APELAÇÃO CÍVEL Nº 5003058-16.2016.4.04.7113/RS
RELATORA | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | MARCIA MALVEZ ATUATTI |
ADVOGADO | : | JULIANA ZANUZ ANEZI |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. NECESSIDADE DE COMPLEMENTAÇÃO DA PROVA PERICIAL. ANULAÇÃO DA SENTENÇA.
1. A concessão de benefício previdenciário por incapacidade decorre da convicção judicial formada predominantemente a partir da produção de prova pericial.
2. Considerando que a perícia judicial realizada pronunciou-se somente sobre uma das moléstias apresentadas pela parte autora (ortopedia), deve ser anulada a sentença para aperfeiçoamento da instrução processual, mediante a realização de laudo judicial por especialista nas outras doenças, já diagnosticadas e sobre as quais não houve pronunciamento (reumatismo, fibromialgia e mialgia).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora para anular a sentença para aperfeiçoamento da instrução processual, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre/RS, 05 de julho de 2017.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5003058-16.2016.4.04.7113/RS
RELATOR | : | SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | MARCIA MALVEZ ATUATTI |
ADVOGADO | : | JULIANA ZANUZ ANEZI |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
RELATÓRIO
Trata-se de apelação da parte autora contra sentença (01/03/2017) que julgou improcedente ação visando ao restabelecimento de auxílio-doença e/ou concessão de aposentadoria por invalidez, desde a data do cancelamento administrativo (30/09/2013), condenando-a ao pagamento de custas processuais, honorários advocatícios e periciais, suspensa a exigibilidade por litigar ao amparo da assistência judiciária gratuita.
Alega que houve cerceamento de defesa pelo juízo a quo ao indeferir a realização de perícias socioeconômica e com especialista em reumatologia, a primeira para demonstrar as dificuldades para reabilitação profissional e a segunda em razão de apresentar não apenas patologias ortopédicas mas também reumatológicas (reumatismo e fibromialgia).
No mérito, apesar de o perito judicial ter constatado não haver incapacidade, alega ser possível concluir em sentido contrário, conjugando-se as moléstias ortopédicas diagnosticadas com suas condições pessoais.
Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
VOTO
Nos termos do artigo 1.046 do Código de Processo Civil (CPC), em vigor desde 18 de março de 2016, com a redação que lhe deu a Lei 13.105, de 16 de março de 2015, suas disposições aplicar-se-ão, desde logo, aos processos pendentes, ficando revogada a Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973.
Com as ressalvas feitas nas disposições seguintes a este artigo 1.046 do CPC, compreende-se que não terá aplicação a nova legislação para retroativamente atingir atos processuais já praticados nos processos em curso e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada, conforme expressamente estabelece seu artigo 14.
Mérito
A autora, de profissão empresária, nascida em 25/01/1973 (44 anos atualmente), alegou na inicial estar incapacitada para o trabalho em razão de fibromialgia e artropatia degenerativa (evento 1, INIC1, fl. 2). Esteve em gozo de auxílio-doença de 04/02/2013 a 30/09/2013, pretendendo seu restabelecimento e a conversão em aposentadoria por invalidez.
Tratando-se de concessão de benefício por incapacidade a solução da controvérsia passa, via de regra, pela produção de prova pericial. O perito judicial é o profissional de confiança do juízo, cujo compromisso é examinar a parte com imparcialidade, cabendo ao julgador valorar a prova técnica em cotejo com o restante conjunto probatório.
No laudo pericial judicial realizado em 25/09/2016 o perito assim se manifestou (evento 41):
6. SÍNTESE PROCESSUAL E HISTÓRICO PREVIDENCIÁRIO
A ação visa à concessão de aposentadoria por invalidez ou restabelecimento do benefício espécie B31 (auxílio-doença).
A INFBEN1 revelou que a parte autora esteve em benefício por auxílio-doença espécie B31 no INSS no período compreendido entre 12/11/15 e 28/03 /16, na fl. n° 01, evento 02 dos autos.
Foi reabilitada pelo INSS, trouxe o diploma do curso realizado no SENAI.
7. OCUPAÇÃO HABITUAL
Trouxe a CTPS.
A CTPS revelou que a última profissão trabalhada foi como auxiliar de queijaria na empresa Cooperativa Santa Clara Ltda., admitida em 01/03/88, data da cessação do contrato de trabalho em 05/12/11.
Refere que depois disso passou a fazer parte da sociedade com o esposo numa fábrica de móveis sob medida. A fábrica funciona com dois funcionários, o esposo e o filho.
Refere que o último dia trabalhado foi há um ano.
Refere que realizava as seguintes atividades: passava cola, laminava, pagava contas e tirava os pedidos. Verteu contribuições individuais.
8. PATOLOGIAS
A inicial menciona o(s) seguinte(s) diagnóstico(s) ortopédico(s) PATOLOGIA CID 10:
Cervicalgia M54.2
Reumatismo não especificado M79.0
Fibromialgia M79.7
Mialgia M79.1
9. RELATO DO QUADRO DE SAÚDE ATUAL
9.1 QUADRO CLÍNICO E DIAGNÓSTICO
9.2 TRATAMENTOS
A autora informa como queixa atual "sempre ter muita dor".
Refere ter diagnóstico de fibromialgia. Refere dor e inchaço e a formação de bolas.
Alega não ter reumatismo em exames de sangue.
Indagada a respeito da época do início da sintomatologia, refere que há 17 anos manifestou os primeiros sintomas.
Consultou com médico ortopedista. Realizou exames complementares.
Refere cefaléia constante, tonturas, escotomas visuais, edema e formigamentos, má qualidade de sono em uso de Donaren, rigidez matinal, dor no corpo todo e cansaço físico constante.
Refere que realizou os seguintes tratamentos: sessões de fisioterapia e acupuntura (trouxe comprovantes) e o uso atual de analgésicos, Cymbalta e anti-inflamatórios sintomáticos.
10. EXAME FÍSICO
Ao exame, a paciente apresenta-se em bom estado geral, respondendo às perguntas de forma lúcida, orientada e coerente. Hiperreação ao exame.
Desproporção álgica a despeito da gentileza das manobras semiológicas aplicadas.
Assumiu atitude adequada durante a entrevista. É destra.
A inspeção das mãos não revelou a presença de calosidades palmares.
Altura: 1,81 m Peso: 82 kg
Respiração profusa. Gemente. Alteração da mímica facial.
Inspeção estática - ausência de nódulos de Heberden ou Bouchard.
Inspeção dinâmica - sinais diretos e indiretos de boa mobilidade da coluna lombossacra. Arco de movimento preservado dos membros superiores.
Palpação - dor em mais de 11 dos 18 pontos de tensão.
Muscular - massas musculares eutônicas e eutróficas .
Neurológico - reflexos presentes e simétricos.
Testes especiais - Lasègue negativo bilateralmente. Spurling negativo. Compressão axial do crânio positiva. Waddell positivo. Teste de Adson negativo. Teste de Wright negativo.
11. DOCUMENTOS SUBSIDIÁRIOS E EXAMES COMPLEMENTARES
11.1 NOS AUTOS DO PROCESSO
A conclusão da eletroneuromiografia dos membros superiores datada de 12/08/08 foi anexada no evento 01.
A impressão diagnóstica da ressonância magnética da coluna lombossacra datada de 21/01/16 foi anexada no evento 01.
A impressão diagnóstica da ultrassonografia das articulações dos ombros, cotovelos e punhos datada de 07/08/07 foi anexada no evento 01.
11.2 TRAZIDOS AO ATO PERICIAL
Não trouxe os clichês dos exames de imagem no exame do ato pericial.
Os atestados, receitas e laudos dos exames de imagem foram visualizados no exame do ato pericial.
12. CONSIDERAÇÕES MÉDICO-LEGAIS
A patologia está consolidada e compensada.
Este perito endossa a reabilitação profissional promovida pela autarquia ré conforme descrito no item 06 do laudo pericial.
13. CONCLUSÃO
Não há incapacidade laborativa do ponto de vista ortopédico para a atividade em que foi reabilitada.
(grifos meus)
Respondendo aos quesitos do juízo, o expert reportou-se aos vários itens do laudo. Transcrevo o quesito 2, que considero relevante para o deslinde da questão.
2) A parte autora é portadora de alguma doença? Se positivo, indicar o(s) nome(s) da(s) patologia(s) e qual(is) o(s) exame(s) que comprova(m) o diagnóstico? Caso negativo, o perito deverá apresentar os elementos que fundamentam o diagnóstico.
Sim. Favor reportar-se ao item 08 laudo pericial.
Veja-se que a perícia é detalhada, levou em consideração todos os exames e atestados juntados aos autos e concluiu, taxativamente, que a autora não se encontra inabilitada para o exercício das atividades profissionais para as quais foi reabilitada (supervisão, liderança e gestão da produção - evento 1, PROCADM5, fls. 3/4).
Todavia, o perito, conforme ele próprio se qualifica no início do laudo, é especialista em ortopedia e traumatologia. No entento, as principais queixas da autora são reumatismo, fibromialgia e mialgia. O diagnóstico da presença dessas doenças foi feito pelo perito, que, ao responder o quesito 2 do juízo (quais as doenças de que a autora é portadora) respondeu remetendo ao item 8 do laudo, que trata justamente dessas moléstias, além de cervicalgia.
Ademais, na conclusão da perícia (item 13) é expresso ao afirmar que do ponto de vista ortopédico a autora não está incapacitada para a atividade para a qual foi reabilitada. Ou seja, além de não esclarecer se o reumatismo, a fibromialgia e a mialgia de que a autora é portadora, segundo ele próprio afirma, são incapacitantes, sobre a moléstia ortopédica nada referiu acerca de incapacitação para a atividade habitual da autora. Considerando que ela, o marido e o filho constituíram empresa familiar no ramo moveleiro, com o auxílio, inclusive, de dois empregados, considero de especial relevância esgotar todas as possibilidades de recuperação (ou reabilitação) para o exercício da atividade para a qual a família estabeleceu empresa antes de tentar sua recolocação no mercado de trabalho.
Ademais, segundo consta do sistema Plenus e do CNIS, a autora esteve em gozo de auxílio-doença, anteriormente, por cerca de 10 anos (2003 a 2013), o que, no mínimo, lança dúvidas sobre sua efetiva capacitação para o trabalho.
Concluo, pois, a despeito da perícia detalhada e taxativa, não haver manifestação segura acerca dos males não ortopédicos de que padece a autora, segundo o próprio perito diagnosticou, bem como se deles resulta algum grau de incapacidade para o trabalho.
Nesse sentido, entendo que não poderia ter sido proferida sentença sem antes aclarar tais pontos, considerando, inclusive, que desde a inicial a autora requereu perícia por profissional especialista também quanto a essas doenças.
Por tais razões, tenho que a sentença deva ser anulada e outra proferida, após complementação da instrução processual, mediante realização de perícia médica por especialista(s) em reumatologia, fibromialgia e mialgia.
Esclareço que não é caso de realização de perícia socioeconômica, pois a questão é eminentemente técnica, devendo ser solvida através de parecer médico e avaliação do julgador.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação da parte autora para anular a sentença para aperfeiçoamento da instrução processual.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 05/07/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5003058-16.2016.4.04.7113/RS
ORIGEM: RS 50030581620164047113
RELATOR | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PROCURADOR | : | Dr. Domingos Sávio Dresch da Silveira |
APELANTE | : | MARCIA MALVEZ ATUATTI |
ADVOGADO | : | JULIANA ZANUZ ANEZI |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 05/07/2017, na seqüência 735, disponibilizada no DE de 19/06/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARA ANULAR A SENTENÇA PARA APERFEIÇOAMENTO DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
: | Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO | |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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