Apelação Cível Nº 5018167-74.2018.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: RUTH ELAINE GONCALVES SILVA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
A autora interpôs recurso de apelação contra sentença que julgou improcedente o pedido de concessão de auxílio-doença, com conversão em aposentadoria por invalidez, uma vez que não foi constatada pela perícia médica judicial incapacidade para o exercício de suas atividades habituais, condenando-a ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, arbitrados estes em 10% sobre o valor da causa, cuja exigibilidade permanece suspensa em razão de ser beneficiária da justiça gratuita (Ev. 3, SENT30).
A parte autora, em suas razões de apelação, postulou a concessão do benefício de auxílio-doença, com conversão em aposentadoria por invalidez, alegando estar demonstrada, por meio da documentação juntada aos autos, a sua incapacidade total e permanente para o trabalho, especialmente se considerada a sua idade e demais condições pessoais.
Sem contrarrazões e sem remessa necessária, vieram os autos a este Tribunal.
VOTO
Do benefício por incapacidade
Conforme o disposto no art. 59 da Lei n.º 8.213/91, o auxílio-doença é devido ao segurado que, havendo cumprido o período de carência, salvo as exceções legalmente previstas, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos. A aposentadoria por invalidez, por sua vez, será concedida ao segurado que, uma vez cumprido, quando for o caso, a carência exigida, for considerado incapaz e insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, sendo-lhe pago enquanto permanecer nesta condição, nos termos do 42 da Lei de Benefícios da Previdência Social.
A lei de regência estabelece, ainda, que para a concessão dos benefícios em questão se exige o cumprimento da carência correspondente à 12 (doze) contribuições mensais (art. 25), salvo nos casos legalmente previstos.
Na eventualidade de ocorrer a cessação do recolhimento das contribuições exigidas, prevê o art. 15 da Lei nº 8.213/91 um período de graça, prorrogando-se, por assim dizer, a qualidade de segurado durante determinado período. Decorrido o período de graça, o que acarreta na perda da qualidade de segurado, as contribuições anteriores poderão ser computadas para efeito de carência. Exige-se, contudo, um mínimo de 1/3 do número de contribuições exigidas para o cumprimento da carência definida para o benefício a ser requerido, conforme se extrai da leitura do art. 24 da Lei nº 8.213/91. Dessa forma, cessado o vínculo, eventuais contribuições anteriores à perda da condição de segurado somente poderão ser computadas se cumpridos mais quatro meses.
É importante destacar que o pressuposto para a concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, é a existência de incapacidade (temporária ou total) para o trabalho. Isso quer dizer que não basta estar o segurado acometido de doença grave ou lesão, mas sim, demonstrar que sua incapacidade para o labor decorre delas.
De outra parte, tratando-se de doença ou lesão anterior à filiação ao Regime Geral de Previdência Social, não será conferido o direito à aposentadoria por invalidez/auxílio-doença, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou lesão (§ 2º do art. 42).
Em resumo, a concessão de benefícios por incapacidade pressupõe a demonstração dos seguintes requisitos: a) a qualidade de segurado; b) cumprimento do prazo de carência de 12 (doze) contribuições mensais (quando exigível); c) incapacidade para o trabalho de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporária (auxílio-doença).
No mais, deve ser ressaltado que, conforme jurisprudência dominante, nas ações em que se objetiva a concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez o julgador firma seu convencimento, de regra, através da prova pericial. Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE. AUSÊNCIA DE PERÍCIA MÉDICA. BAIXA DOS AUTOS À ORIGEM. REABERTURA DE INSTRUÇÃO. REALIZAÇÃO DE LAUDO. 1. Nas ações em que se objetiva a aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, o julgador firma seu convencimento, via de regra, com base na prova pericial. 2. Inexistindo prova pericial em caso no qual se faz necessária para a solução do litígio, reabre-se a instrução processual para que se realiza laudo judicial. 3. Sentença anulada para determinar a reabertura da instrução processual e a realização de perícia médica (TRF4ª, AC n.º 0009064-12.2010.404.9999/RS; Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira; DJ de 27/08/2010).
Quanto a isso, José Antônio Savaris, em sua obra "Direito Processual Previdenciário", 03ª ed., Juruá, 2011, p. 239, leciona que "a prova decisiva nos processos em que se discute a existência ou persistência da incapacidade para o trabalho é, em regra, a prova pericial realizada em juízo compreendida, então, à luz da realidade de vida do segurado".
Por fim, é importante ressaltar que, tratando-se de controvérsia cuja solução dependa de prova técnica, o juiz só poderá recusar a conclusão do laudo na eventualidade de motivo relevante constante dos autos, uma vez que o perito judicial encontra-se em posição equidistante das partes, mostrando-se, portanto imparcial e com mais credibilidade. Nesse sentido, os julgados desta Corte: APELAÇÃO CÍVEL Nº 5013417-82.2012.404.7107, 5ª TURMA, Des. Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 05/04/2013 e APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5007389-38.2011.404.7009, 6ª TURMA, Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 04/02/2013.
CASO CONCRETO
Da incapacidade
No caso em análise, foi realizada perícia médica na autora, em 16 de maio de 2017, a fim de que fosse esclarecido o seu estado de saúde e a sua capacidade laborativa, concluindo o perito pela ausência de incapacidade para o exercício de suas atividades habituais (Ev. 3, CARTA PREC/ORDEM25, págs. 34/37).
Nesse contexto, o perito judicial, médico ortopedista, constatou que a apelante apresenta diagnóstico de dor lombar (CID M545) e, ao proceder ao exame físico, esclareceu o seguinte (Ev. 3, CARTA PREC/ORDEM25, págs. 34/37):
Marcha normal. Senta e levanta sem restrições. Retira e coloca o calçado em pé com flexão máxima de tronco. Flexão do tronco e mobilidade da coluna preservadas. Hipercifose torácica moderada. Dermatite ocre em região distal medial da pena direita. Lasegue Negativo (refere alívio ao realizar o teste). Demonstra bastante força de contra resistência (em todos os movimentos que tento realizar faz força contrária). Força e neurovascular preservados em membros inferiores. Sem atrofias ou hipotrofias musculares.
Em seguida, concluiu o perito que (Ev. 3, CARTA PREC/ORDEM25, págs. 34/37):
Sem incapacidade do ponto de vista ortopédico. Autora com alterações degenerativas próprias da idade, sem sinais de patologia incapacitante, tais como atrofias ou contraturas musculares, perda de força muscular, redução de mobilidade articular, edema e alterações inflamatórias articulares. Não realiza tratamento atual. - Grifo nosso.
Conforme se observa do laudo pericial, o perito foi taxativo ao afirmar que a autora, diante dos documentos apresentados, e considerada a sua condição pessoal e profissional, não se encontra incapaz para o exercício de suas atividades habituais.
Assim, havendo o laudo médico oficial concluído pela inexistência de incapacidade para o exercício de atividades laborais habituais, e inexistindo prova substancial em contrário, não há direito a benefício por incapacidade.
No caso sob exame, os documentos juntados aos autos - notadamente os atestados e exames médicos que acompanham a inicial (Ev. 3, ANEXOS PET4) - não têm o condão, por si só, de corroborar as alegações deduzidas pela parte autora. Em que pese tais documentos darem conta das moléstias que poderiam gerar a incapacidade arguida pela autora, verifica-se, a partir de um exame do conjunto probatório dos autos, que deve subsistir a presunção legal de veracidade do exame pericial do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, o qual foi corroborado pela perícia judicial realizada no sentido da ausência de incapacidade. Essa presunção não é absoluta, por certo, mas a parte autora não logrou demonstrar que a sua doença é incapacitante, eis que os atestados médicos acostados se mostram isolados nos autos, constituindo prova unilateral, produzida a partir das conclusões alcançadas por médico particular. Desse modo, a prova produzida pelo autor se mostra insuficiente para infirmar o laudo médico judicial apresentado.
Ressalte-se que o perito judicial detém o conhecimento científico necessário ao exame do segurado, ficando ao seu cargo a análise dos exames laboratoriais ou físicos para exarar o seu diagnóstico. A desconsideração do laudo pericial somente se justificaria com base num robusto contexto probatório contraposto à conclusão do perito judicial, constituído por exames que sejam conclusivos acerca da capacidade para o exercício de atividade laborativa e que efetivamente coloque em dúvida a conclusão do expert do juízo.
Vale dizer, ainda, que, embora o julgador não esteja adstrito à perícia judicial, é inquestionável que, tratando-se de controvérsia cuja solução dependa de prova técnica, o juiz só poderá recusar a conclusão do laudo se houver motivo relevante, uma vez que o perito judicial se encontra em posição equidistante das partes, mostrando-se imparcial e com mais credibilidade. Dessa forma, a prova em sentido contrário ao laudo judicial, para prevalecer, deve ser suficientemente robusta e convincente, o que não ocorreu no presente caso.
Destaque-se, também, que a existência de patologia ou lesão nem sempre significa incapacidade para o trabalho. Doença e incapacidade podem coincidir ou não, dependendo da gravidade da moléstia, das atividades inerentes ao exercício laboral e da sujeição e resposta ao tratamento indicado. Portanto, nem toda enfermidade gera a incapacidade necessária ao deferimento dos benefícios previdenciários postulados.
Assim, eventual divergência quanto às conclusões do laudo não implica realização de nova perícia ou complementação do procedimento, uma vez que se verifica que a prova foi suficientemente esclarecedora para o convencimento do juízo.
Dessa forma, ausente a incapacidade para o trabalho, não é devido o benefício de auxílio-doença.
Honorários advocatícios
Desprovida a apelação, devem ser majorados, por força do § 11 do artigo 85, do CPC, os honorários advocatícios devidos ao patrono do réu para 15% sobre o valor da causa, a serem atualizados na forma prevista no Manual de Cálculos da Justiça Federal.
No entanto, permanece suspensa a exigibilidade da referida verba em razão da gratuidade de justiça, cumprindo ao credor no prazo assinalado no § 3º do artigo 98 do CPC, comprovar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão da benesse.
Prequestionamento
O enfrentamento das questões suscitadas em grau recursal, assim como a análise da legislação aplicável, são suficientes para prequestionar junto às instâncias superiores os dispositivos que as fundamentam. Assim, deixa-se de aplicar os dispositivos legais ensejadores de pronunciamento jurisdicional distinto do que até aqui foi declinado. Desse modo, evita-se a necessidade de oposição de embargos de declaração tão somente para este fim, o que evidenciaria finalidade procrastinatória do recurso, passível de cominação de multa.
Dispositivo
Em face do que foi dito, voto no sentido de negar provimento à apelação da parte autora.
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Apelação Cível Nº 5018167-74.2018.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: RUTH ELAINE GONCALVES SILVA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. LAUDO PERICIAL. INCAPACIDADE NÃO DEMONSTRADA. honorários recursais.
1. Constatada a ausência de patologia incapacitante pela perícia judicial, imprópria a concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez em favor do segurado, ainda que as suas condições pessoais indiquem dificuldade de reinserção no mercado de trabalho.
2. Desprovido o recurso da parte autora, devida a majoração dos honorários advocatícios em 5%, conforme o que está disposto no § 11 do art. 85 do CPC.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 09 de outubro de 2018.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 09/10/2018
Apelação Cível Nº 5018167-74.2018.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: RUTH ELAINE GONCALVES SILVA
ADVOGADO: SANDRA MAIRA NOGUEIRA PATRÍCIO
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 09/10/2018, na sequência 174, disponibilizada no DE de 24/09/2018.
Certifico que a 5ª Turma , ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª Turma , por unanimidade, decidiu negar provimento à apelação da parte autora.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Juiz Federal FÁBIO VITÓRIO MATTIELLO
Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE
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