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PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. VULNERABILIDADE SOCIAL COMPROVADA. TRF4. 5003646-04.2022.4.04.7213...

Data da publicação: 03/07/2024, 11:01:37

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. VULNERABILIDADE SOCIAL COMPROVADA. 1. O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: a) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, de acordo com a redação original do art. 20 da LOAS, ou impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, conforme redação atual do referido dispositivo) ou idoso (neste caso, considerando-se, desde 1º de janeiro de 2004, a idade de 65 anos); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família. 2. No que diz respeito ao requisito econômico, seria paradoxal que o Judiciário, apesar de ter reconhecido a inconstitucionalidade do critério econômico de acessibilidade ao BPC (renda familiar per capita igual ou inferior a ¼ do salário mínimo), enquanto aqui se discute a renda mínima de cidadania universalizada (Projeto de Lei 4856/19), a exemplo de outros países e estados, como Itália, Quênia, Finlândia, Barcelona, Canadá (Ontário), Califórnia (Stockton), Escócia, Holanda, Reino Unido, Índia e outros, que já colocaram em funcionamento ou estão preparando programas-piloto de renda básica universalizada, para enfrentar o grave problema das desigualdades econômicas decorrentes do modelo capitalista, persista medindo com régua milimétrica a insuficiência de recursos familiares das pessoas que, além de estarem em situação de vulnerabilidade, sofrem com as barreiras naturais e as que a sociedade lhes impõe, em razão da idade avançada ou da deficiência. Não foi em vão que o Tribunal da Cidadania, em precedente prolatado no REsp nº 1.112.557/MG, pela 3ª Seção, sendo Relator o Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, publicado em 20/11/09, processado como representativo de controvérsia, nos termos do art. 543-C, do CPC, assentou a relativa validade do critério legal, tornando vinculante a necessidade de exame mais compreensivo para a análise judicial da hipossuficiência econômica. 3. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar, em 18-04-2013, a Reclamação nº 4374 e o Recurso Extraordinário nº 567985, este com repercussão geral, reconheceu e declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da Lei 8.742/93 (LOAS), por considerar que o critério ali previsto - ser a renda familiar mensal per capita inferior a um quarto do salário mínimo - está defasado para caracterizar a situação de vulnerabilidade, razão pela está consolidada a jurisprudência deste Tribunal. 4. O Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário 580.963/PR, realizado em 17-04-2013, declarou, outrossim, a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03), o qual estabelece que o benefício assistencial já concedido a qualquer idoso membro da família "não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS", baseado nos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da isonomia, bem como no caráter de essencialidade de que se revestem os benefícios de valor mínimo, tanto previdenciários quanto assistenciais, concedidos a pessoas idosas e também àquelas com deficiência. Segundo o STF, portanto, não se justifica que, para fins do cálculo da renda familiar per capita, haja previsão de exclusão apenas do valor referente ao recebimento de benefício assistencial por membro idoso da família, quando verbas de outra natureza (benefício previdenciário), bem como outros beneficiários de tais verbas (membro da família portador de deficiência), também deveriam ser contemplados. Portanto, no cálculo da renda familiar per capita, deve ser excluído o valor auferido por idoso com 65 anos ou mais a título de benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima. 5. Hipótese em que o conjunto probatório juntado aos autos comprova a situação de vulnerabilidade social da parte autora, restando necessária a reforma da sentença para que seja restabelecido o benefício conforme postulado. (TRF4, AC 5003646-04.2022.4.04.7213, NONA TURMA, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 25/06/2024)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5003646-04.2022.4.04.7213/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

APELANTE: MARISTELA DE SOUZA (Civilmente Incapaz - Art. 110, 8.213/91) (AUTOR)

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

REPRESENTANTE LEGAL DO APELADO: TEREZINHA DA COSTA SOUZA (Cônjuge, pai, mãe, tutor, curador ou herdeiro necessário) (AUTOR)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Cuida-se de recursos de apelação interpostos por MARISTELA DE SOUZA e pelo INSTITUTO NACIONAL DE SEGURO SOCIAL - INSS em face da sentença publicada em 11-09-2023 que julgou parcialmente procedente demanda de restabelecimento de benefício assistencial nestes termos (e.43.1).

O INSS sustenta, em síntese, que a parte autora recebeu o benefício de forma indevida, necessitando, portanto, fazer a restituição dos valores auferidos (e.51.1).

A autora, por sua vez, sustenta, em síntese, que preenche os requisitos necessários ao restabelecimento do benefício assistencial desde a cessação, em 31-05-2022 (e.58.1).

Com as contrarrazões (60.1 e 62.1), subiram os autos a esta Corte para julgamento.

A Procuradoria Regional da República da 4ª Região opinou pelo desprovimento do recurso do INSS e pelo provimento do recurso da parte autora (e.5.1).

É o relatório.

VOTO

A controvérsia recursal cinge à comprovação da vulnerabilidade social da parte autora.

Destaca-se, a propósito, o seguinte excerto da sentença (e.43.1).

"No presente caso, observo que, em 01/06/2022, a parte autora teve administrativamente cessado seu benefício assistencial NB 87/128.097.482-3, decisão que foi fundamentada no não enquadramento no § 3° do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, uma vez que a renda per capita do grupo familiar seria superior a ¼ (um quarto) do salário mínimo (evento 1, PROCADM24, Página 70).

Para esclarecer a questão, foi realizada diligência, cujo laudo foi anexado aos autos (evento 34, LAUDO_SOC_ECON1), onde consta que a autora reside com seus pais idosos e um irmão maior inválido.

No que tange à renda familiar, auferem o valor aproximado de R$ 4.200,00, proveniente de benefícios de aposentadoria por incapacidade recebido pelo irmão (R$ 1.600,00), e de aposentadoria por idade titulados pela mãe de 62 anos e pelo pai de 67 anos, ambos com valor de um salário mínimo.

Consigno que, ao contrário do que sustenta a parte autora, apenas o benefício recebido por seu pai encerra a hipótese prevista no artigo 20, § 14, da LOAS, razão pela qual somente este deve ser desconsiderado, para fins de cálculo dos rendimentos familiares.

Desta forma, a renda per capita é superior a ¼ do salário-mínimo. Não obstante, considerando que a renda familiar não é o único elemento a ser apreciado para a aferição das condições socioeconômicas da parte requerente, faz-se necessária a análise do restante da prova.

Observo que a família reside em casa própria, construção mista com predominância de madeira, composta por três quartos, sala, cozinha e banheiro; situada em zona rural e em bom estado de conservação, segurança, conforto e higiene.

Pelas fotos anexadas, depreende-se que a casa está equipada com móveis simples, e eletrodomésticos em bom estado de conservação, como: fogão a gás, geladeira, forno elétrico, chuveiro elétrico e freezer.

Foram declarados os seguintes gastos: água (R$ 30,00), energia elétrica (R$ 360,00), alimentação (R$ 1.600,00), gás de cozinha e medicamentos. Os pais da autora declararam, na mesma oportunidade, que outra filha maior reside na vizinhança e utiliza a garagem da casa para guarda de seu automóvel (GM Celta).

Desta forma, a renda per capita não é inferior a ¼ do salário-mínimo tampouco foram demonstrados - ou mesmo informados - gastos que a pudessem comprometer desproporcionalmente, em relação às necessidades básicas da família da parte.

Inclusive, o fato de possuírem um automóvel indica a existência de margem no orçamento doméstico para gastos com combustível, manutenção, licenciamento, seguro obrigatório e tributos, os quais são evidentemente prescindíveis à subsistência.

As fotografias anexadas ao laudo produzido no processo evidenciam situação de conforto superior à experimentada por aqueles que não possuem outros meios para sobreviver de forma digna que lançar mão do auxílio da Assistência Social.

Por oportuno, saliento que o benefício pretendido não pode se constituir em complementação de renda do núcleo familiar, uma vez que é devido somente àquelas pessoas que se encontram à margem da sociedade, sem ter outros meios a se valer para preservar a sua dignidade.

Ainda constou no laudo que os pais da parte autora afirmaram que dependem dos filhos, mas que estes possuem suas próprias despesas.

Inclusive, os filhos cumprem com seu dever legal e moral de amparar os genitores, conforme previsto no artigo 229 da Constituição Federal: "os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade".

[...]

Logo, não foi atendido o requisito da miserabilidade, nos termos fundamentados alhures, pelo que a parte autora não faz jus ao benefício assistencial de prestação continuada, o que não a impede de, futuramente, se alteradas as condições fáticas, pleitear o mesmo benefício."

Pois bem.

Conforme observado pela Procuradoria Regional da República da 4ª Região, o valor auferido a título de benefício previdenciário de até um salário mínimo não deve ser computados no cálculo da renda per capita do núcleo familiar da parte autora (e.5.1):

"Com relação ao preenchimento do requisito econômico, a postulante aduz que as parcelas percebidas pelos genitores, a título de benefício previdenciário no valor de um salário mínimo cada, não devem compor o cálculo da renda per capita.

De fato, há expressa previsão legal nesse sentido. O artigo 20, §14 da Lei nº 8.742/93 prevê que o benefício recebido por pessoa idosa ou pessoa com deficiência, até o valor de um salário-mínimo, não deve ser computado no cálculo da renda familiar:

Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.(Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)

[...]

§ 14. O benefício de prestação continuada ou o benefício previdenciário no valor de até 1 (um) salário-mínimo concedido a idoso acima de 65 (sessenta e cinco) anos de idade ou pessoa com deficiência não será computado, para fins de concessão do benefício de prestação continuada a outro idoso ou pessoa com deficiência da mesma família, no cálculo da renda a que se refere o § 3º deste artigo. (Incluído pela Lei nº 13.982, de 2020)

[...]

Portanto, deve-se retirar do cálculo os valores percebidos pelo pai e irmão maior inválido da autora, restando o valor de apenas um salário mínimo (da genitora) a ser dividido pelas 2 (duas) pessoas da família de Maristela, o que demonstra a necessidade de reforma da sentença. Confira-se:  MÃE: R$ 1.320,00 ÷ 2 = R$ 660,00  DESPESAS: R$ 1.990,00 + 116,08 = R$ 2.106,00".

Outrossim, em laudo social, foi verificado que as despesas fíxas do núcleo familiar da parte autora chegam a aproximadamente R$ 1.990,00, sem contar as medicações e os gastos com transporte e vestuário. Ainda, no referido laudo, foi verificado pela assistente social que a família encontra-se em situação de vulnerabilidade social (e.34.1):

"As despesas fixas, giram em torno das básicas como água R$30,00; luz R$360,00; 01 botijão de gás a cada três meses e alimentação R$1600,00. Em relação a medicação, entende-se que a família possui diversos gastos, tem alguns que eles conseguem através do Programa Federal Farmácia Popular, outros precisam comprar. Sem contar os gastos com transporte, vestuário e algum outro esporádico.

[...]

Diante do observado, entende-se que a família se encontra em vulnerabilidade social [...]"

Dessarte, consoante o conjunto probatório juntado aos autos que comprova a situação de vulnerabilidade social da parte autora, resta necessária a reforma da sentença para que seja restabelecido o benefício conforme postulado.

No que diz respeito ao requisito econômico, seria paradoxal que o Judiciário, apesar de ter reconhecido a inconstitucionalidade do critério econômico de acessibilidade ao BPC (renda familiar per capita igual ou inferior a ¼ do salário mínimo), enquanto aqui se discute a renda mínima de cidadania universalizada (Projeto de Lei 4856/19), a exemplo de outros países e estados, como Itália, Quênia, Finlândia, Barcelona, Canadá (Ontário), Califórnia (Stockton), Escócia, Holanda, Reino Unido, Índia e outros, que já colocaram em funcionamento ou estão preparando programas-piloto de renda básica universalizada, para enfrentar o grave problema das desigualdades econômicas decorrentes do modelo capitalista, persista medindo com régua milimétrica a insuficiência de recursos familiares das pessoas que, além de estarem em situação de vulnerabilidade, sofrem com as barreiras naturais e as que a sociedade lhes impõe, em razão da idade avançada ou da deficiência.

Não foi em vão que o Tribunal da Cidadania, em precedente prolatado no REsp nº 1.112.557/MG, pela 3ª Seção, sendo Relator o Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, publicado em 20/11/09, processado como representativo de controvérsia, nos termos do art. 543-C, do CPC, assentou a relativa validade do critério legal, tornando vinculante a necessidade de exame mais compreensivo para a análise judicial da hipossuficiência econômica:

“RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA, QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.

1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.

2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.

3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).

4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana, especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente a o cidadão social e economicamente vulnerável.

5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo.

6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.

7. Recurso Especial provido (REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009).

Com efeito, no que diz respeito ao requisito econômico, cabe ressaltar o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar, em 18-04-2013, a Reclamação nº 4374 e o Recurso Extraordinário nº 567985, este com repercussão geral, reconheceu e declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da Lei 8.742/93 (LOAS), por considerar que o critério ali previsto - ser a renda familiar mensal per capita inferior a um quarto do salário mínimo - está defasado para caracterizar a situação de vulnerabilidade, razão pela está consolidada a jurisprudência deste Tribunal (v.g. AC 5001745-37.2018.4.04.7214, 9ª TURMA, de minha Relatoria, juntado aos autos em 13/12/2019; AC 5014437-21.2019.4.04.9999, 9ª TURMA, Relator Des. Federal CELSO KIPPER, juntado aos autos em 12/12/2019; AC 5018881-97.2019.4.04.9999, 10ª TURMA, Relator Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, juntado aos autos em 04/02/2020; AC 5025288-22.2019.4.04.9999, 10ª TURMA, Relator Des. Federal MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 07/02/2020; AC 5001203-69.2019.4.04.9999, 6ª TURMA, Relator Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 17/10/2019; AC 5005447-10.2017.4.04.7122, 5ª TURMA, Relator Des. Federal OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 26/08/2019).

Assim, forçoso reconhecer que as despesas com os cuidados necessários da parte autora (v.g. medicamentos, alimentação especial, fraldas descartáveis, tratamento médico, psicológico e fisioterápico) podem ser levadas em consideração na análise da condição de vulnerabilidade da família da parte demandante.

A propósito, a eventual percepção de recursos do Programa Bolsa Família, que, segundo consta no site do Ministério do Desenvolvimento Social e de Combate à Fome (http://www.mds.gov.br/bolsafamilia/), destina-se à "transferência direta de renda que beneficia famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza em todo o País" e "tem como foco de atuação os 16 milhões de brasileiros com renda familiar per capita inferior a R$ 70,00 mensais, e está baseado na garantia de renda, inclusão produtiva e no acesso aos serviços públicos", não só não impede a percepção do benefício assistencial do art. 203, V, da Constituição Federal, como constitui prova indiciária acima de qualquer dúvida razoável de que a unidade familiar se encontra em situação de grave risco social.

Registre-se, ainda, que o Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário 580.963/PR, realizado em 17-04-2013, declarou, outrossim, a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03), o qual estabelece que o benefício assistencial já concedido a qualquer idoso membro da família "não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS", baseado nos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da isonomia, bem como no caráter de essencialidade de que se revestem os benefícios de valor mínimo, tanto previdenciários quanto assistenciais, concedidos a pessoas idosas e também àquelas com deficiência. Segundo o STF, portanto, não se justifica que, para fins do cálculo da renda familiar per capita, haja previsão de exclusão apenas do valor referente ao recebimento de benefício assistencial por membro idoso da família, quando verbas de outra natureza (benefício previdenciário), bem como outros beneficiários de tais verbas (membro da família portador de deficiência), também deveriam ser contemplados.

Este TRF, aliás, já vinha julgando no sentido da desconsideração da interpretação restritiva do artigo 34, parágrafo único, do Estatuto do Idoso.

Assim, no cálculo da renda familiar per capita, deve ser excluído o valor auferido por idoso com 65 anos ou mais a título de benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima (EIAC nº 0006398-38.2010.404.9999/PR, julgado em 04-11-2010), ou de benefício previdenciário de valor superior ao mínimo, até o limite de um salário mínimo, bem como o valor auferido a título de benefício previdenciário por incapacidade ou assistencial em razão de deficiência, independentemente de idade (EIAC N.º 2004.04.01.017568-9/PR, Terceira Seção, julgado em 02-07-2009. Ressalto que tal pessoa, em decorrência da exclusão de sua renda, também não será considerada na composição familiar, para efeito do cálculo da renda per capita. Diante disso, sobreveio a Portaria nº1.282, de 22 de março de 2021, do NSS:

Art. 1º Estabelecer que não será computado para o cálculo da renda per capita familiar o benefício previdenciário de até um salário-mínimo ou o Benefício de Prestação Continuada (BPC/LOAS) concedido a idoso, acima de 65 (sessenta e cinco) anos de idade, ou a pessoa com deficiência, para a concessão do BPC/LOAS, diante do disposto no § 14 do art. 20 da Lei nº 8.742, 7 de dezembro de 1993, incluído pela Lei nº 13.982, de 2 de abril de 2020.

Dos consectários

Segundo o entendimento das Turmas previdenciárias do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, estes são os critérios aplicáveis aos consectários:

Correção monetária

Em relação aos benefícios assistenciais, devem ser observados os seguintes critérios de correção monetária, porquanto não afetados pela decisão do STJ no Tema 905:

- INPC (de 04/2006 a 29/06/2009, conforme o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, combinado com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91).

- IPCA-E (a partir de 30-06-2009, conforme decisão do STF na 2ª tese do Tema 810 (RE 870.947), j. 20/09/2017, ata de julgamento publicada no DJe n. 216, de 22-09-2017, com eficácia imediata nos processos pendentes, nos termos do artigo 1.035, § 11, do NCPC e acórdão publicado em 20-11-2017, cuja modulação foi rejeitada pela maioria do Plenário do STF por ocasião do julgamento dos embargos de declaração em 03-10-2017).

Juros moratórios

Os juros de mora incidirão à razão de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29/06/2009.

A partir de 30/06/2009, incidirão segundo os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme art. 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei 9.494/97, cuja constitucionalidade foi reconhecida pelo STF ao julgar a 1ª tese do Tema 810 da repercussão geral (RE 870.947), julgado em 20/09/2017, com ata de julgamento publicada no DJe n. 216, de 22/09/2017.

SELIC

A partir de dezembro de 2021, a variação da SELIC passa a ser adotada no cálculo da atualização monetária e dos juros de mora, nos termos do art. 3º da Emenda Constitucional nº 113/2021:

"Nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente."

Honorários advocatícios

Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do CPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do CPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).

Invertidos os ônus sucumbenciais, estabeleço a verba honorária em 10% (dez por cento) sobre as parcelas vencidas (Súmula 111 do STJ), considerando as variáveis previstas no artigo 85, § 2º, incisos I a IV do CPC.

Custas Processuais

O INSS é isento do pagamento de custas (art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96 e Lei Complementar Estadual nº 156/97, com a redação dada pelo art. 3º da LCE nº 729/2018).

Tutela específica - implantação do benefício

Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados nos artigos 497 e 536 do NCPC, quando dirigidos à Administração Pública, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo, determino o cumprimento do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora, especialmente diante do seu caráter alimentar e da necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.

TABELA PARA CUMPRIMENTO PELA CEAB
CUMPRIMENTORestabelecer Benefício
NB1280974823
ESPÉCIE
DIB
DIPPrimeiro dia do mês da decisão que determinou a implantação/restabelecimento do benefício
DCB01/06/2022
RMIA apurar
OBSERVAÇÕES

Dispositivo

Ante o exposto, voto por dar provimento ao apelo da aprte autora e negar provimento ao apelo do INSS, bem como restabelecer o benefício, via CEAB.



Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004467383v16 e do código CRC 066153c8.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
Data e Hora: 25/6/2024, às 9:9:24


5003646-04.2022.4.04.7213
40004467383.V16


Conferência de autenticidade emitida em 03/07/2024 08:01:36.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5003646-04.2022.4.04.7213/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

APELANTE: MARISTELA DE SOUZA (Civilmente Incapaz - Art. 110, 8.213/91) (AUTOR)

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

REPRESENTANTE LEGAL DO APELADO: TEREZINHA DA COSTA SOUZA (Cônjuge, pai, mãe, tutor, curador ou herdeiro necessário) (AUTOR)

APELADO: OS MESMOS

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL à pessoa com deficiência. vulnerabilidade social comprovada.

1. O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: a) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, de acordo com a redação original do art. 20 da LOAS, ou impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, conforme redação atual do referido dispositivo) ou idoso (neste caso, considerando-se, desde 1º de janeiro de 2004, a idade de 65 anos); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família.

2. No que diz respeito ao requisito econômico, seria paradoxal que o Judiciário, apesar de ter reconhecido a inconstitucionalidade do critério econômico de acessibilidade ao BPC (renda familiar per capita igual ou inferior a ¼ do salário mínimo), enquanto aqui se discute a renda mínima de cidadania universalizada (Projeto de Lei 4856/19), a exemplo de outros países e estados, como Itália, Quênia, Finlândia, Barcelona, Canadá (Ontário), Califórnia (Stockton), Escócia, Holanda, Reino Unido, Índia e outros, que já colocaram em funcionamento ou estão preparando programas-piloto de renda básica universalizada, para enfrentar o grave problema das desigualdades econômicas decorrentes do modelo capitalista, persista medindo com régua milimétrica a insuficiência de recursos familiares das pessoas que, além de estarem em situação de vulnerabilidade, sofrem com as barreiras naturais e as que a sociedade lhes impõe, em razão da idade avançada ou da deficiência. Não foi em vão que o Tribunal da Cidadania, em precedente prolatado no REsp nº 1.112.557/MG, pela 3ª Seção, sendo Relator o Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, publicado em 20/11/09, processado como representativo de controvérsia, nos termos do art. 543-C, do CPC, assentou a relativa validade do critério legal, tornando vinculante a necessidade de exame mais compreensivo para a análise judicial da hipossuficiência econômica.

3. O Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar, em 18-04-2013, a Reclamação nº 4374 e o Recurso Extraordinário nº 567985, este com repercussão geral, reconheceu e declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da Lei 8.742/93 (LOAS), por considerar que o critério ali previsto - ser a renda familiar mensal per capita inferior a um quarto do salário mínimo - está defasado para caracterizar a situação de vulnerabilidade, razão pela está consolidada a jurisprudência deste Tribunal.

4. O Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário 580.963/PR, realizado em 17-04-2013, declarou, outrossim, a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03), o qual estabelece que o benefício assistencial já concedido a qualquer idoso membro da família "não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS", baseado nos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da isonomia, bem como no caráter de essencialidade de que se revestem os benefícios de valor mínimo, tanto previdenciários quanto assistenciais, concedidos a pessoas idosas e também àquelas com deficiência. Segundo o STF, portanto, não se justifica que, para fins do cálculo da renda familiar per capita, haja previsão de exclusão apenas do valor referente ao recebimento de benefício assistencial por membro idoso da família, quando verbas de outra natureza (benefício previdenciário), bem como outros beneficiários de tais verbas (membro da família portador de deficiência), também deveriam ser contemplados. Portanto, no cálculo da renda familiar per capita, deve ser excluído o valor auferido por idoso com 65 anos ou mais a título de benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima.

5. Hipótese em que o conjunto probatório juntado aos autos comprova a situação de vulnerabilidade social da parte autora, restando necessária a reforma da sentença para que seja restabelecido o benefício conforme postulado.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 9ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento ao apelo da aprte autora e negar provimento ao apelo do INSS, bem como restabelecer o benefício, via CEAB, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 20 de junho de 2024.



Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004467384v3 e do código CRC d7464e60.Informações adicionais da assinatura:
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Conferência de autenticidade emitida em 03/07/2024 08:01:36.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 13/06/2024 A 20/06/2024

Apelação Cível Nº 5003646-04.2022.4.04.7213/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

PRESIDENTE: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

PROCURADOR(A): RODOLFO MARTINS KRIEGER

APELANTE: MARISTELA DE SOUZA (Civilmente Incapaz - Art. 110, 8.213/91) (AUTOR)

ADVOGADO(A): VALDEVINO EIFLER (OAB SC040688)

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

REPRESENTANTE LEGAL DO APELADO: TEREZINHA DA COSTA SOUZA (Cônjuge, pai, mãe, tutor, curador ou herdeiro necessário) (AUTOR)

APELADO: OS MESMOS

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 13/06/2024, às 00:00, a 20/06/2024, às 16:00, na sequência 592, disponibilizada no DE de 04/06/2024.

Certifico que a 9ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 9ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO AO APELO DA APRTE AUTORA E NEGAR PROVIMENTO AO APELO DO INSS, BEM COMO RESTABELECER O BENEFÍCIO, VIA CEAB.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER

Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

ALEXSANDRA FERNANDES DE MACEDO

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 03/07/2024 08:01:36.

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