APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5055699-19.2017.4.04.9999/RS
RELATOR | : | GISELE LEMKE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | MANOEL ERNI GARCIA COUTO |
ADVOGADO | : | JUAREZ MACHADO DE FARIAS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. AVERBAÇÃO DO TRABALHO RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. não COMPROVAÇÃO DE REQUISITOS. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO - revogação do benefício. inversão dos ônus sucumbenciais. AJG.
1. Somente é possível averbar o tempo de serviço rural laborado em regime de economia familiar quando provado o exercício da atividade por meios documentais e testemunhais.
2. Não reconhecido o labor rural pleiteado, revoga-se a apsoentadoria concedida.
3. Invertidos os ônus sucumbenciais, que restam com exigibilidade das verbas suspensa em razão da AJG concedida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, não conhecer da remessa necessária e dar provimento ao apelo do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 20 de fevereiro de 2018.
Juíza Federal Gisele Lemke
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Juíza Federal Gisele Lemke, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9257154v5 e, se solicitado, do código CRC 6F3A1AAC. | |
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5055699-19.2017.4.04.9999/RS
RELATORA | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | MANOEL ERNI GARCIA COUTO |
ADVOGADO | : | JUAREZ MACHADO DE FARIAS |
RELATÓRIO
Trata-se de ação pelo rito ordinário proposta por MANOEL ERNI GARCIA COUTO (59 anos) contra o INSS, postulando a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição mediante o cômputo de período de atividade rural em regime de economia familiar entre 20/01/1970 e 22/06/1984.
A sentença (prolatada em 26/06/2017) julgou procedente o pedido de reconhecimento do tempo de labor rural pretendido, condenando o INSS a conceder à parte demandante a aposentadoria por tempo de contribuição a contar da DER (20/11/2014). Condenado foi o INSS, também, a arcar com honorários advocatícios fixados em R$500,00 (quinhentos reais).
Apela a autarquia insurgindo-se contra o provimento sentencial, alegando que não há prova suficiente do labor rural reconhecido em sentença, pretendendo seja julgado improcedente o pedido inicial.
Com as contrarrazões ao recurso, subiram os autos ao Tribunal.
É o relatório.
VOTO
REEXAME NECESSÁRIO
Não se desconhece a orientação da Súmula 490 do Superior Tribunal de Justiça (A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas). No entanto, considerando que o valor do benefício não será superior a R$ 5.531,31 (Portaria n.º 08/2017, dos Ministérios da Previdência Social e da Fazenda), mesmo que a RMI do benefício seja fixada no teto e que sejam pagas as parcelas referentes aos últimos cinco anos com juros e correção monetária, o valor da condenação não excederá a quantia de mil salários mínimos, montante exigível para a admissibilidade do reexame necessário.
Vale destacar que a sentença não pode ser propriamente considerada ilíquida, pois contém ou refere todos os elementos necessários para se apurar, mediante cálculo aritmético de baixa complexidade, o valor final da condenação.
Portanto, não conheço da remessa oficial, nos termos do artigo 496, § 3º, inciso I, do CPC de 2015.
MÉRITO
DO PEDIDO DE AVERBAÇÃO DE TEMPO RURAL
O tempo de trabalho rural deve ser demonstrado com, pelo menos, um início de prova material contemporânea ao período a ser comprovado, complementada por prova testemunhal idônea. Não é admitida a prova exclusivamente testemunhal, a teor do § 3º do art. 55 da Lei 8.213/1991, preceito jurisprudencialmente ratificado pelo STJ na Súmula 149 e no julgamento do REsp nº 1.321.493/PR (STJ, 1ª Seção, rel. Herman Benjamin, j. 10/10/2012, em regime de "recursos repetitivos" do art. 543-C do CPC1973). Embora o art. 106 da Lei 8.213/1991 relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo (STJ, Quinta Turma, REsp 612.222/PB, rel. Laurita Vaz, j. 28/04/2004, DJ 07/06/2004, p. 277).
Não se exige, por outro lado, prova documental contínua da atividade rural, ou em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, mas início de prova material (notas fiscais, talonário de produtor, comprovantes de pagamento do ITR ou prova de titularidade de imóvel rural, certidões de casamento, de nascimento, de óbito, certificado de dispensa de serviço militar, quaisquer registros em cadastros diversos) que, juntamente com a prova oral, possibilite um juízo de valor seguro acerca dos fatos que se pretende comprovar:
[...] considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ [...]
(STJ, Primeira Seção, REsp 1321493/PR, rel. Herman Benjamin, j. 10out.2012, DJe 19/12/2012)
Quanto à questão da contemporaneidade da prova documental com o período relevante para apuração de carência, já decidiu esta Corte: A contemporaneidade entre a prova documental e o período de labor rural equivalente à carência não é exigência legal, de forma que podem ser aceitos documentos que não correspondam precisamente ao intervalo necessário a comprovar. Precedentes do STJ (TRF4, Sexta Turma, REOAC 0017943-66.2014.404.9999, rel. João Batista Pinto Silveira, D.E. 14/08/2015).
Os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando dos pais ou cônjuge, consubstanciam início de prova material do trabalho rural, já que o §1º do art. 11 da Lei de Benefícios define como sendo regime de economia familiar o exercido pelos membros da família "em condições de mútua dependência e colaboração". Via de regra, os atos negociais são formalizados em nome do pater familias, que representa o grupo familiar perante terceiros, função esta, exercida em geral entre os trabalhadores rurais, pelo genitor ou cônjuge masculino. Nesse sentido, a propósito, preceitua a Súmula 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental", e já consolidado na jurisprudência do STJ: "A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido da admissibilidade de documentos em nome de terceiros como início de prova material para comprovação da atividade rural" (STJ, Quinta Turma, REsp 501.009/SC, rel. Arnaldo Esteves Lima, j. 20/11/2006, DJ 11/12/2006, p. 407).
Importante, ainda, ressaltar que o fato de um dos membros da família exercer atividade outra que não a rural também não descaracteriza automaticamente a condição de segurado especial de quem postula o benefício. A hipótese fática do inc. VII do art. 11 da Lei 8.213/1991, que utiliza o conceito de economia familiar, somente será descaracterizada se comprovado que a remuneração proveniente do trabalho urbano do membro da família dedicado a outra atividade que não a rural seja tal que dispense a renda do trabalho rural dos demais para a subsistência do grupo familiar:
PREVIDENCIÁRIO. EMBARGOS INFRINGENTES. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. SEGURADA ESPECIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. O exercício de atividade urbana por um dos componentes do grupo familiar não afasta, por si só, a qualidade de segurado especial dos demais membros, se estes permanecem desenvolvendo atividade rural, em regime de economia familiar. Para a descaracterização daquele regime, é necessário que o trabalho urbano importe em remuneração de tal monta que dispense o labor rural dos demais para o sustento do grupo. Precedentes do STJ.
(TRF4, Terceira Seção, EINF 5009250-46.2012.404.7002, rel. Rogerio Favreto, juntado aos autos em 12/02/2015)
O INSS alega com frequência que os depoimentos e informações tomados na via administrativa apontam para a ausência de atividade rural no período de carência. As conclusões adotadas pelo INSS no âmbito administrativo devem ser corroboradas pela prova produzida em Juízo. Em conflito as provas colhidas na via administrativa e em as tomadas em juízo, deve-se ficar com estas últimas, pois produzidas com as cautelas legais, garantindo-se o contraditório: "A prova judicial, produzida com maior rigorismo, perante a autoridade judicial e os advogados das partes, de forma imparcial, prevalece sobre a justificação administrativa" (TRF4, Quinta Turma, APELREEX 0024057-21.2014.404.9999, Rel. Taís Schilling Ferraz, D.E. 25/06/2015). Dispondo de elementos que impeçam a pretensão da parte autora, cabe ao INSS produzir em Juízo a prova adequada, cumprindo o ônus processual descrito no inc. II do art. 373 do CPC2015 (inc. II do art. 333 do CPC1973).
Caso concreto quanto ao tempo rural
A sentença reconheceu ao demandante o direito à averbação do tempo rural trabalhado de 20/01/1970 a 21/06/1984, tendo o INSS alegado não haver prova suficiente do labor rural.
Em prova do exercício de atividade rural em juízo, foram ouvidas testemunhas, que confirmaram a alegação do autor de exercício de atividades rurais em regime de economia familiar no período pleiteado.
No entanto, o processo foi instruído com apenas alguns documentos, sendo importante registrar que somente um destes configuraria subsídio válido para a formação do início de prova material, qual seja, o atestado de que frequentou escola em área considerada rural entre 1971 e 1972, quando tinha 13/14 anos aproximadamente.
Não obstante haja grande flexibilidade no acatamento do início de prova material, em razão da reconhecida dificuldade dos segurados na obtenção da documentação, deve-se respeitar uma exigência mínima de comprovação, em respeito à lei, ao Direito e aos cofres da Previdência Social. Tal exigência mínima não restou cumprida no presente caso, sendo manifestamente insuficiente o início de prova material válido, valendo notar que não se trata de reconhecimento de tempo rural para aposentadoria rural por idade na condição de boia fria, mas de pretensão de reconhecimento de tempo rural para a aposentadoria urbana por tempo de contribuição, o que exige um início de prova material mais robusto, não sendo possível o reconhecimento de 14 anos de tempo de serviço rural tão somente com base na comprovação de que o autor teria estudado em escola rural durante 2 anos.
As demais certidões e documentos apresentados pelo autor não possuem relação direta com seu histórico laboral, não fazendo presumir, de qualquer forma, o labor campesino precoce, como quer o autor.
Portanto, os documentos apresentados não constituem início razoável de prova material no período relevante neste processo, não se podendo averbar o período requerido apenas com base em prova testemunhal (§ 3º do art. 55 da Lei 8.213/1991, ratificado pelo STJ na Súmula 149 e no julgamento do REsp nº 1.321.493/PR em regime de "recursos repetitivos" do art. 543-C do CPC1973).
Merece reforma a sentença no ponto, o que acarreta, consequentemente, a revogação da aposentadoria por tempo de contribuição concedida pelo juízo originário.
Verbas sucumbenciais
Invertidos os ônus sucumbenciais, condeno a parte autora a pagar ao INSS honorários advocatícios de 10% sobre o valor atualizado da causa, nos termos do art. 85, §§ 3º e 4º, III, do CPC2015, bem como a arcar com as custas processuais, restando a exigibilidade das verbas suspensa em razão da AJG concedida (Evento 3.5).
CONCLUSÃO
Não conhecida a remessa necessária e dado provimento ao apelo do INSS, para julgar improcedente o pedido. Invertidos os ônus sucumbenciais, suspensa a execução dos honorários em razão da AJG.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por não conhecer da remessa necessária e dar provimento ao apelo do INSS.
Juíza Federal Gisele Lemke
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 20/02/2018
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5055699-19.2017.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00010585720168210118
RELATOR | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
PRESIDENTE | : | Luiz Carlos Canalli |
PROCURADOR | : | Dr. Jorge Luiz Gasparini da Silva |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | MANOEL ERNI GARCIA COUTO |
ADVOGADO | : | JUAREZ MACHADO DE FARIAS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 20/02/2018, na seqüência 500, disponibilizada no DE de 09/01/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NÃO CONHECER DA REMESSA NECESSÁRIA E DAR PROVIMENTO AO APELO DO INSS.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
VOTANTE(S) | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
: | Des. Federal LUIZ CARLOS CANALLI | |
: | Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
| Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9322935v1 e, se solicitado, do código CRC 4206B056. | |
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