APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5010054-28.2014.4.04.7104/RS
RELATOR | : | PAULO AFONSO BRUM VAZ |
APELANTE | : | CLARICE BERNARDETE JACOBS BRUGNERA |
ADVOGADO | : | ALEXANDRE LOURENZI |
: | MÁRCIO DA SILVA PANZENHAGEN | |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | OS MESMOS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. REQUISITOS. INCAPACIDADE DEFINITIVA. COMPROVAÇÃO. CONVERSÃO EM APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. PARCIAL PROVIMENTO.
1. Quatro são os requisitos para a concessão do benefício em tela: (a) qualidade de segurado do requerente; (b) cumprimento da carência de 12 contribuições mensais; (c) superveniência de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de qualquer atividade que garanta a subsistência; e (d) caráter temporário da incapacidade.
2. Hipótese em que restou comprovada incapacidade laborativa definitiva, de forma que merece acolhida a pretensão recursal no sentido de que há respaldo para conversão do auxílio-doença em aposentadoria por invalidez precisamente no laudo do expert, que atestou incapacidade para sua atividade habitual, de forma permanente e definitiva.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Colenda 5a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, não conhecer da remessa oficial e negar provimento às apelaçôes do INSS e da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 22 de agosto de 2017.
Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9035982v4 e, se solicitado, do código CRC F31CC402. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Paulo Afonso Brum Vaz |
| Data e Hora: | 23/08/2017 17:19 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5010054-28.2014.4.04.7104/RS
RELATOR | : | PAULO AFONSO BRUM VAZ |
APELANTE | : | CLARICE BERNARDETE JACOBS BRUGNERA |
ADVOGADO | : | ALEXANDRE LOURENZI |
: | MÁRCIO DA SILVA PANZENHAGEN | |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | OS MESMOS |
RELATÓRIO
Cuida-se de apelações interpostas pelo INSS (evento 109) e da parte autora (evento 110) contra sentença (evento 102), publicada em 22/01/2016, de parcial procedência da pretensão à concessão de benefício por incapacidade (auxílio-doença e posterior conversão em aposentadoria por invalidez).
A autarquia previdenciária sustenta, em suma, que a parte autora não preenche os requisitos para obtenção do benefício, ao argumento de que a DII da autora, segundo a opinião do médico perito do INSS, é no ano de 2003, ao passo que seu reingresso ao RGPS ocorreu em 2006, quando já estava doente. Assim, o juízo de primeiro grau, para acolher ao pedido, confiou apenas na conclusão da perícia judicial, sem levar em consideração as demais provas constantes dos autos. Note-se que, se houve erro do INSS na concessão do benefício, este erro não pode ser convalidado pelo Poder Judiciário, sendo imperativo, pelo princípio da autotutela que o pedido autoral seja julgado totalmente improcedente. Deve ser a segurada suportar o ônus de devolver valores de benefícios percebidos indevidamente, independentemente da presença de má-fé. O INSS insurge-se, ainda, contra os critérios de atualização monetária. Postula a aplicação do art. 1ª-F da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, desde a vigência deste diploma legal, para fins de atualização monetária.
A parte autora, a seu turno, postula a reforma da sentença proferida, no tocante aos danos morais, para conceder a indenização, porque devida, conforme os parâmetros solicitados na exordial.
Com contrarrazões (evento 118), vieram os autos para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Reexame necessário
Não se desconhece o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que a sentença ilíquida está sujeita a reexame necessário (Súmula 490).
Contudo, tratando-se de remessa necessária de sentença que concedeu benefício previdenciário a segurado especial, o qual, como é cediço, corresponde ao valor de um salário mínimo, e a 16 (dezesseis) prestações mensais, devidas entre 01/09/2014 (suspensão indevida) e a data da sentença (22/01/2016), é certo que a condenação, ainda que acrescida de correção monetária e juros, jamais excederá 60 (sessenta) salários-mínimos, montante exigível para a admissibilidade do § 2° do art. 475 do CPC.
Logo, a sentença prescinde de liquidação e não deve ser submetida ao reexame necessário, nos termos do disposto no art. 475, § 2º, do Código de Processo Civil de 1973, o qual é aplicável ao caso em tela porquanto a r. sentença foi proferida antes de 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016), conforme prevê expressamente o artigo 14 do NCPC [A norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada].
Premissas
Trata-se de demanda previdenciária na qual a parte autora objetiva a concessão de AUXÍLIO-DOENÇA, previsto no art. 59 da Lei 8.213/91, ou APOSENTADORIA POR INVALIDEZ, regulado pelo artigo 42 da Lei 8.213/91.
São quatro os requisitos para a concessão desses benefícios por incapacidade: (a) qualidade de segurado do requerente (artigo 15 da LBPS); (b) cumprimento da carência de 12 contribuições mensais prevista no artigo 25, I, da Lei 8.213/91 e art. 24, parágrafo único, da LBPS; (c) superveniência de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de atividade laboral que garanta a subsistência; e (d) caráter permanente da incapacidade (para o caso da aposentadoria por invalidez) ou temporário (para o caso do auxílio-doença).
Cabe salientar que os benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez são fungíveis, sendo facultado ao julgador (e, diga-se, à Administração), conforme a espécie de incapacidade constatada, conceder um deles, ainda que o pedido tenha sido limitado ao outro. Dessa forma, o deferimento do amparo nesses moldes não configura julgamento ultra ou extra petita. Por outro lado, tratando-se de benefício por incapacidade, o Julgador firma a sua convicção, via de regra, por meio da prova pericial.
De qualquer sorte, o caráter da incapacidade, a privar o segurado do exercício de todo e qualquer trabalho, deve ser avaliado conforme as particularidades do caso concreto. Isso porque existem circunstâncias que influenciam na constatação do impedimento laboral (v.g.: faixa etária do requerente, grau de escolaridade, tipo de atividade e o próprio contexto sócio-econômico em que inserido o autor da ação).
Exame do caso concreto
No caso sub examine, a controvérsia recursal atinente à matéria de fundo cinge-se à verificação do nível de incapacidade da parte, dos efeitos financeiros da decisão, bem como à identificação da qualidade de segurado no marco em que a doença teve início.
Diante disso, a partir da perícia realizada nos autos, por médico especialista em cardiologia (evento 37) - Dra. Fernanda Fragomeni Rigoni, CRM 32.540 - de confiança do juízo, e referendada na sentença (evento 102), é possível obter os seguintes dados:
2.1.1 Caso Concreto
Postula a parte autora o restabelecimento do benefício de auxílio doença (NB: 546.294.830-8) e sua conversão em aposentadoria por invalidez, desde a data do cessação do benefício.
Com efeito, a análise do processo administrativo encartado no evento 16 demonstra que a irregularidade na percepção do benefício por incapacidade recebido pela parte autora, segundo apuração do INSS, consiste em (OFÍCIO MOB nº 921/2013): Data do Início da Incapacidade (DII) anterior ao reingresso ao Regime Geral de Previdência Social - RGPS (destaquei).
Nesse andar, considerando que a divergência diz respeito à data de início da incapacidade, foi determinada a realização de prova pericial, que, em resposta aos quesitos formulados por este Juízo, concluiu o seguinte (evento 37 - documento "LAUDPERI1") :
Motivo alegado da incapacidade: FALTA DE AR
Histórico da doença atual: PACIENTE REFERE INFARTO AGUDO DO MIOCÁRDIO EM 2003 TENDO REALIZADO CATETERISMO CARDÍACO NA ÉPOCA E SENDO TRATADA PERCUTANEAMENTE PARA LESÃO EM CORONÁRIA DIREITA. PACIENTE COM LESÕES RESIDUAIS IMPORTANTES QUE NÃO FORAM TRATADAS NESTE MOMENTO. REALIZOU TESTE NÃO INVASIVO PROVOCATIVO DE ISQUEMIA EM 30/5/03, ERGOMETRIA, QUE NÃO EVIDENCIOU ALTERAÇÕES ISQUÊMICAS E A PACIENTE NÃO APRESENTOU SINTOMAS AO EXAME. REFERE TER MANTIDO TRATAMENTO CLÍNICO CONFORME ORIENTAÇÃO MÉDICA E QUE EM 26/8/06 APRESENTOU NOVO EPISÓDIO DE DOR TORÁCICA AGUDA SENDO ENCAMINHADA DA EMERGÊNCIA AO CATETERISMO CARDÍACO E TENDO REALIZADO NOVA ANGIOPLASTIA CORONARIANA, NESTE MOMENTO EM ARTÉRIA CORONÁRIA CIRCUNFLEXA. PACIENTE PERMANECEU INTERNADA E REALIZOU TRATAMENTO PERCUTÂNEA COM IMPLANTE DE 'STENTS' NAS DEMAIS CORONÁRIAS COM LESÕES GRAVES. PACIENTE MANTEVE SEU TRATAMENTO CLÍNICO, REALIZOU NOVO CATETERISMO EM 2008 ABAIXO DESCRITO. REFERE CANSAÇO E DISPNÉIA AOS PEQUENOS ESFORÇOS, OROPNÉIA, DISPNÉIA PAROXÍSTICA NOTURNA. NEGA DOR TORÁCICA. NEGA TABAGISMO ATIVO. REFERE HISTÓRICO DE IAM COM MORTE SÚBITA DO IRMÃO COM 4 ANOS. RELATA TER REALIZADO NOVO CATETERISMO CARDÍACO EM 31/1/14 E NOVAS ANGIOPLASTIAS EM 4/2 E 7/2/14. MANTÉM SINTOMAS HOJE.
FAZ USO CONTÍNUO: AAS 85MG, CAPTOPRIL 50MG 12/12H, ATENOLOL 50MG, ATENSINA 0,150MG 12/12H, HIDROCLOROTIAZIDA 25MG, ANLO 5MG, MONOCORDIL 20MG 12/12H, SINVASTATINA 20MG, EUTHYROX 100MCG
Exames físicos e complementares: AO EXAME:
BOM ESTADO GERAL, LÚCIDA E ORIENTADA
PA 160X90MMHG FC 65BPM
AC: RR, 2T, BHIPERF, SS
AP: MVUD, S/RA
EXTR: AQUECIDAS, PERFUNDIDAS, SEM EDEMA
CARÓTIDAS SEM SOPROS
EXAMES COMPLEMENTARES:
CAT 11/3/03: HIPOCINESIA GRAVE ÍNFERO-BASAL, COM CONTRATILIDADE NORMAL NOS DEMAIS SEGMENTOS. ADA LESÃO LEVE 30% EM SEGMENTO PROXIMAL; 1°RAMO DIAGONAL LESÃO MODERADA DE 50%E 2° RAMO DIAGONAL COM ASPECTO DE OCLUSÃO CRÔNICA COM RECANALIZAÇÃO PARCIAL E FLUXO COMPROMETIDO (TIMI II). ACX COM LESÃO GRAVE (90%) LOGO APÓS O 1°RAMO MARGINAL E OUTRA LESÃO LEVE (30%) DISTAL. ACD COM LESÃO GRAVE (90%) EM ÓSTIO E OCLUSÃO AGUDA EM SEGMENTO MÉDIO. REALIZOU ANGIOPLASTIA CORONARIANA PRIMÁRIA COM IMPLANTE DE 'STENT' EM ARTÉRIA CORONÁRIA DIREITA.
CAT 26/8/06: ADA LESÃO MODERADA 50% SEGMENTO MÉDIO-DISTAL. ACX LESÃO GRAVE 90% NO 1° RAMO MARGINAL. OCLUSÃO DO 2°RAMO MARGINAL NO ÓSTIO. LESÃO GRAVE 90% NA ACX, APÓS A ORIGEM DO 2°RAMO MARGINAL. ACD COM ESTENOSE INTRA-STENT DE 90%. FRAÇÃO DE EJEÇÃO ESTIMADA EM 67% E HIPOCINESIA INFERO-BASAL. ANGIOPLASTIA CORONARIANA COM IMPLANTE DE STENT EM 1°RAMO MARGINAL
ACTP 6/9/06: ACTP COM IMPLANTE DE 'STENT' EM ARTÉRIA CORONARIA CIRCUNFLEXA.
ACTP 21/9/06: ACTP COM IMPLANTE DE 'STENT' EM ARTÉRIA CORONÁRIA DIREITA
CAT 4/3/08: LESÃO MODERADA EM ACD (40%) COM HIPERPLASIA INTIMAL.
CAT 31/1/14: FE 57%; VE COM ACINESIA POSTERO-BASAL; ADA LESÃO CRÍTICA 90% EM TERÇO MÉDIO; ACX LESÃO CRÍTICA 99% DISTAL SEVERA JUNTO 80% JUNTO AO BORDO PROXIMAL DE 'STENT' PRÉVIO; ACD COM LESÃO INTRA-'STENT' DE 70%. REALIZADO ACTP COM IMPLANTE DE 'STENT' EM ADA COM SUCESSO.
ACTP 4/2/13: ACTP COM STENTS EM SCX COM SUCESSO.
ACTP 7/1/13: ACTP COM BALÃO EM ACD COM SUCESSO.
Diagnóstico/CID:
- Hipertensão essencial (primária) (I10)
- Hipotireoidismo não especificado (E039)
- Infarto agudo transmural da parede inferior do miocárdio (I211)
- Miocardiopatia isquêmica (I255)
Justificativa/conclusão: PACIENTE CARDIOPATA ISQUÊMICA GRAVE, COM MÚLTIPLAS INTERVENÇÕES CORONARIANAS PERCUTÂNEAS POR PROGRESSÃO DA DOENÇA, ENCONTRA-SE INCAPACITADA PARA REALIZAR ATIVIDADES LABORATIVAS PELO RISCO DE MORTE SÚBITA. INÍCIO DA DOENÇA EM 11/3/03, DATA DO CATETERISMO DIAGNÓSTICO PÓS-INFARTO E DATA DO INÍCIO DA INCAPACIDADE EM 26/8/06QUANDO REALIZOU NOVO CATETERISMO COMPROVANDO A PROGRESSÃO DA DOENÇA COM NECESSIDADE DE NOVAS INTERVENÇÕES PERCUTÂNEAS. A PACIENTE VEM REALIZANDO TRATAMENTO CLÍNICO OTIMIZADO E APESAR DISSO A DOENÇA MANTÉM-SE PROGRESSIVA E AGRESSIVA.
Data de Início da Doença: 11/03/2003
Data de Início da Incapacidade: 26/08/2006
- Incapacidade para qualquer atividade laborativa
- Incapacidade permanente
O laudo complementar apresentado (evento 51), esclarece:
1-‐Reitero que a data do início da incapacidade foi 26/8/2006 quando foi comprovado por novo cateterismo cardíaco o progresso da doença.
Sendo assim, a autora estava incapacitada de trabalhar, principalmente de exercer esforço físico a partir desta data.
2-‐ A doença é progressiva e pode continuar progredindo.
3-‐ Houve progresso e agravamento da doença entre maio de 2009 e 2014 comprovados por cateterismo cardíaco.
4-‐ Como já descrito anteriormente, houve agravamento da doença.
Cotejando tais informações com os registros constantes do Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS) que apontam os recolhimentos realizados pela parte autora como empregada nos períodos de 01/12/1980 a 09/02/1981; 05/06/1984 a 01/03/1985; bem como, na condição de segurado facultativo, no período de 01/06/2006 a 31/07/2006 e de 01/08/2009 a 31/01/2010; 01/10/2010 a 31/10/2010, além de, como empregada doméstica nos períodos de 01/05/2009 a 30/06/2009 e de 01/05/2010 a 31/10/2010 (evento 13 - documento "CNIS2"), conclui-se que, do ponto de vista da avaliação médica, da perita do juízo, a incapacidade é posterior ao reingresso no RGPS(26/08/2006).
Portanto, malgrado a proximidade de datas evidenciada no caso, é o caso, considerando-se a presumível avaliação clínica idônea da senhora perita médica, de restabelecimento do benefício de auxílio-doença desde a DCB (01/09/2014), e, mais ainda, de sua conversão em aposentadoria por invalidez a partir da realização do laudo médico pericial judicial (08/01/2015 - evento 37), diante da incapacidade permanente então aferida, por novos e subsequentes agravamentos da doença atestados nos autos.
É claro, como já se pode ver do mencionado antes, que não passa sem chamar a atenção deste juízo o fato peculiar de que os novos recolhimentos tenham se iniciado em junho de 2006, depois de mais de vinte anos sem que isso tenha ocorrido. Muito menos o fato de que esta data seja bastante próxima daquela em que a perita médica verificou como sendo a da incapacidade da segurada, o que realmente poderia indicar para um quadro onde se tenha recorrido novamente à previdência quando já não mais tinha a parte condições efetivas de trabalho, por já estar incapacitada por doença grave.
Tampouco deixo de registrar que a mesma segurada já tinha sofrido infarto do miocárdio e intervenções médicas para a solução do problema desde o ano de 2003, não sendo de se descartar a possibilidade de que a doença estivesse já evoluindo desde então, de modo a eventualmente impedir que ela efetivamente tivesse condições reais de laborar quando recomeçou os recolhimentos em junho de 2006.
Entretanto, estes registros, feitos aqui para que a solução deste caso, dada pela interpretação deste magistrado de toda esta situação seja posta à prova nas instâncias superiores de forma ampla e transparente, inclusive com reforma, se for o caso, não se prestam, por si sós, para anular a veemente afirmação da médica nomeada por este juízo como responsável por sua avaliação técnica.
Não há outros elementos nos autos, além de meros indicativos da eventual possibilidade de que tenha havido reingresso sem condições de saúde, apenas para fins de obtenção indevida de benefício, o que acaba, segundo entendo para este caso, por pôr em confronto uma suposição ou presunção (não acolhível por lei, em princípio) de fraude a uma prova médica técnica que, bem ou mal, determinou data específica para início da incapacidade e justificou a razão de assim o fazer.
A autora, com idade atual de 61 anos, possui ensino fundamental completo e desempenhava a profissão de empregada doméstica.
Em vista disso, o INSS alega a preexistência da doença, ao trazer, junto às razões de apelo, provas de que a parte autora já sofria com os sintomas de sua cardiopatia ao reingressar no sistema securitário.
Ressalta-se que serão concedidos - independentemente de carência - os benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez para o rol de doenças especificadas pelo Ministério da Saúde e da Previdência Social, nos termos do art. 26 c/c 151 da Lei 8.213/91. Outrossim, até a elaboração do referido rol, serão consideradas as moléstias declinadas no art. 151 da LBPS, onde, entre outras, consta a cardiopatia grave.
Ademais, é conveniente reiterar que o laudo judicial, sobre o qual se amparou a decisão de primeiro grau, é peremptório quanto à existência de progressão da doença, sendo conveniente extrair da prova técnica o seguinte trecho:
O laudo complementar apresentado (evento 51), esclarece:
1--Reitero que a data do início da incapacidade foi 26/8/2006 quando foi comprovado por novo cateterismo cardíaco o progresso da doença.
Sendo assim, a autora estava incapacitada de trabalhar, principalmente de exercer esforço físico a partir desta data.
2-- A doença é progressiva e pode continuar progredindo.
3-- Houve progresso e agravamento da doença entre maio de 2009 e 2014 comprovados por cateterismo cardíaco.
4-- Como já descrito anteriormente, houve agravamento da doença.
Avaliso a conclusão adotada na origem, devendo prevalecer a prova produzida sob o crivo contraditório, por profissional eqüidistante das partes, evidência esta que é robusta e examinou pormenorizadamente a situação fática, além de responder satisfatoriamente aos quesitos formulados pelas partes.
Deve ser, portanto, mantida a sentença, a fim de que seja concedido o auxílio-doença, no perimeiro período, bem como deferido o pleito à conversão do benefício em aposentadoria por invalidez.
Devolução dos valores percebidos de boa-fé
O recurso do INSS resta prejudicado, por perda de objeto, nesse particular.
Danos morais
Com relação ao pedido de indenização por danos morais, não merece reforma a sentença recorrida, porque não demonstrado abalo psíquico ou humilhação. Ao contrário, o prejuízo havido pelo segurado é de natureza patrimonial, estando recomposto pela decisão que ora reconhece os intervalos como de labor especial e defere os efeitos financeiros desde a DER. Nesse sentido:
ADMINISTRATIVO, CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. ALEGAÇÃO DE ERRO, POR PARTE DE SEGURADA DO INSS, NO SISTEMA DE DADOS DA AUTARQUIA, RESULTANDO EM INDEFERIMENTO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO POSTULADO. INEXISTÊNCIA DE ILÍCITO CIVIL A AMPARAR A PRETENSÃO DE DANO MORAL. PRECEDESTES DESTE TRF.1. A jurisprudência desta Corte tem decidido, em diversos precedentes, não se poder alçar qualquer abalo, seja a discordância do pretendido pela pessoa, ainda que posteriormente seja reconhecido o direito em ação judicial, à condição de dano moral, mormente em se tratando de indeferimento de pedido em sede administrativa, não se olvidando, ainda, que todos os atos administrativos estão adstritos ao princípio da legalidade (art. 37 da CF/88).2. Ainda que no caso possa ter havido algum equívoco por parte da autarquia ao confundir a apelante com segurada homônima, tal não é suficiente para ensejar a caracterização do dano moral, não se podendo elevar as frustrações da demandante à categoria de dano passível de reparação civil.3. Não houve, na hipótese, dano anormal, mas mero dissabor inerente à complexidade da vida social e das relações que se firmam entre a Administração Pública e o administrado, especialmente quando se trata de aplicação de lei e análise de documentação na esfera administrativa, cujo rigor e cautela decorrem, como referido, dos princípios que regem tal atividade. Outrossim, eventual incorreção no procedimento do INSS pode ser enquadrada como ato administrativo passível de correção pelos meios legais cabíveis, tanto junto à própria Administração quanto perante o Judiciário, não havendo, porém, ilícito civil a amparar a pretensão indenizatória.4. Apelo provido somente para o fim de determinar a retificação dos dados da requerente nos registros do INSS, porém desprovido no tocante ao pedido de indenização. (TRF 4ª - 3ª Seção - AC n. 2007.72.05.003676-3/SC - Rel. Des. Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz - D.E. 12/08/2009).
Desprovido o recurso, no ponto.
Conclusão quanto ao direito da parte autora no caso concreto
Dessarte, o exame do conjunto probatório demonstra que a parte autora possui incapacidade para o trabalho, de natureza definitiva, e sem possibilidade de reabilitação, devendo ser mantida a sentença.
Dos consectários
Correção Monetária e Juros
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.
Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O recente art. 491 do NCPC, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.
E no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo, especialmente se considerado que pende de julgamento no STF a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810).
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente definidos por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que seja diferida a solução definitiva para a fase de cumprimento do julgado, em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentado que "diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução. 4. Embargos de declaração rejeitados". (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014).
Na mesma linha vêm decidindo as duas turmas de Direito Administrativo desta Corte (2ª Seção), à unanimidade, (Ad exemplum: os processos 5005406-14.2014.404.7101, 3ª Turma, julgado em 01-06-2016 e 5052050-61.2013.404.7000, 4ª Turma, julgado em 25/05/2016)
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do novo Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a solução em definitivo acerca dos critérios de correção, ocasião em que, provavelmente, a questão já terá sido dirimida pelo tribunal superior, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
A fim de evitar novos recursos, inclusive na fase de cumprimento de sentença, e anteriormente à solução definitiva pelo STF sobre o tema, a alternativa é que o cumprimento do julgado se inicie, adotando-se os índices da Lei 11.960/2009, inclusive para fins de expedição de precatório ou RPV pelo valor incontroverso, diferindo-se para momento posterior ao julgamento pelo STF a decisão do juízo sobre a existência de diferenças remanescentes, a serem requisitadas, acaso outro índice venha a ter sua aplicação legitimada.
Os juros de mora, incidentes desde a citação, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Evita-se, assim, que o presente feito fique paralisado, submetido a infindáveis recursos, sobrestamentos, juízos de retratação, e até ações rescisórias, com comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional, apenas para solução de questão acessória.
Diante disso, difere-se para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009, restando prejudicado o recurso e/ou remessa necessária no ponto.
Honorários advocatícios
Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência".
Saliente-se, por oportuno, que não incide a sistemática dos honorários prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida antes de 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016), conforme prevê expressamente o artigo 14 do NCPC [A norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada].
Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS), isenções estas que não se aplicam quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que, no Estado de Santa Catarina (art. 33, par. único, da Lei Complementar estadual 156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
Conclusão
Mantém-se integralmente a sentença.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por não conhecer da remessa oficial e negar provimento às apelaçôes do INSS e da parte autora.
Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 27/06/2017
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5010054-28.2014.4.04.7104/RS
ORIGEM: RS 50100542820144047104
RELATOR | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
PRESIDENTE | : | Luiz Carlos Canalli |
PROCURADOR | : | Dr(a) |
APELANTE | : | CLARICE BERNARDETE JACOBS BRUGNERA |
ADVOGADO | : | ALEXANDRE LOURENZI |
: | MÁRCIO DA SILVA PANZENHAGEN | |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | OS MESMOS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 27/06/2017, na seqüência 139, disponibilizada no DE de 12/06/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
ADIADO O JULGAMENTO.
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 22/08/2017
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5010054-28.2014.4.04.7104/RS
ORIGEM: RS 50100542820144047104
RELATOR | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
PRESIDENTE | : | Luiz Carlos Canalli |
PROCURADOR | : | Dr. Alexandre Amaral Gavronski |
APELANTE | : | CLARICE BERNARDETE JACOBS BRUGNERA |
ADVOGADO | : | ALEXANDRE LOURENZI |
: | MÁRCIO DA SILVA PANZENHAGEN | |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | OS MESMOS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 22/08/2017, na seqüência 632, disponibilizada no DE de 08/08/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NÃO CONHECER DA REMESSA OFICIAL E NEGAR PROVIMENTO ÀS APELAÇÔES DO INSS E DA PARTE AUTORA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
: | Juiz Federal LUIZ CARLOS CANALLI | |
: | Juíza Federal GISELE LEMKE |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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