APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5006414-66.2013.4.04.7002/PR
RELATOR | : | MARCELO DE NARDI |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | MARCIO LUIS LENZ |
ADVOGADO | : | FÁBIO GUSTAVO KENSY |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-ACIDENTE. VISÃO MONOCULAR. SEGURADO ESPECIAL. IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
1. Comprovada a diminuição da capacidade laboral decorrente da existência de lesões consolidadas ocasionadas por acidente de qualquer natureza, é devido o auxílio-acidente.
2. Hipótese em que a perda da visão de um dos olhos importa redução da capacidade laborativa. Precedentes.
3. A concessão de auxílio-acidente ao segurado especial independe do recolhimento de contribuições previdenciárias. Precedente desta Seção.
4. Ordem para implantação do benefício. Precedente.
ACÓRDÃO
Visto e relatado este processo em que são partes as acima indicadas, decide a Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da Quarta Região, por unanimidade, negar provimento à apelação e à remessa oficial e determinar a implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 01 de dezembro de 2015.
Marcelo De Nardi
Relator
| Documento eletrônico assinado por Marcelo De Nardi, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7939176v4 e, se solicitado, do código CRC 157AA01F. | |
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APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5006414-66.2013.4.04.7002/PR
RELATOR | : | MARCELO DE NARDI |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | MARCIO LUIS LENZ |
ADVOGADO | : | FÁBIO GUSTAVO KENSY |
RELATÓRIO
MÁRCIO LUIS LENZ ajuizou ação ordinária contra o INSS em 25jul.2013, postulando concessão de auxílio-acidente, em razão de acidente de trânsito ocorrido em 9abr.2005, do qual resultou perda da visão do olho esquerdo. Requereu auxílio-doença administrativamente em 11abr.2005, que foi indeferido em razão da não comprovação da condição de segurado especial. Requer o deferimento do benefício desde 18maio2005, data indicada como de potencial alta pelo médico perito do INSS.
A sentença (Evento 51-SENT1) acolheu a preliminar de prescrição quinquenal e julgou procedente o pedido, condenando o INSS à concessão de auxílio-acidente ao demandante desde 18maio2005 e ao pagamento das parcelas em atraso desde 25jul.2008, com correção monetária desde cada vencimento (pelo INPC até junho de 1009 e, após, pela TR) e juros desde a citação (à taxa de um por cento ao mês até jjunho de 2009 e, após, pelos índices aplicáveis à caderneta de poupança). A Autarquia foi isentada do pagamento de custas, mas condenada ao pagamento de honorários de advogado fixados em dez por cento do valor das parcelas da condenação vencidas até a data da sentença. O julgado foi submetido ao reexame necessário.
O INSS apelou (Evento 90-RAZAPELA1), afirmando que haveria contradições entre a prova trazida ao processo e a entrevista rural do autor. Afirma, ainda, que não há incapacidade para o trabalho e que a utilização de maquinário descaracteriza a condição de segurado especial. Aduz que a concessão de auxílio-acidente ao segurado especial antes de 2013 depende do recolhimento de contribuições.
Com contrarrazões, veio o processo a este Tribunal.
VOTO
CONCESSÃO DE AUXÍLIO-ACIDENTE
A sentença analisou adequadamente a controvérsia apresentada no processo, motivo pelo qual se transcreve aqui o seguinte trecho, adotado como razões de decidir:
[...]
No caso dos autos, o ponto central da controvérsia cinge-se à eventual redução da capacidade laborativa da parte autora em razão das sequelas decorrentes do acidente e a qualidade de segurado (rural).
2.3 Da qualidade de segurado
Quanto à qualidade de segurado, o postulante apresentou, a título de prova material do exercício da atividade rural os seguintes documentos:
a - Certidão de nascimento da parte autora, com assento lavrado em 10/03/1986, em que o genitor foi qualificado como agricultor (Ev. 12 - PROCADM1 - P. 5);
b - Matrícula n 21.354, referente à Parte dos Lotes Rurais nº s. 294 e 295, com área de 8,3054 ha, situado em Missal, em que constam como proprietários os pais da parte autora, a partir de 19/01/1996 (Ev. 12 - PROCADM1 - P. 6);
c - CCIR 2000/2001/2002 referente ao imóvel rural em nome do genitor do autor, classificado como 'minifúndio' (Ev. 12 - PROCADM1 - P. 7);
d - Notas Fiscais referentes comercialização da produção agrícola (milho e fumo) para os anos de 2002, 2004 e 2005 (Ev. 12 - PROCADM1 - P. 8/10);
e - Fatura da COPEL, em nome do genitor da parte autora, vencimento em março/2005, endereço na Linha Caçador BC - 748, em Missal, cadastrada como atividade o cultivo de fumo (Ev. 12 - PROCADM1 - P. 11);
f - INFBEN em nome de seu genitor, que foi beneficiário do auxílio-doença na qualidade de segurado especial - rural, para o período de 09/04/2003 a 09/06/2003 (Ev. 12 - PROCADM1 - P. 14);
g - INFBEN em nome de sua genitora, que foi beneficiária do auxílio-doença na qualidade de segurado especial - rural, no período de 15/06/2004 a 25/07/2004 (Ev. 12 - PROCADM1 - P. 16);
h - Entrevista rural (Ev. 12 - PROCADM1 - P. 18/21).
Em juízo, foram colhidas as seguintes declarações por meio de audiência (Ev. 76):
MÁRCIO LUÍS LENZ (autor):
Meus pais sempre foram agricultores. Eu tinha uns 8-9 anos quando vim de Santa Helena para Missal, onde meu pai tem 8 hectares. Plantamos soja, milho. Temos 8 cabeças de gado e 1.000 suínos. A produção é vendida. Não cultivamos mais fumo. Nós não temos empregados. Às vezes fazemos troca de dia. Eu estudei até o ensino médio. Por ocasião do acidente eu ia concluir o 2º grau. Eu estudava no Colégio Padre Eduardo Michelis, no centro de Missal. Eu estudava pela manhã. À tarde eu trabalhava na roça, com plantio de fumo e extração de leite. Na época nós não tínhamos maquinários. Hoje temos um trator. Nós pagávamos o vizinho, de nome Zeno, para o plantio de soja. O pagamento era em percentagem. Na época nós tínhamos um carro, modelo Verona, e uma motocicleta CG Titan. Eu estava indo de Missal para Itaipulândia, à noitinha, e me perdi numa curva, por causa do capacete, e capotei, batendo numa mureta. A consequência do acidente foi a perda da visão. O médico proibiu de utilizar picador de pasto, triturador, motosserras, colheitadeiras, trator, caminhão. À época manejava triturador, motoserra, picador. Hoje tenho dificuldade no manuseio desses equipamentos. Depois do acidente ajudo na agricultura, na plantação, capina. Deixei de fazer atividades de risco. Não entro no potreiro para cuidar do gado, já que de um lado não enxergo e é perigoso. O nosso sustento vem da lavoura. Não temos outra atividade. Os porcos são vendidos para a Sadia, e o leite e os grãos, para a Lar. Hoje temos um carro e uma moto.
LUIZ LEOPOLDO FLACH (testemunha advertida):
Moro bem próximo do autor, na Linha Caçador, Missal/PR. Moro lá faz trinta e oito anos. Sou agricultor. Conheço a família do Márcio. A área deles tem uns 3,5 alqueires. O autor mora com os pais até hoje. Eles plantam milho, soja, têm vacas de leite e suínos. Quem trabalha são os pais e ele os ajuda. Eles trabalham somente na agricultura. Ele estudou até a 8ª série, acho, em Missal. Ele estudava de manhã e depois à noite. Eu fiquei sabendo do acidente. Na ocasião ele trabalhava na lavoura. Hoje eles possuem em trator para trabalhar na lavoura, puxar esterco etc. Na época do acidente eles não tinham trator, compraram faz três anos. O Zeno morava próximo à nossa comunidade. O Zeno fez serviço na área da família do autor. Eles já plantaram fumo, inclusive por ocasião do acidente e até alguns anos depois. Eles têm um veículo Fiat Pálio. Ele estava indo para Itaipulândia quando ocorreu o acidente. Somente a família trabalhava no sítio. O Márcio perdeu parte da visão, em decorrência do acidente. Eles tinham pequenos maquinários como quebrador de milho, motosserra. Ele não dirige trator pois não pode pela perda da visão.
DELMAR SAUSEN (testemunha advertida):
Moro num sítio vizinho do autor, na Linha Caçador, em Missal. O autor sempre morou com os pais e trabalhou na lavoura. Depois do acidente teve um vínculo pequeno com a FRIMESA, mas foi demitido em decorrêndia da visão. Plantavam milho, soja. Ele estudou numa escola em Missal, pela manhã, e à tarde trabalhava na roça. Ele ia para a escola num ônibus escolar. Eles hoje tem um trator. Faziam trabalho manualmente. Ele não dirige trator hoje, por causa do olho. Ele não consegue mais fazer o trabalho como antes, mas se esforçando mais. Eles têm criação de porcos. A área deles é de 3,5 alqueires. Eles nunca tiveram empregados. Terceiros fazem a colheita de soja para eles. Eles também têm vacas de leite, num total de 6-7. O Márcio tem problemas no olho por causa do acidente. Eles hoje tem forrageira que quem mexe é o pai dele.
Diante da análise conjunta das provas material e testemunhal, tenho que ficou devidamente comprovada a atividade rural da parte autora, em regime de economia familiar, em período anterior à sua incapacidade, em 2005. A parte autora apresentou documentos que representam início de prova material a respeito da atividade agrícola executada por sua família. Há uma pequena propriedade rural em nome de seus genitores, adquirida no ano de 1996 e notas fiscais de comercialização da produção agrícola.
Ainda, as testemunhas confirmaram a prática de atividade agrícola pela parte autora em propriedade dos pais, e que o cultivo ocorre de forma manual, apenas pela família, sem o auxílio de empregados, permitindo a conclusão do exercício de atividade tipicamente para subsistência, impondo reconhecimento da qualidade de segurado especial.
Com efeito, as testemunhas foram seguras e convincentes, sabendo especificar a atividade de criação de gado e a venda de leite, suínos, além do plantio de milho e soja, tarefas com as quais a parte autora se ocupava à época do acidente de trânsito.
Deduz-se, assim, que a parte autora exercia atividade campesina regularmente em período anterior ao acidente e respectiva sequela com a perda da visão do olho esquerdo, que resultou na redução da capacidade laborativa, como adiante se verá.
2.4 Da redução da capacidade laboral
Para averiguar a redução da capacidade laboral informada pelo autor, foi determinada pelo Juízo a realização de perícia médica com médico oftalmologista.
Realizada a perícia médica do Juízo na data de 25/04/2014, foram anexados os respectivos laudos nos espelhos 52 e 56.
Em relação à redução da capacidade funcional, o experto judicial informou que a parte autora sofreu acidente de trânsito, do qual resultou na atrofia do nervo ótico de forma irreversível, devido à trauma facial, que já se encontra consolidada.
Ressaltou que não há incapacidade laboral para o exercício da atividade campesina, contudo, há restrição para desempenhar atividades que requerem visão binocular, de forma permanente.
O autor exerce a atividade agrícola e afirmou em seu depoimento que apresenta dificuldade no manuseio dos equipamentos: triturador; motosserra; picador, assim como está impedido de dirigir trator. Ressaltou, ainda, que evita entrar no potreiro para cuidar do gado e outras atividades de risco.
A testemunha Luiz Leopoldo Flach afirmou que hoje a família do autor possui um trator utilizado na lavoura, para puxar esterco, entre outros serviços, mas quem o dirige é o pai do demandante, já que este não pode pela perda da visão. Já a testemunha Delmar Sausen ressaltou que "Ele não dirige trator hoje, por causa do olho. Ele não consegue mais fazer o trabalho como antes, mas se esforçando mais" e que "eles hoje tem forrageira que quem mexe é o pai dele."
Tal limitação foi ratificada no laudo pericial, quando da resposta ao quesito apresentado pela parte autora (Ev. 56):
As seqüelas ocasionadas pelo acidente permitem que o autor manuseie suas ferramentas rotineiras tais como, serras circulares, trituradores de pasto e ração, dirija tratores, caminhão, colheitadeiras e máquinas agrícolas em geral com a mesma perfeição, habilidade e destreza que possuía antes do acidente?
- Não deve.
- Não pode dirigir tratores, caminhões e máquinas agrícolas.
- Pode dirigir automóvel. Carteira de Habilitação B.
A impossibilidade da prática dessas atividades comuns para o campesino familiar representa significativa limitação, pois é comum que pequenos produtores rurais possuam trator, que auxilia nas tarefas diárias no campo. Contudo, em decorrência da visão monocular, o autor somente pode possuir habilitação das Categorias 'A' e 'B', ou seja, para a condução de motocicleta, ciclomotor, motoneta, triciclo, automóvel, caminhonete, camioneta ou utilitário. Já o trator de roda, caminhão, ou o equipamento automotor destinado à movimentação de cargas ou execução de trabalho agrícola é defeso ao demandante conduzir, já que pertencem à categoria 'C'.
Como visto, a lesão está consolidada, resultando em perda parcial da capacidade laboral para a parte autora de sua atividade habitual de agricultor. A sequela, de forma isolada, não determina incapacidade laboral, mas a reduz parcialmente.
É importante registrar que o benefício do auxílio-acidente apresenta caráter indenizatório em face da perda de habilidades laborais por motivo de sequelas. É da sua essência que exista uma perda de capacidade laborativa que corresponda à necessidade de sua indenização. Em outras palavras, é necessário que exista um dano, consubstanciado nessa redução laboral, que é exatamente o caso dos presentes autos.
Nesse contexto, reputo cumpridos os requisitos necessários para a sua concessão, exigidos pelo art. 86 da Lei nº 8.213/91. [...]
A data de início do auxílio é 18/05/2005 que corresponde à data limite do auxílio-doença, no caso de deferimento, conforme fixado pelo perito médico do INSS (Ev. 12 - PROCADM1 - P. 13).
Confirma-se a sentença de procedência. Não merecem acolhida as alegações apresentadas no apelo do INSS.
Inicialmente, cumpre registrar que conforme precedentes deste Tribunal a denominada entrevista administrativa não tem o mesmo valor probante dos depoimentos colhidos em juízo, submetidos ao crivo do contraditório:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS. ATIVIDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PESQUISA ADMINISTRATIVA. CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO.
1. É devido o reconhecimento do tempo de serviço rural, em regime de economia familiar, quando comprovado mediante início de prova material corroborado por testemunhas.
2. Existindo conflito entre as provas colhidas na esfera administrativa e em juízo, deve-se optar, em princípio, por estas últimas, porquanto produzidas com todas as cautelas legais, garantindo a imparcialidade e o contraditório. [...]
(TRF4, Sexta Turma, APELREEX 0015021-86.2013.404.9999, Rel. Marcelo Malucelli, 11maio2015).
Por outro lado, o conjunto probatório permite formar convencimento no sentido da prestação de trabalho rural em regime de economia familiar, não havendo qualquer óbice a esse reconhecimento em razão da existência de maquinário na propriedade da família do autor, até porque a legislação de regência nada dispõe nesse sentido.
A incapacidade para o trabalho em razão da perda da visão de um olho está suficientemente demonstrada pela prova carreada aos autos.
Por fim, no tocante à necessidade do recolhimento de contribuições para a concessão de auxílio-acidente ao segurado especial, esta Terceira Seção já se posicionou em sentido contrário a essa exigibilidade, mesmo antes do advento da L 12.873/2013:
EMBARGOS INFRINGENTES. AUXÍLIO-ACIDENTE. TRABALHADOR RURAL. DESNECESSIDADE DE PAGAMENTO DE CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. 1. O segurado especial faz jus à concessão de auxílio-acidente independentemente do recolhimento de contribuições facultativas. 2. Aplicação de entendimento adotado no âmbito administrativo (artigo 58, II, da IN 20/2007), que não exige o recolhimento de contribuição previdenciária para a concessão do auxílio-acidente ao segurado especial.
(TRF4, Terceira Seção, EINF 0009884-60.2012.404.9999, rel. Néfi Cordeiro, p. 25jul.2013)
CONSECTÁRIOS DA SENTENÇA
Os consectários da sentença foram todos fixados nos termos da jurisprudência da Terceira Seção deste Tribunal Regional Federal da Quarta Região.
IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO
A Terceira Seção deste Tribunal Regional Federal da Quarta Região definiu a questão da implantação imediata de benefício previdenciário:
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. ART. 461 do CPC. TUTELA ESPECÍFICA. OBRIGAÇÃO DE FAZER. EFICÁCIA PREPONDERANTEMENTE MANDAMENTAL DO PROVIMENTO. CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO. POSSIBILIDADE. REQUERIMENTO DO SEGURADO. DESNECESSIDADE.
1. Atento à necessidade de aparelhar o processo de mecanismos preordenados à obtenção do resultado prático equivalente à situação jurídica que se verificaria caso o direito material tivesse sido observado espontaneamente pelo "devedor" através da realização da conduta imposta pelo direito material, o legislador, que já havia, na época da edição do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90) instituído a tutela específica do direito do "credor" de exigir o cumprimento dos deveres de fazer ou não fazer decorrentes de relação de consumo, inseriu no ordenamento processual positivo, por meio da alteração no art. 461 do Código de Processo Civil operada pela Lei 8.952/94, a tutela específica para o cumprimento dos deveres de fazer ou não fazer decorrentes das relações do direito material que não as de consumo.
2. A adoção da tutela específica pela reforma processual de 1994 do CPC veio para suprir, em parte, a morosidade judicial, na proporção em que busca dar ao cidadão aquilo e somente aquilo que lhe é devido, tirando o direito do plano genérico-abstrato da norma, conferindo-lhe efeitos concretos, com o fito de lhe garantir a mesma conseqüência do que aquela que seria obtida pelo adimplemento voluntário.
3. A sentença que concede um benefício previdenciário (ou assistencial), em regra, compõe-se de uma condenação a implantar o referido benefício e de outra ao pagamento das parcelas atrasadas. No tocante à determinação de implantação do benefício (para o futuro, portanto), a sentença é condenatória mandamental e será efetiva mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 461 do CPC, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo).
4. A respeito do momento a partir do qual se poderá tornar efetiva a sentença, na parte referente à implantação futura do benefício, a natureza preponderantemente mandamental da decisão não implica automaticamente o seu cumprimento imediato, pois há de se ter por referência o sistema processual do Código, não a Lei do Mandado de Segurança, eis que a apelação de sentença concessiva do benefício previdenciário será recebida em seu efeito devolutivo e suspensivo, nos termos do art. 520, caput, primeira parte, do CPC, motivo pelo qual a ausência de previsão de efeito suspensivo ex lege da apelação, em casos tais, traz por conseqüência a impossibilidade, de regra, do cumprimento imediato da sentença.
5. Situação diversa ocorre, entretanto, em segundo grau, visto que o acórdão que concede o benefício previdenciário, que esteja sujeito apenas a recurso especial e/ou recurso extraordinário, enseja o cumprimento imediato da determinação de implantar o benefício, ante a ausência, via de regra, de efeito suspensivo daqueles recursos, de acordo com o art. 542, § 2º, do CPC. Tal cumprimento não fica sujeito, pois, ao trânsito em julgado do acórdão, requisito imprescindível apenas para a execução da obrigação de pagar (os valores retroativamente devidos) e, consequentemente, para a expedição de precatório e de requisição de pequeno valor, nos termos dos parágrafos 1º, 1º-A e 3º do art. 100 da Constituição Federal.
6. O cumprimento imediato da tutela específica, diversamente do que ocorre no tocante à antecipação de tutela prevista no art. 273 do CPC, independe de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário, pois aquele é inerente ao pedido de que o réu seja condenado a conceder o benefício previdenciário, e o seu deferimento sustenta-se na eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 461 do CPC. Em suma, a determinação da implantação imediata do benefício contida no acórdão consubstancia, tal como no mandado de segurança, uma ordem (à autarquia previdenciária) e decorre do pedido de tutela específica (ou seja, o de concessão do benefício) contido na petição inicial da ação.
7. Questão de ordem solvida para que, no tocante à obrigação de implantar (para o futuro) o benefício previdenciário, seja determinado o cumprimento imediato do acórdão sujeito apenas a recurso especial e/ou extraordinário, independentemente de trânsito em julgado e de pedido específico da parte autora.
(TRF4, Terceira Seção, AC 2002.71.00.050349-7 questão de ordem, rel. Celso Kipper, j. 9ago.2007)
Neste caso, reconhecido o direito ao benefício, impõe-se a implantação imediata.
A bem da celeridade processual, já que o INSS vem opondo embargos de declaração em todos os casos em que determinada a implantação imediata do benefício, alegando, para fins de prequestionamento, violação do art. 128, ou do inc. I do art. 475-O, tudo do CPC, e art. 37 da Constituição, aborda-se desde logo a matéria.
Não se cogita de ofensa ao art. 128, ou ao inc. I do art. 475-O, do CPC, porque a hipótese, nos termos do precedente da Terceira Seção desta Corte, não é de antecipação, de ofício, de atos executórios. A implantação do benefício decorre da natureza da tutela judicial deferida, como está expresso na ementa acima transcrita.
A invocação do art. 37 da Constituição, por outro lado, é despropositada. Sequer remotamente se verifica ofensa ao princípio da moralidade pela concessão de benefício previdenciário por autoridade judicial competente.
Desta forma, em vista da procedência do pedido e do que estabelecem os arts. 461 e 475-I do CPC, bem como dos fundamentos expostos na questão de ordem cuja ementa foi acima transcrita, deve o INSS implantar o benefício em até quarenta e cinco dias, conforme os parâmetros acima definidos, incumbindo ao representante judicial da autarquia que for intimado desta decisão dar ciência à autoridade administrativa competente e tomar as demais providências necessárias ao cumprimento da tutela específica.
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-ACIDENTE. SEGURADO ESPECIAL. VISÃO MONOCULAR. SEQUELA IRREVERSÍVEL. REDUÇÃO DA CAPACIDADE LABORAL. TUTELA ESPECÍFICA. I. É devido o auxílio-acidente quando ficar comprovado que o segurado padece, após acidente, de seqüela irreversível, redutora da capacidade de exercer a sua ocupação habitual. II. Aperfeiçoados os requisitos legais, o segurado com visão monocular decorrente de trauma tem direito à concessão de auxílio-acidente. III. Deve-se determinar a imediata implantação do benefício previdenciário, considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 461 do CPC, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo.
(TRF4, Quinta Turma, REOAC 0024162-95.2014.404.9999, rel. Rogerio Favreto, j. 26fev.2015).
Pelo exposto, voto no sentido de negar provimento à apelação e à remessa oficial e determinar a implantação do benefício.
Marcelo De Nardi
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 01/12/2015
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5006414-66.2013.4.04.7002/PR
ORIGEM: PR 50064146620134047002
RELATOR | : | Juiz Federal MARCELO DE NARDI |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Jorge Luiz Gasparini da Silva |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | MARCIO LUIS LENZ |
ADVOGADO | : | FÁBIO GUSTAVO KENSY |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 01/12/2015, na seqüência 1085, disponibilizada no DE de 18/11/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E À REMESSA OFICIAL E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal MARCELO DE NARDI |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal MARCELO DE NARDI |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ | |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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