Apelação Cível Nº 5009844-12.2020.4.04.9999/PR
RELATORA: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELANTE: RAFAEL FERNANDES GREGORIO
APELANTE: INGRIDY MARYA FERNANDES GREGORIO
APELANTE: EMILLY FERNANDES GREGORIO
APELANTE: EMANUELI FERNANDES GREGÓRIO
APELANTE: SOFIA FERNANDES GREGÓRIO
APELADO: OS MESMOS
RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária em face do INSS em que os autores requerem a concessão de auxílio-reclusão, em virtude da prisão do pai, em 15/08/2018.
A sentença, proferida em 10/02/2020, julgou procedente o pedido, para conceder o auxílio-reclusão desde a data do encarceramento (08/2018), no valor de um salário mínimo. A autarquia foi condenada ao pagamento das prestações vencidas, corrigidas monetariamente pelo INPC e com juros de mora, além de custas processuais e de honorários advocatícios de 10% do valor da condenação. O magistrado de origem não fez referência a reexame necessário (evento 71).
Não há notícia nos autos sobre a implantação do benefício.
O INSS apelou, sustentando que não restou comprovada a baixa renda, pois em agosto de 2018, mês da prisão, o instituidor laborou apenas um dia e recebeu R$ 485,53, valor superior ao limite legal para enquadramento no quesito baixa renda. Alude que o próprio recluso pediu a rescisão do vínculo empregatício e que, caso prevaleça o entendimento constante da sentença, todo segurado, ciente de que será preso, poderá pedir a rescisão do vínculo empregatício para garantir o direito dos dependentes ao benefício. Pede a reforma da sentença, para que julgado improcedente o pedido. Se mantido o decisum, requer que a implantação e pagamento do benefício sejam condicionados à apresentação de certidão carcerária atualizada, comprovando o período de reclusão (evento 99).
A parte autora também apelou, aduzindo que o valor de um salário mínimo definido pelo magistrado como RMI do benefício está em desacordo com os arts. 80, 75, 44 e 29, II, da Lei 8.213/91, os quais estabelecem que o valor mensal do auxílio-reclusão devido à parte autora será de 100% do valor da aposentadoria a que o segurado teria direito se estivesse aposentado por invalidez na data da prisão, cujo salário de benefício é calculado pela média aritmética simples dos maiores salários de contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo. Requer que o cálculo da RMI siga o disposto no art. 29, II, da Lei de Benefícios (evento 112).
O Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento de ambos os recursos (evento 128).
Sem contrarrazões, os autos vieram para julgamento.
É o relatório.
VOTO
AUXÍLIO-RECLUSÃO
O benefício de auxílio-reclusão é regido pela lei vigente na data da prisão, sendo devido nas mesmas condições da pensão por morte, nos termos do art. 80 da Lei 8.213/1991 (redação vigente até 17/01/2019, quando editada a MP 871, de 18/01/2019, convertida na Lei 13.846, em 18/06/2019):
Art. 80. O auxílio-reclusão será devido, nas mesmas condições da pensão por morte, aos dependentes do segurado recolhido à prisão, que não receber remuneração da empresa nem estiver em gozo de auxílio-doença, de aposentadoria ou de abono de permanência em serviço.
Parágrafo único. O requerimento do auxílio-reclusão deverá ser instruído com certidão do efetivo recolhimento à prisão, sendo obrigatória, para a manutenção do benefício, a apresentação de declaração de permanência na condição de presidiário.
A Emenda Constitucional n. 20, de 15/12/1998, estabeleceu restrição adicional à concessão do benefício, ao prever no inciso IV do art. 201 da Constituição a concessão somente aos dependentes dos segurados de baixa renda.
O art. 13 da referida EC dispunha que até que a lei discipline o acesso ao salário-família e auxílio-reclusão para os servidores, segurados e seus dependentes, esses benefícios serão concedidos apenas àqueles que tenham renda bruta mensal igual ou inferior a R$ 360,00 (trezentos e sessenta reais), que, até a publicação da lei, serão corrigidos pelos mesmos índices aplicados aos benefícios do regime geral de previdência social. O limite de renda supra referido é reajustado anualmente por portarias do Ministério da Economia/Fazenda.
Com base nesses preceitos, a concessão do benefício pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: a) recolhimento à prisão do instituidor; b) dependência econômica do requerente em relação ao recluso; c) condição de segurado ao tempo do recolhimento à prisão; d) o segurado não pode estar recebendo remuneração como empregado ou ser beneficiário de auxílio-doença, aposentadoria ou de abono de permanência em serviço; e e) enquadramento do instituidor como segurado de baixa renda.
Importa consignar que o art. 116, § 5º, do Decreto n. 3.048/99, estabelece ser devido o auxílio-reclusão apenas durante o período em que o segurado estiver recolhido à prisão sob regime fechado ou semiaberto (regra que perdurou até 30/06/2020, véspera da publicação do Decreto 10.410/2020).
CASO CONCRETO
A parte autora requer a concessão de auxílio-reclusão em decorrência da prisão do pai, Rogério Mattos Gregório, em 15/08/2018, conforme certidão de efetivo recolhimento colacionada (evento 1, OUT22).
O pedido administrativo, protocolado em 02/10/2018, foi indeferido, sob o argumento de que o salário de contribuição superava o limite legal (evento 1, OUT21).
A presente ação foi ajuizada em 08/07/2019.
No curso do processo, foi acostado atestado carcerário, informando que Rogério esteve preso de 15/08/2018 a 03/01/2019 em regime fechado e de 03/01/2019 a 24/04/2019 em regime semiaberto (evento 89, CERT2).
Extrato do CNIS indica que o instituidor voltou a laborar formalmente em 22/11/2019 (evento 75, OUT3).
Dessa forma, a concessão do auxílio-reclusão em comento limita-se ao período de 15/08/2018 a 24/04/2019.
Não houve discussão sobre a qualidade de dependentes dos autores, todos eles filhos menores do instituidor ao tempo do encarceramento (e da DER): Emily, nascida em 07/06/2003, com 15 anos na data da prisão; Rafael (de 14/02/2008), com 10 anos; Ingridy (de 06/06/2009), com 9 anos; Sofia (de 26/11/2013), com 4 anos; e Emanueli (de 20/05/2016), com dois anos de idade (evento 1, OUT14 e CERTNASC15-18).
A qualidade de segurado também não foi questionada, porquanto o instituidor teve um último vínculo empregatício de 09/05/2018 a 01/08/2018 (evento 11, OUT2, p. 14), encerrado duas semanas antes da prisão.
A controvérsia reside no preenchimento do requisito baixa renda.
BAIXA RENDA
Para aferição do enquadramento no conceito de segurado de baixa renda de que trata o inc. IV do art. 201 da Constituição, vige o preceito do art. 13 da EC 20/1998, conforme supra referido, sendo que o limite legal é atualizando anualmente por Portarias do Ministério da Economia/Fazenda.
Na data do recolhimento à prisão do instituidor, a legislação indicava o limite de R$ 1.319,18 (Portaria 15, de 16/01/2018).
Entretanto, no caso de segurado desempregado ao tempo do encarceramento, o Superior Tribunal de Justiça, em julgamento pela sistemática dos recursos repetitivos (Tema 896), firmou a seguinte tese após ulterior revisão (publicada em 01/07/2021):
Para a concessão de auxílio-reclusão (art. 80 da Lei 8.213/1991) no regime anterior à vigência da MP 871/2019, o critério de aferição de renda do segurado que não exerce atividade laboral remunerada no momento do recolhimento à prisão é a ausência de renda, e não o último salário de contribuição.
Tal entendimento tem aplicação às prisões efetuadas antes de 18/01/2019, data em que passou a vigorar a Medida Provisória 871/2019.
In casu, a prisão foi levada a efeito em 15/08/2018, previamente à edição da Medida Provisória, e o segurado encontrava-se desempregado desde 01/08/2018.
Logo, na data do recolhimento a estabelecimento prisional, ele não dispunha de remuneração, tampouco estava em gozo de auxílio-doença, de aposentadoria ou de abono de permanência em serviço.
Registre-se que argumento do INSS, de que o instituidor teria se afastado do último emprego intencionalmente para assegurar a concessão do benefício aos dependentes, não se mostra crível. Outrossim, a remuneração acertada no contrato de trabalho era vinculada à produção, com garantia do piso mínimo de R$ 1.084,00 por mês, conforme anotação na CTPS (evento 1, OUT11, p. 3), valor básico inferior ao limite legal então vigente em 2018, de R$ 1.319,18.
Portanto, comprovada a baixa renda e atendidos as demais requisitos, os autores fazem jus ao auxílio-reclusão desde a data da prisão (15/08/2018), conforme constou da sentença.
Tendo em vista que noticiada nos autos a soltura do instituidor em 24/04/2019 (evento 89, CERT2), este deve ser o termo final do benefício, merecendo acolhida a apelação do INSS no ponto.
Provido parcialmente o recurso do INSS para determinar o pagamento das parcelas do auxílio-reclusão aos demandantes entre a data da prisão (15/08/2018) e a soltura do instituidor (24/04/2019).
RENDA MENSAL INICIAL
A parte autora se insurge contra a fixação da renda mensal inicial do benefício em um salário mínimo, sob a alegação que o cálculo deve seguir o mesmo da pensão por morte, em conformidade com os arts. 80, 75, 44 e 29, II da Lei 8.213/91.
Tenho que o recurso merece guarida.
O art. 80 da Lei de Benefícios dispõe que o auxílio-reclusão será devido nas mesmas condições da pensão por morte.
Já o art. 75 estabelece que "o valor mensal da pensão por morte será de 100% do valor da aposentadoria que o segurado recebia ou daquela a que teria direito se estivesse aposentado por invalidez na data do seu falecimento". Portanto, aplica-se, ao auxílio-reclusão a regra prevista no art. 75 para fins de fixação da renda mensal do benefício.
No caso concreto, como o recluso não recebia aposentadoria, o valor do auxílio-reclusão deverá equivaler a 100% do valor da aposentadoria por invalidez a que teria direito na época da prisão, a qual, por sua vez, deverá ser calculada conforme o disposto no art. 29, inciso II, da Lei de Benefícios, combinado com o art. 3º da Lei 9.876/99, ou seja, com base na média aritmética simples dos maiores salários de contribuição, correspondentes a, no mínimo, oitenta por cento de todo o período contributivo decorrido desde a competência julho de 1994 (TRF4, AC 5010761-65.2019.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 31/07/2019)
Logo, provido o recurso dos autores.
CONSECTÁRIOS DA SUCUMBÊNCIA
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Parcialmente provido o recurso da autarquia, não cabe majoração da verba honorária na instância recursal.
PREQUESTIONAMENTO
Restam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pelas partes.
CONCLUSÃO
Apelação da parte autora provida.
Apelação do INSS parcialmente provida.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação da parte autora e parcial provimento à apelação do INSS.
Documento eletrônico assinado por CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, Desembargadora Federal Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002702379v12 e do código CRC bd86c8d7.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5009844-12.2020.4.04.9999/PR
RELATORA: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELANTE: RAFAEL FERNANDES GREGORIO
APELANTE: INGRIDY MARYA FERNANDES GREGORIO
APELANTE: EMILLY FERNANDES GREGORIO
APELANTE: EMANUELI FERNANDES GREGÓRIO
APELANTE: SOFIA FERNANDES GREGÓRIO
APELADO: OS MESMOS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-RECLUSÃO. desemprego. BAIXA RENDA. COMPROVAÇÃO. renda mensal inicial.
1. O auxílio-reclusão é benefício destinado aos dependentes do segurado, cujos requisitos para concessão são: recolhimento do segurado a estabelecimento prisional; qualidade de segurado na data da prisão; não percepção, pelo instituidor, de remuneração empregatícia ou de benefícios de auxílio-doença, aposentadoria ou abono permanência; baixa renda do recluso na data da prisão; e qualidade de dependente do autor.
2. Hipótese em que o instituidor do benefício estava desempregado ao tempo da prisão, não dispondo de remuneração. Enquadramento como segurado de baixa renda, nos termos do Tema nº 896 do STJ, julgado pela sistemática dos recursos repetivos.
3. RMI do auxílio-reclusão calculada nos mesmos moldes da pensão por morte, equivalendo a 100% da aposentadoria que o segurado recebia ou daquela a que teria direito se estivesse aposentado por invalidez na data da prisão - arts. 80 e 75 da Lei de Benefícios.
4. In casu, como o instituidor não recebia aposentadoria, a RMI do auxílio-reclusão deverá equivaler a 100% do valor da aposentadoria por invalidez a que teria direito na época da prisão, cujo cálculo tem por base a média aritmética simples dos maiores salários de contribuição, correspondentes a, no mínimo, oitenta por cento de todo o período contributivo decorrido desde a competência de julho de 1994. Inteligência do art. 29, II da Lei 8.213/91 c/c o art. 3º da Lei 9.876/99.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora e parcial provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 17 de agosto de 2021.
Documento eletrônico assinado por CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, Desembargadora Federal Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002702380v7 e do código CRC 869ab4bd.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 09/08/2021 A 17/08/2021
Apelação Cível Nº 5009844-12.2020.4.04.9999/PR
RELATORA: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
PRESIDENTE: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
PROCURADOR(A): SERGIO CRUZ ARENHART
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELANTE: RAFAEL FERNANDES GREGORIO
ADVOGADO: MARCELE POLYANA PAIO (OAB PR043350)
ADVOGADO: ANTONIO CARLOS LOURO DE MATOS (OAB PR047870)
APELANTE: INGRIDY MARYA FERNANDES GREGORIO
ADVOGADO: MARCELE POLYANA PAIO (OAB PR043350)
ADVOGADO: ANTONIO CARLOS LOURO DE MATOS (OAB PR047870)
APELANTE: EMILLY FERNANDES GREGORIO
ADVOGADO: ANTONIO CARLOS LOURO DE MATOS (OAB PR047870)
ADVOGADO: MARCELE POLYANA PAIO (OAB PR043350)
APELANTE: EMANUELI FERNANDES GREGÓRIO
ADVOGADO: MARCELE POLYANA PAIO (OAB PR043350)
ADVOGADO: ANTONIO CARLOS LOURO DE MATOS (OAB PR047870)
APELANTE: SOFIA FERNANDES GREGÓRIO
ADVOGADO: MARCELE POLYANA PAIO (OAB PR043350)
ADVOGADO: ANTONIO CARLOS LOURO DE MATOS (OAB PR047870)
APELADO: OS MESMOS
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 09/08/2021, às 00:00, a 17/08/2021, às 16:00, na sequência 201, disponibilizada no DE de 29/07/2021.
Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
Votante: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
SUZANA ROESSING
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 26/08/2021 04:01:10.