APELAÇÃO CÍVEL Nº 5040551-36.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | RODRIGO KOEHLER RIBEIRO |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | VALTUIR CLOVIS MERBOLD |
ADVOGADO | : | ALAN RODRIGO PUPIN |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. RECONHECIMENTO. REQUISITOS PREENCHIDOS. CATEGORIA PROFISSIONAL. VIGILANTE.
1. Para caracterizar o início de prova material, não é necessário que os documentos apresentados comprovem, ano a ano, o exercício da atividade rural, seja porque se deve presumir a continuidade nos períodos imediatamente próximos, sobretudo no período anterior à comprovação, à medida que a realidade em nosso país é a migração do meio rural ao urbano, e não o inverso, seja porque é inerente à informalidade do trabalho campesino a escassez documental.
2. No caso concreto, comprovado em parte o labor rural em regime de economia familiar, mediante a produção de início de prova material, corroborada por prova testemunhal idônea, a parte autora faz jus à averbação do respectivo tempo de serviço.
3. O aproveitamento do tempo de atividade rural exercido até 31 de outubro de 1991, independentemente do recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias e exceto para efeito de carência, está expressamente autorizado e previsto pelo art. 55, § 2º, da Lei n.º 8.213/91, e pelo art. 127, inc. V, do Decreto n.º 3.048/99.
4. Uma vez exercida atividade enquadrável como especial, sob a égide da legislação que a ampara, o segurado adquire o direito ao reconhecimento como tal e ao acréscimo decorrente da sua conversão em tempo de serviço comum no âmbito do Regime Geral de Previdência Social.
5. A atividade de vigia/vigilante deve ser considerada especial por equiparação à categoria profissional de "guarda" até 28/04/1995.
6. Demonstrado o exercício de atividade perigosa (vigia, fazendo uso de arma de fogo) em condições prejudiciais à saúde ou à integridade física - risco de morte -, é possível o reconhecimento da especialidade após 28/04/1995.
7. Merece acolhimento o pedido de desistência formulado antes da prolação da sentença, mormente quando o INSS manifestou concordância com o requerimento.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação do autor, bem como por negar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 22 de novembro de 2016.
Rodrigo Koehler Ribeiro
Relator
| Documento eletrônico assinado por Rodrigo Koehler Ribeiro, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8584889v5 e, se solicitado, do código CRC A815A903. | |
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| Signatário (a): | Rodrigo Koehler Ribeiro |
| Data e Hora: | 29/11/2016 17:48 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5040551-36.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | RODRIGO KOEHLER RIBEIRO |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | VALTUIR CLOVIS MERBOLD |
ADVOGADO | : | ALAN RODRIGO PUPIN |
RELATÓRIO
Trata-se de apelações interpostas pelo INSS e pela parte autora contra sentença que julgou parcialmente procedentes os pedidos formulados na inicial para (evento 55):
condenar o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS a:
a) averbar a conversão judicial do período de 01/01/1994 a 30/04/2001 e de 01/05/2001 a 28/11/2012, que tiveram um acréscimo de 06 anos, 6 meses e 29 dias e que deverão ser averbados para computo pelo INSS.
Ante a sucumbência mínima do réu, condeno o autor ao pagamento das custas e despesas processuais e honorários advocatícios ao patrono do réu observando-se que se trata o autor de beneficiário da assistência judiciária gratuita.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Posteriormente, arquive-se.
A parte autora postula a reforma do decisum, para que fosse homologada a desistência quanto ao pedido de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição. Além disso, argumentou fazer jus a averbação do tempo de labor rural no período de 26/11/1982 a 30/11/1988.
O INSS, por sua vez, argumenta que não há possibilidade de reconhecimento da especialidade da atividade de vigilante após 05/03/1997.
Com contrarrazões, subiram os autos a este Corte para julgamento dos recursos.
É o relatório.
VOTO
Do novo CPC (Lei 13.105/2015)
Consoante a norma inserta no art. 14 do atual CPC, Lei nº 13.105, de 16/03/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Portanto, apesar da nova normatização processual ter aplicação imediata aos processos em curso, os atos processuais já praticados, perfeitos e acabados não podem mais ser atingidos pela mudança ocorrida a posteriori.
Nesse sentido, serão examinados segundo as normas do CPC de 2015 tão somente os recursos e remessas em face de sentenças/acórdãos publicado(a)s a contar do dia 18/03/2016.
Da ordem cronológica dos processos
Dispõe o art. 12 do atual CPC (Lei nº 13.105/2015, com redação da Lei nº 13.256/2016) que "os juízes e os tribunais atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão", estando, contudo, excluídos da regra do caput, entre outros, "as preferências legais e as metas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça" (§2º, inciso VII), bem como "a causa que exija urgência no julgamento, assim reconhecida por decisão fundamentada" (§2º, inciso IX).
Dessa forma, deverão ter preferência de julgamento em relação àqueles processos que estão conclusos há mais tempo, aqueles feitos em que esteja litigando pessoa com mais de sessenta anos (idoso, Lei n. 10.741/2013), pessoas portadoras de doenças indicadas no art. 6º, inciso XIV, da Lei n. 7.713/88, as demandas de interesse de criança ou adolescente (Lei n. 8.069/90) ou os processos inseridos como prioritários nas metas impostas pelo CNJ.
Observado que o caso presente se enquadra em uma das hipóteses referidas (a saber: metas do CNJ), justifica-se seja proferido julgamento fora da ordem cronológica de conclusão.
Da atividade rural
O tempo de serviço rural deve ser demonstrado mediante inicio de prova material contemporâneo ao período a ser comprovado, complementado por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, em princípio, a teor do art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91, e Súmula 149 do STJ.
Os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando integrantes do mesmo núcleo familiar, consubstanciam início de prova material do labor rural, consoante inclusive consagrado na Súmula 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
Cumpre salientar que, para caracterizar o início de prova material, não é necessário que os documentos apresentados comprovem, ano a ano, o exercício da atividade rural, seja porque se deve presumir a continuidade nos períodos imediatamente próximos, sobretudo no período anterior à comprovação, à medida que a realidade em nosso país é a migração do meio rural ao urbano, e não o inverso, seja porque é inerente à informalidade do trabalho campesino a escassez documental. O início de prova material deve viabilizar, em conjunto com a prova oral, um juízo de valor seguro acerca da situação fática.
De outra parte, afigura-se possível o reconhecimento de atividade rural para fins previdenciários no período dos 12 a 14 anos de idade. A jurisprudência deste Tribunal, do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal é pacífica nesse sentido (TRF4ªR - 3ª Seção, EI 2001.04.01.025230-0/RS, Rel. Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, j. 12/03/2003; STJ - AgRg no RESP 419601/SC, 6ª T, Rel. Min. Paulo Medina, DJ 18/04/2005, p. 399 e RESP 541103/RS, 5ª T, Rel. Min. Jorge Scartezzini, DJ 01/07/2004, p. 260; STF - AI 529694/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª T, j. em 15.02.2005). Dessa forma o termo inicial que será considerado na presente decisão é 22/04/68, data em que o autor completou 12 anos.
No presente caso, intenta a parte autora, com o presente recurso, o reconhecimento do tempo de labor rural no período de 26/11/1982 a 30/11/1988, alegando que trabalhou com seus pais e irmãos nas atividades rurais.
Conforme se verifica na sentença recorrida, o Juízo a quo considerou que o início de prova material é extemporâneo. O INSS também havia considerado que os documentos apresentados eram insuficientes (13-OUT6, p. 13).
Compulsando os autos, destaco os seguintes documentos juntados pelo autor para a comprovação da atividade rural (evento 13):
- certidões de casamento o seu genitor realizado em 1961, onde ele foi qualificado como lavrador (out 4)
- nota fiscal de produtor comprovando a venda de produtos em nome do seu genitor, relativa ao ano de 1988 (out 4)
As certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural da parte autora, nos termos na jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça (REsp nº 980.065/SP, Quinta Turma, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, j. em 20/11/2007, DJU, Seção 1, de 17/12/2007, p. 340, e REsp nº 637.437/PB, Relatora Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, j. em 17/08/2004, DJU, Seção 1, de 13/09/2004, p. 287, REsp nº 1.321.493-PR, Primeira Seção, Relator Ministro Herman Benjamim, DJe em 19/12/2012, submetido à sistemática dos recursos repetitivos.).
O autor Valtuir Clóvis Merbold disse que começou a trabalhar no sítio dos avós com 12 anos de idade, sendo que a propriedade que tinha cerca de 8 alqueires ficava em Francisco Beltrão. Plantavam produtos para o consumo da família. Disse que a família foi morar no sítio em 1982 e que lá ficou até os 18 anos de idade, sendo que o seu pai ficou morando lá até 1999, quando faleceu (233-VIDEO3).
A prova testemunhal, por sua vez, corrobora o teor dos documentos apresentados. A depoente Sirlei Bernadete Trevizan, prima do autor, disse que a propriedade era do avô e lá moravam a família dela e a família do autor. O imóvel tinha entre 7 e 8 alqueires e ficava uns 18 (dezoito) quilômetros da cidade. Na época plantavam para sobreviver. No período em questão, entre os 12 e os 18 anos de idade, o autor trabalhou na roça com a família (233-VIDEO1).
A testemunha Terezinha Margaret Trevizan, prima do autor, ele morava no sítio do nono, todos trabalhavam na lavoura, mas plantavam para sobreviver, pois a propriedade era pequena. A propriedade não chegava a 8 alqueires e o terreno era dobrado. Acredita que aproveitavam metade da área para a produção. O autor morava com os pais e mais três irmãos e todos trabalhavam na roça. Afirmou que na época eles plantavam feijão, arroz, milho, mandioca, coisas para sobreviver. Criavam alguns animais para consumo da casa (233-VIDEO2).
Analisando em conjunto a prova documental e testemunhal, é possível afirmar que a parte autora trabalhou no meio rural, em regime de economia familiar, o que está demonstrado pela prova testemunhal e documental acostada no feito.
Assim, devidamente comprovada a atividade rural no período de 26/11/1982 a 30/11/1988, totalizando 06 anos e 05 dias, merecendo acolhida o recurso da parte autora no ponto.
Atividade especial
Trata-se de demanda previdenciária destinada ao reconhecimento do tempo de serviço prestado sob condições especiais, com a consequente concessão de APOSENTADORIA ESPECIAL, regulamentada no artigo 57 da Lei nº 8.213/91, ou, mediante a conversão daquele(s) interregno(s) para comum, com a concessão de APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO, prevista nos artigos 52 e 53, I e II, da Lei de Benefícios e artigo 9º, § 1º, I, "a" e "b", da Emenda Constitucional nº 20, de 1998.
A natureza da atividade é qualificada pela lei vigente à época da prestação do serviço, sem aplicação retroativa de norma ulterior que nesse sentido não haja disposto (RE nº 174.150-3/RJ, Relator Ministro Octávio Gallotti, DJ 18/08/2000). Também por força do princípio tempus regit actum, o modo de comprovação da atividade especial é orientado pela lei vigente ao tempo da prestação do serviço. A partir dessa premissa geral, articulam-se as seguintes diretrizes para o presente julgado:
a) Para as atividades exercidas até 28/04/1995, véspera da vigência da Lei nº 9.032/95, é possível o reconhecimento do tempo de atividade especial pelo pertencimento à determinada categoria profissional ou pela exposição aos agentes nocivos, nos termos previstos pelos decretos regulamentares. Por outro lado, em razão do caráter protetivo ao trabalhador, é de ser reconhecida a natureza qualificada da atividade ainda que as condições que prejudicam sua saúde ou integridade física não se encontrem expressas em determinado regulamento (inteligência da Súmula nº 198 do extinto TFR).
b) Após a vigência da Lei nº 9.032/95, em 29/04/1995, a concessão da aposentadoria especial pressupõe a comprovação, pelo segurado, do tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física (Lei nº 8.213/91, art. 57, § 3º). Sem embargo, para a caracterização da especialidade não se reclama exposição às condições insalubres durante todos os momentos da prática laboral, sendo suficiente que o trabalhador, em cada dia de labor, esteja exposto a agentes nocivos em período razoável da jornada (salvo exceções, v.g., periculosidade) (TRF4, EINF nº 0010314-72.2009.404.7200, Terceira Seção, Relator Des. Federal Celso Kipper, D.E. 07/11/2011).
c) Para as atividades desempenhadas a partir de 06/03/1997, com a vigência do Decreto nº 2.172, a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos se dá mediante formulário, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho, expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho (Lei nº 8.213/91, art. 58, § 1º) (TRF4, AC nº 2002.71.07.001611-3, Quinta Turma, Relator Des. Federal Celso Kipper, D.E. 07/07/2008).
d) Em relação aos agentes nocivos físicos ruído, frio e calor, é necessária a apresentação de laudo técnico independentemente do período de prestação da atividade, dada a necessidade de medição da intensidade desses agentes nocivos. De qualquer modo, a partir de 01/01/2004, é suficiente a apresentação de Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, elaborado conforme as exigências legais (TRF4, EINF nº 0010314-72.2009.404.7200, Terceira Seção, Relator Des. Federal Celso Kipper, D.E. 07/11/2011).
e) A extemporaneidade do laudo pericial não lhe retira a força probatória, em face da presunção de conservação do anterior estado de coisas, que deve operar desde que não evidenciada a alteração das condições de trabalho. A rigor, dada a evolução das normas de proteção ao trabalhador e em face das inovações tecnológicas, é plausível a tese de que, à época da prestação do serviço, as condições ambientais eram ainda mais ofensivas à saúde do trabalhador (TRF4, EINF 0031711-50.2005.404.7000, Terceira Seção, Relator Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon, D.E. 08/08/2013).
f) O limite de tolerância para ruído é de 80 dB(A) até 05/03/1997; 90 dB(A) de 06/03/1997 a 18/11/2003; e 85 dB(A) a partir de 19/11/2003 (STJ, RESP nº 1.398.260/PR, Relator Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014, julgamento proferido de acordo com a sistemática de representativo de controvérsia - CPC, art. 543-C).
g) Quanto aos efeitos da utilização do equipamento de proteção individual, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial. Todavia, na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria (ARE nº 664.335, Relator Ministro Luiz Fux, Tribunal Pleno, j. 04/12/2014, DJ 12/02/2015). Deve-se observar, contudo, que a adoção de EPI não deve ser considerada para fins de caracterização da atividade especial em tempo anterior a 03/12/1998, visto que esta exigência apenas foi disposta pela MP nº 1.729/98, convertida na Lei nº 9.732/89 (IN INSS/PRES nº 77/2015, art. 279, §6º).
h) A lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico vigente à época da prestação do serviço (STJ, EDcl no RESP nº 1.310.034/PR, Relator Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 26/11/2014, DJ 02/02/2015, julgamento proferido de acordo com a sistemática de representativo de controvérsia - CPC, art. 543-C). Dessa forma, é possível a conversão do tempo especial em comum mesmo para as atividades exercidas anteriormente à vigência da Lei nº 6.887/80, ao passo que a conversão do tempo comum em especial é apenas possível para o segurado que cumpriu os requisitos para aposentadoria especial até a vigência da Lei nº 9.032/95. O Egrégio STJ firmou entendimento, em recurso repetitivo representativo de controvérsia (RESP nº 1.151.363), que é possível a conversão de tempo de serviço especial em comum mesmo após 1998, já que a última reedição da MP nº 1.663, parcialmente convertida na Lei nº 9.711/98, suprimiu a parte do texto das edições anteriores que revogava o § 5º do art. 57 da Lei nº 8.213/91.
i) Segundo pacífica jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (ED no RE 567360, Rel. Ministro Celso de Mello, Segunda Turma, DJe de 06-08-2009; RE nº 262082, Rel. Ministro Sepúlveda Pertence, Primeira Turma, DJ de 18-05-2001), em matéria previdenciária, para a análise das condições da inativação, a lei de regência é aquela vigente no tempo em que implementados os requisitos legais para a concessão do benefício, consoante o princípio tempus regit actum. Assim, nos casos em que os requisitos para a aposentadoria se perfectibilizaram sob a égide da legislação anterior, quando vigia o Decreto 83.080, de 24-01-1979, o fator de conversão a ser aplicado é 1,2. No entanto, quando os requisitos da aposentadoria forem implementados durante a vigência da Lei nº 8.213, de 24-07-1991, que prevê o fator de conversão 1,4, este é o fator a ser aplicado em todo o período laboral.
Exame do tempo especial no caso concreto
O INSS pretende o afastamento do caráter especial alcançado aos intervalos em que o autor trabalhou na condição de vigilante, após 05/03/1997.
Até 28/04/1995, ou seja, anteriormente ao advento da Lei nº 9.032, admitia-se o reconhecimento da especialidade do tempo de serviço em que o autor exerceu a função de vigilante, pelo enquadramento da categoria profissional, por equiparação à função de guarda, havendo presunção de periculosidade e sendo desnecessária a prova da efetiva exposição habitual e permanente ao agente nocivo e independentemente de o segurado portar arma de fogo no exercício de sua jornada laboral (TRF - 4ª Região, EIAC nº 1999.04.01.082520-0, Relator Desembargador Federal Paulo Afonso Brum Vaz, DJU 10-04-2002).
A partir de 29/05/1995, descabido o enquadramento pela categoria profissional, exigindo-se a demonstração da efetiva exposição a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador (como o uso de arma de fogo, por exemplo), mediante apresentação de qualquer meio de prova, até 05/03/1997, e, a partir de então, através de laudo técnico ou perícia judicial que confirme a condição periculosa da atividade. É que nos dias atuais a prestação de serviços de segurança privada assemelha-se, em muito, àquelas exercidas pela segurança pública.
De fato, no que diz respeito ao reconhecimento do tempo de serviço na atividade de vigilante como sendo especial para fins de conversão, cumpre referir que a noção da profissão que se tinha anos atrás, daquela pessoa que, precipuamente, fazia ronda e afugentava pequenos larápios, muitas das vezes inofensivos, hodiernamente deve ser repensada. Efetivamente, cada vez mais as atividades da segurança privada aproximam-se daquelas desenvolvidas pela força policial pública, em razão da elevação do grau de exposição ao risco da ação criminosa, mormente quando uso de arma de fogo. Assim, para os períodos posteriores a 28/04/95, desde que comprovado o desempenho de atividade perigosa, notadamente em razão do manuseio de armamento, nada obsta o reconhecimento da especialidade. No caso dos autos foi demonstrado que o segurado exercia a função de guarda de valores, realizando a segurança no transporte, entrega e coleta de numerários, sempre portando arma de fogo. (EINF nº 2003.71.00.059814-2/RS, Relator Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. de 21-10-2009).
Realmente, até 28/04/1995, é possível o reconhecimento da especialidade da profissão de vigia ou vigilante por analogia à função de guarda, independentemente de o segurado portar arma de fogo no exercício de sua jornada laboral. Após essa data, o reconhecimento da especialidade depende da comprovação da efetiva exposição a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, como o uso de arma de fogo, por exemplo. (APELREEX nº 5016913-53.2011.404.7108/RS, Relatora Des. Federal Vânia Hack de Almeida, Sexta Turma, D.E. 23/07/2015).
A propósito, o egrégio Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo representativo de controvérsia, já decidiu que, à luz da interpretação sistemática, as normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991). (REsp nº 1.306.113/SC, Relator Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe 07/03/2013).
Não se pode olvidar que a própria natureza das atividades desenvolvidas expõe o trabalhador à possibilidade de ocorrência de algum evento danoso que coloque em risco a sua própria vida, notoriamente os crimes contra o patrimônio, o que autoriza o reconhecimento da especialidade do labor.
A legislação previdenciária não cuidou de definir os conceitos de periculosidade, insalubridade e penosidade. Conforme Rocha e Baltazar (ROCHA, Daniel Machado da e BALTAZAR, J. José Paulo. Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social. Porto Alegre, Atlas, 2015, pp. 321-322):
"As definições de insalubridade, periculosidade e penosidade sempre estiveram ausentes da legislação previdenciária, que toma de empréstimo os conceitos da CLT, ampliados por outros diplomas esparsos. Com a modificação operada na redação do §1º do art. 58, pela Lei 9.732/98, a adequação do emprego destes conceitos fica ainda mais evidente. (...)
As atividades periculosas são estabelecidas com fulcro no art. 193 da CLT, já com a redação definida pela Lei nº 12.740/12:
'São consideradas atividades ou operações perigosas, na forma da regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, aquelas que, por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem risco acentuado em virtude de exposição permanente do trabalhador a: I - inflamáveis, explosivos ou energia elétrica; II - roubos ou outras espécies de violência física nas atividades profissionais de segurança pessoal ou patrimonial.'
Realmente, em caso análogo, este Regional deixou assentado que a jurisprudência tem considerado que as listagens de agentes nocivos em decretos regulamentadores são exemplificativas, aplicando o enunciado da súmula 198 do extinto TFR. Assim, comprovada a periculosidade do ambiente de trabalho, em face de inflamáveis, deve ser reconhecido o exercício de atividade especial. (TRF4, APELREEX 5002860-46.2011.404.7115, Sexta Turma, Relatora p/ Acórdão Luciane Merlin Clève Kravetz, D.E. 26/06/2013).
Feita a digressão, na hipótese dos autos, estas são as condições da prestação de serviço do autor:
Período: 01/01/1994 a 30/04/2001
Empresa: Principal Vigilância S/C Ltda.
Atividade/função: vigilante
Agentes nocivos: periculosidade
Enquadramento legal: Código 2.5.7 do Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64 conjugado com a Súmula nº 198 do TRF.
Provas: PPP (evento 01, OUT11 e OUT12), CTPS (1-OUT20) e laudo pericial judicial (evento 40)
Conclusão: Restou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial pela parte autora no período antes indicado, conforme a legislação aplicável à espécie, em face da sujeição, habitual e permanente, ao agente periculoso, bem como em face do enquadramento por categoria profissional.
Período: 01/05/2001 a 28/11/2012
Empresa: Máster Vigilância Especializada SS Ltda.
Atividade/função: vigilante
Agentes nocivos: periculosidade
Enquadramento legal: Código 2.5.7 do Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64 conjugado com a Súmula nº 198 do TRF.
Provas: PPP (evento 01, OUT13 e OUT14), CTPS (1-OUT18 e OUT21) e laudo pericial judicial (evento 40)
Conclusão: Restou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial pela parte autora no período antes indicado, conforme a legislação aplicável à espécie, em face da sujeição, habitual e permanente, ao agente periculoso, bem como em face do enquadramento por categoria profissional.
A anotação na Carteira Profissional e/ou na Carteira de Trabalho e Previdência Social, a teor do art. 19 do Decreto nº 3.048/99, vale para todos os efeitos como prova de filiação à Previdência Social, relação de emprego, tempo de serviço e salários-de-contribuição, podendo, em caso de dúvida, ser exigida pelo Instituto Nacional do Seguro Social a apresentação dos documentos que serviram de base à anotação. Assim é que as anotações em CTPS constituem-se em prova idônea dos contratos de trabalho nela indicados e goza de presunção juris tantum a veracidade de seus registros (Súmula nº 12 do TST). Dito isso, inexistindo sequer indícios de fraude e/ou má-fé, os registros na CTPS servem como meio de prova para fins de enquadramento da atividade como especial, pela categoria profissional, somente até o advento da Lei nº 9.032/95, ou seja, até a data de 28/04/1995.
Com efeito, presume-se que o segurado estava exposto aos agentes nocivos pelo simples exercício da profissão. Tal fato, aliás, explica porque, nos casos de enquadramento por atividade profissional, a especialidade do labor pode ser provada pelo simples registro do contrato na CTPS, eis que esta é, por excelência, o documento onde se faz constar a ocupação a ser desenvolvida pelo empregado. (TRF - 4ª Região. EINF nº 2000.70.00.0304570/PR, Relator: Des. Fed. Paulo Afonso Brum Vaz, Terceira Seção, julgamento em 12-02-2003).
Com relação aos interregnos em análise foram acostados aos autos formulários PPPs, nos quais há referência de que o trabalhador portava arma de fogo (evento 01, OUT11 a OUT14). Embora os referidos PPP's não registrem os fatores de risco, a omissão foi suprida pelo laudo pericial judicial (evento 40), onde o perito concluiu pelo efetivo exercício de atividades perigosas pelo autor. A respeito do tema altercado, a Turma Nacional de Uniformização, no julgamento do PEDILEF nº 2009.71.62001838-7, deixou assentado que o PPP é preenchido com base em laudo técnico ambiental elaborado por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho. A validade do conteúdo do PPP depende da congruência com o laudo técnico. (Relator Juiz Federal Herculano Martins Nacif, DOU 22/03/2013).
Além disso, ao contrário do que alega o INSS, a Lei nº 7.102/83, regulamentada pelo Decreto nº 89.056/83, que dispõe sobre segurança para estabelecimentos financeiros, estabelece normas para constituição e funcionamento das empresas particulares que exploram serviços de vigilância e de transporte de valores, e dá outras providências, não tem incidência no âmbito previdenciário. Logo, não há exigência, para fins de concessão de benefícios previdenciários, de apresentação de habilitação legal para o exercício da profissão.
Conclusão quanto ao tempo de atividade especial
É de ser mantida a sentença que reconheceu a especialidade dos períodos de 01/01/1994 a 30/04/2001 e de 01/05/2001 a 28/11/2012.
Do direito da parte autora à concessão do benefício
Resta analisar, agora, a possibilidade de concessão da aposentadoria por tempo de contribuição.
A soma do tempo de serviço administrativamente computado pelo INSS, até 28/11/2012 (23 anos, 06 meses, 13-OUT7) com o acréscimo decorrente do computo do labor rural em regime de economia familiar (06 anos e 05 dias) e da conversão do tempo de serviço especial em comum, pelo fator multiplicador 1,4 (07 anos, 06 meses e 23 dias) resulta em 37 anos e 28 dias. Por essa razão, o autor faz jus à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição integral, desde a data do requerimento administrativo (28/11/2012).
No entanto, não se pode olvidar que ele manifestou a desistência do pedido de concessão de aposentadoria.
Do pedido de desistência parcial
No evento 168 (PET1) o autor manifestou a desistência do pedido de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, mantendo a pretensão de obter a averbação dos acréscimos decorrentes do computo de tempo rural e da conversão de tempo especial.
Intimado, o INSS concordou com a desistência parcial manifestada pela parte autora (177-PET1).
Evidentemente, a manifestação da parte autora é apta a subsumir a hipótese vertida no inciso VIII do art. 267 do então vigente CPC, pelo qual, uma vez requerida, antes da prolação da sentença, a desistência produzirá a extinção do processo, sem resolução de mérito.
Nessas condições, considerando que o pedido de desistência foi formulado antes da prolação da sentença e não apreciado quando do julgamento do processo, homologo a desistência requerida pela autora nos termos do art. 267, inc. VIII do CPC vigente na data da prolação da sentença e declaro extinto o processo, sem julgamento do mérito, tão-somente com relação ao pedido de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
Das custas e honorários:
Mantida a sentença neste particular, considerando que houve sucumbência mínima da parte autora.
Conclusão:
Sentença reformada para reconhecer o direito ao computo do período de labor rural em regime de economia familiar entre 26/11/1982 a 30/11/1988 e homologar o pedido de desistência em relação ao pedido de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação do autor e negar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial.
Rodrigo Koehler Ribeiro
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 22/11/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5040551-36.2015.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00049886120138160075
RELATOR | : | Juiz Federal RODRIGO KOEHLER RIBEIRO |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Carlos Eduardo Copetti Leite |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | VALTUIR CLOVIS MERBOLD |
ADVOGADO | : | ALAN RODRIGO PUPIN |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 22/11/2016, na seqüência 433, disponibilizada no DE de 03/11/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO AUTOR E NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E À REMESSA OFICIAL.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal RODRIGO KOEHLER RIBEIRO |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal RODRIGO KOEHLER RIBEIRO |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO | |
: | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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