| D.E. Publicado em 29/09/2017 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0003900-56.2016.4.04.9999/PR
RELATOR | : | Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | ROSANGELA POLINICOLA |
ADVOGADO | : | Monica Maria Pereira Bichara e outro |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. FALTA DA QUALIDADE DE SEGURADO. ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA REVOGADA EM VIRTUDE DO JULGAMENTO DE IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS. DESCABIMENTO DE RESTITUIÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS. INAPLICABILIDADE DO ART. 115 DA LEI DE BENEFÍCIOS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
1. A comprovação da qualidade de segurado especial e a carência, dependem de início de prova material contemporânea, a qual necessita ser corroborada por prova testemunhal, não se admitindo a comprovação com base em prova meramente testemunhal.
2. Não comprovadas a qualidade de segurado especial e a carência, desnecessária a análise da incapacidade.
3. Não obstante tenha sido revogada a antecipação dos efeitos da tutela, é incabível a restituição dos valores recebidos a tal título, uma vez que foram alcançados à parte autora por força de decisão judicial e auferidos de absoluta boa-fé.
4. O art. 115 da Lei nº 8.213/1991 é aplicável tão somente nas hipóteses em que o pagamento do benefício tenha ocorrido por força de decisão administrativa.
5. Nos casos em que há revogação da antecipação dos efeitos da tutela, deve ser aplicado, de forma temperada, o art. 297, parágrafo único, c/c art. 520, incisos I e II do Código de Processo Civil, em vista dos princípios da segurança jurídica e da razoabilidade, bem como o princípio segundo o qual, na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.
6. Dentro do contexto que estão inseridos os benefícios previdenciários e assistenciais, não podem ser considerados indevidos os valores recebidos por força de antecipação dos efeitos da tutela posteriormente revogada, não havendo que se falar, por consequência, em restituição, devolução ou desconto.
7. Com a inversão da sucumbência, arcará a parte autora com o pagamento das custas e dos honorários advocatícios, os quais vão fixados em 10% sobre o valor da causa, suspensa a exigibilidade por ser beneficiária da Assistência Judiciária Gratuita - AJG, enquanto perdurar a condição de hipossuficiência econômica.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Turma Regional suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento ao apelo do INSS e à remessa oficial, tida por interposta, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 19 de setembro de 2017.
Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9109490v7 e, se solicitado, do código CRC FE72601A. | |
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| Data e Hora: | 20/09/2017 01:09 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0003900-56.2016.4.04.9999/PR
RELATOR | : | Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO |
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RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária por meio da qual a autora postula a concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez.
Sentenciando (sentença publicada em 26/11/2015), o juízo de primeiro grau julgou procedente o pedido para conceder aposentadoria à autora, a contar da DER em 24/01/2011.
Em suas razões recursais, o INSS sustenta que a autora não provou sua qualidade de segurada, porquanto trouxe apenas 01 (um) documento em que seu marido foi qualificado como agricultor, referente ao ano de 2000, mais de 10 anos antes da data do início da incapacidade. Reformada a sentença, requer sejam devolvidos os valores concedidos por força de antecipação de tutela. Caso se entenda que a autora possui direito, requer seja concedido o auxílio-doença ao invés de aposentadoria por invalidez.
Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
É o breve relatório.
VOTO
Reexame necessário
Considero interposta a remessa necessária, visto que sua dispensa apenas tem lugar quando a sentença líquida veicular condenação não excedente a 60 (sessenta) salários mínimos (STJ, Súmula 490, EREsp 600.596, Corte Especial, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, DJ 23/11/2009).
Saliente-se, por oportuno, que não incide o limite de 1.000 (mil) salários mínimos previsto no art. 496, §3º, inciso I, do NCPC, porquanto a sentença foi proferida antes de 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016), conforme prevê expressamente o artigo 14 do NCPC [A norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada].
Do benefício por incapacidade
Conforme o disposto no art. 59 da Lei n.º 8.213/91, o auxílio-doença é devido ao segurado que, havendo cumprido o período de carência, salvo as exceções legalmente previstas, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos. A aposentadoria por invalidez, por sua vez, será concedida ao segurado que, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, for considerado incapaz e insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, sendo-lhe pago enquanto permanecer nesta condição, nos termos do 42 da Lei de Benefícios da Previdência Social.
A lei de regência estabelece, ainda, que para a concessão dos benefícios em questão se exige o cumprimento da carência correspondente à 12 (doze) contribuições mensais (art. 25), salvo nos casos legalmente previstos.
Na eventualidade de ocorrer a cessação do recolhimento das contribuições exigidas, prevê o art. 15 da Lei n.º 8.213/91 um período de graça, prorrogando-se, por assim dizer, a qualidade de segurado durante determinado período. Vejamos:
"Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar;
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social.
§ 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos."
Decorrido o período de graça, o que acarreta na perda da qualidade de segurado, as contribuições anteriores poderão ser computadas para efeito de carência. Exige-se, contudo, um mínimo de 1/3 do número de contribuições exigidas para o cumprimento da carência definida para o benefício a ser requerido, conforme se extrai da leitura do art. 24 da Lei n.º 8.213/91. Dessa forma, cessado o vínculo, eventuais contribuições anteriores à perda da condição de segurado somente poderão ser computadas se cumpridos mais quatro meses.
É importante destacar que o pressuposto para a concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, é a existência de incapacidade (temporária ou total) para o trabalho. Isso quer dizer que não basta estar o segurado acometido de doença grave ou lesão, mas sim, demonstrar que sua incapacidade para o labor decorre delas.
De outra parte, tratando-se de doença ou lesão anterior à filiação ao Regime Geral de Previdência Social, não será conferido o direito à aposentadoria por invalidez/auxílio-doença, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou lesão (§ 2º do art. 42).
Em resumo, a concessão de benefícios por incapacidade pressupõe a demonstração dos seguintes requisitos: a) a qualidade de segurado; b) cumprimento do prazo de carência de 12 (doze) contribuições mensais (quando exigível); c) incapacidade para o trabalho de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporária (auxílio-doença).
No mais, deve ser ressaltado que, conforme jurisprudência dominante, nas ações em que se objetiva a concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez o julgador firma seu convencimento, de regra, através da prova pericial.
Nesse sentido:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE. AUSÊNCIA DE PERÍCIA MÉDICA. BAIXA DOS AUTOS À ORIGEM. REABERTURA DE INSTRUÇÃO. REALIZAÇÃO DE LAUDO. 1. Nas ações em que se objetiva a aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, o julgador firma seu convencimento, via de regra, com base na prova pericial. 2. Inexistindo prova pericial em caso no qual se faz necessária para a solução do litígio, reabre-se a instrução processual para que se realiza laudo judicial. 3. Sentença anulada para determinar a reabertura da instrução processual e a realização de perícia médica (TRF4ª, AC n.º 0009064-12.2010.404.9999/RS; Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira; DJ de 27/08/2010).
Quanto a isso, José Antônio Savaris, em sua obra "Direito Processual Previdenciário", 03ª ed., Juruá, 2011, p. 239, leciona que "a prova decisiva nos processos em que se discute a existência ou persistência da incapacidade para o trabalho é, em regra, a prova pericial realizada em juízo compreendida, então, à luz da realidade de vida do segurado".
Por fim, é importante ressaltar que, tratando-se de controvérsia cuja solução dependa de prova técnica, o juiz só poderá recusar a conclusão do laudo na eventualidade de motivo relevante constante dos autos, uma vez que o perito judicial encontra-se em posição equidistante das partes, mostrando-se, portanto imparcial e com mais credibilidade. Nesse sentido, os julgados desta Corte: APELAÇÃO CÍVEL Nº 5013417-82.2012.404.7107, 5ª TURMA, Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 05/04/2013 e APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5007389-38.2011.404.7009, 6ª TURMA, Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 04/02/2013.
Da qualidade de segurado e da carência
Para provar a qualidade de segurado e o cumprimento da carência de 12 meses, necessárias à concessão de benefício por incapacidade, a autora trouxe aos autos Certidão de Nascimento de filho, no ano de 2000, onde seu marido foi qualificado como "trabalhador rural" e ela "do lar" (fl. 13) e Certidão de Casamento Religioso, em 2007, onde os nubentes não foram qualificados (fl. 14), além de Declarações de particulares dizendo conhecer a autora e que a mesma presta serviço rural (fls. 17/18).
Não obstante, entendo que os documentos apresentados não se prestam como início de prova material.
A Certidão de Nascimento do filho da autora, apesar de o qualificar o esposo como trabalhador rural, é um documento referente ao ano de 2000, mais de 10 anos antes da DER (24/01/2011) e data do início da incapacidade fixada pelo perito no ano de 2011.
A Certidão Matrimonial de Casamento Religioso, igualmente, não se presta a comprovar a qualidade de segurado ou a carência, posto que não comprovam a profissão de lavrador/agricultor de nenhum dos nubentes.
Finalmente, as Declarações prestadas por particulares, equivalem a prova oral colhida em Justificação Administrativa, não podendo ser equiparada a prova documental.
Consabido que a prova material necessita ser contemporânea ao período a que se busca comprovar a qualidade de segurado especial, o que não foi o caso dos autos.
No caso concreto, além de haver apenas 01 (um) documento que se poderia aproveitar como início de prova (Certidão de Nascimento de Filho), ele não é contemporâneo aos fatos
Desta forma, por não restar comprovadas a qualidade de segurado e a carência, necessárias à concessão de benefício por incapacidade, tenho que deve ser reformada a sentença, para o fim de julgar improcedente o pedido.
Resta prejudicada a análise da incapacidade da parte autora, porquanto não detém a qualidade de segurado e a carência na data do início da incapacidade/DER.
Devolução das parcelas recebidas de boa-fé
No caso concreto, está sendo discutida a necessidade de devolução de valores recebidos em sede de antecipação dos efeitos da tutela posteriormente revogada. Portanto, discute-se, em síntese, a responsabilidade da parte autora em razão de valores recebidos em razão de DECISÃO JUDICIAL posteriormente revogada.
Assim, a controvérsia diz respeito à aplicação do art. 297, parágrafo único, c/c art. 520, incisos I e II, do Código de Processo Civil, que prevê a responsabilização objetiva da parte autora nos casos em que a antecipação dos efeitos da tutela é posteriormente revogada.
Nesse sentido, não há responsabilidade objetiva da parte autora quando o pagamento indevido decorre de decisão judicial, em razão do princípio da segurança jurídica e da boa-fé, naqueles casos em que está sendo discutida a concessão de benefício previdenciário, ou seja, de caráter eminentemente alimentar.
Em relação ao disposto pelo art. 115, inc. II, da Lei nº 8.213/1991, a sua aplicação é limitada aos casos em que o pagamento do benefício tenha ocorrido por força de decisão ADMINISTRATIVA, o que não ocorreu ao caso dos autos, uma vez que o pagamento do benefício se deu por decisão judicial.
Por oportuno, as seguintes decisões desta Corte:
APELAÇÃO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. PERCEPÇÃO DE BENEFÍCIO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA CONCEDIDA EM COGNIÇÃO EXAURIENTE POSTERIOMENTE REVOGADA. IMPOSSIBILIDADE. 1. O Superior Tribunal de Justiça, no julgamento dos Recursos Especiais 1.384.418/SC e 1.401.560/MT, este último representativo de controvérsia, modificando a consolidada orientação anterior, fixou entendimento no sentido de que é possível a repetição de valores recebidos do erário no influxo dos efeitos de antecipação de tutela posteriormente revogada, em face da precariedade da decisão judicial que a justifica, ainda que se trate de verba alimentar e esteja caracterizada a boa-fé subjetiva. 2. A desnecessidade de devolução de valores somente estaria autorizada no caso de recebimento com boa-fé objetiva, pela presunção de pagamento em caráter definitivo, o que não se verifica nas decisões que antecipam os efeitos da tutela. 3. Aplicação moderada da nova orientação, pois o rigorismo processual, muitas vezes, cede seu espaço em favor da efetividade dos postulados constitucionais dos direitos sociais fundamentais destinada a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social (artigo 194 da Constituição Federal). 4. A antecipação de tutela confirmada ou concedida em sentença, ou em grau de recurso, inviabiliza a restituição de valores, pois a análise foi efetuada em sede de cognição exauriente, o que mitiga o seu caráter precário e caracteriza a boa-fé objetiva. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5003185-31.2014.404.7207, 6ª TURMA, Juiz Federal OSNI CARDOSO FILHO, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 16/03/2016)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSO CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO PERCEBIDO POR FORÇA DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA POSTERIORMENTE REVOGADA. RECURSO ESPECIAL REPETITIVO 1.401.560. INTERPRETAÇÃO COM TEMPERAMENTOS. TUTELA ANTECIPADA DEFERIDA NA SENTENÇA. IRREPETIBILIDADE. 1. O STJ, no julgamento do REsp nº 1.401.560, exarado em regime de recurso repetitivo, entendeu ser repetível a verba percebida por força de tutela antecipada posteriormente revogada, em cumprimento ao art. 115, II, da Lei nº 8.213/91. 2. A interpretação do repetitivo deve ser observada com temperamentos, impondo-se a devolução apenas nos casos em que a medida antecipatória/liminar não tenha sido confirmada em sentença ou em acórdão, porquanto nas demais situações, embora permaneça o caráter precário do provimento, presente se fez uma cognição exauriente acerca das provas e do direito postulado, o que concretiza a boa-fé objetiva do segurado. 3. Neste contexto, a melhor interpretação a ser conferida aos casos em que se discute a (ir)repetibilidade da verba alimentar previdenciária, deve ser a seguinte: a) deferida a liminar/tutela antecipada no curso do processo, posteriormente não ratificada em sentença, forçoso é a devolução da verba recebida precariamente; b) deferida a liminar/tutela antecipada no curso do processo e ratificada em sentença, ou deferida na própria sentença, tem-se por irrepetível o montante percebido; c) deferido o benefício em sede recursal, por força do art. 461 do CPC/73, igualmente tem-se por irrepetível a verba. 4. No caso dos autos, a parte autora percebeu benefício previdenciário por força de tutela antecipada deferida na própria sentença, de modo que o montante recebido a título de aposentadoria por idade rural é irrepetível, mormente porque o título transitado em julgado nada referiu acerca da (des)necessidade de devolução dos valores. (TRF4, AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 0004848-56.2015.404.0000, 6ª TURMA, Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, POR UNANIMIDADE, D.E. 14/04/2016, PUBLICAÇÃO EM 15/04/2016)
Em conclusão, o art. 115 da Lei nº 8.213/1991 é aplicável tão somente nas hipóteses em que o pagamento do benefício tenha ocorrido por força de decisão administrativa.
Nos casos em que há revogação da antecipação dos efeitos da tutela, deve ser aplicado, de forma temperada, o art. 297, parágrafo único, c/c art. 520, incisos I e II, do Código de Processo Civil, em vista dos princípios da segurança jurídica e da razoabilidade, bem como o princípio segundo o qual, na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.
Cabe registrar, por oportuno, que, conquanto a Primeira Seção do STJ, no julgamento do REsp 1.401.560/MT (representativo de controvérsia julgado em 12/02/2014 e publicado no DJe de 13/10/2015), tenha firmado a tese de que, sendo a tutela antecipada provimento de caráter provisório e precário, a sua futura revogação acarreta a restituição dos valores recebidos, a Terceira Seção deste Regional, tem ratificado o entendimento no sentido de que é descabida a cobrança de valores recebidos em razão de decisão judicial, a exemplo dos seguintes precedentes:
"PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. CONVERSÃO DOS BENEFÍCIOS EM URV - ART. 20 DA LEI Nº 8.880/94. CONSTITUCIONALIDADE RECONHECIDA PELO STF. VIOLAÇÃO À LEI. DEVOLUÇÃO DE PARCELAS RECEBIDAS DE BOA-FÉ - IMPOSSIBILIDADE. 1. Afirmada pelo STF a constitucionalidade da forma de conversão dos benefícios em URV determinada pelo artigo 20 da Lei nº 8.880/94, deve ser reconhecida, no acórdão rescindendo, sua violação. 2. É indevida a restituição de valores recebidos por força da decisão rescindenda, os quais, de caráter alimentar, até então estavam protegidos pelo pálio da coisa julgada. 3. Precedentes do STF e do STJ. (TRF4, AR 2003.04.01.030574-0, Terceira Seção, Relator Roger Raupp Rios, D.E. 11/11/2014)
AÇÃO RESCISÓRIA. PREVIDENCIÁRIO. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS A TÍTULO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. VIOLAÇÃO DO ART. 515 DO CPC. OMISSÃO DO ACÓRDÃO.
1. Omisso o acórdão quanto ao pedido de reforma da sentença para desobrigar a autora da devolução de parcelas do auxílio-doença recebidas por força de antecipação de tutela revogada, admite-se a rescisão com fundamento no art. 485, V, do CPC.
2. O pagamento originado de decisão devidamente motivada à luz das razões de fato e de direito apresentadas, e mediante o permissivo do art. 273 do CPC, tem presunção de legitimidade e assume contornos de definitividade no sentir da segurada, dada a finalidade a que se destina de prover os meios de subsistência.
3. Evidenciada a boa-fé, o beneficiário não pode ficar jungido à contingência de devolver valores que já foram consumidos, sob pena de inviabilização do instituto da antecipação de tutela no âmbito dos direitos previdenciários.
4. Hipótese em que não se constata a alegada violação do princípio da reserva do plenário por declaração tácita de inconstitucionalidade dos arts. 115 da Lei nº 8.213/91 e 475-O do CPC.
5. Ação rescisória julgada procedente; dispensada a autora da restituição das verbas recebidas durante a vigência da antecipação de tutela.
(AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0015157-78.2011.404.0000/PR, Rel. Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon, D.E. 09-08-2013)
A própria Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça reconhece a irrepetibilidade dos valores recebidos a título de tutela antecipada quando a decisão é confirmada pelo Tribunal de origem:
PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. SENTENÇA QUE DETERMINA O RESTABELECIMENTO DE PENSÃO POR MORTE. CONFIRMAÇÃO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. DECISÃO REFORMADA NO JULGAMENTO DO RECURSO ESPECIAL. DEVOLUÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS DE BOA-FÉ. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES DO STJ.
1. A dupla conformidade entre a sentença e o acórdão gera a estabilização da decisão de primeira instância, de sorte que, de um lado, limita a possibilidade de recurso do vencido, tornando estável a relação jurídica submetida a julgamento; e, de outro, cria no vencedor a legítima expectativa de que é titular do direito reconhecido na sentença e confirmado pelo Tribunal de segunda instância.
2. Essa expectativa legítima de titularidade do direito, advinda de ordem judicial com força definitiva, é suficiente para caracterizar a boa-fé exigida de quem recebe a verba de natureza alimentar posteriormente cassada, porque, no mínimo, confia - e, de fato, deve confiar - no acerto do duplo julgamento.
3. Por meio da edição da súm. 34/AGU, a própria União reconhece a irrepetibilidade da verba recebida de boa-fé, por servidor público, em virtude de interpretação errônea ou inadequada da Lei pela Administração. Desse modo, e com maior razão, assim também deve ser entendido na hipótese em que o restabelecimento do benefício previdenciário dá-se por ordem judicial posteriormente reformada.
4. Na hipótese, impor ao embargado a obrigação de devolver a verba que por anos recebeu de boa-fé, em virtude de ordem judicial com força definitiva, não se mostra razoável, na medida em que, justamente pela natureza alimentar do benefício então restabelecido, pressupõe-se que os valores correspondentes foram por ele utilizados para a manutenção da própria subsistência e de sua família. Assim, a ordem de restituição de tudo o que foi recebido, seguida à perda do respectivo benefício, fere a dignidade da pessoa humana e abala a confiança que se espera haver dos jurisdicionados nas decisões judiciais.
5. Embargos de divergência no recurso especial conhecidos e desprovidos.
(EREsp 1086154/RS, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Corte Especial, julgado em 20/11/2013, DJe 19/03/2014).
Esta posição é acolhida também pelo Supremo Tribunal Federal:
"DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO RECEBIDO POR FORÇA DE DECISÃO JUDICIAL. DEVOLUÇÃO. ART. 115 DA LEI 8.213/91. IMPOSSIBILIDADE. BOA-FÉ E CARÁTER ALIMENTAR. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO DO ART. 97 DA CF. RESERVA DE PLENÁRIO: INOCORRÊNCIA. ACÓRDÃO RECORRIDO PUBLICADO EM 15.4.2009.
A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que o benefício previdenciário recebido de boa-fé pelo segurado em virtude de decisão judicial não está sujeito a repetição de indébito, dado o seu caráter alimentar. Na hipótese, não importa declaração de inconstitucionalidade do art. 115 da Lei 8.213/91, o reconhecimento, pelo Tribunal de origem, da impossibilidade de desconto dos valores indevidamente percebidos. Agravo regimental conhecido e não provido."( AG. REG. NO AGRAVO DE INSTRUMENTO 829.661/MG. Rel. Ministra Rosa Weber. 1ª Turma. Maioria. Julgado em 18/06/2013. DJE 07/08/2013).
Em reforço, transcrevo excerto da decisão monocrática proferida pelo Ministro Roberto Barroso, quando da apreciação de agravo interposto pelo INSS contra decisão que negou seguimento a recurso extraordinário (ARE 7342.31/RS, DJe 30/04/2015):
"O recurso extraordinário é inadmissível. Com efeito, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal já assentou que o benefício previdenciário recebido de boa-fé pelo segurado, em decorrência de decisão judicial, não está sujeito à repetição de indébito, em razão de seu caráter alimentar. Precedentes: AI 841.473-RG, Rel. Min. Presidente; e ARE 638.548-AgR, Rel. Min. Luiz Fux".
Dessa forma, a pretensão de restituição dos valores recebidos por força de antecipação de tutela encontra óbice, no caso em exame, na natureza alimentar de ditas verbas e na boa-fé que pautou o seu recebimento pelo segurado, cabendo privilegiar assim estes dois institutos. Ademais, o dispositivo legal utilizado como fundamento para embasar a cobrança dos valores recebidos indevidamente, refere-se a ato administrativo que culminou em pagamento indevido, e não por força de decisão judicial posteriormente reformada.
Em conclusão, não se desconhece o julgado do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.401.560/MT), afetado como repetitivo, nos termos do art. 1.040, II CPC/2015, no qual estabeleceu o entendimento de que a reforma da decisão que antecipa a tutela obriga o autor da ação a devolver os benefícios previdenciários indevidamente recebidos. Contudo, diante do entendimento diverso, no âmbito da Corte Especial do próprio STJ, bem como dos precedentes do Supremo Tribunal Federal e deste Tribunal, resolvo manter a sentença.
Honorários e custas
Com a inversão da sucumbência, arcará a parte autora com o pagamento das custas e dos honorários advocatícios, os quais vão fixados em 10% sobre o valor da causa, suspensa a exigibilidade por ser beneficiária da Assistência Judiciária Gratuita - AJG, enquanto perdurar a condição de hipossuficiência econômica.
Prequestionamento
Restam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pelas partes.
Conclusão
Apelação e Remessa oficial providas para julgar improcedente o pedido e condenar a parte autora ao pagamento dos honorários advocatícios e custas.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento ao apelo do INSS e à remessa oficial, tida por interposta.
Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 19/09/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0003900-56.2016.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00006575520118160156
RELATOR | : | Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO |
PRESIDENTE | : | Luiz Fernando Wowk Penteado |
PROCURADOR | : | Dr. Claudio Dutra Fontella |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | ROSANGELA POLINICOLA |
ADVOGADO | : | Monica Maria Pereira Bichara e outro |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 19/09/2017, na seqüência 16, disponibilizada no DE de 04/09/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO AO APELO DO INSS E À REMESSA OFICIAL, TIDA POR INTERPOSTA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO |
: | Des. Federal AMAURY CHAVES DE ATHAYDE | |
: | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA | |
AUSENTE(S) | : | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA |
Suzana Roessing
Secretária de Turma
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