Apelação Cível Nº 5004080-74.2022.4.04.9999/PR
RELATORA: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: GUILHERME DAS NEVES FLORIANO
APELADO: VITORIA DAS NEVES FLORIANO
RELATÓRIO
Trata-se de ação de procedimento comum em que é postulada a concessão de auxílio-reclusão, em virtude da prisão do genitor dos autores no período de 30/09/2020 a 04/12/2020.
Processado o feito, sobreveio sentença, em que julgado procedente o pedido (evento 36):
Diante do exposto, e por tudo mais que consta dos autos, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial para:
a) condenar o réu ao pagamento das parcelas devidas a título de auxílio-reclusão durante a prisão: 30/09/2020 (data inicial do encarceramento) até a data final do encarceramento (04/12/2020), com juros e correção monetária;
A autarquia foi condenada ao pagamento das prestações vencidas, corrigidas monetariamente e com juros de mora, além de custas e despesas processuais e de honorários advocatícios de 10% do valor da condenação, sem menção a reexame necessário.
Em sede de embargos de declaração foi reformada a sentença no que tange à verba honorária, fixada em 10% sobre o valor da causa (evento 52).
O INSS apela, alegando que a renda do instituidor superou o limite legal e que é incabível a flexibilização do critério econômico, razão pela qual o feito deve ser julgado improcedente. Acrescenta que não foi comprovado o recolhimento à prisão em regime fechado no período em questão. Caso não seja este o entendimento, pede que a base de cálculo dos ônus sucumbenciais seja a condenação e não o valor da causa, estipulada em R$ 28.600,00, que não guarda relação com o montante discutido em juízo (evento 57).
Com contrarrazões (evento 70), vieram os autos a este Tribunal.
O Ministério Público Federal manifestou-se pelo desprovimento do recurso (evento 78).
É o relatório.
VOTO
MÉRITO
AUXÍLIO-RECLUSÃO
A concessão do auxílio-reclusão, benefício previsto no art. 80 da Lei 8.213/91, é regida pela lei vigente à época da prisão do instituidor e tem por requisitos desde 18/01/2019, conforme a redação dada pela Medida Provisória 871/2019, convertida na Lei 13.846/2019: a) recolhimento à prisão em regime fechado; b) comprovação da qualidade de segurado do preso; c) carência de 24 contribuições mensais; d) dependência econômica do requerente em relação ao recluso; d) baixa renda do instituidor; e f) que o segurado não esteja recebendo remuneração como empregado ou seja beneficiário de auxílio-doença, pensão por morte, salário-maternidade, aposentadoria ou abono de permanência em serviço.
Quanto à carência, na hipótese de perda da qualidade de segurado, o instituidor deverá contar a partir da nova filiação à Previdência Social com metade do período de carência previsto no inciso IV do art. 25 da Lei 8.213/91, ou seja, com um total de 12 contribuições, nos termos do art. 27-A da mencionada legislação.
Os §§ 3º e 4º do art. 80 da Lei 8.213/91 determinam como ocorre o enquadramento do segurado como de baixa renda:
§ 3º Para fins do disposto nesta Lei, considera-se segurado de baixa renda aquele que, no mês de competência de recolhimento à prisão, tenha renda, apurada nos termos do disposto no § 4º deste artigo, de valor igual ou inferior àquela prevista no art. 13 da Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998, corrigido pelos índices de reajuste aplicados aos benefícios do RGPS.
§ 4º A aferição da renda mensal bruta para enquadramento do segurado como de baixa renda ocorrerá pela média dos salários de contribuição apurados no período de 12 (doze) meses anteriores ao mês do recolhimento à prisão.
O referido limite legal é atualizado anualmente por portarias ministeriais:
- R$ 1.364,43 a partir de 01/01/2019 (Portaria ME nº 09/2019);
- R$ 1.425,56 a partir de 01/01/2020 (Portaria ME nº 914/2020);
- R$ 1.503,25 a partir de 01/01/2021 (Portaria SEPRT/ME nº 477/2021).
Importa consignar que o § 5º do art. 116 do Decreto n. 3.048/99, com a redação dada pelo Decreto 10.410, de 2020, estabelece ser devido o auxílio-reclusão apenas durante o período em que o segurado estiver recolhido à prisão sob regime fechado, sendo que o exercício de atividade remunerada após a prisão do segurado em regime fechado não acarreta a perda do direito ao recebimento do auxílio-reclusão pelos dependentes (§ 6º do art. 116)
A manutenção do benefício deverá respeitar o limite etário dos autores (dependentes dos genitores para fins de auxílio-reclusão até os 21 anos de idade, desde que não emancipados) e a permanência do instituidor em regime fechado.
A data de início do benefício, segundo disposto no art. 74 da Lei 8.213/91, deverá recair na data da prisão, se o pedido administrativo for protocolado em até 180 dias após a reclusão, para os filhos menores de 16 anos, ou em até 90 dias após o recolhimento a estabelecimento prisional para os demais dependentes. Caso o requerimento seja formulado após os prazos acima referidos, o termo inicial será na data do pedido.
CASO CONCRETO
A parte autora requer a concessão de auxílio-reclusão em decorrência da prisão preventiva do pai, que perdurou de 30/09/2020 a 04/12/2020, conforme documentos colacionados (evento 1, OUT6-7).
O pedido administrativo, protocolado em 03/11/2020, foi indeferido, sob o argumento de que ultrapassado o limite legal (evento 1, OUT9).
A presente ação foi ajuizada em 17/05/2021.
QUALIDADE DE DEPENDENTE
A dependência econômica do cônjuge, companheiro(a) e filho menor de 21 anos ou inválido é presumida, conforme o art. 16, I, § 4º, da Lei 8.213/91.
In casu, os autores são filhos menores do recluso: Guilherme e Vitória são gêmeos, nascidos em 21/04/2009, com 11 anos na data do encarceramento (certidões nascimento, evento 1, CERTNASC3-4).
QUALIDADE DE SEGURADO E CARÊNCIA
Na data da prisão, o instituidor estava empregado, vínculo iniciado 01/12/2018, na função de operador de retroescavadeira na empresa Iaro Marques DIB-ME, segundo dados da CTPS e do CNIS (eventos 1, OUT8 e 12, OUT2).
Tendo em vista que o recluso teve vários contratos trabalhistas desde 01/2005, observa-se que resta preenchido o requisito carência - recolhimento de 24 contribuições previdenciárias.
BAIXA RENDA
Segundo acima referido, a aferição do critério baixa renda ocorre com base na média dos salários de contribuição apurados no período de 12 (doze) meses anteriores ao mês do recolhimento à prisão, in casu, entre setembro de 2019 e agosto de 2020, visto que a prisão ocorreu em 30/09/2020.
À época, o limite legal para enquadramento no quesito baixa renda era de R$ 1.425,56.
Analisando-se o extrato do CNIS, verifica-se que o instituidor percebia salário bruto mensal de R$ 2.415,00, variando o valor no período apenas em 12/2019 (R$ 3.220,00) e em 02/2020 (R$ 2.254,00).
Logo, a média de remuneração percebida pelo instituidor nos últimos 12 meses prévios ao encarceramento totalizou R$ 2.468,66.
A relativização do critério econômico é admitida diante da necessidade de proteção social, sobretudo quando a lide envolve absolutamente incapaz, desde que o limite não seja significativamente ultrapassado, consoante os precedentes abaixo colacionados:
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-RECLUSÃO. REQUISITOS. LEGISLAÇÃO VIGENTE À ÉPOCA DO ENCARCERAMENTO. UNIÃO ESTÁVEL. RENDA DO SEGURADO. FLEXIBILIZAÇÃO DO CRITÉRIO ECONÔMICO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS. TUTELA ESPECÍFICA. 1. A concessão de auxílio-reclusão rege-se pela legislação vigente à época do encarceramento, a qual, no caso, previa que o benefício era devido aos dependentes do segurado recolhido à prisão que não recebesse remuneração da empresa, nem estivesse em gozo de auxílio-doença, aposentadoria por invalidez ou de abono de permanência em serviço, e tivesse renda bruta mensal igual ou inferior ao limite legal estipulado. 2. Demonstrada a existência de união estável, presume-se a dependência econômica, nos termos do artigo 16, I e § 4º, da Lei nº 8.213/1991. 3. Hipótese em que viável a flexibilização do critério previsto para a baixa renda, pois o limite estabelecido pela norma que rege a matéria não foi significativamente extrapolado. 4. Preenchidos, cumulativamente, os requisitos necessários à obtenção de auxílio-reclusão, tem a parte autora direito à concessão do benefício. 5. Honorários advocatícios majorados em razão do comando inserto no § 11 do artigo 85 do CPC. 6. Reconhecido o direito da parte, impõe-se a determinação para a imediata implantação do benefício, nos termos do artigo 497 do CPC. (TRF4, AC 5020794-46.2021.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, juntado aos autos em 10/02/2022)
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-RECLUSÃO. CRITÉRIO ECONÔMICO. BAIXA RENDA. FLEXIBILIZAÇÃO. POSSIBILIDADE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO. 1. O auxílio-reclusão é benefício destinado aos dependentes do segurado recluso, cujos requisitos para concessão são: a) recolhimento à prisão em regime fechado; b) comprovação da qualidade de segurado do preso; c) carência de 24 contribuições mensais; d) dependência do requerente em relação ao recluso; d) baixa renda do instituidor; e f) que o segurado não esteja recebendo remuneração como empregado ou seja beneficiário de auxílio-doença, pensão por morte, salário-maternidade, aposentadoria ou abono de permanência em serviço. 2. Hipótese em que viável a flexibilização do critério econômico, em face da necessária proteção social da dependente, absolutamente incapaz, e pelo fato de que o limite de renda estabelecido pela norma legal não foi significativamente ultrapassado. 3. Majorados de 10% para 15% os honorários advocatícios fixados na sentença ante o desprovimento do recurso do INSS. (TRF4, AC 5022120-75.2020.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relatora GISELE LEMKE, juntado aos autos em 29/09/2021)
Entretanto, no caso vertente, o limite foi superado em R$ 1.043,00, pouco mais de 70% acima do parâmetro estipulado pela legislação, de forma que não há que falar em relativização do critério renda.
Assim, é de ser provido o recurso do INSS para julgar improcedente o pedido.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Invertida a sucumbência, condeno a parte autora ao pagamento dos honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da causa atualizado, restando suspensa a exigibilidade da verba, em razão da gratuidade da justiça.
PREQUESTIONAMENTO
Objetivando possibilitar o acesso das partes às instâncias superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto.
CONCLUSÃO
Apelo do INSS provido para julgar improcedente o pedido.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação do INSS, nos termos da fundamentação.
Documento eletrônico assinado por CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, Desembargadora Federal Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003161770v7 e do código CRC 46963c2c.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI
Data e Hora: 28/4/2022, às 14:33:24
Conferência de autenticidade emitida em 06/05/2022 04:01:08.
Apelação Cível Nº 5004080-74.2022.4.04.9999/PR
RELATORA: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: GUILHERME DAS NEVES FLORIANO
APELADO: VITORIA DAS NEVES FLORIANO
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-RECLUSÃO. BAIXA RENDA. flexibilização. impossibilidade. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
1. O auxílio-reclusão é benefício destinado aos dependentes do segurado recluso, cujos requisitos para concessão são: a) recolhimento à prisão em regime fechado; b) comprovação da qualidade de segurado do preso; c) carência de 24 contribuições mensais; d) dependência do requerente em relação ao recluso; e) baixa renda do instituidor; e f) que o segurado não esteja recebendo remuneração como empregado ou seja beneficiário de auxílio-doença, pensão por morte, salário-maternidade, aposentadoria ou abono de permanência em serviço.
2. A dependência econômica do cônjuge, companheiro(a) e filho menor de 21 anos ou inválido é presumida, conforme o art. 16, I, § 4º, da Lei 8.213/91.
3. Hipótese em que inviável a flexibilização do critério econômico, uma vez que o limite legal foi ultrapassado em montante significativo. Improcedência do pedido.
4. Condenada a parte autora ao pagamento dos honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da causa atualizado, restando suspensa a exigibilidade da verba, em razão da gratuidade da justiça.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação do INSS, nos termos da fundamentação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 26 de abril de 2022.
Documento eletrônico assinado por CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, Desembargadora Federal Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003161771v4 e do código CRC c9a8c706.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI
Data e Hora: 28/4/2022, às 14:33:24
Conferência de autenticidade emitida em 06/05/2022 04:01:08.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 18/04/2022 A 26/04/2022
Apelação Cível Nº 5004080-74.2022.4.04.9999/PR
RELATORA: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
PRESIDENTE: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
PROCURADOR(A): MAURICIO GOTARDO GERUM
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: GUILHERME DAS NEVES FLORIANO
ADVOGADO: CELIO APARECIDO RIBEIRO (OAB PR055937)
ADVOGADO: FERNANDA NASCIMENTO E SILVA DE ABREU (OAB SP291860)
ADVOGADO: JOSLEIDE SCHEIDT DO VALLE (OAB PR055936)
APELADO: VITORIA DAS NEVES FLORIANO
ADVOGADO: CELIO APARECIDO RIBEIRO (OAB PR055937)
ADVOGADO: FERNANDA NASCIMENTO E SILVA DE ABREU (OAB SP291860)
ADVOGADO: JOSLEIDE SCHEIDT DO VALLE (OAB PR055936)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 18/04/2022, às 00:00, a 26/04/2022, às 16:00, na sequência 377, disponibilizada no DE de 04/04/2022.
Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
Votante: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
SUZANA ROESSING
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 06/05/2022 04:01:08.