Apelação Cível Nº 5004987-54.2019.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
APELANTE: Cleria Maria Casagrande
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação contra sentença, publicada em 09/10/2018, na qual o magistrado a quo julgou improcedente o pedido de concessão/restabelecimento do benefício de auxílio-doença, com posterior conversão em aposentadoria por invalidez, condenando a parte autora ao pagamento de custas processuais e de honorários advocatícios, os quais restaram suspensos em razão do benefício da assistência judiciária gratuita.
Em suas razões, a parte autora sustenta que apresenta tendinopatia grave, problemas sérios nos ombros e restrição de movimentação dos membros superiores, aliados à idade avançada e à baixíssima escolaridade, razão pela qual requer a concessão dos benefícios postulados na inicial.
Apresentadas as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
A qualidade de segurado e a carência mínima exigidas para a concessão do benefício não foram questionadas nos autos. Além disso, no âmbito administrativo, o Instituto Nacional do Seguro Social reconheceu o preenchimento de tais requisitos ao conceder à parte autora os benefícios de auxílio-doença NB 542.838.026-4, NB 546.159.775-7 e NB 619.673.027-8, nos períodos de 28/09/2010 a 28/10/2010, 16/05/2011 a 16/06/2017 e 28/07/2017 a 09/10/2017. Tenho-os, assim, por incontroversos.
Resta, pois, averiguar a existência de incapacidade laboral que justifique a concessão dos benefícios postulados.
Tratando-se de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, o Julgador firma sua convicção, via de regra, por meio da prova pericial.
No caso concreto, a parte autora possui 53 anos e desempenha a atividade profissional de Agricultora. Foi realizada perícia médica judicial, por especialista em Ortopedia e Traumatologia, em 24/08/18 (Evento 5, VIDEO1).
O perito judicial informou que a autora apresentou teste de Apley positivo no ombro direito, tendinopatia em ambos os ombros e epicondilite no cotovelo direito. Porém, concluiu que não há incapacidade, havendo restrição parcial para atividades que exijam elevação dos membros superiores acima de 60º, 90º.
A parte autora apresentou com a petição inicial os seguintes documentos: atestado médico de 03/11/2017, informando tendinopatia de ombros direito e esquerdo e epicondilite de cotovelo direito, sugerindo afastamento de 3 meses (Evento 2, OUT7, Página 1), ultrassonografias de ombros direito e esquerdo e de cotovelo direito, de 05/10/2017, com diagnósticos de tendinopatia do manguito rotador e artropatia degenerativa acromioclavicular em ambos os ombros (Evento 2, OUT7, Páginas 2/3) e tendinopatia do extensor e flexor comum no cotovelo direito (Evento 2, OUT7, Página 4).
Dos benefícios recebidos pela autora, o NB542.838.026-4 e o NB 546.159.775-7 foram concedidos pelas patologias ortopédicas apresentadas (Evento 2, OUT19, Páginas 15/18). Já o NB 619.673.027-8 foi concedido no período pós-operatório de doação de rim (Evento 2, OUT19, Página 19). O requerimento mais recente (16/11/2017, Evento 2, OUT19, Página 3) também teve como fundamento as patologias ortopédicas (Evento 2, OUT19, Página 21).
Com efeito, cumpre esclarecer que o perito judicial é o profissional de confiança do juízo, cujo compromisso é examinar a parte com imparcialidade. Porém, cabe referir que, a meu juízo, o magistrado não fica adstrito às conclusões do perito quando a prova em sentido contrário ao laudo judicial for suficientemente robusta e convincente, o que, a meu sentir, ocorreu no presente feito.
A perícia judicial comprovou a existência das patologias ortopédicas em ambos os ombros e no cotovelo direito. Foi informada, ainda, restrição para elevação dos membros superiores acima de 60º, ou seja, restrição para elevar os braços à altura dos ombros.
Em que pese o laudo pericial e sua conclusão pela aptidão laboral da parte autora, entendo que a confirmação da existência de patologias ortopédicas limitadoras, as quais deram causa, inclusive, a longo período de benefício por incapacidade, associada à necessidade de restrições de atividades, demonstram efetiva incapacidade para o exercício da atividade profissional de agricultora.
Ora, é necessário sopesar a realidade fática. Se a autora, que atua exclusivamente na agricultura e conta, atualmente, 53 anos de idade, necessita agora laborar ergonomicamente correto para que não corra o risco de ter suas patologias ortopédicas agravadas, vez que os trabalhos braçais contribuíram para a evolução das doenças degenerativas que lhe acometem; se a autora é analfabeta e, certamente, nunca foi instruída quanto aos cuidados ergonômicos e, portanto, atuou sempre de forma postural incorreta; se as atividades agrícolas são essencialmente braçais e exigem horas de elevados esforços, vigor físico e trabalho muscular repetitivo e prolongado, notadamente aquelas de cultivo artesanal, que envolvem plantio, colheita, transporte, carregamento e descarregamento da produção e exigem a plena aptidão do emprego de força; se a autora sente dores em razão de tais lesões, necessitando do uso de fármacos para aliviar o quadro sintomático; e, finalmente, se as atividades permitidas devem limitar-se tão somente às leves, moderadas, de modo a evitar diversos movimentos, sendo certo que tais movimentos são imprescindíveis e inerentes à sua atividade habitual, é forçoso concluir que há efetiva incapacidade para o exercício das atividades campesinas, insuscetíveis de serem realizadas de forma ergonômica, não sendo razoável exigir-se que estas atividades sejam desempenhadas sob constante acometimento de dor.
Destarte, forçoso concluir que, no caso concreto, não há apenas leves restrições, mas efetiva incapacidade para o exercício de atividades rurícolas.
Não há, porém, elementos suficientes para a comprovação de incapacidade definitiva, notadamente porque o único atestado médico apresentado indica afastamento das atividades laborais por três meses.
Considerando, pois, o conjunto probatório é devido o benefício de auxílio-doença, até a efetiva recuperação ou reabilitação a outra atividade.
Termo inicial
Tendo o conjunto probatório apontado a existência de incapacidade laboral desde a época do requerimento administrativo (16/11/2017, Evento 2, OUT19, Página 3), o benefício é devido desde então.
Correção monetária e juros moratórios
A atualização monetária das parcelas vencidas deve observar o INPC no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91, conforme deliberação do STJ no julgamento do Tema 905 (REsp nº 1.495.146 - MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DE 02-03-2018), o qual resta inalterado após a conclusão do julgamento, pelo Plenário do STF, em 03-10-2019, de todos os EDs opostos ao RE 870.947 (Tema 810 da repercussão geral), pois rejeitada a modulação dos efeitos da decisão de mérito.
Quanto aos juros de mora, até 29-06-2009 devem ser fixados à taxa de 1% ao mês, a contar da citação, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/1987, aplicável, analogicamente, aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte. A partir de 30-06-2009, por força da Lei n. 11.960, de 29-06-2009, que alterou o art. 1º-F da Lei n. 9.494/97, para fins de apuração dos juros de mora haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice oficial aplicado à caderneta de poupança, conforme decidido pelo Pretório Excelso no RE n. 870.947 (Tema STF 810).
Honorários advocatícios
Considerando que a sentença foi publicada após 18-03-2016, data definida pelo Plenário do STJ para início da vigência do NCPC (Enunciado Administrativo nº 1-STJ), bem como o Enunciado Administrativo n. 7 - STJ (Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18 de março de 2016, será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do art. 85, § 11, do novo CPC), aplica-se ao caso a sistemática de honorários advocatícios ora vigente.
Desse modo, os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data do presente julgamento, a teor das Súmulas 111 do STJ e 76 desta Corte, ressaltando ser incabível, no caso, a majoração dos honorários prevista § 11 do art. 85 do NCPC, a teor do posicionamento que vem sendo adotado pelo STJ (v.g. AgIntno AREsp 829.107/RJ, Relator p/ Acórdão Ministro MARCO BUZZI, Quarta Turma, DJe 06-02-2017 e AgInt nos EDcl no REsp1357561/MG, Relator Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Terceira Turma, DJe 19-04-2017).
Honorários periciais
Sucumbente, deve o INSS suportar o pagamento do valor fixado a título de honorários periciais.
Custas
O INSS é isento do pagamento das custas judiciais na Justiça Federal, nos termos do art. 4º, I, da Lei n. 9.289/96, e na Justiça Estadual de Santa Catarina, a teor do que preceitua o art. 33, parágrafo primeiro, da Lei Complementar Estadual n. 156/97, com a redação dada pela Lei Complementar Estadual n. 729/2018.
Tutela específica
Na vigência do Código de Processo Civil de 1973, a Terceira Seção desta Corte, buscando dar efetividade ao disposto no art. 461, que dispunha acerca da tutela específica, firmou o entendimento de que o acórdão que concedesse benefício previdenciário e sujeito apenas a recurso especial e/ou extraordinário, em princípio, sem efeito suspensivo, ensejava o cumprimento imediato da determinação de implantar o benefício, independentemente do trânsito em julgado ou de requerimento específico da parte, em virtude da eficácia mandamental dos provimentos fundados no referido artigo (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC n. 2002.71.00.050349-7/RS, de minha Relatoria, julgado em 09-08-2007).
Nesses termos, entendeu o Órgão Julgador que a parte correspondente à obrigação de fazer ensejava o cumprimento desde logo, enquanto a obrigação de pagar ficaria postergada para a fase executória.
O art. 497 do novo CPC, buscando dar efetividade ao processo, dispôs de forma similar à prevista no Código de 1973, razão pela qual o entendimento firmado pela Terceira Seção deste Tribunal, no julgamento da Questão de Ordem acima referida, mantém-se íntegro e atual.
Portanto, com fulcro no art. 497 do CPC, determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora, a ser efetivada em 45 dias. Na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação da parte autora para conceder o benefício de auxílio-doença desde o requerimento administrativo e determinar o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício.
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Apelação Cível Nº 5004987-54.2019.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
APELANTE: Cleria Maria Casagrande
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA/APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE LABORAL. agricultora. TERMO INICIAL.
1. A perícia judicial comprovou a existência de tendinopatia em ambos os ombros e epicondilite no cotovelo direito. Foi informada, ainda, restrição para elevação dos membros superiores acima de 60º.
2. A autora possui 53 anos e é analfabeta. Se as atividades permitidas devem limitar-se tão somente às leves, moderadas, de modo a evitar diversos movimentos, sendo certo que tais movimentos são imprescindíveis e inerentes à sua atividade habitual, é forçoso concluir que há efetiva incapacidade para o exercício das atividades campesinas, insuscetíveis de serem realizadas de forma ergonômica.
3. Considerando, pois, o conjunto probatório é devido o benefício de auxílio-doença, até a efetiva recuperação ou reabilitação a outra atividade.
4. Tendo o conjunto probatório apontado a existência da incapacidade laboral desde a época do requerimento administrativo, o benefício é devido desde então.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da parte autora para conceder o benefício de auxílio-doença desde o requerimento administrativo e determinar o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 20 de agosto de 2020.
Documento eletrônico assinado por CELSO KIPPER, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001773614v4 e do código CRC 14551b82.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 13/08/2020 A 20/08/2020
Apelação Cível Nº 5004987-54.2019.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
PRESIDENTE: Desembargador Federal CELSO KIPPER
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
APELANTE: Cleria Maria Casagrande
ADVOGADO: CARLO ANDREAS DALCANALE (OAB SC016187)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 13/08/2020, às 00:00, a 20/08/2020, às 16:00, na sequência 1071, disponibilizada no DE de 03/08/2020.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARA CONCEDER O BENEFÍCIO DE AUXÍLIO-DOENÇA DESDE O REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO E DETERMINAR O CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO NO TOCANTE À IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES
Secretária
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