Apelação Cível Nº 5010588-41.2019.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
APELANTE: GELTRUDES SALETE LEGRAMANTI
ADVOGADO: DANIEL NATAL BRUNETTO (OAB RS063345)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Trata-se de apelação em face de sentença proferida (na vigência do CPC/2015) com o seguinte dispositivo:
"Isso posto, julgo procedente o pedido, para condenar o Instituto Nacional de Seguridade Social – INSS a conceder o benefício de auxílio-doença a GELTRUDES SALETE LEGRAMANTI, a contar de 17 de maio de 2018, ficando mantida a tutela de urgência deferida.
A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, quais sejam: a) INPC (de 04-2006 a 29-06-2009, conforme o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, combinado com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11-08-2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91); b) IPCA-E (a partir de 30-06-2009, conforme RE 870.947, j. 20-09-2017). Já os juros de mora serão de 1% (um por cento) ao mês, aplicados a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29-06-2009. A partir de 30-06-2009, segundo os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme art. 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei nº 9.494/97.
Tais parâmetros poderão ser revistos em sede de cumprimento de sentença, de acordo com o que restar decidido pelo STF.
Aplicam-se os índices de deflação na correção monetária do crédito, preservando-se o valor nominal.
As parcelas pagas em virtude da tutela provisória de urgência deverão ser abatidas do principal em eventual cumprimento de sentença.
Custas pelo INSS, resultando isento, conforme artigo 5º da Lei Estadual nº 14.634/2014. Condeno também a autarquia ao pagamento de honorários advocatícios ao patrono da parte autora, em percentual a ser fixado quando da liquidação do julgado, nos termos do artigo 85, § 3º e § 4º, inciso II, do Novo Código de Processo Civil, observando-se o preceito inserto na Súmula 111 do STJ.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se."
Em suas razões recursais, a autora alega que está definitivamente incapacitada para o exercício de suas atividades habituais, bem como que, diante da inviabilidade de sua reabilitação, faz jus ao benefício de aposentadoria por invalidez desde o cancelamento do auxílio-doença (16/05/2018). Requer, ainda, a majoração da verba honorária, nos termos do art. 85, § 11, do CPC/2015.
Com as contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
O apelo preenche os requisitos legais de admissibilidade.
Mérito
Tratando-se de benefício por incapacidade, o julgador firma sua convicção, via de regra, por meio da prova pericial. Tal assertiva, todavia, não é absoluta, uma vez que o julgador não está adstrito ao laudo pericial (art. 479, CPC).
A perícia médica judicial (Evento 13, LAUDO1), realizada em 29/08/2018, por especialista em medicina do trabalho, apurou que a autora, auxiliar de embalagem, nascida em 10/12/1982, é portadora de Seqüela de traumatismo de vértebra (CID-10: T91), e concluiu que ela está temporariamente incapacitada para o exercício de sua atividade habitual e de outras que demandem esforço de tronco, nos seguintes termos:
"(...)
5. HISTÓRIA CLÍNICA:
Relata a autora que em 2015 sofreu uma queda do telhado sofrendo traumatismo na cabeça e nas costas.
Necessitou o uso de colete de contenção.
Retornou ao trabalho após 4 meses sentindo dor nas costa.
Trabalhou por um mês e precisou procurar atendimento médico, tendo sido indicada fisioterapia e uso de medicação analgésica.
6. EXAME DAS FUNÇÕES:
Examinanda apresenta-se vestida com roupas simples, boa condição de asseio.
Lúcida, coerente, orientada, memória preservada, linguagem clara, afeto modulado, pensamento lógico e conduta adequada.
Apresenta tomografia de coluna lombar que mostra seqüela de fratura em L1.
(...)
Do Juízo:
a) Diga o perito se existe incapacidade para o trabalho.
Para atividades que demandem esforço de tronco.
b) Em caso positivo, se a incapacidade é parcial ou total e temporária ou definitiva.
Parcial temporária.
c) Em caso de incapacidade temporária, se existe data aproximada de recuperação da capacidade.
Depende do tratamento proposto e do engajamento da autora neste.
d) Diga se existe possibilidade de reabilitação e há nexo causal com as atividades profissionais desenvolvidas pela parte autora.
Sim, sem nexo com o trabalho.
e) E diga se é possível estabelecer a data de início da incapacidade.
A data do acidente.
9. CONCLUSÃO.
A autora apresenta patologia que a incapacita para atividades que exijam esforço de tronco."
Respondendo aos quesitos formulados pelo INSS, o expert afirmou que a parte autora "não realiza tratamento adequado, pois o adequado seria cirúrgico, devendo ser reavaliada seis meses após a cirurgia" (quesito 12 - Evento 13, LAUDO1, p. 5).
Em que pese o perito judicial tenha concluído pela incapacidade temporária, a fundamentação apresentada e as respostas aos quesitos formulados demonstram estar a autora definitivamente incapacitada para o exercício de suas atividades habituais, porquanto a plena recuperação da capacidade laboral depende de procedimento cirúrgico, ao qual a autora não está obrigada a se submeter.
Afasto, ao menos por ora, a concessão da aposentadoria por invalidez, sendo adequada a tentativa de submetê-la ao serviço de reabilitação mantido pelo INSS, a fim de voltar a exercer atividade produtiva, solução sempre preferível à inativação, ainda mais considerando que a autora é relativamente jovem (37 anos de idade) e possui ensino fundamental completo (Evento 25, PROCADM8, p. 6).
Desse modo, tenho que merece parcial reforma a sentença, apenas para determinar que o auxílio-doença, restabelecido a contar da cessação administrativa, em 16/05/2018, seja mantido até a efetiva reabilitação da segurada.
Correção monetária
A correção monetária, segundo o entendimento consolidado na 3ª Seção deste TRF4, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos seguintes índices oficiais:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94;
- INPC a partir de 04/2006, de acordo com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91, sendo que o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, determina a aplicabilidade do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso.
A incidência da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública foi afastada pelo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 870947, com repercussão geral, tendo-se determinado, no recurso paradigma a utilização do IPCA-E, como já havia sido determinado para o período subsequente à inscrição em precatório, por meio das ADIs 4.357 e 4.425.
Interpretando a decisão do STF, e tendo presente que o recurso paradigma que originou o precedente tratava de condenação da Fazenda Pública ao pagamento de débito de natureza não previdenciária (benefício assistencial), o Superior Tribunal de Justiça, em precedente também vinculante (REsp 1495146), distinguiu, para fins de determinação do índice de atualização aplicável, os créditos de natureza previdenciária, para estabelecer que, tendo sido reconhecida a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização, deveria voltar a incidir, em relação a tal natureza de obrigação, o índice que reajustava os créditos previdenciários anteriormente à Lei 11.960/09, ou seja, o INPC.
Importante ter presente, para a adequada compreensão do eventual impacto sobre os créditos dos segurados, que os índices em referência - INPC e IPCA-E tiveram variação praticamente idêntica no período transcorrido desde julho de 2009 até setembro de 2017, quando julgado o RE 870947, pelo STF (IPCA-E: 64,23%; INPC 63,63%), de forma que a adoção de um ou outro índice nas decisões judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação.
A conjugação dos precedentes acima resulta na aplicação do INPC aos benefícios previdenciários, a partir de abril 2006, reservando-se a aplicação do IPCA-E aos benefícios de natureza assistencial.
Em data de 24 de setembro de 2018, o Ministro Luiz Fux, relator do RE 870947 (tema 810), deferiu efeito suspensivo aos embargos de declaração opostos pela Fazenda Pública, por considerar que a imediata aplicação da decisão daquela Corte, frente à pendência de pedido de modulação de efeitos, poderia causar prejuízo "às já combalidas finanças públicas".
Em face do efeito suspensivo deferido pelo STF sobre o próprio acórdão, e considerando que a correção monetária é questão acessória no presente feito, bem como que o debate remanescente naquela Corte Suprema restringe-se à modulação dos efeitos da decisão de inconstitucionalidade, impõe-se desde logo, inclusive em respeito à decisão também vinculante do STJ, no tema 905, o estabelecimento do índice aplicável – INPC para os benefícios previdenciários e IPCA-E para os assistenciais -, cabendo, porém, ao juízo de origem observar, na fase de cumprimento do presente julgado, o que vier a ser deliberado nos referidos embargos declaratórios.
Juros de mora
Os juros de mora devem incidir a partir da citação.
Até 29/06/2009, os juros de mora devem incidir à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado hígido pelo STF no RE 870947, com repercussão geral reconhecida. Os juros devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, 5ª Turma, AgRgnoAgRg no Ag 1211604/SP, Rel. Min. Laurita Vaz).
Honorários advocatícios
Tendo em vista que a sentença foi publicada sob a égide do novo CPC, este regramento é aplicável quanto à sucumbência.
No tocante ao cabimento da majoração da verba honorária, conforme previsão do §11 do art. 85 do CPC/2015, assim decidiu a Segunda Seção do STJ, no julgamento do AgInt nos EREsp nº 1.539.725-DF (DJe de 19-10-2017):
É devida a majoração da verba honorária sucumbencial, na forma do art. 85, §11, do CPC/2015, quando estiverem presentes os seguintes requisitos, simultaneamente:
a) vigência do CPC/2015 quando da publicação da decisão recorrida, ou seja, ela deve ter sido publicada a partir de 18/03/2016;
b) não conhecimento integralmente ou desprovimento do recurso, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente;
c) existência de condenação da parte recorrente ao pagamento de honorários desde a origem no feito em que interposto o recurso.
No caso concreto, não estão preenchidos todos os requisitos acima elencados, não sendo devida, portanto, a majoração da verba honorária.
Prequestionamento
O prequestionamento da matéria segue a sistemática prevista no art. 1.025 do CPC/2015.
Antecipação de tutela
Confirmado o direito ao benefício, resta mantida a antecipação dos efeitos da tutela concedida (Evento 15, DESPADEC1), em razão do seu caráter alimentar e necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.
Conclusão
- Recurso da parte autora parcialmente provido, para determinar que o auxílio-doença, restabelecido a contar da cessação administrativa, em 16/05/2018, seja mantido até a efetiva reabilitação da segurada;
- consectários adequados à orientação do STF em sede de repercussão geral;
- mantida a antecipação de tutela concedida.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação e manter a antecipação de tutela concedida.
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Apelação Cível Nº 5010588-41.2019.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
APELANTE: GELTRUDES SALETE LEGRAMANTI
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE LABORAL PARCIAL E PERMANENTE COM POSSIBILIDADE DE REABILITAÇÃO PROFISSIONAL. PERÍCIA JUDICIAL CONCLUDENTE. CORREÇÃO MONETÁRIA. TEMA 810 DO STF.
1. Nas ações em que se objetiva a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, o julgador firma seu convencimento com base na prova pericial, não deixando de se ater, entretanto, aos demais elementos de prova.
2. É devido o auxílio-doença quando a perícia judicial é concludente de que a parte autora está permanentemente incapacitada para a sua atividade habitual, podendo ser reabilitada para outras ocupações que lhe garantam a subsistência.
3. Hipótese em que os elementos de prova indicam a continuidade da moléstia incapacitante após a cessação do auxílio-doença, impondo-se o restabelecimento do benefício até a efetiva reabilitação da segurada.
4. O Supremo Tribunal Federal reconheceu no RE 870947, com repercussão geral, a inconstitucionalidade do uso da TR.
5. O Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1495146, em precedente também vinculante, e tendo presente a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização monetária, distinguiu os créditos de natureza previdenciária, em relação aos quais, com base na legislação anterior, determinou a aplicação do INPC, daqueles de caráter administrativo, para os quais deverá ser utilizado o IPCA-E.
6. Estando pendentes embargos de declaração no STF para decisão sobre eventual modulação dos efeitos da inconstitucionalidade do uso da TR, impõe-se fixar desde logo os índices substitutivos, resguardando-se, porém, a possibilidade de terem seu termo inicial definido na origem, em fase de cumprimento de sentença.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação e manter a antecipação de tutela concedida, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 24 de julho de 2019.
Documento eletrônico assinado por JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001091499v6 e do código CRC ef29f754.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Ordinária DE 24/07/2019
Apelação Cível Nº 5010588-41.2019.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APELANTE: GELTRUDES SALETE LEGRAMANTI
ADVOGADO: DANIEL NATAL BRUNETTO (OAB RS063345)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 24/07/2019, na sequência 249, disponibilizada no DE de 08/07/2019.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA, DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO E MANTER A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA CONCEDIDA.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Votante: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 04:33:06.