Apelação Cível Nº 5001567-87.2019.4.04.7106/RS
RELATORA: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
APELANTE: HILDA FERNANDES CASTRO (AUTOR)
ADVOGADO: MANUELA CASTRO SANCHES (OAB RS086329)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
Trata-se de ação previdenciária ajuizada em 04/06/2019 contra o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, postulando a concessão de benefício assistencial ao idoso.
O juízo de origem, em sentença publicada em 28/02/2020, julgou improcedentes os pedidos. Condenou a parte autora ao pagamento de custas processuais e de honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa. A exigibilidade de tais verbas, contudo, restou suspensa em virtude do deferimento da gratuidade de justiça.
A parte autora apelou sustentando que está em situação de vulnerabilidade social, uma vez que os ganhos auferidos pela aposentadoria do esposo não são suficientes para que a família viva com dignidade. Alega que os gastos com medicamentos e alimentação são superiores aos descritos na perícia social. Afirma que o fato de possuírem automóvel não retira o direito ao benefício, pois o bem foi adquirido ao longo da vida laborativa do casal.
Com contrarrazões, subiram os autos ao Tribunal para julgamento.
O MPF deixou de se manifestar quanto ao mérito (evento 4 desta instância).
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
O apelo preenche os requisitos de admissibilidade.
Do benefício assistencial devido à pessoa idosa
À época do requerimento administrativo, formulado anteriormente às alterações promovidas na Lei nº 8.742/1993 pela Lei 12.435/2011, os critérios de concessão do benefício assistencial estavam assim dispostos:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de 1 (um) salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 70 (setenta) anos ou mais e que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
§ 1o Para os efeitos do disposto no caput, entende-se como família o conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, desde que vivam sob o mesmo teto.
§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho.
§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
§ 4º O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo o da assistência médica.
§ 5º A situação de internado não prejudica o direito do idoso ou do portador de deficiência ao benefício.
§ 6o A concessão do benefício ficará sujeita a exame médico pericial e laudo realizados pelos serviços de perícia médica do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS.
(...)
Art. 38. A idade prevista no art. 20 desta Lei reduzir-se-á para sessenta e sete anos a partir de 1o de janeiro de 1998.
Do aspecto socioeconômico
O art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/1993, estabelecia que se considerava hipossuficiente a pessoa com deficiência ou idoso cuja família possuísse renda per capita inferior a ¼ do salário mínimo.
O Supremo Tribunal Federal, ao analisar os recursos extraordinários 567.985 e 580.963, ambos submetidos à repercussão geral, reconheceu a inconstitucionalidade do § 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/1993 - LOAS, assim como do parágrafo único do art. 34 da Lei 10.741/2003 - Estatuto do Idoso.
No primeiro caso, o STF identificou a ocorrência de um processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro), assentando, assim, que o critério econômico presente na LOAS não pode ser tomado como absoluto, cabendo a análise da situação de necessidade à luz das circunstâncias em concreto.
Reconhecida a inconstitucionalidade do critério objetivo para aferição do requisito econômico do benefício assistencial, em regime de repercussão geral, cabe ao julgador, na análise do caso concreto, avaliar os aspectos socioeconômicos que cercam a subsistência da parte autora e de sua família.
Quanto ao parágrafo único do art. 34, que estabelece que o benefício assistencial já concedido a qualquer idoso membro da família "não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS", entendeu a Suprema Corte que violou o princípio da isonomia. Isso porque abriu exceção para o recebimento de dois benefícios assistenciais por idosos, mas não permitiu a percepção conjunta de benefício de idoso com o de deficiente ou de qualquer outro previdenciário. Em consequência, o STF afastou a restrição, com o que, qualquer benefício previdenciário ou assistencial, de até um salário mínimo, não deve ser considerado na renda familiar per capita.
Do caso concreto
A parte autora nasceu em 05/12/1945, contando, ao tempo do requerimento administrativo, formulado em 27/12/2010, com 65 anos de idade.
A controvérsia no plano recursal restringe-se ao critério econômico para concessão do benefício.
Quanto à condição socioeconômica do grupo familiar da parte autora, o estudo social (evento 16), realizado em 30/09/2019, informa que a requerente mora com seu esposo, o Sr. Herani da Silva Castro (74 anos).
A renda do grupo familiar é proveniente da aposentadoria do Sr. Herani como servidor público da Secretaria Estadual de Agricultura, no valor de R$ 1.500,00. As despesas fixas são oriundas de gastos com medicamentos (R$ 100,00), alimentação (R$ 500,00), água (R$ 45,00), energia elétrica (R$ 120,00), gás (R$ 68,00) e combustível (R$ 300,00).
A casa em que residem é própria e se encontra em boas condições, sendo de alvenaria, com cinco cômodos e banheiro. Os móveis e utensílios também se encontram em bom estado de conservação. O casal possui, ainda, um automóvel Fusca/76.
De acordo com a assistente social, a parte autora tem dois filhos, que residem em Santana do Livramento, mesma cidade da demandante. O mais velho é Sargento da Brigada e a mais nova trabalha no comércio como escriturária. Embora a autora se relacione com os filhos, os quais em tese poderiam auxilia-la em caso de necessidade, a assistente social não refere que prestem auxílio financeiro. Pelo contrário, consta do laudo social que a requerente não recebe ajuda financeira de terceiros, sendo a única renda para seu sustento a proveniente da aposentadoria de seu marido.
Contudo, observa-se que não há sinais de miserabilidade ou de que a demandante não possua condições de ter uma vida digna e suprir suas necessidades básicas com a renda obtida pelo grupo familiar. Como bem destacado na sentença, ainda que a renda familiar não seja elevada, permite ao casal manter-se com dignidade e ter os meios necessários para sua sobrevivência, sendo a renda inclusive superior aos gastos mensais apurados na perícia social.
Outrossim, as fotos do laudo complementar (ev.26) demonstram que embora a família resida em casa simples, está em bom estado, e é guarnecida com os móveis e utensílios domésticos necessários ao casal.
Registro, ainda, que embora a demandante afirme que os gastos em medicamentos são superiores ao informado na perícia social, tendo juntado fatura de cartão de crédito no valor de R$ 520,93 ao evento 34, não consta do documento a discriminação dos valores que compõem a fatura, não sendo possível afirmar que de fato se refere à aquisição de medicamentos. No mesmo sentido, a alegação de que há gastos superiores em alimentação não vem amparada em prova documental.
Por fim, observo que eventual comprovação das despesas da autora com alimentação e medicamentos deveria ter sido realizada por ocasião da perícia social, especialmente porque na decisão que determinou a realização da perícia socioeconômica (ev.3) o juízo de origem também determinou que os comprovantes de despesas da família, deveriam ser disponibilizados à perita.
Portanto, não há como infirmar as conclusões da perícia social quanto às despesas do grupo familiar, do que se depreende que a renda obtida é suficiente ao casal quanto às suas necessidades de sobrevivência, o que, aliado ao fato de não estarem presentes outras provas que apontem miserabilidade, enseja a improcedência do pedido de benefício de assistência social.
Assim, deve ser mantida a sentença que julgou improcedente o pedido formulado pela parte autora.
Honorários Advocatícios
Desprovido o recurso da parte autora, deve ser observada, em cumprimento de sentença, a majoração de 50% da verba honorária fixada na origem, pela incidência do §11 do artigo 85 do CPC.
Conclusão
Desprovido o apelo da parte autora. Majorado os honorários advocatícios pela incidência do §11 do artigo 85 do CPC. Nos demais pontos mantida a sentença.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
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Apelação Cível Nº 5001567-87.2019.4.04.7106/RS
RELATORA: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
APELANTE: HILDA FERNANDES CASTRO (AUTOR)
ADVOGADO: MANUELA CASTRO SANCHES (OAB RS086329)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ASPECTO SOCIOECONÔMICO. requisito não atendido. INDEFERIMENTO.
1. O benefício assistencial é devido à pessoa com deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
2. Não comprovado o preenchimento do requisito econômico, é indevido o benefício assistencial.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 15 de julho de 2020.
Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Juíza Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001860270v4 e do código CRC 3aafd187.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Telepresencial DE 15/07/2020
Apelação Cível Nº 5001567-87.2019.4.04.7106/RS
RELATORA: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PROCURADOR(A): JUAREZ MERCANTE
APELANTE: HILDA FERNANDES CASTRO (AUTOR)
ADVOGADO: MANUELA CASTRO SANCHES (OAB RS086329)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Telepresencial do dia 15/07/2020, na sequência 338, disponibilizada no DE de 02/07/2020.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PAULO ROBERTO DO AMARAL NUNES
Secretário
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