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Apelação Cível Nº 5020841-20.2021.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
APELANTE: BIANCA MAYARA DE MATOS MARIANO
APELANTE: PEDRO HENRIQUE MARIANO SALVADOR
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Bianca Mayara de Matos Mariano, por si e representando seu filho Pedro Henrique Mariano Salvador, ajuizou ação de procedimento comum em face do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, objetivando a concessão de auxílio-reclusão, em virtude da prisão de seu companheiro/pai, Fernando Rafael Salvador, a contar de 16/06/2015, data do requerimento administrativo.
Ao proferir a sentença, em 19/06/2021, o magistrado a quo julgou improcedente o pedido, condenando a parte autora ao pagamento de custas e honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor da causa, cuja exigibilidade fica suspensa em face da concessão de gratuidade da justiça.
Inconformada, a parte autora interpôs recurso de apelação, sustentando preencher todos os requisitos para a concessão do benefício.
Oportunizadas contrarrazões, vieram os autos a esta Corte, onde o Ministério Público Federal ofertou parecer opinando pelo desprovimento do recurso.
É o relatório.
VOTO
AUXÍLIO-RECLUSÃO
A concessão de auxílio-reclusão, benefício previsto no artigo 80 da Lei nº 8.213/91, rege-se pela legislação vigente à época do encarceramento e depende do preenchimento dos seguintes requisitos: (a) efetivo recolhimento à prisão; (b) demonstração da qualidade de segurado do preso; (c) condição de dependente de quem objetiva o benefício; (d) renda bruta mensal do segurado igual ou inferior ao limite legal e, a partir da edição da Medida Provisória nº 871/19, (e) cumprimento da carência de 24 contribuições mensais.
Este é o teor do artigo 80 da Lei de Benefícios, na atual redação conferida pela Lei nº 13.846/19:
Art. 80. O auxílio-reclusão, cumprida a carência prevista no inciso IV do caput do art. 25 desta Lei, será devido, nas condições da pensão por morte, aos dependentes do segurado de baixa renda recolhido à prisão em regime fechado que não receber remuneração da empresa nem estiver em gozo de auxílio-doença, de pensão por morte, de salário-maternidade, de aposentadoria ou de abono de permanência em serviço.
(...)
§ 3º Para fins do disposto nesta Lei, considera-se segurado de baixa renda aquele que, no mês de competência de recolhimento à prisão, tenha renda, apurada nos termos do disposto no § 4º deste artigo, de valor igual ou inferior àquela prevista no art. 13 da Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998, corrigido pelos índices de reajuste aplicados aos benefícios do RGPS.
§ 4º A aferição da renda mensal bruta para enquadramento do segurado como de baixa renda ocorrerá pela média dos salários de contribuição apurados no período de 12 (doze) meses anteriores ao mês do recolhimento à prisão.
(...)
Por sua vez, o artigo 13 da EC nº 20/98 estabelece o seguinte:
Art. 13 - Até que a lei discipline o acesso ao salário-família e auxílio-reclusão para os servidores, segurados e seus dependentes, esses benefícios serão concedidos apenas àqueles que tenham renda bruta mensal igual ou inferior a R$ 360,00 (trezentos e sessenta reais), que, até a publicação da lei, serão corrigidos pelos mesmos índices aplicados aos benefícios do regime geral de previdência social.
O limite de renda acima referido vem sendo reajustado anualmente por Portarias do Ministério da Economia/Fazenda.
CASO CONCRETO
Alega a parte autora preencher todos os requisitos para a concessão do benefício de auxílio-reclusão, em virtude da prisão de Fernando Rafael Salvador, ocorrida em 14/04/2015 (Evento 13, OUT14, p. 19).
A condição de dependente do autor Pedro Henrique Mariano Salvador, nascido em 15/05/2014, é presumida por força do disposto no artigo 16, inciso I e § 4º, da Lei nº 8.213/91.
Já em relação à autora Bianca Mayara de Matos Mariano, a dependência econômica, caso comprovada a existência de união estável, também é presumida, consoante as disposições contidas nesse mesmo artigo.
A jurisprudência desta Corte é pacífica no sentido de o período de convivência não ser o fator determinante para o reconhecimento da união estável, mas sim a vida em comum, de forma pública e contínua, com o intuito de constituir família.
Na hipótese em apreço, foram juntados os seguintes documentos:
- certidão de nascimento de filho em comum, o também autor Pedro Henrique Mariano Salvador, nascido em 15/05/2014 (Evento 13, OUT13, p. 19);
- escritura pública de declaração de união estável, lavrada em 06/01/2014 (Evento 13, OUT13, p. 4).
A fim de complementar o início de prova material, foram ouvidas três testemunhas, cujos depoimentos foram unânimes e congruentes no sentido de o casal ter convivido em união estável, de forma pública, contínua e duradoura, até a prisão de Fernando, em 14/04/2015.
Nesse contexto, exclusivamente para fins previdenciários, entendo demonstrada a existência de união estável e, portanto, a condição de dependente da autora Bianca Mayara de Matos Mariano, à luz do disposto no artigo 16, inciso I, da Lei nº 8.213/1991.
Quanto à manutenção da qualidade de segurado do instituidor do benefício, os documentos colacionados aos autos revelam que Fernando manteve vínculo empregatício até 16/08/2013 (Evento 13, OUT14, p. 14). Somando-se a esta última data os 12 meses previstos no inciso II do artigo 15 da Lei nº 8.213/91, c/c artigo 14 do Regulamento da Previdência Social - Decreto nº 3.048/99, Fernando manteria sua qualidade de segurado até 15/10/2014.
Contudo, a ausência de novos registros no Cadastro Nacional de Informações Sociais ou na Carteira de Trabalho permite concluir que Fernando passou à condição de desempregado, porque, assim como o recolhimento de contribuições gera a presunção de exercício de atividade laborativa, a ausência deste denota o inverso, fazendo jus, portanto, à prorrogação do período de graça prevista no artigo 15, § 2º, da Lei nº 8.213/91.
Tal circunstância, aliás, é corroborada pelo protocolo de atendimento junto à Agência do Trabalhador – SINE/PR, com cadastro de busca de emprego em 10/06/2014 (Evento 14, OUT3, p. 2).
Além disso, as testemunhas ouvidas em juízo foram convincentes ao declarar que Fernando estava desempregado no período que antecedeu sua prisão.
Sublinhe-se que a situação de desemprego, que autoriza a prorrogação do período de graça, pode ser comprovada por qualquer meio idôneo, e não apenas pelo registro em órgão do Ministério do Trabalho e Emprego, pois, no âmbito judicial, o sistema de tarifação legal de provas não se sobrepõe ao livre convencimento motivado do juiz.
Com relação à renda auferida pelo segurado instituidor do benefício, o contexto probatório, como já visto, indica que Fernando, após o término de seu último vínculo laboral, em 16/08/2013, passou à condição de desempregado, situação que perdurou até seu encarceramento, em 14/04/2015.
Conforme a tese firmada pela Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp nº 1.485.417/MS, submetido ao rito dos recursos repetitivos (Tema 896), e revisada no julgamento do REsp nº 1.842.985/PR, para fins de concessão de auxílio-reclusão no regime anterior à vigência da MP nº 871/2019, “o critério de aferição de renda do segurado que não exerce atividade laboral remunerada no momento do recolhimento à prisão é a ausência de renda, e não o último salário de contribuição”.
Logo, se Fernando estava desempregado no momento de sua prisão, mostra-se irrelevante o fato de o último salário percebido ser superior ao teto fixado na Portaria MPS/MF nº 15/2013, pois o critério a ser observado é a ausência de renda.
Nesse contexto, entendo preenchidos os requisitos necessários à concessão de auxílio-reclusão em vista do encarceramento ocorrido em 14/04/2015.
Contudo, quanto à continuidade do recebimento do benefício, cabem algumas ponderações.
O exame dos autos revela que Fernando Rafael Salvador empreendeu fuga em 29/11/2015 (Evento 13, OUT14, p. 19), sendo recapturado somente em 23/02/2017 (Evento 1, OUT7, p. 3).
O artigo 117, § 2º, do Decreto nº 3.048/99 é expresso no sentido de que, em caso de fuga, “o benefício será suspenso e, se houver recaptura do segurado, será restabelecido a contar da data em que esta ocorrer, desde que esteja ainda mantida a qualidade de segurado”.
Por sua vez, quanto ao período de graça, a legislação previdenciária traz prazo específico para o segurado recolhido à prisão. Eis o teor do artigo 15 da Lei nº 8.213/91 no ponto que interessa:
Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
(...)
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;
Logo, nos termos do artigo 15, IV, da Lei nº 8.213/91 c/c artigo 14 do Decreto nº 3.048/99, Fernando, após a data da fuga, em 29/11/2015, manteve sua qualidade de segurado somente até 15/01/2017.
Depreende-se, assim, que, na data recaptura, em 23/02/2017, Fernando já havia perdido sua qualidade de segurado.
Merece, pois, reforma a sentença, a fim de ser conferido à parte autora o direito à percepção de auxílio-reclusão no período de 16/06/2015 (DER – conforme pedido inicial) a 29/11/2015 (fuga).
CONSECTÁRIOS LEGAIS
Os consectários legais devem ser fixados nos termos que constam do Manual de Cálculos da Justiça Federal e, a partir da vigência da Lei nº 11.960/09, que alterou a redação do artigo 1º-F da Lei nº 9.494/97, nos termos das teses firmadas pelo Supremo Tribunal Federal no Tema 810 (RE 870.947) e pelo Superior Tribunal de Justiça no Tema 905 (REsp 1.492.221/PR).
CONSECTÁRIOS DA SUCUMBÊNCIA
Reformada a sentença de improcedência, inverto os ônus sucumbenciais e condeno o INSS ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre as parcelas vencidas.
O INSS é isento do pagamento de custas processuais quando demandado no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96). Contudo, essa isenção não se aplica quando se tratar de demanda ajuizada perante a Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4).
PREQUESTIONAMENTO
Restam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pelas partes.
CONCLUSÃO
Apelação da parte autora parcialmente provida, para lhe conceder o benefício de auxílio-reclusão no período de 16/06/2015 a 29/11/2015.
Invertidos os ônus sucumbenciais.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação.
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Apelação Cível Nº 5020841-20.2021.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
APELANTE: BIANCA MAYARA DE MATOS MARIANO
APELANTE: PEDRO HENRIQUE MARIANO SALVADOR
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-RECLUSÃO. REQUISITOS. LEGISLAÇÃO VIGENTE À ÉPOCA DO ENCARCERAMENTO. UNIÃO ESTÁVEL. QUALIDADE DE SEGURADO. DESEMPREGO. PRORROGAÇÃO DO PERÍODO DE GRAÇA. BAIXA RENDA. FUGA. CONSECTÁRIOS LEGAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
1. A concessão de auxílio-reclusão rege-se pela legislação vigente à época do encarceramento, a qual, no caso, previa que o benefício era devido aos dependentes do segurado recolhido à prisão que não recebesse remuneração da empresa, nem estivesse em gozo de auxílio-doença, aposentadoria por invalidez ou de abono de permanência em serviço, e tivesse renda bruta mensal igual ou inferior ao limite legal estipulado.
2. Demonstrada a existência de união estável, presume-se a dependência econômica, nos termos do artigo 16, I e § 4º, da Lei nº 8.213/1991.
3. A situação de desemprego, que autoriza a prorrogação do período de graça, pode ser comprovada por qualquer meio idôneo, e não apenas pelo registro em órgão do Ministério do Trabalho e Emprego, pois, no âmbito judicial, o sistema de tarifação legal de provas não se sobrepõe ao livre convencimento motivado do juiz.
4. Conforme a tese firmada pela Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp nº 1.485.417/MS, submetido ao rito dos recursos repetitivos (Tema 896), e revisada no julgamento do REsp nº 1.842.985/PR, para fins de concessão de auxílio-reclusão no regime anterior à vigência da MP nº 871/2019, “o critério de aferição de renda do segurado que não exerce atividade laboral remunerada no momento do recolhimento à prisão é a ausência de renda, e não o último salário de contribuição”.
5. Preenchidos, cumulativamente, os requisitos necessários à obtenção de auxílio-reclusão, tem a parte autora direito à concessão do benefício.
6. À luz do artigo 117, § 2º, do Decreto nº 3.048/99, o registro de fuga implica a perda da qualidade de segurado nas hipóteses em que ocorrer a recaptura após transcorrido o prazo previsto no artigo 15, inciso IV, da Lei nº 8.213/91.
7. Consectários legais fixados nos termos das teses firmadas pelo STF (Tema 810) e pelo STJ (Tema 905).
8. Invertidos os ônus sucumbenciais, impõe-se a condenação do INSS ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre as parcelas vencidas.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 08 de março de 2022.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 25/02/2022 A 08/03/2022
Apelação Cível Nº 5020841-20.2021.4.04.9999/PR
RELATOR: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
PRESIDENTE: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
APELANTE: BIANCA MAYARA DE MATOS MARIANO
ADVOGADO: SIMONE HANSEN ALVES GROSSI (OAB PR036900)
ADVOGADO: ANDREIA APARECIDA AGUILAR DE SOUZA (OAB PR033265)
APELANTE: PEDRO HENRIQUE MARIANO SALVADOR
ADVOGADO: SIMONE HANSEN ALVES GROSSI (OAB PR036900)
ADVOGADO: ANDREIA APARECIDA AGUILAR DE SOUZA (OAB PR033265)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 25/02/2022, às 00:00, a 08/03/2022, às 16:00, na sequência 9, disponibilizada no DE de 16/02/2022.
Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO
Votante: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI
Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA
SUZANA ROESSING
Secretária
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