Apelação Cível Nº 5016133-29.2018.4.04.9999/PR
RELATORA: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
APELANTE: NEUSA ZACARIAS FAIAO
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta contra sentença que julgou improcedente pedido de auxílio-doença, condenando a parte autora em honorários de R$500,00, suspensa a exigibilidade em virtude da gratuidade da justiça (ev. 26).
A parte autora apelou (ev. 31) alegando que, mesmo não sendo constatada pela perícia nenhuma incapacidade para o trabalho, o contexto de vida e o fato de ser portadora de doenças graves, levam a crer que esta não tem condições de exercer nenhum tipo de atividade laborativa, fazendo jus à concessão do benefício por incapacidade desde a DER.
Com contrarrazões, subiram os autos ao Tribunal para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
O apelo preenche os requisitos de admissibilidade.
Benefício por incapacidade
Conforme o disposto no art. 59 da Lei n.º 8.213/91, o auxílio-doença é devido ao segurado que, havendo cumprido o período de carência, salvo as exceções legalmente previstas, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.
A aposentadoria por invalidez, por sua vez, será concedida ao segurado que, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, for considerado incapaz e insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, sendo-lhe paga enquanto permanecer nessa condição, nos termos do art. 42 da Lei de Benefícios da Previdência Social.
A lei de regência estabelece que a carência exigida para a obtenção desses benefícios é de 12 (doze) contribuições mensais (art. 25, I), salvo nos casos legalmente previstos.
Em sendo a incapacidade anterior à filiação ao RGPS, ou à recuperação da condição de segurado, resulta afastada a cobertura previdenciária (art. 42, §2º e art. 59, §1º).
Caso concreto
A autora, costureira, nascida em 30/12/52, ajuizou ação em 13/01/11, objetivando a concessão de benefício por incapacidade desde o requerimento de 29/07/09 (NB 31/536.613.689-6). Teve indeferidos, por não constata incapacidade, também os seguintes pedidos: 29/09/09 (NB315375660624), 09/03/09 (31538601995-0), 17/08/10 (NB 315422653893).
Antecipada a tutela em 18/01/11 (p. 2, inic2, ev. 1).
Conforme consulta CNIS, a autora recebeu auxílio-doença (NB 5451104715 decorrente ação judicial - p. 7, pet18 - de 17/08/10 a 31/12/15), foi aposentada por idade em 26/08/14 e recebe pensão por morte desde 26/12/14.
- Incapacidade
A prova pericial é fundamental nos casos de benefício por incapacidade e tem como função elucidar os fatos trazidos ao processo. Submete-se ao princípio do contraditório, oportunizando-se, como no caso dos autos, a participação das partes na sua produção e a manifestação sobre os dados e conclusões técnicas apresentadas. Não importa, por outro lado, que seu resultado não atenda à expectativa de um dos demandantes ou mesmo de ambos, porque se destina a colher elementos necessários à formação do convencimento do juízo, ao qual incumbe decidir sobre a sua realização e eventual complementação e, posteriormente, apreciar seu poder de esclarecimento dos fatos, cotejando a perícia com os demais elementos carreados ao processo.
O juiz não está adstrito ao laudo pericial, nos termos do art. 479 do CPC, mas se entender por não acolher as conclusões do perito, à luz dos demais elementos presentes nos autos, deverá indicar os motivos que o levam a entendimento diverso.
Durante a instrução processual, em 26/04/16, foi realizada perícia médica por especialista em ortopedia, que atestou estar a autora apta para atividades habituais, mesmo que portadora de diabetes, arritmia cardíaca e hipertensão arterial (laodoperici24).
Da perícia, complementar, extrai-se:
Comentários: Na impugnação a Autora se mostra inconformada com as conclusões do laudo que a considera apta para o trabalho de costureira no seu lar apesar das doenças, alega ainda que o Perito não teria levado em consideração a extensa documentação medica apresentada. No caso, a primeira observação que o Perito faz é que foi sim observada toda a documentação medica e foram uteis para o raciocínio pericial. O Perito em nenhum momento negou a presença das patologias citadas, apenas afirmou que as patologias e lesões estavam recebendo tratamento adequado e no momento do exame pericial a Autora apresentava uma situação de saúde que permitiria o seu trabalho. Lembro que o seu trabalho é de costureira na sua residência, atividade de pouco esforço e que a Autora é quem faz o seu horário de trabalho. Apesar das doenças lembro que no momento do exame pericial a Autora estava com 63 anos. Outro fato importante a ser lembrado é de que se os médicos particulares sugeriram afastamento laborativo os da Autarquia entenderam diferente. O Perito é um “tertius” qualificado que faz o seu trabalho equidistante das partes e longe do animo que move os litigantes. O que vi no momento do exame pericial foi o que relatei.
Quesitos da parte Autora mov. 1.1 (sequenciados de A/H):
A- A Autora basicamente é portadora de obesidade e distúrbios circulatórios que podem ser causados ou agravados pela obesidade, o CID de Obesidade E 66.9, hipertensão arterial I 10, do diabetes E 14. Lembro que a pressão arterial medida durante o exame pericial se mostrou normal e o diabetes foi apenas sugerido devido a uma pequena ulceração na perna comum aos diabetes. Não observei varizes ou disfunção cardíaca e/ou pulmonar no momento do exame.
B- A autora é apta para o trabalho, observação do dia do exame pericial.
C- As patologias se mostraram controladas não sendo intensas o suficiente para incapacitar para o trabalho habitual da Autora.
D- Sim.
E- Não vi indicação de cirurgia no momento do exame pericial.
F- Critérios para aposentadoria são do INSS e envolvem questões administrativas e intensidade de doenças.
G-O trabalho do Perito não envolve essa avaliação administrativa que é ada seara do direito.
Quesitos do INSS mov.1.5 (sequenciados de 1/14):
1- Observei moléstias degenerativas e controladas, relacionadas a obesidade e sistema circulatório a especificação está no laudo pericial.
2- Utiliza medicações rotineiras para combate da hipertensão e diabetes; o Perito não deve se envolver em tratamentos por determinação expressa do CRM.
3- Exames laboratoriais não “comprovam” moléstias, são sempre subsidiários e deve obrigatoriamente serem corroborado pelo exame clinico.
4- Não há incapacidade.
5- Não constatei incapacidade para a sua atividade habitual.
6- Não tenho elementos para comprovação.
7- Não observei calosidades nas suas mãos.
8- A logica diz ser moderada considerando que não se mostravam salientes no exame pericial.
9- Não há incapacidade.
10- Prejudicado.
11- Os distúrbios da Autora são degenerativos e irreversíveis, podem ser controlados.
12- Prejudicado.
13- Impossível o Perito definir com exatidão o solicitado.
14- Não há incapacidade.
Como referido acima, ao decidir, esta Corte não está vinculada às conclusões do laudo pericial, havendo elementos substanciais nos autos que apontam para solução diversa da aventada na perícia.
No caso dos autos, a autora, conforme laudos, receitas e exames médicos acostados, é portadora de doenças graves que, aliadas às suas condições pessoais, como idade avançada, permitem concluir que estava incapacitada quando da DER em 29/07/09. São eles: - atestado de 27/07/09, de médico cardiologista, indicando aposentadoria por impossibilidade de exercício da atividade habitual em decorrência de obesidade, H.A. III, dispnéia aos esforços e broncoespamos, - atestado acrdiológico de 22/12/09, solicitando avaliação para fins de aposentadoria, por incapacidade em decorrência de HAS III, sobrecarga do ventrínculo esquerdo, broncoespasmo, dor torácica que piora com esforço físico, - encaminhamento à avaliação para cirurgia ginecológica em 08/12/10 (UBS) e exame indicando incontinência urinária esforço, - atestado cardiológico informando tratamento desde 25/06/09, com incapacidade para o trabalho, fator preponderante para invalidez: dispnéias aos esforços físicos e cansaço fácil (p. 27 e seguintes, Inici1, ev. 1), - atestado cardiológico de 04/04/13, indicando incapacidade definitiva, com fator preponderante para invalidez dispnéia e cansaço fácil, em decorrência de hipertensão arterial estágio III, dispnéia, obesidade, hipotireoidismo, diabetes melittus III (pet18).
Dessa forma, constatada, do cotejo probatório, incapacidade desde a DER e presente a qualidade de segurada (recolhimentos como facultativo de 05/05/08 a 31/10/10), faz jus a parte autora ao auxílio-doença desde a data do requerimento em 29/07/09, descontando-se os valores que já percebeu a título de benefício por incapacidade, com termo final em 26/08/14, quando foi aposentada por idade.
Consectários e provimento finais
- Correção monetária
A correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94);
- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da lei 8.213/91, na redação da Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, e art. 31 da Lei n.º 10.741/03, que determina a aplicação do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso).
A utilização da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública, que fora prevista na Lei 11.960/2009, que introduziu o art. 1º-F na Lei 9.494/97, foi afastada pelo STF no julgamento do tema 810, através do RE 870947, com repercussão geral, com trânsito em julgado em 03/03/2020.
No julgamento do tema 905, através do REsp 1.495146, e interpretando o julgamento do STF, transitado em julgado em 11/02/2020, o STJ definiu quais os índices que se aplicariam em substituição à TR, concluindo que aos benefícios assistenciais deveria ser utilizado IPCA-E, conforme decidiu a Suprema Corte, no recurso representativo da controvérsia e que, aos previdenciários, voltaria a ser aplicável o INPC, uma vez que a inconstitucionalidade reconhecida restabeleceu a validade e os efeitos da legislação anterior, que determinava a adoção deste último índice, nos termos acima indicados.
A conjugação dos precedentes dos tribunais superiores resulta, assim, na aplicação do INPC aos benefícios previdenciários, a partir de abril 2006, reservando-se a aplicação do IPCA-E aos benefícios de natureza assistencial.
Importante ter presente, para a adequada compreensão do eventual impacto sobre os créditos dos segurados, que os índices em referência - INPC e IPCA-E tiveram variação muito próxima no período de julho de 2009 (data em que começou a vigorar a TR) e até setembro de 2019, quando julgados os embargos de declaração no RE 870947 pelo STF (IPCA-E: 76,77%; INPC 75,11), de forma que a adoção de um ou outro índice nas decisões judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação.
Juros de mora
Os juros de mora devem incidir a partir da citação.
Até 29-06-2009, já tendo havido citação, deve-se adotar a taxa de 1% ao mês a título de juros de mora, conforme o art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo percentual aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado, no ponto, constitucional pelo STF no RE 870947, decisão com repercussão geral.
Os juros de mora devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo legal em referência determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, AgRgno AgRg no Ag 1211604/SP).
Antecipação de tutela
Confirmado o direito ao benefício de auxílio-doença, resta mantida a antecipação dos efeitos da tutela, concedida pelo juízo de origem.
Honorários Advocatícios
Tendo em vista que a sentença foi publicada sob a égide do novo CPC, é aplicável quanto à sucumbência aquele regramento.
Considerando a natureza previdenciária da causa, bem como a existência de parcelas vencidas, e tendo presente que o valor da condenação não excederá de 200 salários mínimos, os honorários de sucumbência devem ser fixados originariamente em 10% sobre as parcelas vencidas, nos termos do artigo 85, §3º, inciso I, do CPC. Conforme a Súmula n.º 111 do Superior Tribunal de Justiça, a verba honorária deve incidir sobre as prestações vencidas até a data da decisão de procedência (acórdão).
Custas
Quando demandado perante a Justiça Estadual do Paraná, o INSS responde pelas custas (Súmula 20/TRF4).
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação.
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Apelação Cível Nº 5016133-29.2018.4.04.9999/PR
RELATORA: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
APELANTE: NEUSA ZACARIAS FAIAO
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE CONSTATADA DESDE A DER. DIREITO AO BENEFÍCIO. JUROS E CORREÇÃO.
1. O juiz não está adstrito ao laudo pericial, nos termos do art. 479 do CPC, mas se entender por não acolher as conclusões do perito, à luz dos demais elementos presentes nos autos, deverá indicar os motivos que o levam a entendimento diverso.
2. Constatada, do cotejo probatório, incapacidade desde a data da entreda do requerimento e presente a qualidade de segurada, é devido auxílio-doença desde então, descontando-se os valores já percebidos a título de benefício por incapacidade, com termo final, no caso, na data em que a parte autora foi aposentada por idade.
3. O Supremo Tribunal Federal reconheceu no RE 870947, com repercussão geral, a inconstitucionalidade do uso da TR, sem modulação de efeitos.
4. O Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1495146, em precedente também vinculante, e tendo presente a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização monetária, distinguiu os créditos de natureza previdenciária, em relação aos quais, com base na legislação anterior, determinou a aplicação do INPC, daqueles de caráter administrativo, para os quais deverá ser utilizado o IPCA-E.
5. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29/06/2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o percentual aplicado à caderneta de poupança.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, DAR provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 24 de junho de 2020.
Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Juíza Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001828355v3 e do código CRC d9e6c833.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 17/06/2020 A 24/06/2020
Apelação Cível Nº 5016133-29.2018.4.04.9999/PR
RELATORA: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PROCURADOR(A): JOSE OSMAR PUMES
APELANTE: NEUSA ZACARIAS FAIAO
ADVOGADO: BADRYED DA SILVA (OAB PR042071)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 17/06/2020, às 00:00, a 24/06/2020, às 14:00, na sequência 296, disponibilizada no DE de 05/06/2020.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
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