Apelação Cível Nº 5003081-35.2015.4.04.7100/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
APELANTE: VERECIR RODRIGUES DA SILVA (AUTOR)
ADVOGADO: EDSON SALVATI DA CUNHA (OAB RS064128)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
Trata-se de apelação em face de sentença, proferida na vigência do CPC/2015, que julgou procedente em parte o pedido, com o seguinte dispositivo (Evento 164 do originário):
Ante o exposto, resolvo o mérito do processo, indeferindo a prescrição e julgando parcialmente procedentes os pedidos (CPC, art. 487, I, II), para condenar o INSS a pagar aos sucessores do autor o benefício assistencial desde 27/12/2015 até a data do óbito, em 04/07/2018 (Evento 117, CERTOBT2) e descontadas da condenação as parcelas já recebidas em razão da concessão do NB 88/702.519.942-8.
Nas parcelas vencidas, incidem os seguintes encargos: i) correção monetária: desde o vencimento de cada prestação, pelo mesmo índice utilizado para os reajustamentos dos benefícios do RGPS, sendo o INPC a partir de 04/2006, substituído pelo IPCA-E em 07/2009; ii) juros de mora: desde a citação, pelos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicáveis à caderneta de poupança; ou desde que devidas as prestações, se posterior à citação.
Honorários nos termos da fundamentação.
Sem custas, porque a parte autora é beneficiária da AJG e o INSS é isento (Lei n° 9.289/1996, art. 4°, I).
Condeno o INSS ao ressarcimento de 2/3 dos honorários periciais adiantados pela Seção Judiciária do Rio Grande do Sul (Eventos 35, 84 e 100). A parte autora responde por 1/3 desses honorários, mas a execução fica suspensa em virtude da AJG.
Publique-se e intimem-se.
Sentença não sujeita à remessa necessária, pois é nula a possibilidade de o valor da condenação atingir o limite mínimo de mil salários mínimos (R$1.045.000,00) estabelecido para essa providência no artigo 496, § 3°, I do CPC 2015. Isso porque, em valores atualizados e acrescidos de juros de mora e honorários advocatícios de 10%, o citado limite somente seria alcançado pela condenação ao pagamento do valor integral das prestações mensais pelo teto previdenciário devidas desde, ao menos, 01/2005. Por esses motivos, deixo de aplicar a Súmula 490 do STJ.
Em seu apelo, postula o INSS a reforma da sentença, com improcedência do pedido. Refere que fato superveniente apenas pode ser considerado quando abranger circunstâncias que possam influir no acolhimento ou rejeição da pretensão inicialmente formulada. Alega que o reconhecimento de fato superveniente não apreciado na via administrativa viola a necessidade de prévio requerimento, questão julgada pelo STF no RE 631.240. No caso de manutenção do benefício, sustenta que sejam afastados os juros de mora, com aplicação do julgamento do STJ no Tema 995, que tratou sobre a reafirmação da DER ou, se mantidos, que sejam aplicados conforme o disposto no art. 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei 11.960/2009. Por fim, pede o afastamento da condenação em honorários (Evento 172 do originário).
Com as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte (Evento 179 do originário).
O MPF apresentou parecer (Evento 53).
É o relatório.
VOTO
O presente feito foi ajuizado visando a concessão de benefício de prestação continuada ao deficiente, indeferido pelo INSS sob o fundamento de que não possui incapacidade para o trabalho. Em primeira sentença, o pedido foi julgado improcedente e foi indeferida nova perícia médica, na especialidade de infectologia.
Em julgamento por esta Turma, em sessão realizada em 9-4-2018, foi decidido, por unanimidade, anular, de ofício, a sentença e determinar a reabertura da instrução, a fim de que seja realizado laudo sócio econômico, pois presente o requisito etário, já reconhecendo a possibilidade de concessão do benefício assistencial, na hipótese de estarem preenchidos todo os requisitos (Eventos 29 e 30).
Com o retorno so autos ao Juízo de origem, após apresentado o laudo, foi proferida sentença, que transcrevo em parte, adotando como razão de decidir (Evento 164 do originário):
Nesse ponto, encerrando a polêmica sobre a matéria, o Supremo Tribunal Federal, na sessão de 18/04/2013, decidiu pela inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do artigo 34, parágrafo único, da Lei n° 10.741/2003 (Estatuto do Idoso), consagrando a interpretação de que o benefício assistencial recebido por deficiente e o benefício previdenciário recebido por idoso, ambos no valor de um salário mínimo, também devem ser excluídos do cálculo da renda familiar per capita, a exemplo do benefício assistencial recebido por idoso (RE 580.963, Rel. Min. Gilmar Mendes, Plenário, julg. 18/04/2013, DJE 14/11/2013). Ademais, se o benefício previdenciário tiver valor superior ao mínimo, é excluído um salário mínimo (TRF4, AC 5038528-50.2016.4.04.7100, Sexta Turma, Relator Artur César de Souza, juntado aos autos em 12/12/2017).
É importante destacar que se exclui a renda e o próprio idoso ou deficiente da contagem do grupo familiar quando não há saldo de valor para compor a renda familiar (TNU, Pedido 200772520024887, Juíza Federal Rosana Noya Weibel Kaufmann, DOU 13/05/2011).
Já o parâmetro de 1/4 do salário mínimo para aferição da miserabilidade, apesar de ter sido considerado constitucional pelo STF num primeiro momento (ADI 1.232-1/DF, julgada em 27/08/1998), aquela Corte reapreciou a questão, declarando incidentalmente a inconstitucionalidade do artigo 20, § 3°, da Lei n° 8.742/1993, a fim de a miserabilidade ser analisada a partir das condições socioeconômicas da família a que pertence o beneficiário da assistência social (RE 567.985, Relator: Min. Marco Aurélio, Relator(a) p/ Acórdão: Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 18/04/2013, DJe-194 divulg. 02/10/2013, public. 03/10/2013).
Aplicando essas premissas ao caso concreto, em relação à condição de deficiente, a perícia médica, na especialidade pneumologia, concluiu que o autor não é acometido de moléstia incapacitante para o exercício de atividade laborativa produtiva e regular ou para a vida independente. A perita esclareceu que o autor é portador de DPOC (Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica) - CID/10 J44.9, doença crônica em que ocorre broncoespasmo, mas parcialmente reversível com a medicação adequada. No entanto, tal quadro não se mostra incapacitante, tampouco caracteriza impedimento de longo prazo capaz de limitar a participação plena e efetiva da parte autora na vida em sociedade, não se enquadrando, portanto, no conceito de deficiente para fins de recebimento do benefício assistencial.
Da documentação acostada ao Evento 1 (OUT9/10; LAU11), por sua vez, extraem-se atestados médicos no sentido de que o autor realizou tratamento em razão de doença pulmonar, nos períodos de 2010, 2011 e 2014, os quais, todavia, não são significativos a ponto de acarretar incapacidade de longo prazo para as atividades habituais, desde a data do requerimento administrativo até os dias atuais.
Do mesmo modo, de acordo com a perícia na especialidade infectologia (Evento 99, LAUDOPERIC1), o demandante sofre de Hepatite viral crônica não especificada (B189), todavia, a perita concluiu que "não foi constatada incapacidade pela doença infecciosa".
Assim, considerando que o autor não é incapaz para o trabalho e para a vida independente, consoante a redação original do artigo 20 da LOAS, tampouco apresenta impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, não faz jus ao benefício assistencial à pessoa com deficiência.
Por outro lado, no curso do processo, o demandante, nascido em 27/12/1950 (vide Evento 1, RG4), completou 65 anos de idade (em 27/12/2015), pelo que, ainda que não tenha havido requerimento expresso de benefício assistencial ao idoso, analiso o direito a esse benefício, por força do artigo 493 do CPC ("Se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento do mérito, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a decisão").
Assim, no que toca à segunda exigência (situação de risco social), a autarquia deferiu o requerimento posterior, NB 88/702.519.942-8, com DER em 15/09/2016. Pelo que se extrai do referido processo administrativo (Evento 137, PROCADM2), o grupo familiar era composto somente pelo demandante, que vivia sozinho, estava desempregado e sem fonte de renda, o que é corroborado pelas informações no CNIS, que registra a última contribuição como autônomo em dezembro de 1990 (Evento 163).
Nesse contexto, deveria ser pago o benefício assistencial ao autor desde 27/12/2015 até a data do óbito, em 04/07/2018 (Evento 117, CERTOBT2). Nas parcelas vencidas serão descontadas da condenação as parcelas já recebidas em razão da concessão do NB 88/702.519.942-8.
Conforme bem referido nas contrarrazões, o art. 493 do CPC autoriza o magistrado para tomar em consideração, caso após a propositura da ação, ocorrer algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento. Essa é exatamente a hipótese dos autos.
Além de o falecido ter preenchido os requisitos para a concessão do benefício assistencial ao idoso, houve a concessão do benefício no âmbito administrativo (Evento 163 do originário), o que configura reconhecimento do direito, conforme art. 487, inciso III, alínea "a", do CPC.
Assim, deve ser mantida a concessão do benefício assistencial, desde 27-12-2015 até a data do óbito, em 4-7-2018, descontadas as parcelas já pagas na via administrativa.
Correção monetária
Na sentença, a partir de julho/2009 foi fixado o IPCA-E como índice de correção. Assim, deve ser ser mantida no ponto, pois de acordo com o Tema 810 do STF e 905 do STJ, uma vez que foi benefício assistencial a contar de 27-12-2015.
Juros de mora.
A ação foi ajuizada em janeiro de 2015 e o benefício concedido em juízo teve termo inicial em dezembro de 2015, sendo reconhecido primeiramente no âmbito administrativo. Logo, com razão o INSS, pois não há falar em juros de mora nessa situação.
Honorários
Tendo em vista que a sentença foi publicada sob a égide do novo CPC, este regramento é aplicável quanto à sucumbência.
No tocante ao cabimento da majoração da verba honorária, conforme previsão do §11 do art. 85 do CPC/2015, assim decidiu a Segunda Seção do STJ, no julgamento do AgInt nos EREsp nº 1.539.725-DF (DJe de 19-10-2017):
É devida a majoração da verba honorária sucumbencial, na forma do art. 85, §11, do CPC/2015, quando estiverem presentes os seguintes requisitos, simultaneamente:
a) vigência do CPC/2015 quando da publicação da decisão recorrida, ou seja, ela deve ter sido publicada a partir de 18/03/2016;
b) não conhecimento integralmente ou desprovimento do recurso, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente;
c) existência de condenação da parte recorrente ao pagamento de honorários desde a origem no feito em que interposto o recurso.
No caso, em razão do provimento em parte do apelo do INSS, a verba honorária deve ser mantida conforme determinada na sentença, não sendo hipótese de majoração.
Conclusão:
Parcial provimento ao apelo do INSS para afastar os juros de mora.
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao apelo do INSS.
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Apelação Cível Nº 5003081-35.2015.4.04.7100/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
APELANTE: VERECIR RODRIGUES DA SILVA (AUTOR)
ADVOGADO: EDSON SALVATI DA CUNHA (OAB RS064128)
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EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL AO IDOSO. REQUISITOS. PREENCHIMENTO NO CURSO DO PROCESSO. JUROS DE MORA.
1. Preenchidos os requisitos para amparo social ao idoso no curso do processo, deve ser concedido o benefício, ainda que na inicial tenha sido postulado benefício assistencial à pessoa com deficiência.
2. Ajuizada a ação em janeiro de 2015 e concedido o benefício em juízo, com termo inicial em dezembro de 2015, já implantado no âmbito administrativo, não há incidência de juros de mora.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento ao apelo do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 07 de julho de 2021.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Telepresencial DE 07/07/2021
Apelação Cível Nº 5003081-35.2015.4.04.7100/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
PRESIDENTE: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PROCURADOR(A): MARCUS VINICIUS AGUIAR MACEDO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: VERECIR RODRIGUES DA SILVA (AUTOR)
ADVOGADO: EDSON SALVATI DA CUNHA (OAB RS064128)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Telepresencial do dia 07/07/2021, na sequência 1057, disponibilizada no DE de 28/06/2021.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DO INSS.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PAULO ROBERTO DO AMARAL NUNES
Secretário
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