| D.E. Publicado em 16/05/2018 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002553-51.2017.4.04.9999/RS
RELATORA | : | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
APELANTE | : | VOLMIR HOFFMANN SCHUTZ |
ADVOGADO | : | Carla Fabiana Wahldrich e outros |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE TEMPORÁRIA. TERMO INICIAL. RESTABELECIMENTO
Comprovada a incapacidade temporária para o exercício das atividades laborativas habituais, é cabível o restabelecimento de auxílio-doença, devendo-se reconhecer efeitos financeiros retroativos à data da indevida cessação do benefício, quando demonstrado que, embora descoberto do amparo previdenciário, o segurado permaneceu incapacitado.
O benefício deverá ser mantido ativo enquanto não realizado procedimento cirúrgico ou reabilitado o autor para atividade profissional compatível com suas limitações físicas.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação e determinar a implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 25 de abril de 2018.
Juíza Federal Taís Schilling Ferraz
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Juíza Federal Taís Schilling Ferraz, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9356338v8 e, se solicitado, do código CRC 3F01FEEE. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002553-51.2017.4.04.9999/RS
RELATORA | : | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
APELANTE | : | VOLMIR HOFFMANN SCHUTZ |
ADVOGADO | : | Carla Fabiana Wahldrich e outros |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
RELATÓRIO
Trata-se de ação previdenciária ajuizada por Volmir Hoffmann Schutz, em 25-04-2012, contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, objetivando o restabelecimento do benefício de auxílio-doença.
Realizou-se perícia médica judicial em 15-10-2012 (fls. 46-9).
O magistrado de origem, em sentença publicada em 08-07-2016 (fl. 128), julgou improcedente o pedido, condenando a parte autora ao pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios ao patrono da ré, estes fixados em R$ 724,00 (setecentos e vinte e quatro reais), suspensa sua exigibilidade em face do deferimento da AJG.
A parte autora apela (fls. 129-33), sustentando existirem provas suficientes acerca de sua incapacidade laboral, inclusive a perícia médica oficial.
Sem contrarrazões, subiram os autos ao Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do sul, o qual declinou da competência para este Tribunal.
Nesta Corte, em decorrência de pedido do autor, foi deferida tutela de urgência, para fins de implantação do benefício de auxílio-doença (fls. 155-6), sendo esta reiterada, com aplicação de multa de R$ 100,00 por descumprimento além do prazo de 10 dias (fl. 163). O INSS informou que implantou o benefício e, ao mesmo tempo, estabeleceu data futura para seu cancelamento (fls. 167-8).
O demandante peticiona novamente, informando ter sido submetida à perícia médica administrativa, ocorrendo daí o cancelamento do benefício, motivo pelo qual solicita seu restabelecimento em 48h, sob pena de multa de R$ 500,00.
É o relatório.
VOTO
Inicialmente, anoto que se encontram preenchidos os requisitos de admissibilidade recursal.
Benefício por incapacidade
Conforme o disposto no art. 59 da Lei n.º 8.213/91, o auxílio-doença é devido ao segurado que, havendo cumprido o período de carência, salvo as exceções legalmente previstas, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.
A aposentadoria por invalidez, por sua vez, será concedida ao segurado que, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, for considerado incapaz e insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, sendo-lhe paga enquanto permanecer nessa condição, nos termos do 42 da Lei de Benefícios da Previdência Social.
A lei de regência estabelece, ainda, que para a concessão dos benefícios em questão exige-se o cumprimento da carência correspondente a 12 (doze) contribuições mensais (art. 25), salvo nos casos legalmente previstos.
Na eventualidade de ocorrer a cessação do recolhimento das contribuições exigidas, prevê o art. 15 da Lei n.º 8.213/91 um período de graça, prorrogando-se, por assim dizer, a qualidade de segurado durante determinado período. Vejamos:
"Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
I - sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício;
II - até 12 (doze) meses após a cessação das contribuições, o segurado que deixar de exercer atividade remunerada abrangida pela Previdência Social ou estiver suspenso ou licenciado sem remuneração;
III - até 12 (doze) meses após cessar a segregação, o segurado acometido de doença de segregação compulsória;
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
V - até 3 (três) meses após o licenciamento, o segurado incorporado às Forças Armadas para prestar serviço militar;
VI - até 6 (seis) meses após a cessação das contribuições, o segurado facultativo.
§ 1º O prazo do inciso II será prorrogado para até 24 (vinte e quatro) meses se o segurado já tiver pago mais de 120 (cento e vinte) contribuições mensais sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
§ 2º Os prazos do inciso II ou do § 1º serão acrescidos de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
§ 3º Durante os prazos deste artigo, o segurado conserva todos os seus direitos perante a Previdência Social.
§ 4º A perda da qualidade de segurado ocorrerá no dia seguinte ao do término do prazo fixado no Plano de Custeio da Seguridade Social para recolhimento da contribuição referente ao mês imediatamente posterior ao do final dos prazos fixados neste artigo e seus parágrafos."
Decorrido o período de graça, o que acarreta a perda da qualidade de segurado, as contribuições anteriores poderão ser computadas para efeito de carência. Exige-se, contudo, um recolhimento mínimo de 1/3 do número de contribuições exigidas para o cumprimento da carência definida para o benefício a ser requerido, conforme se extrai da leitura do art. 24 da Lei n.º 8.213/91. Dessa forma, cessado o vínculo, eventuais contribuições anteriores à perda da condição de segurado somente poderão ser computadas se recolhidas, in casu, mais quatro contribuições.
É importante destacar que o pressuposto para a concessão de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez é a existência de incapacidade (temporária ou total) para o trabalho. Isso quer dizer que não basta estar o segurado acometido de doença grave ou lesão, mas, sim, demonstrar que sua incapacidade para o labor delas decorre.
De outra parte, tratando-se de doença ou lesão anterior à filiação ao Regime Geral de Previdência Social, não será conferido o direito à aposentadoria por invalidez/auxílio-doença, salvo quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou lesão (§ 2º do art. 42).
Em resumo, a concessão de benefícios por incapacidade pressupõe a demonstração dos seguintes requisitos: a) a qualidade de segurado; b) cumprimento do prazo de carência de 12 (doze) contribuições mensais (quando exigível); c) incapacidade para o trabalho de caráter total e permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporária (auxílio-doença).
No mais, deve ser ressaltado que, conforme jurisprudência dominante, nas ações em que se objetiva a concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez o julgador firma seu convencimento, de regra, através da prova pericial.
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. RESTABELECIMENTO. INCAPACIDADE LABORATIVA.
1. Quatro são os requisitos para a concessão do benefício em tela: (a) a qualidade de segurado do requerente; (b) o cumprimento da carência de 12 contribuições mensais; (c) a superveniência de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de atividade laboral que garanta a subsistência; e (d) o caráter total e permanente da incapacidade (para o caso da aposentadoria por invalidez) ou temporário (para o caso do auxílio-doença). 2. Segundo entendimento dominante na jurisprudência pátria, nas ações em que se objetiva a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio- doença, ou mesmo nos casos de restauração desses benefícios, o julgador firma seu convencimento com base na prova pericial, não deixando de se ater, entretanto, aos demais elementos de prova, sendo certo que embora possível, teoricamente, o exercício de outra atividade pelo segurado, ainda assim a inativação por invalidez deve ser outorgada se, na prática, for difícil a respectiva reabilitação, seja pela natureza da doença ou das atividades normalmente desenvolvidas, seja pela idade avançada. (TRF4, APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5004883-67.2016.404.9999, 6ª Turma, Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 04/08/2017)
Quanto a isso, José Antônio Savaris, em sua obra "Direito Processual Previdenciário", 03ª ed., Juruá, 2011, p. 239, leciona que "a prova decisiva nos processos em que se discute a existência ou persistência da incapacidade para o trabalho é, em regra, a prova pericial realizada em juízo compreendida, então, à luz da realidade de vida do segurado".
Caso concreto
- Incapacidade
A prova pericial é fundamental nos casos de benefício por incapacidade e tem como função elucidar os fatos trazidos ao processo. Submete-se ao princípio do contraditório, oportunizando-se, como no caso dos autos, a participação das partes na sua produção e a manifestação sobre os dados e conclusões técnicas apresentadas. Não importa, por outro lado, que seu resultado não atenda à expectativa de um dos demandantes ou mesmo de ambos, porque se destina a colher elementos necessários à formação do convencimento do juízo, ao qual incumbe decidir sobre a sua realização e eventual complementação e, posteriormente, apreciar seu poder de esclarecimento dos fatos, cotejando a perícia com os demais elementos carreados ao processo.
O juiz não está adstrito ao laudo pericial, nos termos do art. 479 do CPC, mas se entender por não acolher as conclusões do perito, à luz dos demais elementos presentes nos autos, deverá indicar os motivos que o levam a entendimento diverso.
Durante a instrução processual foram realizadas perícias médicas pelos doutores Ana Cláudia Vasconcellos Azeredo (fls. 46-9) e Alexandre Rotband (fls. 93-6), ambos especialistas em medicina do trabalho, respectivamente em 15-10-2012 e 20-11-2014, de cujos laudos técnicos foi possível extrair:
a - enfermidade: hérnia umbilical, diabetes mellitus, obesidade e diástase dos retos abdominais;
b- incapacidade: existente;
c- grau da incapacidade: parcial;
d- prognóstico da incapacidade: o perito não considera a incapacidade definitiva;
e - início da incapacidade: desde as altas dos procedimentos cirúrgicos das hérnias umbilicais, até recuperação, que costuma ocorrer em 30 dias.
O primeiro perito entendeu haver apenas restrições a atividades que demandem grandes esforços físicos, mas não incapacidade ao labor.
O segundo profissional foi mais além, e manifestou-se pela ocorrência de incapacidade para atividades que exijam esforços físicos, em razão da diástase dos retos abdominais de que acometido o autor (separação dos músculo abdominais).
A primeira cirurgia decorrente da presença da hérnia umbilical ocorreu em 05-02-2010, havendo o demandante retornado ao labor em maio de 2010. Em consequência de recidiva, novo procedimento cirúrgico teve efeito em 06-10-2010, quando, retornando à empresa, o médico desta atestou inaptidão (atestado de saúde ocupacional, datado de 26-05-2011), impedindo-o de assumir suas funções; entretanto, o réu não reconheceu sua incapacidade, negando-lhe o benefício.
Em pesquisa ao sistema Plenus do INSS, verifico que o autor esteve em benefício de auxílio-doença (NB 539.732.378-7 e NB 543.228.114-3), de 14-02-2010 a 07-05-2010 e de 21-10-2010 a 04-04-2011, sob o CID K46 (hérnia abdominal não especificada, com obstrução, sem gangrena).
Acerca da profissiografia do autor, registro que este exerceu sua última atividade na condição de armazenista, e, ao longo de sua vida, desenvolveu as funções de marteleiro em cutelaria, serviços gerais e ajudante de fundição; todas essas, atividades eminentemente braçais.
Nascido em 15-01-1966, atualmente conta com 52 anos de idade, e possui escolaridade até o 1º grau completo.
Conforme pedido na inicial, o demandante pretende o restabelecimento do benefício 543.228.114-3, o qual foi cessado em 04-04-2011, ou, sucessivamente, a concessão do auxílio-doença indeferido em 13-02-2012 (fl. 06).
O atestado de saúde ocupacional da fl. 20, datado de 26-05-2011, indica ser o autor inapto ao trabalho, por portador de hérnia umbilical (CID K42.9 - Hérnia umbilical sem obstrução ou gangrena) com recidiva da lesão 8 meses após a primeira cirurgia, afirmando que para desempenhar novamente suas funções deverá estar completamente curado de sua patologia.
Infere-se daí que a incapacidade do requerente permaneceu para além do cancelamento do benefício pela autarquia previdenciária, devendo o auxílio-doença ser restabelecido, desde que indevidamente cessado, em 04-04-2011.
Confirmando a permanência da inaptidão laboral pela mesma moléstia incapacitante diagnosticada em todas as perícias, oficiais e administrativas (hérnia umbilical), há também o atestado da fl. 19, firmado por médico credenciado da rede pública de saúde, Dra. Jane Maria Rios Wolf, datado de 15-02-2012.
Ainda, ratificando o impedimento à realização de esforços físicos, foram juntados os atestados de fls. 39 e 45, datados de 08-06-2012 e 03-12-2012.
Portanto, inexistem dívidas de que perdura a incapacidade do autor.
E esta, conforme afirmação do perito oficial, somente pode ser afastada por meio de um procedimento cirúrgico, tratamento por ele recomendado e dito como de ótimo prognóstico.
Qualidade de segurado e carência
A qualidade de segurado e a carência mínima são incontestes. O autor estava em gozo de benefício na data inicial da incapacidade aqui reconhecida, razão pela qual considero atendidos estes requisitos.
Assim, presentes os requisitos legais ao benefício, e tendo o laudo médico oficial concluído pela existência de patologia incapacitante para o exercício de atividades laborais, bem como pela possibilidade de reversão do quadro, cabível a concessão do auxílio-doença.
- Termo inicial
A perícia constatou que a incapacidade teve início a partir dos procedimentos cirúrgicos havidos.
Além disso, do cotejo do laudo com os demais elementos trazidos aos autos, desde a inicial, possível concluir que a incapacidade ao cancelamento do benefício, em 04-04-2011, pois o autor continuou sofrendo da mesma moléstia, e impedido de realizar esforços físicos inerentes a suas funções laborais.
Portanto, ao ver frustrada a sua expectativa de restabelecimento do benefício a parte autora já se encontrava impossibilitada de trabalhar, motivo pelo qual o benefício de auxílio-doença deverá ser restabelecido desde a data em que indevidamente cessado.
- Termo final
A Lei 13.457, de 26-06-2017, alterando os termos do art. 60 da Lei 8.213/91, assim dispôs:
"Art. 60 (...)
§8º Sempre que possível, o ato de concessão ou de reativação de auxílio-doença, judicial ou administrativo, deverá fixar o prazo estimado para a duração do benefício.
§9º Na ausência de fixação do prazo de que trata o § 8o deste artigo, o benefício cessará após o prazo de cento e vinte dias, contado da data de concessão ou de reativação do auxílio-doença, exceto se o segurado requerer a sua prorrogação perante o INSS, na forma do regulamento, observado o disposto no art. 62 desta Lei.
§10. O segurado em gozo de auxílio-doença, concedido judicial ou administrativamente, poderá ser convocado a qualquer momento para avaliação das condições que ensejaram sua concessão ou manutenção, observado o disposto no art. 101 desta Lei.
§11. O segurado que não concordar com o resultado da avaliação da qual dispõe o § 10 deste artigo poderá apresentar, no prazo máximo de trinta dias, recurso da decisão da administração perante o Conselho de Recursos do Seguro Social, cuja análise médica pericial, se necessária, será feita pelo assistente técnico médico da junta de recursos do seguro social, perito diverso daquele que indeferiu o benefício."
Segundo referidas alterações, portanto, a circunstância de ter sido judicializada a discussão quanto ao direito ao benefício por incapacidade, não exclui a possibilidade de o INSS realizar revisão periódica da condição laborativa do segurado.
O § 8º, acima transcrito, traz a regra geral, ao estabelecer que, sempre que possível, na decisão judicial que concede ou reativa auxílio-doença, haverá fixação do prazo para a duração do benefício.
Não houve determinação legal de que o juiz estipulasse prazo. E isto se deve à circunstância de que haverá situações em que as características da incapacidade indicarão a sua definitividade, desde logo, ou não permitirão estimar o tempo necessário de reabilitação.
O § 9º traz uma regra subsidiária, aplicável à Administração, mas que não poderá ser aplicada indistintamente nos casos judicializados.
Se a questão está judicializada, com antecipação de tutela deferida liminarmente, por sentença ou por decisão em agravo de instrumento, o eventual cancelamento do auxílio-doença terá que ser previamente submetido pelo INSS ao crivo do Poder Judiciário. Até que se esgotem as instâncias destinadas à apreciação de questões de fato, a autarquia não poderá sponte sua, revogar ou dar efeitos limitados a uma decisão judicial que não o tenha feito.
Nessa perspectiva, tem-se que:
a) Tratando-se de benefício temporário, quando a implantação do auxílio-doença decorrer de decisão judicial, ainda que o INSS venha a exercer a prerrogativa de convocar o segurado para nova perícia administrativa, não poderá cancelar o benefício sem autorização do juízo, até o esgotamento da jurisdição da Turma julgadora.
b) Após o esgotamento da jurisdição da Turma Julgadora, com a concessão ou confirmação do direito ao auxílio-doença, o INSS poderá convocar o segurado para nova perícia, nos prazos da legislação, e, após regular constatação da recuperação da capacidade laborativa, promover o cancelamento do benefício, comunicando, neste caso, ao juízo originário ou da execução provisória, sobre a decisão de cancelamento e sua motivação.
Em resumo, após decisão judicial de concessão de auxílio-doença, estando a decisão vigente, enquanto o feito não for julgado em segunda instância, necessário submeter ao juízo eventuais razões para o cancelamento do benefício, o qual não poderá decorrer diretamente da decisão administrativa. Após este marco, será suficiente a comunicação do cancelamento e das razões, precedida de perícia administrativa.
Registro que a convocação para nova perícia administrativa, conquanto possa acontecer a qualquer tempo (§10 do artigo 60 da Lei nº 8.213 introduzido pela Lei nº 13.457/2017), pressupõe a observação do que foi estabelecido no respectivo julgamento (ou decisão liminar), em termos de prazo ou condições específicas para revisão da concessão.
No caso, como já se disse, dos esclarecimentos do perito judicial exsurge que a incapacidade é temporária mas a alta depende de procedimento cirúrgico.
Destaque-se que o autor não está obrigado a sujeitar-se ao tratamento cirúrgico (art. 101 da Lei de Benefícios), porém mesmo que realize a intervenção cirúrgica, esta depende de agendamento pelo SUS, o que, via de regra, é demorado.
Nesse contexto, o benefício não poderá ser cancelado antes de efetivamente realizada a indigitada cirurgia e comprovado, mediante perícia médica administrativa, que houve efetiva melhora da doença incapacitante. Eventualmente, ausente a melhora, a autarquia poderá converter o benefício em aposentadoria por invalidez.
Para afastar-se a necessidade de submissão prévia a juízo do eventual cancelamento do benefício na via administrativa, fica assentado que tal não poderá ocorrer sem que a parte autora recupere sua capacidade laboral, mediante a realização de eventual cirurgia ou sem que seja reabilitada para função compatível com sua limitação física. De qualquer forma, havendo cancelamento do benefício antes do trânsito em julgado da ação, a autarquia deve providenciar a comunicação de tal medida nos autos do processo.
Consectários e Provimentos Finais
- Correção monetária
A correção monetária, segundo o entendimento consolidado na 3ª Seção deste TRF4, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos seguintes índices oficiais:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94;
- INPC de 04/2006 a 29/06/2009, conforme o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, combinado com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91.
- IPCA-E a partir de 30/06/2009.
A incidência da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública foi afastada pelo STF, no julgamento do RE 870947, com repercussão geral, tendo-se determinado a utilização do IPCA-E, como já havia sido determinado para o período subsequente à inscrição em precatório, por meio das ADIs 4.357 e 4.425.
- Juros de mora
Os juros de mora devem incidir a partir da citação.
Até 29-06-2009, os juros de mora devem incidir à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado hígido pelo STF no RE 870947, com repercussão geral reconhecida. Os juros devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, 5ª Turma, AgRgno AgRg no Ag 1211604/SP, Rel. Min. Laurita Vaz).
- Custas processuais
O TJRS, nos autos do incidente de inconstitucionalidade 7004334053, concluiu pela inconstitucionalidade da Lei Estadual 13.471/2010, a qual dispensava as pessoas jurídicas de direito público do pagamento de custas e despesas processuais. Na ADIN estadual 70038755864, entretanto, a inconstitucionalidade reconhecida restringiu-se à dispensa, pela mesma lei, do pagamento de despesas processuais, não alcançando as custas. Em tais condições, e não havendo vinculação da Corte ao entendimento adotado pelo TJRS em incidente de inconstitucionalidade, mantido o entendimento anteriormente adotado, já consagrado pelas Turmas de Direito Previdenciário, para reconhecer o direito da autarquia à isenção das custas, nos termos da Lei 13.471/2010.
- Honorários advocatícios
Tendo havido a inversão da sucumbência, são aplicáveis as normas do novo CPC.
Considerando a natureza previdenciária da causa, bem como a existência de parcelas vencidas, e tendo presente que o valor da condenação não excederá de 200 salários mínimos, os honorários de sucumbência devem ser fixados em 10% sobre as parcelas vencidas, nos termos do artigo 85, §3º, inciso I, do CPC.
- Tutela específica - implantação do benefício
Nesta Corte, em decorrência de pedido do autor, foi deferida tutela de urgência, para fins de implantação do benefício de auxílio-doença (fls. 155-6), sendo esta reiterada, com aplicação de multa de R$ 100,00 por descumprimento além do prazo de 10 dias (fl. 163). O INSS informou que implantou o benefício e, ao mesmo tempo, estabeleceu data futura para seu cancelamento (fls. 167-8).
O demandante peticionou novamente, informando ter sido submetido à perícia médica administrativa, ocorrendo daí o cancelamento do benefício, motivo pelo qual solicita seu restabelecimento em 48h, sob pena de multa de R$ 500,00.
No que diz respeito à antecipação da tutela em obrigações de fazer e à possibilidade de cominação de multa como forma de coerção, dispõe o Novo Código de Processo Civil, em seu artigos 497 e 536, §1º, in verbis:
Art. 497. Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente.
Art. 536. No cumprimento de sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de não fazer, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento, para a efetivação da tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente, determinar as medidas necessárias à satisfação do exequente.
§ 1o Para atender ao disposto no caput, o juiz poderá determinar, entre outras medidas, a imposição de multa, a busca e apreensão, a remoção de pessoas e coisas, o desfazimento de obras e o impedimento de atividade nociva, podendo, caso necessário, requisitar o auxílio de força policial.
Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados nos artigos 497 e 536 do NCPC, quando dirigidos à Administração Pública, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo, diante das considerações havidas, tenho por pertinente que seja determinada a implantação do benefício de auxílio-doença em 48 horas, sob pena de multa diária de R$ 500,00, consoante pedido pelo autor.
- Prequestionamento
Ficam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pelas partes cuja incidência restou superada pelas próprias razões de decidir.
Conclusão
À vista do provimento do recurso da parte autora, alterada a sentença no sentido de restabelecer o benefício de auxílio-doença, a contar de seu cancelamento, ocorrido em 04-04-2011.
Deferida a tutela específica e determinada a implantação do benefício.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação e determinar a implantação do benefício.
Juíza Federal Taís Schilling Ferraz
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Juíza Federal Taís Schilling Ferraz, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9356337v6 e, se solicitado, do código CRC C88A39F1. | |
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 25/04/2018
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002553-51.2017.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00077224520128210086
RELATOR | : | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PROCURADOR | : | Dr.Vitor Hugo Gomes da Cunha |
APELANTE | : | VOLMIR HOFFMANN SCHUTZ |
ADVOGADO | : | Carla Fabiana Wahldrich e outros |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 25/04/2018, na seqüência 57, disponibilizada no DE de 04/04/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
VOTANTE(S) | : | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
: | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA | |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
| Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9387567v1 e, se solicitado, do código CRC 4544B4B. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Lídice Peña Thomaz |
| Data e Hora: | 25/04/2018 12:33 |
