nas situações previstas no Anexo IV do Decreto 53.831/1964, que configuram hipóteses de enquadramento por categoria profissional, admitido até a vigência da Lei 9.032/1995, sendo que as controvérsias ocorrem quanto à possibilidade de reconhecimento da penosidade nos intervalos posteriores a essa data.
5. O requisito exigido para o reconhecimento da especialidade do tempo de contribuição prestado a partir da vigência da Lei 9.032/1995 e até a superveniência da Emenda Constitucional 103/2019 - condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física - não exclui a possibilidade de inclusão de atividades exercidas em situação de periculosidade e penosidade.
6. Essa posição acabou sendo sancionada pelo STJ no julgamento do REsp 1.306.113/SC, admitido como recurso representativo de controvérsia repetitiva sob o Tema n° 534, em que, embora a questão submetida a julgamento fosse a possibilidade de configuração da especialidade do trabalho exposto ao agente perigoso eletricidade, a tese fixada ultrapassa os limites do agente eletricidade, e da própria periculosidade, permitindo o reconhecimento da especialidade do labor prestado sob exposição a outros fatores de periculosidade, à penosidade, e até mesmo a agentes insalubres não previstos em regulamento, desde que com embasamento "na técnica médica e na legislação correlata".
7. Admitida a possibilidade de reconhecimento da penosidade após a vigência da Lei 9.032/1995, esse reconhecimento deve se dar com base em critérios objetivos analisados no caso concreto por meio de perícia técnica, uma vez que extinta a possibilidade de mero enquadramento por categoria profissional.
8. Tratando-se de circunstância que, embora possua previsão constitucional, carece de regulamentação legislativa, sequer é cogitada pelos empregadores na confecção dos formulários habitualmente utilizados para a comprovação de atividade especial, motivo pelo qual é necessário que os órgãos judiciais garantam o direito dos segurados à produção da prova da alegada penosidade. Ademais, considerando que a tese encaminhada por esta Corte vincula o reconhecimento da penosidade à identificação dessa circunstância por perícia técnica, essa constitui, então, o único meio de prova à disposição do segurado.
9. Tese fixada nos seguintes termos: deve ser admitida a possibilidade de reconhecimento do caráter especial das atividades de motorista ou de cobrador de ônibus em virtude da penosidade, ainda que a atividade tenha sido prestada após a extinção da previsão legal de enquadramento por categoria profissional pela Lei 9.032/1995, desde que tal circunstância seja comprovada por meio de perícia judicial individualizada, possuindo o interessado direito de produzir tal prova.
10. Cabendo ao órgão colegiado julgar também o recurso que dá origem à assunção de competência admitida, conforme disposto no art. 947, §2º do CPC, no caso concreto deve ser dado provimento à preliminar da parte autora para anular a sentença e determinar o retorno do feito ao Juízo de origem, para que se proceda à reabertura da instrução processual.
(TRF4 5033888-90.2018.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 27/11/2020)
Ainda que a função de motorista ou ajudante de caminhão não tenha sido abrangida pelo IAC julgado por este Tribunal, em razão da necessidade de conformação da extensão do incidente aos limites objetivos da lide originária, reputo que não há impedimentos à aplicação analógica da solução determinada pela Corte também para esses trabalhadores, uma vez que se encontram expostos à situação fática semelhante, plenamente alcançada pelos fundamentos determinantes do precedente invocado.
Assim, em síntese, este Tribunal fixou tese favorável à admissão da circunstância da penosidade como fator de reconhecimento do caráter especial das atividades de motorista e cobrador de ônibus e de motorista e ajudante de caminhão nos intervalos laborados após a extinção da possibilidade de enquadramento por categoria profissional pela Lei 9.032/1995, definindo também que esse reconhecimento depende de comprovação por meio de exame pericial específico.
No caso concreto foi realizada perícia judicial e o profissional responsável pela diligência analisou efetivamente a circunstância da penosidade, mesmo após a extinção da possibilidade de enquadramento por categoria profissional.
Dos Equipamentos de Proteção Individual
A utilização de Equipamentos de Proteção Individual é irrelevante para o reconhecimento da especialidade dos períodos laborados até 03 de dezembro de 1998, data da publicação da MP 1.729/98, convertida na Lei 9.732/98, que alterou o § 2.º do artigo 58 da Lei 8.213/91, determinando que o laudo técnico contenha informação sobre a existência de tecnologia de proteção individual que diminua a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância e recomendação sobre a sua adoção pelo estabelecimento respectivo.
No caso, embora haja períodos posteriores à data acima mencionada, também quanto a eles não há que se falar em afastamento da especialidade em razão de EPIs, uma vez que:
a) o reconhecimento do exercício de atividade especial se deu em virtude da exposição da parte autora ao agente agressivo ruído, a respeito do qual o STF decidiu, no julgamento do ARE 664.335 (tema 555, com repercussão geral) que a declaração do empregador, em PPP, quanto à eficácia dos EPIs, não descaracteriza o tempo de serviço especial;
b) o reconhecimento do exercício de atividade especial se deu em virtude da exposição da parte autora à periculosidade, circunstância em que, conforme decidido no julgamento do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas - IRDR - n.º 15 desta Corte, AC 5054341-77.2016.4.04.0000/SC, não se cogita de afastamento da especialidade pelo uso de EPI.
Desse modo, considerando a impossibilidade de afastamento dos riscos decorrentes da exposição do trabalhador à periculosidade, a questão relativa à responsabilidade do segurado, contribuinte individual, pelo fornecimento e utilização de EPIs perde a relevância.
Da fonte de custeio
A tese do INSS de impossibilidade de reconhecimento da especialidade das atividades da parte autora, em razão de a empresa fornecer equipamentos de proteção individual, ficando dispensada da contribuição adicional para o financiamento do benefício de aposentadoria especial, caso em que a concessão da Aposentadoria Especial significaria a criação de benefício sem a devida fonte de custeio não deve ser acolhida.
O art. 195, § 5.º, da Constituição Federal/88 embora disponha que nenhum benefício da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total, em se tratando de concessão de Aposentadoria Especial ou de conversão de tempo exercido sob condições especiais em tempo de trabalho comum, previstas nos artigos 57 e 58 da Lei de Benefícios, existe específica indicação legislativa de fonte de custeio: o §6.º do mesmo art. 57 supracitado, combinado com o art. 22, inc. II, da Lei n.º 8.212/91, os quais possuem o seguinte teor:
Art. 57 - (...) § 6.º - O benefício previsto neste artigo será financiado com os recursos provenientes da contribuição de que trata o inc. II do art. 22 da Lei 8.212, de 24/07/91, cujas alíquotas serão acrescidas de 12, 9 ou 6 pontos percentuais, conforme a atividade exercida pelo segurado a serviço da empresa permita a concessão de aposentadoria especial após 15, 20 ou 25 anos de contribuição, respectivamente.
Art. 22 - (...) II - para o financiamento do benefício previsto nos arts. 57 e 58 da Lei 8.213/91, e daqueles concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho, sobre o total das remunerações pagas ou creditadas, no decorrer do mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos:
a) 1% para as empresas em cuja atividade preponderante o risco de acidentes do trabalho seja considerado leve;
b) 2% para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja considerado médio;
c) 3% para as empresas em cuja atividade preponderante esse risco seja considerado grave.
O fato de a lei indicar como fonte do financiamento da Aposentadoria Especial e da conversão de tempo especial em comum as contribuições a cargo da empresa não é óbice, pois o art. 195, caput e incisos, da Constituição Federal/88, dispõem que a seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e, dentre outras ali elencadas, das contribuições sociais do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei.
Por fim, a rigor sequer haveria necessidade de específica indicação legislativa da fonte de custeio, uma vez que se trata de benefício previdenciário previsto pela própria Constituição Federal (art. 201, § 1.º c/c art. 15 da EC n.º 20/98), hipótese em que sua concessão independe de identificação da fonte de custeio (STF, RE n.º 220.742-6, Segunda Turma, Rel. Ministro Néri da Silveira, julgado em 03.03.1998; RE n.º 170.574, Primeira Turma, Rel. Ministro Sepúlveda Pertence, julgado em 31.05.1994; AI n.º 614.268 AgR, Primeira Turma, Rel. Ministro Ricardo Lewandowski, julgado em 20.11.2007; ADI n.° 352-6, Plenário, Rel. Ministro Sepúlveda Pertence, julgada em 30.10.1997; RE n.º 215.401-6, Segunda Turma, Rel. Ministro Néri da Silveira, julgado em 26.08.1997; AI n.º 553.993, Rel. Ministro Joaquim Barbosa, decisão monocrática, DJ de 28.09.2005), regra esta dirigida à legislação ordinária posterior que venha a criar novo benefício ou a majorar e estender benefício já existente.
Ainda que conste o código zero no campo do PPP relativo à GFIP, não há impedimento à consideração da atividade como especial, em que pese o INSS entender que tal reconhecimento ficaria sem custeio específico, ante a ausência das contribuições dispostas nos arts. 57, §§ 6.º e 7.º, da Lei n.º 8.213/91, e art. 22, inc. II, da Lei n.º 8.212/91, porquanto, se estiver comprovado o trabalho em condições adversas à saúde do trabalhador, a mera ausência do código ou o preenchimento equivocado no referido documento não obsta o direito do trabalhador ao cômputo do tempo especial, uma vez que o INSS possui os meios necessários para sanar eventual irregularidade constatada na empresa, não podendo o segurado ser penalizado por falha do empregador.
Quanto ao recolhimento das contribuições estabelecidas nos arts. 57, §§ 6.º e 7.º da Lei n.º 8.213/91 e art. 22, inc. II, da Lei n.º 8.212/91, cabe ao empregador efetuá-lo, conforme dispõe o art. 30, inc. I, alíneas a e b, da Lei n.º 8.212/91:
Art. 30. A arrecadação e o recolhimento das contribuições ou de outras importâncias devidas à Seguridade Social obedecem às seguintes normas:
I - a empresa é obrigada a:
a) arrecadar as contribuições dos segurados empregados e trabalhadores avulsos a seu serviço, descontando-as da respectiva remuneração;
b) recolher os valores arrecadados na forma da alínea a deste inciso, a contribuição a que se refere o inciso IV do art. 22 desta Lei, assim como as contribuições a seu cargo incidentes sobre as remunerações pagas, devidas ou creditadas, a qualquer título, aos segurados empregados, trabalhadores avulsos e contribuintes individuais a seu serviço até o dia 20 (vinte) do mês subsequente ao da competência;
Diante dessas considerações, deve ser mantido o reconhecimento da especialidade do tempo de serviço sujeito a condições nocivas à saúde prestado pela parte autora.
Da conversão do tempo especial em comum
Esta Corte já firmou entendimento no sentido de que é possível a conversão do tempo especial para comum, mesmo com relação aos períodos anteriores ao advento da Lei 6.887, de 10.12.1980, desde que os requisitos para a outorga da inativação tenham se perfectibilizado após a sua edição. Nesse sentido o julgamento proferido pelo Juiz Federal Loraci Flores de Lima, em Embargos de Declaração, no processo de 0027300-90.2007.404.7000, Sessão de 07.07.2010, decisão unânime.
No que tange à possibilidade de conversão de tempo de serviço especial prestado a partir de 28.05.1998, a Medida Provisória 1.663/98 revogou o §5.º do art. 57 da Lei 8.213/91. A Lei 9.711/98, todavia, deixou de convalidar a prefalada revogação, por via expressa ou tácita, motivo pelo qual plena é a vigência dos artigos 57 e 58 da Lei de Benefícios e, por conseguinte, possível a conversão de tempo de serviço especial em comum inclusive após 28.05.1998.
Do Fator de Conversão
O fator de conversão do tempo especial em comum a ser utilizado é aquele previsto na legislação aplicada na data concessão do benefício e no cálculo de sua renda mensal inicial, e não o contido na legislação vigente quando o serviço foi prestado. A questão, inclusive já foi pacificada pelo Superior Tribunal de Justiça em Recurso Especial Repetitivo (REsp 1151363/MG, Rel. Min. Jorge Mussi, Terceira Seção, julgado em 23.03.2011, DJe 05.04.2011).
Assim, admitida a especialidade da atividade desenvolvida no(s) período(s) antes indicado(s), impõe-se a conversão pelo fator multiplicador 1,4, chegando-se ao seguinte acréscimo: 06 anos, 04 meses e 11 dias.
Dirimida a questão acerca da comprovação do tempo de serviço controvertido, cabe a análise do direito à aposentadoria pretendida.
CONTAGEM DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO
TEMPO DE SERVIÇO COMUM (com conversões)
Data de Nascimento | 29/04/1958 |
Sexo | Masculino |
DER | 18/09/2013 |
Nº | Nome / Anotações | Início | Fim | Fator | Tempo | Carência |
1 | rural | 29/04/1970 | 30/11/1978 | 1.00 | 8 anos, 7 meses e 2 dias | 0 |
2 | urbano | 01/12/1978 | 16/06/1979 | 1.00 | 0 anos, 6 meses e 16 dias | 7 |
3 | rural | 17/06/1979 | 15/08/1979 | 1.00 | 0 anos, 1 meses e 29 dias | 0 |
4 | urbano | 16/08/1979 | 15/01/1981 | 1.00 | 1 anos, 5 meses e 0 dias | 18 |
5 | rural | 16/01/1981 | 30/08/1990 | 1.00 | 9 anos, 7 meses e 15 dias | 0 |
6 | urbano | 01/09/1990 | 28/04/1995 | 1.00 | 4 anos, 7 meses e 28 dias | 55 |
7 | especial | 29/04/1995 | 16/12/2003 | 1.40 Especial | 8 anos, 7 meses e 18 dias + 3 anos, 5 meses e 13 dias = 12 anos, 1 meses e 1 dias | 105 |
8 | urbano | 01/08/2003 | 31/08/2003 | 1.00 | 0 anos, 0 meses e 0 dias (Ajustada concomitância) | 0 |
9 | urbano | 01/02/2005 | 31/03/2005 | 1.00 | 0 anos, 2 meses e 0 dias | 2 |
10 | urbano | 01/06/2005 | 30/06/2005 | 1.00 | 0 anos, 1 meses e 0 dias | 1 |
11 | urbano | 01/08/2005 | 31/08/2005 | 1.00 | 0 anos, 1 meses e 0 dias | 1 |
12 | especial | 12/06/2006 | 18/09/2013 | 1.40 Especial | 7 anos, 3 meses e 7 dias + 2 anos, 10 meses e 26 dias = 10 anos, 2 meses e 3 dias | 88 |
Marco Temporal | Tempo de contribuição | Carência | Idade | Pontos (Lei 13.183/2015) |
Até a data da EC nº 20/98 (16/12/1998) | 30 anos, 1 meses e 1 dias | 125 | 40 anos, 7 meses e 17 dias | inaplicável |
Pedágio (EC 20/98) | 0 anos, 0 meses e 0 dias | |||
Até a data da Lei 9.876/99 (28/11/1999) | 31 anos, 5 meses e 0 dias | 136 | 41 anos, 6 meses e 29 dias | inaplicável |
Até a DER (18/09/2013) | 47 anos, 7 meses e 4 dias | 277 | 55 anos, 4 meses e 19 dias | inaplicável |
- Aposentadoria por tempo de serviço / contribuição
Nessas condições, em 16/12/1998, o segurado tem direito adquirido à aposentadoria proporcional por tempo de serviço (regras anteriores à EC 20/98), com o cálculo de acordo com a redação original do art. 29 da Lei 8.213/91 e com coeficiente de 70% (art. 53, inc. I da Lei 8.213/91).
Em 28/11/1999, o segurado não tem direito à aposentadoria por tempo de contribuição, ainda que proporcional (regras de transição da EC 20/98), porque não preenche a idade mínima de 53 anos.
Em 18/09/2013 (DER), o segurado tem direito à aposentadoria integral por tempo de contribuição (CF/88, art. 201, § 7º, inc. I, com redação dada pela EC 20/98). O cálculo do benefício deve ser feito de acordo com a Lei 9.876/99, com a incidência do fator previdenciário, porque a DER é anterior a 18/06/2015, dia do início da vigência da MP 676/2015, que incluiu o art. 29-C na Lei 8.213/91.
Registre-se que a influência de variáveis, como valor dos salários de contribuição, período básico de cálculo a ser considerado, coeficiente de cálculo utilizado, diferença de acréscimo de coeficiente e incidência ou não de fator previdenciário, conforme seja considerado o tempo apurado até 16.12.1998, até 28.11.1999 ou até a data do requerimento, não permite identificar de plano qual a alternativa mais benéfica à parte autora. De qualquer sorte, está claro o seu direito à majoração da aposentadoria que já recebe e deve, por ocasião da revisão, ser observada a renda mais vantajosa.
Convém salientar que o próprio INSS ao processar pedidos de aposentadoria, quando cabível, faz simulações, considerando as hipóteses já referidas e concede o benefício mais benéfico. Se a própria Administração tem essa conduta, não tem sentido que em juízo se proceda de maneira diversa. Da mesma maneira tem o segurado o direito à revisão do seu benefício na forma mais vantajosa. Salienta-se que a DER serviu apenas para definir a data a partir da qual o benefício foi devido.
Com o intuito de evitar possíveis discussões acerca da natureza jurídica do provimento jurisdicional deve ser esclarecido que não há falar em acórdão condicional, pois o comando é único: determinar que o INSS revise o benefício com o cálculo que for mais vantajoso ao segurado.
Da prescrição quinquenal
O parágrafo único do art. 103 da Lei 8213/91 (redação dada pela Lei 9.528/97) dispõe sobre a prescrição quinquenal das parcelas de benefícios não reclamados nas épocas próprias, podendo, inclusive, ser reconhecida, de ofício.
Não tendo transcorrido lapso superior a cinco anos entre o requerimento administrativo (18/09/2013) e o ajuizamento da ação (15/04/2015), não há parcelas atingidas pela prescrição.
Dos Consectários
A correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5.º e 6.º, da Lei 8.880/94);
- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da lei 8.213/91, na redação da Lei 11.430/06, precedida da MP 316, de 11.08.2006, e art. 31 da Lei 10.741/03, que determina a aplicação do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso).
A utilização da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública, que fora prevista na Lei 11.960/2009, que introduziu o art. 1º-F na Lei 9.494/1997, foi afastada pelo STF no julgamento do RE 870.947, Tema 810 da repercussão geral, o que restou confirmado no julgamento de embargos de declaração por aquela Corte, sem qualquer modulação de efeitos.
No julgamento do REsp 1.495.146, Tema 905 representativo de controvérsia repetitiva, o STJ, interpretando o precedente do STF, definiu quais os índices que se aplicariam em substituição à TR, concluindo que aos benefícios assistenciais deveria ser utilizado IPCA-E, conforme decidiu a Suprema Corte, e que, aos benefícios previdenciários voltaria a ser aplicável o INPC, uma vez que a inconstitucionalidade reconhecida restabeleceu a validade e os efeitos da legislação anterior, que determinava a adoção deste último índice, nos termos acima indicados.
A conjugação dos precedentes dos tribunais superiores resulta, assim, na aplicação do INPC aos benefícios previdenciários, a partir de abril 2006, reservando-se a aplicação do IPCA-E aos benefícios de natureza assistencial.
Importante ter presente, para a adequada compreensão do eventual impacto sobre os créditos dos segurados, que os índices em referência - INPC e IPCA-E tiveram variação muito próxima no período de julho de 2009 (data em que começou a vigorar a TR) e até setembro de 2019, quando julgados os embargos de declaração no RE 870947 pelo STF (IPCA-E: 76,77%; INPC 75,11), de forma que a adoção de um ou outro índice nas decisões judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação.
Os juros de mora devem incidir a partir da citação.
Até 29.06.2009, já tendo havido citação, deve-se adotar a taxa de 1% ao mês a título de juros de mora, conforme o art. 3.º do Decreto-Lei 2.322/1987, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo percentual aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/1997, na redação da Lei 11.960/2009, considerado, no ponto, constitucional pelo STF no RE 870947, decisão com repercussão geral.
Os juros de mora devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo legal em referência determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, AgRg no AgRg no Ag 1211604/SP).
Por fim, a partir de 09/12/2021, data da publicação da Emenda Constitucional n.º 113/2021, incidirá a determinação de seu art. 3.°, que assim dispõe:
Art. 3º Nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente.
Alteração, de ofício, quanto à taxa Selic.
Da sucumbência
Alterado o provimento da ação, sendo mínima a sucumbência da parte autora, incumbe ao INSS o pagamento da totalidade dos ônus processuais, nos termos do parágrafo único do art. 86 do CPC.
Das Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4.º, I, da Lei 9.289/96).
Tratando-se de feitos afetos à competência delegada, tramitados na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, a autarquia também é isenta do pagamento dessas custas (taxa única), de acordo com o disposto no art. 5.º, I, da Lei Estadual n.º 14.634/14, que institui a Taxa Única de Serviços Judiciais desse Estado, ressalvando-se que tal isenção não a exime da obrigação de reembolsar eventuais despesas judiciais feitas pela parte vencedora (parágrafo único, do art. 5.º). Salienta-se, ainda, que nessa taxa única não estão incluídas as despesas processuais mencionadas no parágrafo único do art. 2.º da referida lei, tais como remuneração de peritos e assistentes técnicos, despesas de condução de oficiais de justiça, entre outras.
Da Verba Honorária
Nas ações previdenciárias os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência".
No caso, tendo havido alteração da sentença, com acréscimo de proveito econômico à parte recorrente, a base de cálculo da verba honorária estende-se às parcelas vencidas até prolação do presente acórdão.
Logo, dou parcial provimento ao recurso do INSS, quanto ao ponto.
Incabível a majoração da verba honorária prevista no parágrafo 11 do art. 85 do CPC/2015, uma vez que tendo sido alterado o provimento da ação, com a redistribuição da sucumbência nesta instância, não subsiste a condenação originalmente fixada pela sentença, que constitui um dos requisitos estabelecidos pela Segunda Seção do STJ no julgamento do AgInt nos EREsp 1.539.725 – DF (DJe: 19.10.2017).
Da tutela específica
Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados nos artigos 497 e 536 do CPC/2015, e o fato de que, em princípio, a presente decisão não está sujeita a recurso com efeito suspensivo, o presente julgado deverá ser cumprido de imediato quanto à implantação do benefício concedido em favor da parte autora.
Dados para cumprimento: ( X ) Concessão ( ) Restabelecimento ( ) Revisão | |
NB | 162.208.343-9 |
Espécie | Aposentadoria Por Tempo de Contribuição |
DIB | 18/09/2013 |
DIP | No primeiro dia do mês da implantação do benefício. |
DCB | Não se aplica. |
RMI | A apurar. |
Observações | - |
Na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor da renda mensal atual desse benefício for superior ao daquele.
Faculta-se à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.
Requisite a Secretaria da 6ª Turma, à CEAB-DJ-INSS-SR3, o cumprimento da decisão e a comprovação nos presentes autos, no prazo de 20 (vinte) dias.
Prequestionamento
A fim de possibilitar o acesso às instâncias superiores, consideram-se prequestionadas as matérias constitucionais e legais suscitadas no recurso, nos termos dos fundamentos do voto, deixando de aplicar dispositivos constitucionais ou legais não expressamente mencionados e/ou havidos como aptos a fundamentar pronunciamento judicial em sentido diverso do que está declarado.
Dispositivo
Frente ao exposto, voto por corrigir, de ofício, erro material da sentença, dar parcial provimento aos recursos do INSS e da parte autora, e determinar o cumprimento imediato do acórdão com relação à implantação do benefício, via CEAB.
Documento eletrônico assinado por JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003466568v75 e do código CRC d5bd6e66.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5021960-16.2021.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APELANTE: LUIS VILMAR GEYER
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE RURAL. ATIVIDADE ESPECIAL. MOTORISTAS E COBRADORES DE ÔNIBUS, MOTORISTAS E AJUDANTES DE CAMINHÃO. IAC TRF4 N.° 5. POSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO DA PENOSIDADE APÓS A EXTINÇÃO DA PREVISÃO LEGAL DE ENQUADRAMENTO POR CATEGORIA PROFISSIONAL PELA LEI 9.032/1995. substâncias inflamáveis. periculosidade. EQUIPAMENTOS DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL. INAPLICABILIDADE. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. OPÇÃO PELo benefício MAIS VANTAJOSo. TUTELA ESPECÍFICA.
1. O tempo de serviço rural para fins previdenciários pode ser demonstrado através de início de prova material, desde que complementado por prova testemunhal idônea.
2. O reconhecimento de tempo de serviço prestado na área rural até 31.10.1991, para efeito de concessão de benefício no Regime Geral da Previdência Social, não está condicionado ao recolhimento das contribuições previdenciárias correspondentes, exceto para efeito de carência.
3. Apresentada a prova necessária a demonstrar o exercício de atividade sujeita a condições especiais, conforme a legislação vigente na data da prestação do trabalho, o respectivo tempo de serviço especial deve ser reconhecido.
4. A 3ª Seção deste Tribunal, no julgamento do IAC TRF4 n.° 5, processo 50338889020184040000, firmou tese favorável à admissão da penosidade como fator de reconhecimento do caráter especial das atividades de motoristas e cobradores de ônibus - entendimento aplicável, por analogia, aos motoristas e ajudantes de caminhão - também nos intervalos laborados após a extinção da possibilidade de enquadramento por categoria profissional pela Lei 9.032/1995.
5. Conforme estabelecido no julgamento do IAC TRF4 n.° 5, processo 50338889020184040000, o risco de violência física caracteriza a penosidade das atividades de motorista ou cobrador de ônibus e, por analogia, de motoristas de caminhão.
6. Comprovado o exercício de atividade em área de risco, com a consequente exposição do segurado a substâncias inflamáveis, deve ser reconhecido o respectivo tempo de serviço como especial em razão da periculosidade, com base no Anexo 2 da NR 16.
7. Sendo caso de enquadramento por categoria profissional ou de reconhecimento da especialidade em virtude de periculosidade, não se cogita do afastamento da especialidade pelo uso de Equipamentos de Proteção Individual (IRDR TRF4 n.º 15, AC 5054341-77.2016.4.04.0000/SC).
8. Preenchidos os requisitos de tempo de contribuição e carência até a promulgação da Emenda Constitucional 103/2019, é devida à parte autora a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, podendo optar pela forma de benefício mais vantajoso que fizer jus.
9. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 497 do CPC/15, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, corrigir, de ofício, erro material da sentença, dar parcial provimento aos recursos do INSS e da parte autora, e determinar o cumprimento imediato do acórdão com relação à implantação do benefício, via CEAB, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 11 de outubro de 2022.
Documento eletrônico assinado por JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003466569v6 e do código CRC 4873c14d.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Data e Hora: 14/10/2022, às 1:8:30
Conferência de autenticidade emitida em 22/10/2022 04:01:06.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO ORDINÁRIA DE 11/10/2022
Apelação Cível Nº 5021960-16.2021.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PRESIDENTE: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PROCURADOR(A): FÁBIO BENTO ALVES
SUSTENTAÇÃO ORAL PRESENCIAL: JOAO MARCOS DUARTE GUARA por LUIS VILMAR GEYER
APELANTE: LUIS VILMAR GEYER
ADVOGADO: JOAO MARCOS DUARTE GUARA (OAB RS084845)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 11/10/2022, na sequência 40, disponibilizada no DE de 30/09/2022.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CORRIGIR, DE OFÍCIO, ERRO MATERIAL DA SENTENÇA, DAR PARCIAL PROVIMENTO AOS RECURSOS DO INSS E DA PARTE AUTORA, E DETERMINAR O CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO COM RELAÇÃO À IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO, VIA CEAB.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 22/10/2022 04:01:06.