
Apelação Cível Nº 5004255-33.2021.4.04.7015/PR
RELATORA: Juíza Federal FLÁVIA DA SILVA XAVIER
RELATÓRIO
Trata-se de ação de procedimento comum em que é postulada a aposentadoria por idade rural, desde 14/05/2015 (DER).
Processado o feito, sobreveio sentença, cujo dispositivo tem o seguinte teor:
"(...)
Ante o exposto:
1) deixo de resolver o mérito da demanda, por ausência dos pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo, em relação ao pedido de reconhecimento do período de 2000 a 2005 como tempo de serviço rural, nos termos da fundamentação e com base no Tema 629 do STJ e no art. 485, VI, do CPC;
2) reconheço a prejudicial de prescrição quinquenal, suscitada pelo demandado, e, no mérito propriamente dito, julgo improcedentes os demais pedidos, nos termos da fundamentação, com fulcro no art. 487, I, do Código de Processo Civil.
Condeno a parte autora ao pagamento das custas e dos honorários de sucumbência, estes fixados em 10% do valor da causa. O pagamento permanecerá suspenso enquanto perdurar a condição de necessitado (justiça gratuita já deferida no evento 4).
Eventual apelação interposta fica recebida no duplo efeito, desde que tempestiva. Verificado tal requisito, intime-se a parte adversa para contra-arrazoar em quinze dias. Vencido este prazo, remetam-se os autos ao E. TRF4.
Publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se.
Oportunamente, arquivem-se.
A parte autora apela, alegando que: (a) não há prova testemunhal acerca da atividade rurícola praticada em âmbito administrativo, nem judicial, o que houve administrativamente foi a chamada “entrevista rural” (evento 1 – PROCADM12 - páginas 10 e 11); (b) o INSS sequer determinou a realização de justificação administrativa para produção de prova oral, cujo comportamento foi reproduzido pelo juízo singular no presente feito; (c) se a prova oral é indispensável em juízo, mesmo quando foi colhido depoimento em sede administrativa, é evidente sua necessidade no caso dos autos, em que não há oitiva de testemunhas nem na seara administrativa, nem na seara judicial; (d) dos documentos juntados aos autos, bem como de todas as informações prestadas no decorrer da instrução processual, demonstram que a sua vida sempre foi junto ao labor rural, bem como de todos os seus familiares que inclusive se encontram aposentados por idade rural; (e) os presentes autos precisam de uma análise documental pormenorizada com base no seu histórico, que não foi “criada” pelos pais e sim pela irmã e pelo cunhado, então, não há razão para não aceitar como prova documental os documentos destes. Pede que seja reformada a sentença e reconhecido que nos anos de 2000 a 2005 exercia a atividade rural e, consequentemente seja reconhecido seu direito à aposentadoria por idade rural ou seja anulada a sentença e reaberta a instrução processual com a realização de audiência de instrução julgamento.
Com contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
PRESCRIÇÃO QUINQUENAL
Em se tratando de obrigação de trato sucessivo e de caráter alimentar, não há falar em prescrição do fundo de direito.
Contudo, são atingidas pela prescrição as parcelas vencidas antes do quinquênio que precede o ajuizamento da ação, conforme os termos da Lei nº 8.213/91 e da Súmula 85/STJ.
Considerando que a ação foi proposta em 29/09/2021, restariam prescritas as parcelas anteriores a 29/09/2016.
Tendo em vista que a DER é 14/05/2015, existem parcelas prescritas.
A PROVA TESTEMUNHAL NA COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE RURAL
O direito à ampla defesa e ao contraditório é amparado pelo art. 5º, LV, da Constituição Federal e decorre dele a nulidade de qualquer decisão que ao contraditório não for submetida - especialmente quando infringir algum prejuízo.
Deve-se atentar que, em matéria previdenciária, as regras processuais devem ser aplicadas atendo-se à busca da verdade real.
Em se tratando de benefício devido a trabalhador rural, tem-se que a prova testemunhal é essencial à comprovação da atividade, uma vez que se presta a corroborar os inícios de prova material apresentados. Trata-se, pois, de prova que, segundo o entendimento desta Corte, é indispensável à adequada solução do processo.
Ainda, não se exige prova plena da atividade rural de todo o período correspondente à carência, como forma a inviabilizar a pretensão, mas apenas um início de documentação que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar.
Importante observar, inclusive, por similaridade, o decidido por esta Corte ao julgar o IRDR/TRF4 - Tema 17, em que restou firmada a seguinte tese:
Não é possível dispensar a produção de prova testemunhal em juízo, para comprovação de labor rural, quando houver prova oral colhida em justificação realizada no processo administrativo e o conjunto probatório não permitir o reconhecimento do período e/ou o deferimento do benefício previdenciário.
CASO CONCRETO
A parte autora, nascida em 14/05/1960 (evento 1 - CERTNASC4), completou a idade mínima para a obtenção da aposentadoria rural (55 anos), em 14/05/2015, requereu o benefício na via administrativa em 14/05/2015 (evento 1 - PROCADM12).
Assim, deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, nos 180 meses que antecedem o implemento do requisito etário ou anteriores ao requerimento administrativo, o que lhe for mais favorável. Vale dizer, de 14/05/2000 a 14/05/2015.
Visando à demonstração do exercício da atividade rural nos períodos controvertidos, a parte autora juntou aos autos a cópia dos seguintes documentos, assim arrolados na sentença:
- título eleitoral do pai da autora, onde constou que ele tinha como profissão a de lavrador, em 13.7.1959;
- certidão de casamento dos pais da autora, em 26.8.1959, onde o genitor constou qualificado como lavrador;
- certidão de nascimento da autora, cujo assento foi lavrado em 16.5.1960, onde o pai constou qualificado como lavrador;
- certidão de óbito da mãe da autora, em 6.4.1964;
- declaração do INCRA referente a imóvel de propriedade do pai da autora - 1965 a 1978;
- ficha de associado ao sindicato dos trabalhadores rurais de Califórnia, em nome do pai da autora, com admissão em 29.11.1982 e registro de pagamento de mensalidades desde então até o ano de 1988;
- certidão de óbito do pai da autora, em 8.8.1992, onde consta que ele era lavrador aposentado;
- comprovante de inscrição da autora no CADPRO, em 12.8.2013;
- notas fiscais comprovando a venda de milho pela autora em 2013, 2014 e 2015;
- notas fiscais de produtor - 2013 a 2015;
- CCIR 2006 a 2009 e 2010 a 2014;
- carteira de trabalho e CNIS da autora;
- cópia do processo administrativo da irmã da autora, Maria Conceição de Souza, do qual constam os seguintes documentos:
- certidão de casamento da irmã Maria Conceição, onde o marido dela, Clemente, constou qualificado como lavrador de profissão, em 13.9.1969;
- matrícula de imóvel rural de propriedade do pai da autora, em que ele constou qualificado como lavrador;
- certificado de cadastro de imóvel de propriedade do pai da autora junto ao INCRA, referente aos exercícios de 1987 e 1989;
- notificação para pagamento do ITR - exercícios de 1990 a 1999;
- declaração do ITR feita pelo cunhado Clemente; e
- notas fiscais comprovando a comercialização de milho pelo cunhado Clemente em 1993, 1995 e 1999.
Com efeito, ainda que a parte autora tenha apresentado autodeclaração (evento 21 - OUT2), há necessidade de produção de prova oral para assegurar o contraditório e a ampla, devendo ser oportunizado à parte requerente a oitiva de testemunhas.
As atividades rurais são, geralmente, exercidas por pessoas extremamente simples e com grau de vulnerabilidade elevado, cuja comprovação é difícil e qualquer meio de prova é útil na busca da verdade real, principalmente a oitiva pessoal da parte requerente, bem como das testemunhas arroladas.
In casu, afigura-se necessária a realização de prova testemunhal, com a colheita de depoimentos que elucidem as circunstâncias do labor rurícola alegadamente exercido pela parte autora, sobretudo porque os documentos não abrangem todo o período de prova, necessitando que sejam corroborados por firme e coesa prova oral.
Outrossim, oportunidade de facultar à parte autora, inclusive, acostar aos autos outros documentos que, por ventura, dispuser, em nome próprio ou de um integrante do núcleo familiar, hábeis a reforçar/constituir início razoável de prova material do alegado exercício de atividade agrícola no período controverso.
Dessa forma, a medida que se impõe é a anulação da sentença com o retorno dos autos ao juízo de origem para reabrir a instrução dos autos.
PREQUESTIONAMENTO
Objetivando possibilitar o acesso das partes às instâncias superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto.
CONCLUSÃO
Apelação parcialmente provida para anular a sentença e determinar o retorno dos autos à origem para reabertura da instrução.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação.
Documento eletrônico assinado por FLAVIA DA SILVA XAVIER, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004667041v17 e do código CRC 3ca5c2e0.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5004255-33.2021.4.04.7015/PR
RELATORA: Juíza Federal FLÁVIA DA SILVA XAVIER
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE RURAL. REALIZAÇÃO DE PROVA TESTEMUNHAL. IMPRESCINDIBILIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA. ANULAÇÃO DA SENTENÇA. REABERTURA DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL.
1. O direito à ampla defesa e ao contraditório é amparado pelo art. 5º, LV, da CF, devendo ser realizada audiência de instrução para produção de prova testemunhal.
2. A insuficiência da instrução processual acarreta a anulação da sentença e a consequente remessa dos autos à origem para reabertura da instrução.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 10ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 17 de setembro de 2024.
Documento eletrônico assinado por FLAVIA DA SILVA XAVIER, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004667042v6 e do código CRC 4663df5f.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 10/09/2024 A 17/09/2024
Apelação Cível Nº 5004255-33.2021.4.04.7015/PR
RELATORA: Juíza Federal FLÁVIA DA SILVA XAVIER
PRESIDENTE: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
PROCURADOR(A): FABIO NESI VENZON
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 10/09/2024, às 00:00, a 17/09/2024, às 16:00, na sequência 180, disponibilizada no DE de 30/08/2024.
Certifico que a 10ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 10ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal FLÁVIA DA SILVA XAVIER
Votante: Juíza Federal FLÁVIA DA SILVA XAVIER
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
SUZANA ROESSING
Secretária
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