Apelação Cível Nº 5008207-26.2020.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: ELIANE ALDROVANDI
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Eliane Aldrovandi interpôs apelação em face de sentença que julgou parcialmente procedente o pedido para restabelecimento de auxílio-doença, em seu favor, desde 18 de maio de 2019, pelo prazo de 12 (doze) meses a contar da reimplantação decorrente da sentença, condenando a autarquia ao pagamento das parcelas em atraso, corrigidas e com juros, e dos honorários advocatícios, em percentual a ser fixado na fase de liquidação de sentença (Eventos 55 e 64).
Sustentou que faz jus à aposentadoria por invalidez, já que há prova da inaptidão total e permanente em razão dos problemas psiquiátricos que apresenta há muitos anos, pois não há possibilidade de reabilitação, bem como mencionou que possui ideação suicida constante. Citou ter idade avançada. Argumentou que está incapacitada desde a cessação administrativa, ocorrida em 16 de julho de 2017, de forma que este deve ser o termo inicial do benefício. Por fim, caso mantido o auxílio-doença, pediu seja concedido por prazo indeterminado (Evento 72).
Com contrarrazões, subiram os autos.
VOTO
Benefício por incapacidade
O art. 59 da Lei n.º 8.213/91 estabelece que o auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido na referida lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.
Por sua vez, o art. 42 da Lei nº 8.213/91 estabelece que a aposentadoria por invalidez será concedida ao segurado que, tendo cumprido, quando for o caso, a carência exigida, for considerado incapaz e insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência.
A Lei nº 8.213/91 estabelece que, para a concessão dos benefícios em questão, deve ser cumprida a carência correspondente a 12 (doze) contribuições mensais (art. 25), a qual é dispensada nos casos legalmente previstos (art. 26, II, da Lei nº 8.213/91).
O fato de a incapacidade temporária ser total ou parcial para fins de concessão do auxílio-doença não interfere na concessão desse benefício, uma vez que, por incapacidade parcial, deve-se entender aquela que prejudica o desenvolvimento de alguma das atividades laborativas habituais do segurado. No mesmo sentido, assim já decidiu o e. STJ, verbis:
RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE PARCIAL PARA O TRABALHO HABITUAL.
1. É devido o auxílio-doença ao segurado considerado parcialmente incapaz para o trabalho, mas suscetível de reabilitação profissional para o exercício de outras atividades laborais.
2. Recurso improvido. (STJ, REsp 501267 / SP, rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, T6 - SEXTA TURMA, DJ 28/06/2004 p. 427)
Por fim, a diferença entre os dois benefícios restou esclarecida consoante excerto doutrinário abaixo colacionado, verbis:
"A diferença, comparativamente à aposentadoria por invalidez, repousa na circunstância de que para a obtenção de auxílio-doença basta a incapacidade para o trabalho ou atividade habitual do segurado, enquanto para a aposentadoria por invalidez exige-se a incapacidade total, para qualquer atividade que garanta a subsistência. Tanto é assim que, exercendo o segurado mais de uma atividade e ficando incapacitado para apenas uma delas, o auxílio-doença será concedido em relação à atividade para a qual o segurado estiver incapacitado, considerando-se para efeito de carência somente as contribuições relativas a essa atividade (RPS, art. 71, § 1º) (in ROCHA, Daniel Machado da. BALTAZAR JÚNIOR, José Paulo. Comentários à Lei de Benefícios da Previdência Social. 15. ed. rev., atual. e ampl. - São Paulo: Atlas, 2017.)
De modo geral, o acesso aos benefícios previdenciários de aposentadoria por invalidez e de auxílio-doença pressupõe a presença de 3 requisitos: (1) qualidade de segurado ao tempo de início da incapacidade, (2) carência de 12 contribuições mensais, salvo as hipóteses previstas no art. 26, II, da Lei nº 8.213/91, que dispensam o prazo de carência, e (3) requisito específico, relacionado à existência de incapacidade impeditiva para o labor habitual em momento posterior ao ingresso no RGPS, aceitando-se, contudo, a derivada de doença anterior, desde que agravada após o ingresso no RGPS, nos termos do art. 42, § 2º, e art. 59, parágrafo único, ambos da Lei nº 8.213/91.
Caso concreto
Discute-se acerca da possibilidade de conversão do auxílio-doença em aposentadoria por invalidez (pedido principal), e, em caso de manutenção da sentença no ponto, sobre a adequada data para cessação do benefício, argumentando a apelante que, uma vez mantido o auxílio-doença, deverá ser por tempo indeterminado (pedido subsidiário), até que recupere a capacidade para o trabalho.
No que é pertinente ao pedido para conversão do auxílio-doença em aposentadoria por invalidez, a apelação não merece provimento.
Isso porque, nos termos do laudo pericial (Evento 29), a autora, atualmente com 36 anos de idade (nascida em 03/10/1982), faxineira, foi diagnosticada com Transtorno bipolar maníaco. A incapacidade, por sua vez, foi classificada como de cunho total e temporário, sendo que o período estimado para recuperação é de doze meses, desde que realize o tratamento médico adequado.
Neste ponto, cumpre esclarecer que a autora também é portadora de melanoma cutâneo, o qual foi tratado cirurgicamente em dezembro de 2019 e não acarreta incapacidade, uma vez que as cicatrizes estão bem consolidadas, não há limitação de mobilidade e não houve complicações cirúrgicas comprovadas. O quadro incapacitante, portanto, restringe-se às moléstias de origem psiquiátrica.
Atestou o perito, à época do exame médico (janeiro de 2020), a necessidade de afastamento do labor por período não inferior a 12 meses a partir da perícia, tempo para realização dos tratamentos complementares e devida recuperação. Destaque-se, por oportuno, o que constou das considerações médicas do laudo (sublinhado no original):
- Sobre patologia psiquiátrica, revisão dos documentos acostados e exame pericial permitem verificar que há trocas recentes de medicações, com histórico de internações psiquiátricas em 2019 (última em outubro de 2019). Ao exame do estado mental, autor apresenta alterações que cursam com hipovigilância, alteração em vontade, afetividade e fala.
O quadro¹ identificado incapacita temporariamente o autor para suas atividades laborais. Não se observou redução de capacidade laborativa ao exame pericial. No quadro apresentado pelo do autor recomenda-se afastamento por período não inferior a 12 meses a contar da perícia, tempo para realização dos tratamentos complementares e devida recuperação. Observo quadro de incapacidade para atos da vida civil.
Quanto à reabilitação, no caso em tela, observando a idade, escolaridade e funções prévias, não há recomendação
Como se vê, o perito foi taxativo ao definir como temporária a incapacidade, ainda que tenha mencionado estar a autora, ao momento da perícia, incapacitada para atos da vida civil. O que se extrai dos termos do laudo pericial, em uma ótica global e completa, é que a autora possui condições de recuperar sua capacidade laborativa, mediante a adoção do tratamento médico adequado.
Da mesma forma, não é caso de reabilitação, pois, uma vez tratados os sintomas incapacitantes, a autora estará apta a retornar ao exercício de suas atividades laborativas habituais.
Os atestados médicos, por sua vez, não são suficientes a fazer prova no sentido da inaptidão total e permanente, até mesmo porque foram analisados pelo perito. Demais disso, trata-se de segurada com 36 anos de idade e sem comorbidades outras que autorizem a conversão do benefício temporário em definitivo.
Assim, a autora não faz jus à conversão do auxílio-doença em aposentadoria por invalidez.
No que é pertinente ao pedido subsidiário para a concessão do auxílio-doença por tempo indeterminado, de igual modo, não procede, uma vez que, a partir da vigência da Lei nº 13.457, de 26/06/2017, deve ser estabelecido pelo magistrado, sempre que possível, um prazo de cessação para o auxílio-doença.
Na hipótese, o perito foi claro ao dizer que, a partir da data da perícia, haveria a necessidade de 12 (doze) meses para a recuperação. Correta, portanto, a sentença, no ponto.
Diante do que foi dito, nega-se provimento à apelação.
Termo inicial
Quanto à data de início do benefício, também está correta a sentença.
Especificamente em relação à DII, para fim de fixação da DIB, registrou o perito judicial que pode ser comprovada a partir do dia 18 de maio de 2019, conforme laudo administrativo.
No mesmo sentido, a autora relatou ao perito que, quanto às enfermidades psiquiátricas, houve descompensação em maio de 2019, quando apresentou quadro de tentativa de suicídio por ingesta medicamentosa. Referiu, também, que apresentou 2 episódios de internação psiquiátrica (maio e outubro de 2019).
A própria narrativa da autora por ocasião da perícia judicial, assim, corrobora o entendimento de que o início da incapacidade ocorreu em maio de 2019, conforme fixou o perito.
Ademais, analisando-se os documentos juntados aos autos, melhor sorte não lhe assiste. Isso porque, no atestado médico emitido em 31 de maio de 2019 e assinado pelo Dr. Gabriel Etges, consta expressamente que a autora esteve internada no Hospital Roque Gonzales de 18 a 31 de maio de 2019 por ter tentado suicídio após ingesta de medicamentos (Evento 1 - ATESTMED8).
Com efeito, conforme se observa do dossiê médico juntado pelo INSS aos autos (Evento 24 - LAUDO3), há períodos intermitentes de incapacidade laborativa em razão das moléstias psiquiátricas de que a autora é portadora, considerando-se a sua natureza. Assim, inexistindo provas concretas no sentido de que a autora estava incapacitada na cessação administrativa do benefício, em 16 de julho de 2018, indevido o seu restabelecimento desde lá.
Nega-se provimento ao apelo.
Correção monetária
Após o julgamento, pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral, do Tema 810 (RE n. 870.947), a que se seguiu o dos embargos de declaração da mesma decisão, rejeitados e com afirmação de inexistência de modulação de efeitos, deve a atualização monetária obedecer ao Tema 905 do Superior Tribunal de Justiça, que estabelece para as condenações judiciais de natureza previdenciária:
As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91.
Assim, a correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices, que se aplicam conforme a pertinente incidência ao período compreendido na condenação:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94);
- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da lei 8.213/91).
Juros moratórios
Os juros de mora, de 1% (um por cento) ao mês, serão aplicados a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29 de junho de 2009. A partir de 30 de junho de 2009, os juros moratórios serão computados de forma equivalente aos aplicáveis à caderneta de poupança, conforme dispõe o art. 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei nº 9.494/97.
Prequestionamento
O enfrentamento das questões suscitadas em grau recursal, assim como a análise da legislação aplicável, são suficientes para prequestionar junto às instâncias Superiores os dispositivos que as fundamentam. Assim, deixo de aplicar os dispositivos legais ensejadores de pronunciamento jurisdicional distinto do que até aqui foi declinado. Desse modo, evita-se a necessidade de oposição de embargos de declaração tão somente para este fim, o que evidenciaria finalidade procrastinatória do recurso, passível de cominação de multa.
Dispositivo
Em face do que foi dito, voto no sentido de negar provimento à apelação e, de ofício, adequar os consectários legais, nos termos da fundamentação.
Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001985762v10 e do código CRC f1c14146.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5008207-26.2020.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: ELIANE ALDROVANDI
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. auxílio-doença/APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. LAUDO PERICIAL. TRANSTORNO AFETIVO BIPOLAR. faxineira. INCAPACIDADE TEMPORÁRIA. termo inicial. conjunto probatório. DATA DE CESSAÇÃO. OBSERVÂNCIA DA LEI 13.457/2017.
1. O direito à aposentadoria por invalidez e ao auxílio-doença pressupõe o preenchimento de 3 (três) requisitos: (1) a qualidade de segurado ao tempo de início da incapacidade, (2) a carência de 12 (doze) contribuições mensais, ressalvadas as hipóteses previstas no art. 26, II, da Lei nº 8.213, que a dispensam, e (3) aquele relacionado à existência de incapacidade impeditiva para toda e qualquer atividade (aposentadoria por invalidez) ou para seu trabalho habitual (auxílio-doença) em momento posterior ao ingresso no RGPS, aceitando-se, contudo, a derivada de doença anterior, desde que agravada após esta data, nos termos dos arts. 42, §2º, e 59, parágrafo único; ambos da Lei nº 8.213.
2. Diante da prova no sentido de que a parte autora está inapta temporariamente para o exercício de sua atividade habitual, faz jus à concessão do auxílio-doença, que não pode ser convertido em aposentadoria por invalidez pois ausente o caráter definitivo do quadro incapacitante.
3. Comprovado pelo conjunto probatório que a autora está incapacitada desde a data fixada pelo perito, este será o termo inicial do benefício.
4. A partir da vigência da Lei nº 13.457, de 26/06/2017, deve ser estabelecido pelo magistrado, sempre que possível, um prazo de cessação para o auxílio-doença.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação e, de ofício, adequar os consectários legais, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 22 de setembro de 2020.
Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001985763v6 e do código CRC b1bdf8a4.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 14/09/2020 A 22/09/2020
Apelação Cível Nº 5008207-26.2020.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PROCURADOR(A): JOÃO HELIOFAR DE JESUS VILLAR
APELANTE: ELIANE ALDROVANDI
ADVOGADO: DANIEL NATAL BRUNETTO (OAB RS063345)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 14/09/2020, às 00:00, a 22/09/2020, às 14:00, na sequência 80, disponibilizada no DE de 02/09/2020.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E, DE OFÍCIO, ADEQUAR OS CONSECTÁRIOS LEGAIS.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
Votante: Juíza Federal ELIANA PAGGIARIN MARINHO
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
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