| D.E. Publicado em 12/09/2018 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000788-79.2016.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | GENI MARIA BERNARDES DE OLIVEIRA |
ADVOGADO | : | Cassiana Alvina Carvalho e outro |
: | Janize Girardi Graminha |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. QUALIDADE DE SEGURADO. NÃO COMPROVAÇÃO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL A PORTADOR DE DEFICIÊNCIA. REQUISITOS PREENCHIDOS. CONCESSÃO. TUTELA ESPECÍFICA.
1. As provas demonstram que a autora não trabalhou quando do seu ingresso, justamente porque já estava incapacitada há vários anos, tratando-se das hipóteses previstas no parágrafo único do artigo 59 e no parágrafo segundo do artigo 42 da LBPS, em que impossível a concessão do auxílio-doença ou da aposentadoria por invalidez por falta de qualidade de segurado na data de início da incapacidade ou de incapacidade preexistente ao ingresso no RGPS.
2. Em questões previdenciárias é possível conceder benefício diverso daquele pleiteado na inicial sem que isso caracterize um julgamento extra ou ultra petita, já que as ações previdenciárias revestem-se de cunho social e devem ser pautadas pelo princípio da economia processual.
3. Demonstrada a deficiência e a hipossuficiência do núcleo familiar, é devida a concessão do benefício assistencial ao portador de deficiência a contar da cessação administrativa do benefício de auxílio-doença.
4. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício em favor da parte autora, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 497 do CPC/15, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso do INSS, determinando a implantação do benefício assistencial ao portador de deficiência desde a cessação administrativa do benefício de auxílio-doença, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 04 de setembro de 2018.
Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9448968v3 e, se solicitado, do código CRC BEFF47CF. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | João Batista Pinto Silveira |
| Data e Hora: | 04/09/2018 14:21 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000788-79.2016.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | GENI MARIA BERNARDES DE OLIVEIRA |
ADVOGADO | : | Cassiana Alvina Carvalho e outro |
: | Janize Girardi Graminha |
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação interposta contra sentença (de setembro/2015) que, confirmando a tutela antecipada, julgou procedente o pedido para condenar o INSS a:
a) conceder em favor da parte autora o benefício de auxílio-doença desde a cessação administrativa (08-05-12) e convertê-lo em aposentadoria por invalidez desde a data do laudo judicial (09-03-13);
b) pagar as parcelas atrasadas, corrigidas monetariamente pelo IPCA e com juros de mora de acordo com a Lei 11.960/09;
c) arcar com os honorários advocatícios, fixados em 10% sobre as parcelas vencidas até a data da sentença (Súmula 111 do STJ);
d) reembolsar os honorários periciais;
e) pagar as custas de acordo com o ofício-circular nº 003/2014.
Recorre o INSS, alegando, em suma, que há incapacidade preexistente ao momento da filiação à Previdência Social, pois o perito judicial afirma que a doença da autora é crônica e começou na adolescência, e a parte autora somente contribuiu no período de 03/2007 a 05/2008, requerendo a improcedência do pedido. Subsidiariamente, requer a aplicação integral da Lei 11.960/09 e a isenção das custas processuais.
Com contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal.
O MPF opinou pelo parcial provimento da apelação (fls. 211/215v).
Em sessão realizada no dia 17-05-2017 (fl. 225) a 6ª Turma deste Tribunal decidiu, por unanimidade, solver questão de ordem para converter o julgamento em diligência, de ofício, com a reabertura da instrução para a realização de estudo social, diante da possibilidade, em questões previdenciárias, de conceder benefício diverso daquele pleiteado sem que isso caracterize um julgamento extra ou ultra petita.
Realizada a diligência solicitada, com a feitura do estudo social às fls. 292/295, e da vista as partes e ao MPF, os autos retornaram conclusos a este gabinete.
É o relatório.
VOTO
Controverte-se, na espécie, acerca do acerto ou não da sentença que, confirmando a tutela antecipada, julgou procedente o pedido para condenar o INSS a conceder em favor da parte autora o benefício de auxílio-doença desde a cessação administrativa (08-05-12) e convertê-lo em aposentadoria por invalidez desde a data do laudo judicial (09-03-13).
Da remessa necessária
É caso de remessa necessária dado que, embora em vigor as novas regras quanto às hipóteses de seu conhecimento de que tratam os arts. 496, I, 496, §3.º, I e no art. 496, §4.º e seus incisos do NCPC/2015, cuidando-se de sentença publicada/disponibilizada em data anterior a 18.03.2016, devem ser observados os parâmetros até então vigentes, sem que isso implique em não incidência imediata de regra processual, considerando-se que o ato foi praticado em observância aos balizadores da época.
Quanto à aposentadoria por invalidez, reza o art. 42 da Lei nº 8.213/91:
Art. 42. A aposentadoria por invalidez, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, será devida ao segurado que, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, e ser-lhe-á paga enquanto permanecer nesta condição.
Já no que tange ao auxílio-doença, dispõe o art. 59 do mesmo diploma:
Art. 59. O auxílio-doença será devido ao segurado que, havendo cumprido, quando for o caso, o período de carência exigido nesta Lei, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 dias consecutivos.
Segundo entendimento dominante na jurisprudência pátria, nas ações em que se objetiva a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, ou mesmo nos casos de restauração desses benefícios, o julgador firma seu convencimento com base na prova pericial, não deixando de se ater, entretanto, aos demais elementos de prova, sendo certo que embora possível, teoricamente, o exercício de outra atividade pelo segurado, ainda assim a inativação por invalidez deve ser outorgada se, na prática, for difícil a respectiva reabilitação, seja pela natureza da doença ou das atividades normalmente desenvolvidas, seja pela idade avançada.
Durante a instrução processual, foi realizada perícia médico-judicial por psiquiatra em 09-03-13, juntada às fls. 71/74 e complementada às fls. 87 e 100, da qual se extraem as seguintes informações acerca do quadro clínico da parte autora:
a) enfermidades: afirma o perito que Apresenta movimentos involuntários de boca e língua, sugerindo uma alteração que ocorre com o uso crônico de alguns antipsicóticos, principalmente haloperidol... Mostra dificuldade em compreender o que lhe é perguntado. Dificuldade em responder sugerido déficit intelectual... Mostra-se hipovigil e hipotenaz, nega alucinações visuais e auditivas, desorientada auto e alo psiquicamente (não sabe sua idade, não sabe onde está nem porque, não sabe dia e ano)... Alterações na memória, consciência lúcida, pensamento não avaliado, pois a periciada respondia somente o que lhe era perguntando por monossílabas ou ficava quieta mostrando que não havia compreendido a pergunta. Apresenta linguagem com disartria, dislalia, afeto indiferente rígido. Inteligência clinicamente abaixo da médica, sem juízo crítico de enfermidade, com incapacidade de fazer abstração do pensamento... Apresenta sintomas desde a infância, com desmaios, dificuldade de adquirir autonomia, crises psicóticas... Apresenta história de crises de agressividade, gritos, fugas de casa, internação psiquiátrica... No momento apresenta sintomas negativos como apatia, pobreza de discurso, embotamento, retraimento social e diminuição do desempenho social e familiar. Apresenta alteração na qualidade global de aspectos do comportamento pessoal, tais como perda de interesse, falta de objetivos, atitude ensimesmada, apresentando, conforme relato familiar, uma deterioração insidiosa da personalidade, condutas estranhas e incapacidade para atender às demandas da sociedade. Há predomínio atualmente, dos sintomas negativos. Portanto, firmo o diagnóstico de Esquizofrenia simples CID X F 20.6... Apresenta doença mental crônica, que a afasta do trabalho... Apresenta sintomas crônicos de esquizofrenia simples, com deterioração cognitiva, de afeto e conduta... Doença crônica, iniciada na adolescência, com fator genético importante... Apresenta deterioração cognitiva, de afeto, de compreensão, conduta hipoativa embotamento, retraimento social e diminuição do desempenho global social, familiar e pessoal... alteração das faculdades mentais com grave perturbação da vida orgânica e social... A periciada apresenta doença crônica com início na adolescência... A periciada sofre de Esquizofrenia, onde a deterioração da capacidade intelectual não se dá, necessariamente ao longo da vida, mas problemas cognitivos graves generalizados como de atenção, memória e funcionamento executivo parecem existir já na fase inicial da doença, o que torna difícil para a periciada realizar tarefas cotidianas como trabalhar e estudar;
b) incapacidade: responde o perito que... não realiza nenhuma atividade, é necessário supervisão e orientação para higiene pessoal... incapacidade para realizar qualquer atividade sozinha. Antigamente apresentava períodos psicóticos com gritos, falar sozinha, e agressividade... apresenta-se incapaz para atividades profissionais regulares, necessitando de supervisão familiar e manter acompanhamento psiquiátrico por tempo indeterminado... A periciada nunca exerceu atividade profissional de forma regular, à não ser como doméstica por 30 dias no passado... nunca foi capaz de exercer atividade profissional... incapacidade crônica... Produz incapacidade total para qualquer trabalho... A incapacidade total remonta desde a piora insidiosa da doença, ou seja, adulto jovem... A incapacidade para qualquer atividade é definitiva... A incapacidade é omniprofissional... Não tem condições de reabilitação... A periciada é invalida para as atividades laborais devido à deterioração cognitiva e de desempenho pessoal, familiar e social... incapacidade permanente para as atividades da vida diária, pois apresenta transtorno mental crônico deteriorante... Não é incapacidade temporária, é incapacidade permanente... Total... A periciada é incapaz total e permanente para atividade laboral, sem indicação de cirurgia... Não é possível reabilitação profissional... A periciada apresenta sequelas permanentes de doença mental... Apresenta prejuízo para atender demandas pessoais, sociais e ocupacionais, prejuízo este que por ser insidioso, não é possível precisar a data do início da incapacidade, mas pela história pregressa pode-se constatar que a mesma se encontra incapaz para desenvolver atividades laborativas há muito tempo, pois não conseguiu manter-se empregada por mais de 30 dias, tendo também, desde sempre, necessidade de ser auxiliada ora pela mãe, ora pelo esposo, nas lidas domésticas e criação da filha... Em 2008, (quando houve concessão do benefício de forma administrativa) a autora teve um agravamento em seu quadro... Deste período até hoje, a Sra. Geni B. de Oliveira manteve a sua doença estável... não teve agravamento do seu quadro desde 2008, e manteve alterações cognitivas graves relativamente estáveis durante todo o curso da doença, da adolescência até hoje, que estão diretamente ligados ao prejuízo funcional e a pior qualidade de vida da mesma;
c) tratamento: diz o perito que... faz uso de Haldol 2,5 mg/d, biperideno 4 mg/d, clorpromazina 25 mg/d e fluoxetina 20 mg/d... A periciada esteve internada no Hospital Bezerra de Menezes por 30 dias... Não há indicação cirúrgica... Não é necessário cirurgia.
Do exame dos autos, colhem-se as seguintes informações sobre a parte autora:
a) idade: 58 anos (nascimento em 28-03-59 - fl. 10);
b) filiação: a autora recolheu contribuições como CI de 01-03-07 a 31-05-08 (fls. 16/17 e CNIS em anexo);
c) histórico de benefícios: a autora gozou de auxílio-doença de 02-06-08 a 01-05-12, cancelado por irregularidade/erro administrativo, tendo sido indeferido o pedido de 10-08-12 (fls. 14/17, 20/23, 34/55, 102, 143/152 e SPlenus em anexo); ajuizou a presente ação em 25-07-12 e, em 30-07-12, foi concedida a tutela antecipada (fls. 25/26);
d) atestado de 29-06-12 (fl. 18), referindo CID F71.1, não possuindo condições de compreensão e de discernimento das variadas condições da vida, sem condições de exercer atividades laborativas; atestado de 20-06-12 (fl. 19), referindo CID F25, não apresentando condições de exercer atividades laborativas; atestado de 30-11-11, referindo CID F25, apresentando desde os 12 anos agressividade aos familiares e quadro depressivo; atestado de 05-12-11 (fl. 51v), referindo acompanhamento psicológico; atestado de 2008 (fl. 52); atestado de internação de 25-05-05 a 28-06-05 (fl. 53v);
e) receitas de 2007 e 2009 (fls. 52v/53);
f) laudo do INSS de 21-06-08 (fl. 90), cujo diagnóstico foi de CID F25 (transtornos esquizoafetivos); idem os laudo de 12-01-09 (fl. 91), de 23-06-09 (fl. 92), de 12-02-10 (fl. 93), de 30-11-10 (fl. 94) e de 12-12-11 (fl. 95).
Recorre o INSS, sustentando, em suma, que há incapacidade preexistente ao momento da filiação à Previdência Social, pois o perito judicial afirma que a doença da autora é crônica e começou na adolescência, e a parte autora somente contribuiu no período de 03/2007 a 05/2008, requerendo a improcedência do pedido.
Com razão o INSS, pois há provas nos autos de que quando a autora ingressou no RGPS em 03/07 ela já estava total e definitivamente incapacitada para o trabalho. O perito judicial afirmou que a autora nunca trabalhou e que tem problemas mentais desde a infância, estando incapacitada desde quando era jovem. Conforme CNIS, a autora começou a recolher contribuições como CI apenas no ano de 2007, sendo que juntou um atestado de 2011 referindo que possui transtornos esquizofrênicos desde os 12 anos de idade, agressividade aos familiares e quadro depressivo. Assim, não se trata daquela hipótese em que há o ingresso no RGPS já portador de doença, mas ainda não incapacitado. Ou seja, as provas demonstram que a autora não trabalhou quando do seu ingresso, justamente porque já estava incapacitada há vários anos, tratando-se das hipóteses previstas no parágrafo único do artigo 59 e no parágrafo segundo do artigo 42 da LBPS, em que impossível a concessão do auxílio-doença ou da aposentadoria por invalidez por falta de qualidade de segurado na data de início da incapacidade ou de incapacidade preexistente ao ingresso no RGPS.
Dessa forma, é de ser reformada a sentença que concedeu o auxílio-doença e a aposentadoria por invalidez, para julgar improcedentes tais pedidos.
Todavia, embora tenha postulado na inicial a concessão de aposentadoria por invalidez ou de auxílio-doença, por estar incapacitada para o trabalho de forma total e definitiva por doença mental, cumpre referir que, em questões previdenciárias, é possível conceder benefício diverso daquele pleiteado sem que isso caracterize um julgamento extra ou ultra petita, já que as ações previdenciárias revestem-se de cunho social e devem ser pautadas pelo princípio da economia processual.
Assim, verificando o julgador o preenchimento dos requisitos legais, pode conceder o benefício a que o requerente fizer jus.
Nesse sentido, a jurisprudência a seguir colacionada:
AGRAVO REGIMENTAL. PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. SENTENÇA. NULIDADE. EXTRA PETITA.
Não é extra petita a r. sentença que, constatando o preenchimento dos requisitos legais para tanto, reconhece como período trabalhado em atividade especial interstício diverso do pedido, tempo esse que havia sido indeferido na esfera administrativa e que o MM. Julgador, com base no acervo probatório dos autos e tendo em vista a relevância da questão social que envolve a matéria, reconheceu como devido ao autor. Agravo regimental desprovido. (STJ. AgRg no Resp336.295/SC, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 18.09.2003, DJ 28.10.2003, p. 329)
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSO CIVIL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO DIVERSO. POSSIBILIDADE. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. NECESSIDADE DE ESTUDO SÓCIO-ECONÔMICO. ART. 515, § 3°, CPC. INAPLICABILIDADE. 1. Os benefícios de auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e assistencial são fungíveis, sendo facultado ao julgador, conforme a espécie de incapacidade constatada, conceder um deles, ainda que o pedido tenha sido limitado a outro (...) (TRF4, AC 2005.72.13.000201-3, Turma Suplementar, Relator Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 11/05/2007 - grifei)
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO DISTINTO DO POSTULADO. POSSIBILIDADE. CONDIÇÕES PESSOAIS. CUSTAS. HONORÁRIOS PERICIAIS.
1. Já se encontra pacificado o entendimento de que o deferimento de beneficio previdenciário distinto do postulado não caracteriza julgamento extra petita, já que as ações previdenciárias revestem-se de cunho social e devem ser pautadas pelo princípio da economia processual e pela máxima da mihi factum dabo tibi ius, evitando-se maiores prejuízos às partes.
2. Tratando-se de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, o Julgador firma a sua convicção, via de regra, por meio da prova pericial.
3. Tendo a prova pericial concluído que a autora se encontra incapacitada para a agricultura, e sendo suas condições pessoais tais como a idade, o baixo nível de escolaridade e o tipo de doença que a impede de exercer atividades braçais favoráveis à aposentação, de reformar-se a sentença que julgou improcedente o pedido, concedendo-se aposentadoria por invalidez a partir da data do laudo.
(TRF4, AC 2004.04.01.008240-7, Quinta Turma, Relator Celso Kipper, publicado em 04/08/2004 - grifei)
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. FALTA DE QUALIDADE DE SEGURADO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. FUNGIBILIDADE DE PEDIDOS. SENTENÇA ANULADA PARA REABERTURA DA INSTRUÇÃO. LAUDO SOCIAL.
1. Não se trata de caso de auxílio-doença nem de aposentadoria por invalidez, pois não comprovada a qualidade de segurado quando da amputação. 2. Considerando a peculiaridade do caso concreto, em que existe pretensão resistida do INSS que, em duas oportunidades indeferiu o benefício assistencial e a instrução realizada que aponta no sentido de se tratar de pessoa pobre no sentido legal. Considerando ainda o fato de não ter ocorrido apelo do autor, na medida em que foi vitorioso na ação, entendo que a excepcionalidade do caso recomenda a fungibilidade dos pedidos. 3. Sentença anulada, de ofício, a fim de que seja reaberta a instrução, para a realização de laudo social.
(TRF4, A C Nº 0019055-75.2011.404.9999/RS, Sexta Turma, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 28/06/2012)
Dada a peculiaridade do caso concreto, em que existe pretensão resistida do INSS que cancelou o benefício previdenciário na via administrativa em razão da incapacidade preexistente, e a possibilidade da fungibilidade dos pedidos, bem como realizado o pertinente estudo social, acostado às fls. 292/295, passo ao exame do direito à concessão do BENEFÍCIO ASSISTENCIAL.
A Constituição Federal instituiu o benefício assistencial ao deficiente e ao idoso nos seguintes termos:
Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente da contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
(...)
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
A Lei n.º 8.742, de 7 de dezembro de 1993, veio a regular a matéria, merecendo transcrição o caput e os parágrafos 1º a 3º do art. 20:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de 1 (um) salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 70 (setenta) anos ou mais e que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, entende-se como família o conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991, desde que vivam sob o mesmo teto. (Redação dada pela Lei n. 9.720, de 30.11.1998)
§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho.
§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa cuja renda mensal per capita seja inferior a ¼ (um quarto) do salário mínimo.(...)
A redação do art. 20 da LOAS, acima mencionado, foi alterada pelas Leis nº 12.435, de 06-07-2011 e nº 12.470, de 31-08-2011, passando a apresentar o seguinte teor:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)
§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 4o O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os da assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 5o A condição de acolhimento em instituições de longa permanência não prejudica o direito do idoso ou da pessoa com deficiência ao benefício de prestação continuada. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 6º A concessão do benefício ficará sujeita à avaliação da deficiência e do grau de impedimento de que trata o § 2º, composta por avaliação médica e avaliação social realizadas por médicos peritos e por assistentes sociais do Instituto Nacional de Seguro Social - INSS. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)
(...)
§ 8º A renda familiar mensal a que se refere o § 3o deverá ser declarada pelo requerente ou seu representante legal, sujeitando-se aos demais procedimentos previstos no regulamento para o deferimento do pedido. (Incluído pela Lei nº 9.720, de 30.11.1998)
(...)
§ 10. Considera-se impedimento de longo prazo, para os fins do § 2o deste artigo, aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)
No tocante ao idoso, o art. 38 da mesma Lei, com a redação dada pela Lei n.º 9.720, de 30 de novembro de 1998, dispunha (antes de ser revogado pela Lei 12.435/2011) que a idade prevista no art. 20 reduz-se para 67 anos a partir de 1º de janeiro de 1998. Esta idade sofreu nova redução, desta feita para 65 anos, pelo art. 34, caput, da Lei n.º 10.741, de 1º de outubro de 2003 (Estatuto do Idoso), idade esta que deve ser considerada a partir de 1º de janeiro de 2004, data de início da vigência do Estatuto, nos termos do seu art. 118.
Portanto, o direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: a) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, consoante a redação original do art. 20 da LOAS, ou aquela pessoa que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, consoante a redação atual do referido dispositivo) ou idoso (neste caso, considerando-se, desde 1º de janeiro de 2004, a idade de 65 anos); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) do autor e de sua família.
Mais recentemente, o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei n. 13.146, de 6 de julho de 2015, com início de vigência em 5 de janeiro de 2016), redimensiona o conceito de pessoa com deficiência de maneira a abranger diversas ordens de impedimentos de longo prazo capazes de obstaculizar a plena e equânime participação social do portador de deficiência, considerando o meio em que este se encontra inserido. Com esse novo paradigma, o conceito de deficiência desvincula-se da mera incapacidade para o trabalho e para a vida independente - abandonando critérios de análise restritivos, voltados ao exame das condições biomédicas do postulante ao benefício -, para se identificar com uma perspectiva mais abrangente, atrelada ao modelo social de direitos humanos, visando à remoção de barreiras impeditivas de inserção social. Assim, a análise atual da condição de deficiente não mais se concentra na incapacidade laboral e na impossibilidade de sustento, senão na existência de restrição capaz de obstaculizar a efetiva participação social de quem o postula de forma plena e justa.
Acerca dos critérios para aferição da pobreza, vinha justificando a consideração do § 3º do art. 20 da LOAS, nos seguintes termos:
O Tribunal parece caminhar no sentido de se admitir que o critério de 1/4 do salário mínimo pode ser conjugado com outros fatores indicativos do estado de miserabilidade do indivíduo e de sua família para concessão do benefício assistencial de que trata o art. 203, inciso V, da Constituição.
Entendimento contrário, ou seja, no sentido da manutenção da decisão proferida na Rcl 2.303/RS, ressaltaria ao menos a inconstitucionalidade por omissão do § 3 do art. 20 da Lei n° 8.742/93, diante da insuficiência de critérios para se aferir se o deficiente ou o idoso não possuem meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, como exige o art. 203, inciso V, da Constituição.
A meu ver, toda essa reinterpretação do art. 203 da Constituição, que vem sendo realizada tanto pelo legislador como por esta Corte, pode ser reveladora de um processo de inconstitucionalização do § 3o do art. 20 da Lei n° 8.742/93.
Diante de todas essas perplexidades sobre o tema, é certo que o plenário do Tribunal terá que enfrentá-lo novamente.
Ademais, o próprio caráter alimentar do benefício em referência torna injustificada a alegada urgência da pretensão cautelar em casos como este.
(STF, Rcl 4374 MC/PE, Rel. Ministro Gilmar Mendes, DJ 06-02-07)
Nesse sentido, a orientação consolidada do Superior Tribunal de Justiça:
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. LOAS. ASSISTÊNCIA SOCIAL. PREVISÃO CONSTITUCIONAL. AFERIÇÃO DA CONDIÇÃO ECONÔMICA POR OUTROS MEIOS LEGÍTIMOS. VIABILIDADE. PRECEDENTES. PROVA. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N.º 7/STJ. INCIDÊNCIA.
1. Este Superior Tribunal de Justiça pacificou entendimento no sentido de que o critério de aferição da renda mensal previsto no § 3.º do art. 20 da Lei n.º 8.742/93 deverá ser observado como um mínimo, não excluindo a possibilidade de o julgador, ao analisar o caso concreto, lançar mão de outros elementos probatórios que afirmem a condição de miserabilidade da parte e de sua família.
2. "A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo." (REsp 1.112.557/MG, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, DJe 20/11/2009).
3. "Em respeito aos princípios da igualdade e da razoabilidade, deve ser excluído do cálculo da renda familiar per capita qualquer benefício de valor mínimo recebido por maior de 65 anos, independentemente se assistencial ou previdenciário, aplicando-se, analogicamente, o disposto no parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso." (Pet 2.203/PE, Rel. Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, TERCEIRA SEÇÃO, DJe 11/10/2011).
4. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no Ag 1394595/SP2011/0010708-7, Min. Og Fernandes, Sexta Turma, DJ de 09-05-2012)
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. LOAS. ASSISTÊNCIA SOCIAL. PREVISÃO CONSTITUCIONAL. AFERIÇÃO DA CONDIÇÃO ECONÔMICA POR OUTROS MEIOS LEGÍTIMOS. VIABILIDADE. PRECEDENTES. PROVA. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N.° 7/STJ.INCIDÊNCIA. REPERCUSSÃO GERAL. RECONHECIMENTO. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. SOBRESTAMENTO. NÃO APLICAÇÃO.
1. Este Superior Tribunal de Justiça pacificou entendimento no sentido de que o critério de aferição da renda mensal previsto no § 3.° do art. 20 da Lei n.° 8.742/93 deverá ser observado como um mínimo, não excluindo a possibilidade de o julgador, ao analisar o caso concreto, lançar mão de outros elementos probatórios que afirmem a condição de miserabilidade da parte e de sua família.
2. "A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo." (REsp 1.112.557/MG, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, DJe 20/11/2009).
3. Assentando a Corte Regional estarem demonstrados os requisitos à concessão do benefício assistencial, verificar se a renda mensal da família supera ou não um quarto de um salário-mínimo encontra óbice no Enunciado n.° 7 da Súmula da Jurisprudência deste Tribunal.
4. O reconhecimento de repercussão geral pelo colendo Supremo Tribunal Federal, com fulcro no art. 543-B do CPC, não tem o condão de sobrestar o julgamento dos recursos especiais em tramitação nesta Corte.
5. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no REsp 1267161/PR, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA, julgado em 13/09/2011, DJe 28/09/2011)
Recentemente, o Egrégio Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 567985/MT (18-04-13), com repercussão geral reconhecida, revendo o seu posicionamento anterior (ADI nº 1.232/DF e Reclamações nº 2303/RS e 2298/SP), reconheceu e declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do § 3º do art. 20 da Lei 8.742/93, que estabelecia a renda familiar mensal per capita inferior a ¼ do salário mínimo para a concessão de benefício a idosos ou deficientes, em razão da defasagem do critério caracterizador da miserabilidade contido na mencionada norma. Segundo o Relator do acórdão, Min. Gilmar Mendes, os programas de assistência social no Brasil utilizam atualmente o valor de meio salário mínimo como referencial econômico para a concessão dos respectivos benefícios, tendo referido o Programa Nacional de Acesso à Alimentação - Cartão Alimentação (Lei n.º 10.689/03), o Programa Bolsa Família - PBF (Lei n.º 10.836/04), o Programa Nacional de Renda Mínima Vinculado à Educação - Bolsa Escola (Lei 10.219/2001), Programa Nacional de Renda Mínima Vinculado à Saúde - Bolsa Alimentação (MP 2.206-1/2001) Programa Auxílio-Gás (Decreto n.º 4.102/2002), Cadastramento Único do Governo Federal (Decreto 3.811/2001).
Assim, inexistindo critério numérico atual tido por constitucional pelo STF, como referencial econômico para aferição da pobreza, e tendo sido indicada a razoabilidade de considerar o valor de meio salário mínimo per capita, utilizado pelos programas de assistência social no Brasil, tal parâmetro também deve ser utilizado como balizador para aferição da miserabilidade para a concessão de benefício assistencial, conjugado com outros fatores indicativos da situação de hipossuficiência.
Por outro lado, o Supremo Tribunal Federal por decisões monocráticas de vários de seus Ministros vinha mantendo decisões que excluíam do cálculo da renda familiar per capita os valores percebidos por pessoa idosa a título de benefício previdenciário de renda mínima, não as considerando atentatórias à posição daquele Excelso Tribunal (Reclamação 4270/RN, Rel. Ministro EROS GRAU).
Mais do que isso, recentemente (sessão de 18-04-13), no julgamento do RE 580963/PR, o Pretório Excelso, por maioria de votos, reconheceu e declarou incidenter tantum a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 34 da Lei nº 10.741/03 (Estatuto do idoso), por reputar violado o princípio da isonomia, uma vez que o legislador abrira exceção para o recebimento de dois benefícios assistenciais de idoso, mas não permitira a percepção conjunta de benefício de idoso com o de deficiente ou de qualquer outro previdenciário.
Aponto, apenas, que a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 34 da Lei 10.741/2003 deu-se por omissão parcial, permitindo sua interpretação de forma extensiva. Assim, o critério da exclusão dos benefícios assistenciais continua sendo aplicado, mas não somente ele, admitindo-se, extensivamente, em razão da omissão declarada.
Assim, no cálculo da renda familiar per capita, deve ser excluído o valor auferido por idoso com 65 anos ou mais a título de benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima (EIAC nº 0006398-38.2010.404.9999/PR, julgado em 04-11-2010), ou de benefício previdenciário de valor superior ao mínimo, até o limite de um salário mínimo, bem como o valor auferido a título de benefício previdenciário por incapacidade ou assistencial em razão de deficiência, independentemente de idade (EIAC N.º 2004.04.01.017568-9/PR, Terceira Seção, julgado em 02-07-2009. Ressalto que tal pessoa, em decorrência da exclusão de sua renda, também não será considerada na composição familiar, para efeito do cálculo da renda per capita.
Por outro lado, não podem ser incluídos no cálculo da renda familiar os rendimentos auferidos por irmãos ou filhos maiores de 21 anos e não inválidos, bem assim por avós, tios, sobrinhos, primos e outros parentes não relacionados no art. 16 da Lei de Benefícios, conforme disposto no art. 20, § 1º, da Lei n.º 8.742/93, na redação dada pela Lei n.º 9.720, de 30-11-1998, ao entender como família, para efeito de concessão do benefício assistencial, o conjunto de pessoas, que vivam sob o mesmo teto, elencadas no art. 16 da Lei de Benefícios - entre as quais não se encontram aquelas antes referidas.
O egrégio Supremo Tribunal Federal tem assentado, por decisões monocráticas de seus Ministros, que decisões que excluem do cálculo da renda familiar per capita os rendimentos auferidos por pessoas não relacionadas no art. 16 da Lei de Benefícios não divergem da orientação traçada no julgamento da ADI 1.232-1, como se constata, v. g., de decisões proferidas pelos Ministros GILMAR MENDES (AI 557297/SC - DJU de 13-02-2006) e CARLOS VELLOSO (Reclamação 3891/RS - DJU de 09-12-2005).
Porém, a partir da entrada em vigor da Lei n.º 12.435, de 06-07-2011, que alterou a redação do art. 20, § 1º, da Lei n.º 8.742/93, o conceito de família, para efeito de concessão do benefício assistencial, passou a ser o conjunto de pessoas, que vivam sob o mesmo teto, ali elencadas ("Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.").
Ressalto, outrossim, que cuidados que se fazem necessário com a parte autora, em decorrência de sua deficiência, incapacidade ou idade avançada, geram despesas com aquisição de medicamentos, alimentação especial, tratamento médico, psicológico e fisioterápico, entre outros -, tais despesas podem ser levadas em consideração na análise da condição de miserabilidade da família do demandante. Referido entendimento não afronta o entendimento do Supremo Tribunal Federal esposado na ADI 1.232-1, como demonstram as decisões monocráticas dos Ministros CARLOS VELLOSO (Reclamação 3891/RS - DJU de 09-12-2005), CELSO DE MELLO (Reclamações 3750/PR, decisão de 14-10-2005, e 3893/SP, decisão de 21-10-2005) e CARLOS BRITTO (RE 447370 - DJU de 02-08-2005).
Destaca-se, por fim, que eventual circunstância de a parte autora ser beneficiária e perceber renda proveniente do Programa Bolsa Família, não só não impede a percepção do benefício assistencial do art. 203, V, da Constituição Federal, como constitui forte indicativo de que a unidade familiar encontra-se em situação de risco social.
A questão referente a incapacidade restou devidamente demonstrada quando da análise dos benefícios de auxílio-doença e ou aposentadoria por invalidez, tendo ficado devidamente demonstrada a incapacitada para o trabalho de forma total e definitiva por doença mental desde muito jovem.
Superado o requisito da deficiência, passo ao exame da hipossuficiência do núcleo familiar.
De acordo com o estudo social acostado às fls. 293/295, verifica-se que a autora, com 58 anos de idade, reside com seu esposo, com 65 anos de idade. Constou assim do estudo social:
A senhora Geni Maria é casada com o senhor Antônio há 33 anos, Tapejara. Possuem uma filha, a jovem Adriana de Oliveira, de 31 anos de idade, casada, que reside com seu esposo em moradia localizada nos fundos do terreno da casa dos pais.
A senhora Geni Maria realiza acompanhamento no CAPS há 14 anos. Foi internada em hospital psiquiátrico há quinze anos, ocasião em que encontrava-se bem agressiva. Atualmente está com o uso de medicação e faz acompanhamento com médico psiquiatra e usa a seguinte medicação: Haloperidol 2,5 mg - 1 comprimido a tarde; Biperideno 2 mg - I comprimido manhã e tarde; Clorpromazina 25 mg - I comprimido a noite: fluoxetina 20 mg; Respiridon 2mg - 1 comprimido a noite e Hidroclorotiazida - 1 comprimido pela manhã. A maioria da medicação é conseguida na Secretaria de Saúde, apenas o respiridon é adquirido em farmácia comercial.
O senhor Antonio Osmarino apresenta hipertensão arterial e diabetes: faz uso de medicação que é adquirida através da Secretaria de Saúde.
A senhora Geni Maria não exerceu ao longo da vida atividade que gerasse renda pelas dificuldades apresentadas, precisando receber cuidados. A filha auxilia os pais na organização da moradia do casal.
A família reside em moradia mista, com três quartos, sala, cozinha e banheiro. Encontrando-se em bom estado de conservação e organização.
Possuem os móveis e eletrodomésticos simples, necessários para o conforto família. A casa foi recebida de herança dos pais de Geni Maria Bernardes de Oliveira. A filha Adriana auxilia na organização da moradia dos pais.
Adriana relata que a senhora Geni Maria recebeu por 12 anos auxílio-doença, mas que não está mais recebendo. A renda da família é proveniente de pequenos trabalhos realizados pelo senhor Antônio Osmarino, recebendo o valor médio de R$ 100,00 (cem reais) ao mês. O gasto em energia elétrica é no valor de R$ 74,07 (setenta quatro reais e sete centavos) e em água o valor de R$ 54,79 (cinquenta quatro reais e setenta nove centavos). Para sua subsistência recebem auxílio de familiares, principalmente da filha. A família está inscrita no Cadastro Único.
4. Parecer:
A senhora Geni Maria e o senhor Antonio Osmarino não são alfabetizados, e ela possui dificuldades de compreensão dependendo de alguém para cuidá-la. A situação dela é caracterizada pela dependência financeira e nas atividades diárias de seu esposo e seus familiares, uma vez que não exerce atividade remunerada.
Hoje o casal depende dos familiares para as despesas do dia a dia, alimentação, vestuário, pois o senhor Antonio Osmarino realiza apenas trabalhos esporádicos, sendo o valor recebido insuficiente para custear as despesas do casal.
Assim, e acerca da razoabilidade de considerar o valor numérico conjugado com outros fatores indicativos da situação de risco social, e considerando que o direito ao benefício de prestação continuada não pressupõe a verificação de um estado de miserabilidade extremo - bastando estar demonstrada a insuficiência de meios para o beneficiário, dignamente, prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família -, tenho por configurada a situação de risco social necessária à concessão do benefício.
Portanto, tenho como devida a concessão do benefício assistencial desde a data cessação administrativa do benefício de auxílio-doença em 08-05-12.
Dos consectários
Correção monetária
A correção monetária, segundo o entendimento consolidado na 3.ª Seção deste TRF4, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos seguintes índices oficiais:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5.º e 6.º, da Lei n.º 8.880/94;
- INPC a partir de 04/2006, de acordo com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91, sendo que o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, determina a aplicabilidade do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso.
A incidência da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública foi afastada pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 870947, com repercussão geral, tendo-se determinado, no recurso paradigma a utilização do IPCA-E, como já havia sido determinado para o período subsequente à inscrição em precatório, por meio das ADIs 4.357 e 4.425.
Interpretando a decisão do STF, e tendo presente que o recurso paradigma que originou o precedente tratava de condenação da Fazenda Pública ao pagamento de débito de natureza não previdenciária (benefício assistencial), o Superior Tribunal de Justiça, em precedente também vinculante (REsp 1495146), distinguiu, para fins de determinação do índice de atualização aplicável, os créditos de natureza previdenciária, para estabelecer que, tendo sido reconhecida a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização, deveria voltar a incidir, em relação a tal natureza de obrigação, o índice que reajustava os créditos previdenciários anteriormente à Lei 11.960/09, ou seja, o INPC.
Importante ter presente, para a adequada compreensão do eventual impacto sobre os créditos dos segurados, que os índices em referência - INPC e IPCA-E tiveram variação praticamente idêntica no período transcorrido desde julho de 2009 até setembro de 2017, quando julgado o RE 870947, pelo STF (IPCA-E: 64,23%; INPC 63,63%), de forma que a adoção de um ou outro índice nas decisões judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação.
A conjugação dos precedentes acima resulta na aplicação do INPC aos benefícios previdenciários, a partir de abril 2006, reservando-se a aplicação do IPCA-E aos benefícios de natureza assistencial.
Juros de mora
Os juros de mora devem incidir a partir da citação.
Até 29.06.2009, os juros de mora devem incidir à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3.º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1.º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado hígido pelo STF no RE 870947, com repercussão geral reconhecida. Os juros devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, 5.ª Turma, AgRgno AgRg no Ag 1211604/SP, Rel. Min. Laurita Vaz).
Da Verba Honorária
Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência".
Das Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4.º, I, da Lei 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, de acordo com disposto no art. 5.º, I, da Lei Estadual 14.634/14, que institui a Taxa Única de Serviços Judiciais desse Estado, ressalvando-se que tal isenção não o exime da obrigação de reembolsar eventuais despesas judiciais feitas pela parte vencedora (parágrafo único, do art. 5.º). Salienta-se, ainda, que nessa taxa única não estão incluídas as despesas processuais mencionadas no parágrafo único, do art. 2.º, da referida Lei, tais como remuneração de peritos e assistentes técnicos, despesas de condução de oficiais de justiça, entre outras.
Tal isenção não se aplica quando o INSS é demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula n.º 20 deste regional), devendo ser salientado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (art. 33, parágrafo único, da Lei Complementar estadual 156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
Da tutela específica
Considerando os termos do art. 497 do CPC/2015, que repete dispositivo constante do art. 461 do Código de Processo Civil/1973, e o fato de que, em princípio, a presente decisão não está sujeita a recurso com efeito suspensivo (Questão de Ordem na AC 2002.71.00.050349-7/RS - Rel. p/ acórdão Desemb. Federal Celso Kipper, julgado em 09.08.2007 - 3.ª Seção), o presente julgado deverá ser cumprido de imediato quanto à implantação do benefício concedido em favor da parte autora, no prazo de 45 dias.
Na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor da renda mensal atual desse benefício for superior ao daquele.
Faculta-se à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao recurso do INSS, determinando a implantação do benefício assistencial ao portador de deficiência desde a cessação administrativa do benefício de auxílio-doença.
Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 04/09/2018
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000788-79.2016.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00033630220128210135
RELATOR | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PROCURADOR | : | Dr. Marcelo Veiga Beckhausen |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | GENI MARIA BERNARDES DE OLIVEIRA |
ADVOGADO | : | Cassiana Alvina Carvalho e outro |
: | Janize Girardi Graminha |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 04/09/2018, na seqüência 7, disponibilizada no DE de 17/08/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DO INSS, DETERMINANDO A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO ASSISTENCIAL AO PORTADOR DE DEFICIÊNCIA DESDE A CESSAÇÃO ADMINISTRATIVA DO BENEFÍCIO DE AUXÍLIO-DOENÇA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
: | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ | |
: | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA |
Paulo Roberto do Amaral Nunes
Secretário em substituição
| Documento eletrônico assinado por Paulo Roberto do Amaral Nunes, Secretário em substituição, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9461095v1 e, se solicitado, do código CRC EA1218A0. | |
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