APELAÇÃO CÍVEL Nº 5013156-39.2015.4.04.7002/PR
RELATOR | : | Des. Federal MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | WALDI ADI HANKE |
ADVOGADO | : | SANDRA FAGUNDES |
APELADO | : | OS MESMOS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL AO IDOSO. REQUISITOS. AUSÊNCIA DE SITUAÇÃO DE RISCO SOCIAL. REVISÃO ADMINISTRATIVA PARA VERIFICAÇÃO DA PERMANÊNCIA DAS CONDIÇÕES PESSOAIS. CABIMENTO. DESNECESSIDADE DE DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS. BOA-FÉ CONFIGURADA.
1.O direito ao benefício assistencial amparo ao idoso pressupõe opreenchimento dos seguintes requisitos: a) condição deidoso (neste caso, considerando-se, desde 1º de janeiro de2004, a idade de 65 anos); e b)situação de risco social (estadode miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação dedesamparo) da parte autora e de sua família.
2. Não cabe presunção absoluta de miserabilidade para fins de concessão de benefício assistencial se, consideradas as circunstâncias concretas de vida do grupo familiar, não se verifica situação de hipossuficiência e vulnerabilidade social, sendo, o bem estar e o sustento do idoso promovido pela família.
3. Ausentes os pressupostos, não cabe concessão do benefício assistencial.
4.A legislação específica (LOAS) prevê a revisão do ato concessório a cada dois anos para avaliação de sua continuidade, estabelecendo sua cessação quando superadas as condições que lhe deram origem.
5.Os valores pretéritos recebidos são de caráter alimentar. Sendo assim, caracterizada a boa-fé é indevida sua restituição.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Turma Regional suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e ao recurso adesivo da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Curitiba, 20 de junho de 2018.
Juiz Federal Convocado Oscar Valente Cardoso
Relator
Documento eletrônico assinado por Juiz Federal Convocado Oscar Valente Cardoso, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9385819v12 e, se solicitado, do código CRC AFD87B04. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5013156-39.2015.4.04.7002/PR
RELATOR | : | LUIZ ANTONIO BONAT |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | WALDI ADI HANKE |
ADVOGADO | : | SANDRA FAGUNDES |
APELADO | : | OS MESMOS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
RELATÓRIO
Trata-se de demanda na qual a parte autora busca o restabelecimento de benefício assistencial ao idoso (NB 132.991.954-5 - DER 16/03/04), com efeitos financeiros desde a sua cessação (em 01/12/14) e a declaração de inexigibilidade de restituição dos valores recebidos a este título.
A sentença proferida em 21/10/2016 (evento 29), julgou parcialmente procedente o pedido, reconhecendo a inexigibilidade da restituição dos valores recebidos, já que auferidos de boa-fé, mas não restabelecendo o benefício, porque não constatada a miserabilidade da parte autora.
O INSS apresentou recurso de apelação (evento 39), sustentando, em síntese, o cabimento de restituição de valores recebidos indevidamente, o que independe de erro administrativo, do caráter alimentar e de boa-fé, sob pena de enriquecimento sem causa. Requereu o provimento do recurso.
A parte autora apresentou recurso adesivo (evento 43), defendendo a reforma do decisum, com restabelecimento do benefício, porque preencheria o requisito de miserabilidade, uma vez que sobrevive com a ajuda financeira dos filhos, os quais pagam diarista, guarneceram sua residência com móveis e eletrodomésticos novos e, além disso, teriam ajudado na aquisição de um dos veículos de sua propriedade, estando, outro, à venda. Argumentou, ainda, que foram os filhos que efetuaram reforma do imóvel onde reside com a esposa, beneficiária de amparo social, cujo ganho não pode ser considerada para cálculo da renda per capita. Postulou o provimento do recurso.
Com contrarrazões de ambas as partes (eventos 42 e 46) e processado o recurso, subiram os autos a este Tribunal.
O MPF emitiu parecer pela manutenção do benefício (evento 5).
É o relatório.
Peço inclusão em pauta.
Juiz Federal Convocado Oscar Valente Cardoso
Relator
Documento eletrônico assinado por Juiz Federal Convocado Oscar Valente Cardoso, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9385817v19 e, se solicitado, do código CRC 36918BB2. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5013156-39.2015.4.04.7002/PR
RELATOR | : | LUIZ ANTONIO BONAT |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | WALDI ADI HANKE |
ADVOGADO | : | SANDRA FAGUNDES |
APELADO | : | OS MESMOS |
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VOTO
Benefício Assistencial
Trata-se de demanda previdenciária na qual a parte autora objetiva o restabelecimento de benefício assistencial previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal e regulamentado pelo artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pelas Leis nº 12.435, de 06-07-2011, e nº 12.470, de 31-08-2011, além da declaração de inexigibilidade de restituição dos valores já recebidos a este título.
O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: a) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, de acordo com a redação original do art. 20 da LOAS, ou impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, conforme redação atual do referido dispositivo) ou idoso (neste caso, considerando-se, desde 1º de janeiro de 2004, a idade de 65 anos); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família.
Saliente-se, por oportuno, que a incapacidade para a vida independente a que se refere a Lei nº 8.742/93, na redação original, deve ser interpretada de forma a garantir o benefício assistencial a uma maior gama possível de pessoas com deficiência, consoante pacífica jurisprudência do STJ (v.g.STJ, 5ª Turma, RESP 360.202/AL, Rel. Min. Gilson Dipp, DJU de 01-07-2002) e desta Corte (v.g. AC n. 2002.71.04.000395-5/RS, 6ª Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, DJU de 19-04-2006).
Desse modo, a incapacidade para a vida independente (a) não exige que a pessoa possua uma vida vegetativa ou seja incapaz de se locomover; (b) não significa incapacidade para as atividades básicas do ser humano, tais como alimentar-se, fazer a higiene pessoal e vestir-se sozinho; (c) não impõe a incapacidade de se expressar ou se comunicar; e (d) não pressupõe dependência total de terceiros.
No que diz respeito ao requisito econômico, cabe ressaltar que o Superior Tribunal de Justiça admitiu, em sede de Recurso Repetitivo, a possibilidade de demonstração da condição de miserabilidade por outros meios de prova, quando a renda per capita familiar for superior a ¼ do salário mínimo (REsp 1112557/MG, 3ª Seção, rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 20/11/2009). Posteriormente, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar, em 18-04-2013, a reclamação nº 4374 e o recurso extraordinário nº 567985, este com repercussão geral, reconheceu e declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da Lei 8.742/93 (LOAS), por considerar que o critério ali previsto - ser a renda familiar mensal per capita inferior a um quarto do salário mínimo - está defasado para caracterizar a situação de miserabilidade.
Assim, forçoso reconhecer que as despesas com os cuidados necessários da parte autora, especialmente medicamentos, alimentação especial, fraldas descartáveis, tratamento médico, psicológico e fisioterápico, podem ser levadas em consideração na análise da condição de miserabilidade da família da parte demandante.
Caso concreto
O INSS insurge-se contra a sentença de parcial procedência proferida em 1º grau, que determinou a cessação do benefício assistencial vigente até 01/12/14 (NB 132.991.954-5, DER 16/03/04) e declarou inexigível a restituição dos valores já recebidos. Defende que além da cessação do benefício, cabe repetição dos valores já recebidos pela parte autora, independentemente da boa-fé, do caráter alimentar da verba e do erro administrativo na concessão, sob pena de enriquecimento sem causa.
Já a parte autora, no recurso adesivo, argumenta que preenche o requisito da miserabilidade, motivo pelo qual deve ser restabelecido o benefício cancelado, com pagamento das parcelas desde a cessação, sendo inexigível a restituição dos valores já recebidos.
Cabe lembrar, por primeiro que, de modo geral no âmbito administrativo, a autotutela legitima o poder-dever do ente administrativo de rever e anular seus atos se eivados de vício.
Como bem sabido, o benefício assistencial possui caráter provisório. A legislação específica (LOAS), seguindo o citado princípio informador, prevê a revisão do ato concessório a cada dois anos para avaliação de sua continuidade, estabelecendo sua cessação quando superadas as condições que lhe deram origem.
Em se tratando de benefício assistencial ao idoso, é necessária a comprovação da idade, bem como, da impossibilidade de o próprio idoso ou sua família prover sua sobrevivência (artigo 20, caput e §3º, da Lei nº 8.742/1993).
Para o caso em exame, na data do requerimento administrativo, o apelado já contava com mais de 65 anos, considerando sua data de nascimento em 25/02/37. Preenchido, assim, o requisito etário. Resta então verificar se as condições socioeconômicas configuraram e/ou permanecem configurando hipossuficiência ensejadora da concessão ou restabelecimento do benefício pretendido.
Acerca da miserabilidade, o STF concluiu não estar o julgador adstrito aos critérios estabelecidos pelo artigo 20, da Lei 8.742/93, devendo, conforme salientado na sentença de primeira instância, a aferição desse requisito ser feita no caso concreto.
Depreende-se, da entrevista social (PROCADM1, evento21) que, à época da concessão administrativa do benefício assistencial, o grupo familiar da parte autora era composto por ele e sua esposa, com renda média de R$ 100,00, advinda de seu trabalho autônomo e que ainda contavam com auxílio financeiro eventual dos filhos.
Na revisão administrativa foi constatado que os integrantes do grupo familiar permaneciam os mesmos, no entanto, pesquisa efetivada no endereço da parte autora (PROCADM1, evento21), apurou padrão de vida diverso daquele informado na concessão: residência de alvenaria, espaçosa, de bom padrão, construída em terreno grande na região central da cidade, com churrasqueira, edícula, garagem com dois veículos de propriedade da parte autora, sendo 1 com inscrição comercial e, no mesmo terreno, outra casa em construção com alto padrão de materiais. Na ocasião, a própria parte autora teria afirmado que sempre exerceu atividade ligada ao turismo, pagando a obra com recursos próprios, o que teria sido confirmado por pedreiros que trabalhavam no local.
Cenário semelhante foi verificado na diligência determinada em juízo. O laudo social (evento 17) apontou a existência de dois imóveis no terreno, sendo um habitado pela parte autora e sua esposa, titular de benefício assistencial e o outro, pelo filho do casal, servidor público municipal. Segundo o documento, o casal declarou que reformou a residência depois que ambos receberam heranças e que sobrevive com auxílio dos filhos, os quais, inclusive, custeiam o salário da empregada da casa. Em resposta ao item 4 do laudo, consta a descrição da residência:
" A casa que o autor reside com sua esposa é de alvenaria composta por 03 quartos, sala, cozinha,banheiro, área de serviço, garagem e um jardim frontal. O material utilizado no interior da casa aparenta ser de primeira qualidade. A mobília também está em ótimo estado. Há rede de luz, água, esgoto e telefone. Também há aparelhos de ar condicionado, forno de microondas, fogão, geladeira e outros eletrodomésticos e móveis em ótimo estado de conservação. (...). Nos fundos fica a área de serviço/lazer e um pomar. Na frente da casa do autor há um jardim com um gramado (...) O autor trabalhou durante muitos anos no ramo do turismo e sempre procurou melhorar suas condições de vida e de sua família (...) As condições de higiene e organização da casa do autor na ocasião eram excelentes. Tudo muito limpo e organizado. O ambiente é extremamente confortável. Ao lado da casa o autor guarda seu automóvel. O lote é cercado por muros e há um portão eletrônico na frente do lote..."
Nos termos do parágrafo único, do artigo 34, da Lei 10.741/20031 (Estatuto do Idoso), o benefício assistencial auferido pela esposa da parte autora não obsta a que esta também perceba benefício da mesma natureza.
Conquanto o valor do benefício assistencial da esposa não seja contabilizado, no peculiar caso dos autos, não há que se cogitar a incidência de presunção absoluta de miserabilidade para fins de concessão/restabelecimento de benefício assistencial. Isso porque, consideradas as circunstâncias concretas de vida do casal não se verifica situação de hipossuficiência. Bem delineado pelo conjunto probatório que a familia da parte autora efetivamente promove sua mantença e ainda custeia o salário da empregada doméstica, proporcionando padrão social que, por óbvio, não se compatibiliza com o conceito de vulnerabilidade social e pobreza.
Ressalta-se que o casal confirmou à assistente social a participação de alguns dos filhos com profissões variadas (gerente de banco, servidor público, profissional de turismo e comerciário em concessionária de veículos) no custeio das despesas dos pais e, se são capazes de sustentá-los, evidentemente a parte autora não se encontra em desamparo. Além disso, as fotografias que acompanham o laudo social (evento 17) reforçam o entendimento acerca da ausência de miserabilidade, demonstrando o conforto da residência, guarnecida com diversos móveis e eletrodomésticos modernos, ar-condicionado, calçadas e portão eletrônico, e ainda dois veículos.
De fato, a conjuntura dos autos não revela condição de vulnerabidade social. O que se verifica é a efetivação do princípio da solidariedade familiar, traduzido no artigo 229, da Costituição Federal:
Art. 229. Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade. (grifei)
Nesse contexto, o reconhecimento de miserabilidade fundada tão só na ausência de renda da parte autora e sua esposa, careceria de razoabilidade, considerando o disposto no artigo 20, da Lei n° 8.742/93 (com redação dada pela Lei nº 12.435/11):
"Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família" (grifei)
Destarte, constitui antes responsabilidade dos filhos prover e colaborar para o bem estar dos pais idosos. Assim é que a obrigação somente recai sobre o Estado se nem o idoso, nem sua família dispõem de meios para resguardar sua sobrevivência digna.
Nessa perspectiva, impende gizar ainda que a admissão da presunção de miserabilidade no presente caso não seria capaz de promover igualdade e justiça social. Justamente porque não é a ausência de renda ou a mera dificuldade financeira a autorizatória da concessão do benefício assistencial, mas sim a miserabilidade que diminui ou fulmina a dignidade da pessoa humana e esta, à toda evidência, não restou caracterizada no quadro alinhavado. Correta, assim, a revisão administrativa efetivada pelo INSS. Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. IDOSO. CRITÉRIO ECONÔMICO. REVISÃO. MANUTENÇÃO DOS REQUISITOS. O benefício assistencial é devido à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. Em relação ao pressuposto econômico, o art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/1993 - LOAS estabelecia que seria considerada hipossuficiente a pessoa com deficiência ou idoso cuja família possuísse renda per capita inferior a ¼ do salário mínimo. Entretanto, o Supremo Tribunal Federal, ao analisar os recursos extraordinários 567.985 e 580.963, ambos submetidos à repercussão geral, reconheceu a inconstitucionalidade do § 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/1993, assim como do art. 34 da Lei 10.741/2003 - Estatuto do Idoso, permitindo que o requisito econômico, para fins de concessão do benefício assistencial, seja aferido caso a caso. O INSS pode fazer revisões administrativas no tocante à manutenção de benefícios que dependem da continuidade dos requisitos atendidos quando da sua concessão. (TRF4, APELREEX 5001511-78.2015.4.04.7111, QUINTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 27/10/2015)
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. CRITÉRIO ECONÔMICO. VULNERABILIDADE SOCIAL NÃO COMPROVADA. REVISÃO ADMINISTRATIVA. CANCELAMENTO DEVIDO. VALOR COBRADO PELO INSS. NÃO COMPROVAÇÃO DA MÁ-FÉ PELO SEGURADO. O benefício assistencial é devido à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. Se o cenário probatório não comprova as alegações do interessado quanto à sua condição socioeconômica de vulnerabilidade e desamparo, não há como considerar configurado pressuposto essencial à manutenção do benefício, sendo devido seu cancelamento administrativo, desde que obedecido o devido processo legal. Tendo havido pagamento indevido de valores a título de benefício previdenciário, sem que o segurado tenha concorrido com má-fé, incabível a restituição. Não importa declaração de inconstitucionalidade do art. 115, da Lei 8.213/91, o reconhecimento da impossibilidade de devolução ou desconto de valores indevidamente percebidos. A hipótese é de não incidência do dispositivo legal, porque não concretizado o seu suporte fático. Precedentes do STF (ARE 734199, Rel Min. Rosa Weber). (TRF4, APELREEX 5002246-45.2014.4.04.7209, QUINTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 15/02/2016)
Diante disso, a parte autora não faz jus ao benefício assistencial, mantida, nesse ponto, a r. sentença de primeira instância.
Restituição dos valores recebidos na vigência do benefício
A possibilidade de restituição ao INSS dos valores pagos entre 16/03/04 e 01/12/14, em razão da cessação do benefício assistencial, condiciona-se à comprovação de que o proceder do titular do benefício concorreu para o equívoco na concessão da benesse, o que afastaria a boa-fé.
Como bem explicitado na r. sentença proferida na origem, não há nos autos qualquer indício de agir doloso, já que não há provas de que se valeu de documento ou dado inverídico para obter a concessão, tampouco há notícia de que, à época da concessão, omitiu dado relevante. Na verdade, o que se evidencia é equívoco do INSS que não efetivou todas as diligências antes da concessão do benefício.
A jurisprudência do STJ é uniforme: a constatação de má aplicação de norma jurídica, interpretação equivocada e erro da administração pela Autarquia não franqueia, por si só, a devolução de valores recebidos indevidamente a título de benefício previdenciário, porquanto, em tese, recebidos de boa-fé pelos beneficiários e da autarquia previdenciária é o ônus da prova em contrário, uma vez que a má-fé não é presumível. Daí que, não obstante significativas as premissas acerca da vedação ao enriquecimento sem causa e da autotutela, no caso dos autos, não demonstrada a índole dolosa do apelado, prevalece configurada a boa-fé.
No âmbito desta Corte a matéria também é assente no sentido da irrepetibilidade de valores pagos a título de benefício previdenciário, levando em conta a boa-fé do beneficiário e o caráter alimentar da verba, tanto na hipótese de pagamento indevido por erro da Administração como na hipótese de tutela cautelar posteriormente revogada:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PAGAMENTO INDEVIDO. BOA-FÉ. DEVOLUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. SÚMULA83/STJ.
1. Cumpre asseverar que não há nos autos informação daexistência de tutela antecipada para recebimento do benefício previdenciário,conforme alegado pelo agravante.
2. A jurisprudência desta Corte é no sentido daimpossibilidade dos descontos, em razão do caráter alimentar dos proventos percebidosa título de benefício previdenciário, aplicando ao caso o princípio dairrepetibilidade dos alimentos. Precedentes. Súmula 83/STJ.
3. A decisão agravada, ao julgar a questão que decidiu deacordo com a interpretação sistemática da legislação, especialmente nos termosdo art. 115 da Lei n. 8.112/91, apenas interpretou as normas, ou seja, de formasistemática, não se subsumindo o caso à hipótese de declaração deinconstitucionalidade sem que a questão tenha sido decidida pelo Plenário.
Agravo regimental improvido. (STJ, AgRgno AREsp 432.511/RN, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA,julgado em 17/12/2013, DJe 03/02/2014)
PREVIDENCIÁRIO. DEVOLUÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE. ERRO IMPUTADO AO PRÓPRIO INSS. BOA FÉ DO SEGURADO CONFIGURADA. INDEVIDO O RESSARCIMENTO Dada a manifesta natureza alimentar do benefício previdenciário, o pagamento indevido feito pela Administração, sem que o beneficiário tenha concorrido com má-fé para tal, é irrestituível. Precedentes da Terceira Seção desta Corte pela aplicação do princípio da irrepetibilidade ou não devolução dos alimentos quando configurada a boa fé do segurado.
(TRF4, Terceira Turma, AC 5008167-97.2014.404.7204, rel. Marga Barth Tessler, j. 26fev.2016)
REPETIÇÃO DE VALORES DE NATUREZA ALIMENTAR. IMPOSSIBILIDADE. O benefício previdenciário concedido administrativamente e recebido de boa-fé é insuscetível de repetição, consoante decidiu o Superior Tribunal de Justiça, de acordo com a sistemática de representativo de controvérsia (REsp 1384418/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 12/06/2013, DJe 30/08/2013). (TRF4, AC 5005354-29.2016.4.04.7204, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 23/10/2017)
Ao consagrar a irrepetibilidade de tais parcelas, não se está em oposição à previsão legal de descontos constante no art. 115, inc. II, §1º, da Lei nº 8.213/1991, e à disciplina do Decreto nº 3.048/99, art. 154, inc. II. Apenas se afasta a incidência desses dispositivos por se tratar de recebimento de verba alimentar, que se presume utilizada para subsistência, interpretando-se a lei à luz da Constituição Federal. De igual forma, não nega vigência aos princípios da legalidade, da moralidade, da presunção de legalidade das leis e da boa-fé objetiva (arts. 5º, LIV, 37, caput, e 97 da Constituição Federal). Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE DE GENITORA. BENEFÍCIO INDEVIDO. EMANCIPAÇÃO. DEVOLUÇÃO DE VALORES. BOA-FÉ. REVOGAÇÃO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. IMPOSSIBILIDADE. 1. Para a obtenção do benefício de pensão por morte deve a parte interessada preencher os requisitos estabelecidos na legislação previdenciária vigente à data do óbito, consoante iterativa jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte. 2. O artigo 16 da Lei nº 8.213/91 dispõe que o filho do segurado é dependente, desde que menor de 21 anos e não emancipado. O art. 77, § 2º, inc. II, da Lei nº. 8.213/1991, igualmente estabelece a emancipação do filho como termo final para a percepção do benefício de pensão, salvo se for inválido, o que não é a hipótese, limitando-se a argumentar que não se emancipou para efeitos previdenciários. 3.Incontroverso o erro administrativo, levando em conta o caráter alimentar dos benefícios, e ausente comprovação de eventual má-fé do segurado, devem ser relativizadas as normas dos arts. 115, II, da Lei nº 8213/91 e 154, § 3º, do Decreto nº 3048/99. (TRF4, AC 0002425-31.2017.404.9999, SEXTA TURMA, Relator ARTUR CÉSAR DE SOUZA, D.E. 23-8-2017)
Desse modo, por se tratar de verba alimentar recebida de boa-fé, e ainda pelo cunho social peculiar às questões envolvendo benefícios previdenciários, irrepetíveis os valores recebidos a título de benefício assistencial, ainda que indevidamente.
Logo, aqui também a sentença de primeiro grau não comporta reparos.
Prequestionamento
Conforme o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, ainda que ausente menção expressa a dispositivos legais, se a matéria ventilada no recurso de apelação foi devidamente examinada pela Corte a quo, resta caracterizado o prequestionamento implícito, o qual viabiliza o conhecimento do recurso especial: AgRg no REsp n.1127411-MG, Primeira Turma, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, DJe de23-03-2010; AgRg no Ag n. 1190273-ES, Segunda Turma, Rel. Ministra Eliana Calmon, DJe de 03-05-2010; Resp n. 1148493-SP, Segunda Turma,Rel. Ministro Castro Meira, DJe de 29-04-2010; AgRg no Ag n.1088331-DF, Quarta Turma, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, DJe de29-03-2010; AgRg no Ag n. 1266387-PE, Quinta Turma, Rel. Ministra Laurita Vaz, DJe de 10-05-2010; REsp n. 1107991-RS, Quinta Turma, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJe de24-05-2010; AgRg no REsp n. 849892-CE, Sexta Turma, Rel.Ministro Og Fernandes, DJe de 05-04-2010; e EREsp n. 161419-RS, Corte Especial, Relator para Acórdão Ministro Ari Pargendler, DJe de10-11-2008).
Honorários Recursais
Por fim, considerando a sucumbência recíproca, mantenho a condenação da verba honorária conforme estabelecido em primeira instância, atendendo ao disposto no art. 85 do CPC, ressalvada a justiça gratuita.
Conclusão
Ante o exposto, voto no sentido de negar provimento à apelação do INSS e ao recurso adesivo da parte autora.
Juiz Federal Convocado Oscar Valente Cardoso
Relator
Documento eletrônico assinado por Juiz Federal Convocado Oscar Valente Cardoso, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9385818v185 e, se solicitado, do código CRC 1976B660. | |
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 20/06/2018
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5013156-39.2015.4.04.7002/PR
ORIGEM: PR 50131563920154047002
RELATOR | : | Juiz Federal OSCAR VALENTE CARDOSO |
PRESIDENTE | : | Luiz Fernando Wowk Penteado |
PROCURADOR | : | Dr. Alexandre Amaral Gavronski |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | WALDI ADI HANKE |
ADVOGADO | : | SANDRA FAGUNDES |
APELADO | : | OS MESMOS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 20/06/2018, na seqüência 734, disponibilizada no DE de 06/06/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E AO RECURSO ADESIVO DA PARTE AUTORA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal OSCAR VALENTE CARDOSO |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal OSCAR VALENTE CARDOSO |
: | Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO | |
: | Des. Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA |
Suzana Roessing
Secretária de Turma
Documento eletrônico assinado por Suzana Roessing, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9430329v1 e, se solicitado, do código CRC 61DEA0B0. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Suzana Roessing |
Data e Hora: | 21/06/2018 12:06 |