APELAÇÃO CÍVEL Nº 5051121-47.2016.4.04.9999/PR
RELATOR | : | TAIS SCHILLING FERRAZ |
APELANTE | : | ONOFRA APARECIDA DA SILVA GONCALVES |
ADVOGADO | : | ROBISON CAVALCANTI GONDASKI |
: | GABRIELA COGO BETTELLI | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. COISA JULGADA. INEXISTÊNCIA. ANULAÇÃO DA SENTENÇA.
Formulado novo pedido de concessão de benefício assistencial na via administrativa, com pretensão relativa a época distinta, não há falar em coisa julgada.
No sistema processual brasileiro, especialmente nas ações individuais típicas, não fazem coisa julgada a verdade dos fatos e os motivos, ainda que importantes para determinar a parte dispositiva da sentença.
Provimento para anulação da sentença, reabertura da instrução e novo julgamento.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação para anular a sentença, com reabertura plena da instrução e consequente julgamento do mérito, diante das provas apresentadas, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 30 de agosto de 2017.
Juíza Federal Taís Schilling Ferraz
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Juíza Federal Taís Schilling Ferraz, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9100897v9 e, se solicitado, do código CRC 3A3AA893. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5051121-47.2016.4.04.9999/PR
RELATOR | : | TAIS SCHILLING FERRAZ |
APELANTE | : | ONOFRA APARECIDA DA SILVA GONCALVES |
ADVOGADO | : | ROBISON CAVALCANTI GONDASKI |
: | GABRIELA COGO BETTELLI | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
RELATÓRIO
Trata-se de ação previdenciária interposta por ONOFRA APARECIDA DA SILVA GONÇALVES, em 12-07-2016, contra o INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, objetivando a concessão de benefício assistencial ao idoso, requerido administrativamente em 09-05-2016.
O julgador monocrático, em sentença (evento 39) publicada em 28-09-2016, extinguiu o feito, sem julgamento de mérito, ante o reconhecimento da existência de coisa julgada, condenando a parte autora ao pagamento das custas processuais, além de honorários advocatícios ao patrono da ré, os quais foram fixados em 10% sobre o valor da causa, suspensa sua exigibilidade em face do deferimento da AJG.
A parte autora apela (evento 45), aduzindo que houve novo requerimento administrativo, diante das atuais condições do grupo familiar, o que afasta o entendimento do julgador monocrático de que ocorrente coisa julgada a impedir o julgamento do feito.
Sem contrarrazões.
Após parecer do Ministério Público Federal requerendo prioridade no julgamento do feito (evento 59), subiram os autos a essa Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Inicialmente, anoto que se encontram preenchidos os requisitos de admissibilidade recursal.
DA COISA JULGADA
O julgador monocrático manifestou o seguinte entendimento:
"A presente demanda visa o recebimento do benefício assistencial (LOAS), alegando a parte autora que preenche todos os requisitos legais, já que é idosa e não possui renda.
Ocorre que, constata-se que a parte autora ingressou, em 13 de julho de 2009, com pedido de concessão da benesse perante o Juizado Especial Federal Cível da Subseção de Maringá, através do processo sob nº 2009.70.53.004282-9.
O seu pedido foi devidamente apreciado, constando a prolação de sentença que o indeferiu (mov. 21.3), a qual transitou em julgado.
(...)
Ora, resta evidente que o pedido inicial do presente feito é idêntico ao processo que tramitou perante o JEF, inclusive quanto as alegações e provas produzidas pela parte autora.
(...)."
Dispõem os arts. 337, parágrafos 2º a 4º, e 485, V, §3º, do NCPC, respectivamente:
Art. 337. (...)
§ 2º. Uma ação é idêntica à outra quando possui as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido.
§ 3º. Há litispendência quando se repete ação que está em curso;
§4º Há coisa julgada quando se repete ação que já foi decidida por decisão transitada em julgado.
Art. 485. O juiz não resolverá o mérito quando:
(...)
V- reconhecer a existência de perempção, de litispendência ou de coisa julgada;
(...)
§ 3º. O juiz conhecerá de ofício da matéria constante dos incisos IV, V, VI e IX, em qualquer tempo e grau de jurisdição, enquanto não ocorrer o trânsito em julgado.
(...)
A coisa julgada é qualidade que se agrega aos efeitos da sentença, tornando indiscutível a decisão não mais sujeita a recurso (NCPC, art. 502), impedindo o reexame da causa no mesmo processo (coisa julgada formal) ou em outra demanda judicial (coisa julgada material). Tal eficácia preclusiva - que visa a salvaguardar a segurança nas relações sociais e jurídicas, conferindo-lhes estabilidade - projeta-se para além do conteúdo explícito do julgado, alcançando todas as alegações e defesas que poderiam ter sido suscitadas e não o foram pelas partes, nos termos do art. 508 do NCPC:
Art. 508. Transitada em julgado a decisão de mérito, considerar-se-ão deduzidas e repelidas todas as alegações e as defesas que a parte poderia opor tanto ao acolhimento quanto à rejeição do pedido.
Ademais, as relações de cunho continuativo estão sujeitas a alterações, como bem ressalvado no artigo 505, inciso I, do NCPC.
Art. 505. Nenhum juiz decidirá novamente as questões já decididas relativas à mesma lide, salvo:
I - se, tratando-se de relação jurídica de trato continuado, sobreveio modificação no estado de fato ou de direito; caso em que poderá a parte pedir a revisão do que foi estatuído na sentença;
Para a admissão da existência de coisa julgada é necessário, nos termos do § 2º do artigo 337 do NCPC, que entre uma e outra demanda seja caracterizada a chamada "tríplice identidade", ou seja, que haja identidade de partes, de pedido e de causa de pedir. A variação de quaisquer desses elementos identificadores afasta a ocorrência de coisa julgada.
Em relação à causa de pedir, sabe-se que ela é composta pelos fundamentos jurídicos e pelo suporte fático. Em ações referentes ao reconhecimento da incapacidade do segurado, por exemplo, a modificação do suporte fático dá-se pela superveniência de nova moléstia ou pelo agravamento de moléstia preexistente, que justifique a concessão de novo benefício.
Assim, é possível o ajuizamento de nova ação pelo segurado contra o INSS (com o mesmo pedido) sempre que houver modificação da situação fática, o que não infringirá a coisa julgada, pois a causa de pedir será diferente. Nessa linha, o seguinte precedente desta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. BÓIA-FRIA. COISA JULGADA. INEXISTÊNCIA. SENTENÇA ANULADA. - Para a admissão da existência de coisa julgada é necessário, nos termos do § 2º do artigo 301 do CPC, que entre uma e outra demanda seja respeitado o chamado Princípio da Tríplice Identidade, ou seja, que haja identidade de partes, de pedido e de causa de pedir. A variação de quaisquer desses elementos identificadores afasta a ocorrência de coisa julgada. (AC 2001.70.01.001404-0, Quinta Turma, Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, DJ 13/11/2002)
Passo à análise do caso concreto.
De fato, a parte autora ajuizou ação previdenciária (autos 2009.70.53.004282-9), em 13/07/2009, perante a Justiça Federal, 2º Juizado Especial Cível de Maringá, pretendendo a concessão de benefício assistencial à pessoa idosa, frente a pedido administrativo que indeferiu o pedido, em face da renda per capita do grupo familiar, com DER em 29-05-2009.
No bojo da referida ação foi realizado auto de constatação (evento 21.4), onde foi informado que o grupo familiar era composto apenas da autora e seu esposo, e que a renda familiar advinha de aposentadoria deste, no valor de um salário mínimo. As despesas relacionadas, existentes na época, com medicação, água e esgoto, energia elétrica, telefone, alimentação, higiene, vestuário, transporte, lazer, e prestação do imóvel, consistiam em pouco mais que o valor de um salário mínimo (SM = R$ 465, despesas = R$ 476,42).
Todavia, mesmo diante de tais despesas, foi julgado improcedente o pedido, tendo transitado em julgado essa decisão em 08-01-2010, à consideração de que:
"(...), a autora reside em casa cedida por filhos, "em bom estado de conservação, com 3 quartos e demais dependências", com móveis e eletrodomésticos (geladeira, fogão, máquina para lavar roupas, ventilador, batedeira de bolo, micro-ondas, televisão, rádio) que proporcionam todo o conforto, situação que não se amolda ao estado de miserabilidade. Ficando claro que a manutenção da autora é assegurada pelos filhos.
Logo, noto que não tem direito ao benefício postulado, pois a assistência social deve ser prestada apenas à pessoa que comprove não possuir meios de ter provido a manutenção por sua família, o que não ocorre no caso dos autos.
Ressalte-se que o dever de amparo aos idosos pelo Estado, portanto, é secundário, somente existindo se os mesmos não puderem ser auxiliados pelos filhos maiores.
(...)"
Posteriormente, a apelante ajuizou a presente ação previdenciária, postulando o mesmo benefício, com base no pedido administrativo com DER em 09-05-2016. O juízo federal, entendendo que o requerimento administrativo trazia os mesmos elementos do anterior, extinguiu o feito sem resolução do mérito, diante do reconhecimento da coisa julgada.
Embora a causa de pedir declinada neste feito inclua em parte a anterior, não se identifica com ela por completo. O novo pedido de benefício assistencial é feito com base nas condições presentes à data do novo requerimento administrativo e o termo inicial do benefício não se identifica com o anterior.
De notar, ainda, que sequer foi procedida perícia social, não tendo sido demonstrado, portanto, que as condições socioeconômicas eram as mesmas da época do primeiro requerimento.
De acordo com o art. 504, I e II do CPC, não fazem coisa julgada os motivos e a verdade dos fatos, ainda que importantes para determinar a extensão da parte dispositiva da sentença.
Na presente ação, a causa de pedir diz respeita à outra época, não se podendo tomá-la como idêntica à anterior, seja em decorrência do pedido, seja em decorrência da causa de pedir. A relação jurídica previdenciária é de natureza continuativa. O não atendimento de requisitos em determinada data não obsta ao reconhecimento posterior, acrescidas novas condições.
Portanto, seja por não haver total identidade de pedidos ou de causas de pedir, seja por incidência do art. 504, I e II do CPC, não há que se falar em coisa julgada.
Assim, não tendo sido possibilitada a instrução do feito, a permitir que já fosse analisado o mérito da demanda, necessária a anulação da sentença que declarou a existência de coisa julgada, de forma que voltem os autos à 1ª instância, com reabertura plena da instrução e consequente julgamento do mérito, diante das provas apresentadas.
Dispositivo:
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação para anular a sentença, com reabertura plena da instrução e consequente julgamento do mérito, diante das provas apresentadas.
Juíza Federal Taís Schilling Ferraz
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 30/08/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5051121-47.2016.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00024405320168160109
RELATOR | : | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PROCURADOR | : | Dr. Cláudio Dutra Fontella |
APELANTE | : | ONOFRA APARECIDA DA SILVA GONCALVES |
ADVOGADO | : | ROBISON CAVALCANTI GONDASKI |
: | GABRIELA COGO BETTELLI | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 30/08/2017, na seqüência 618, disponibilizada no DE de 14/08/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO PARA ANULAR A SENTENÇA, COM REABERTURA PLENA DA INSTRUÇÃO E CONSEQUENTE JULGAMENTO DO MÉRITO, DIANTE DAS PROVAS APRESENTADAS.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
VOTANTE(S) | : | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
: | Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA | |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
| Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9156540v1 e, se solicitado, do código CRC 7AA1DA3. | |
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