| D.E. Publicado em 05/10/2017 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0014614-75.2016.4.04.9999/RS
RELATORA | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
APELANTE | : | NAIR TAVARES CORIM |
ADVOGADO | : | Jones Izolan Treter |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
EMENTA
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. CONCESSÃO. PESSOA COM DEFICIÊNCIA. CONDIÇÃO SOCIOECONÔMICA. MISERABILIDADE. PREENCHIMENTO DE REQUISITOS. INOCORRÊNCIA. ÔNUS SUCUMBENCIAIS.
1. O direito ao benefício assistencial, previsto no art. 203, V, da Constituição Federal, e nos arts. 20 e 21 da Lei 8.742/93 (LOAS) pressupõe o preenchimento de dois requisitos: a) condição de pessoa com deficiência ou idosa e b) situação de risco social, ou seja, de miserabilidade ou de desamparo.
2. Reconhecida a inconstitucionalidade do critério econômico objetivo em regime de repercussão geral, bem como a possibilidade de admissão de outros meios de prova para verificação da hipossuficiência familiar, cabe ao julgador, na análise do caso concreto, aferir o estado de miserabilidade da parte autora e de sua família.
3. No caso em apreço, não foi comprovada a miserabilidade familiar, razão pela qual a parte autora não faz jus ao benefício assistencial.
4. Custas processuais e honorários advocatícios a cargo da parte autora. Majorada a verba honorária, nos termos do art. 85, § 11, do CPC/2015, estando suspensa a exigibilidade em virtude da concessão de gratuidade da justiça.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, não conhecer do agravo retido e negar provimento à apelação da autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 26 de setembro de 2017.
Juíza Federal Gisele Lemke
Relatora
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0014614-75.2016.4.04.9999/RS
RELATORA | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
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RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária em face do INSS em que a parte autora requer o benefício assistencial por ter deficiência e encontrar-se em situação de vulnerabilidade social. Narra na inicial que é portadora de obesidade mórbida.
Em sede de contestação, o INSS alegou falta de interesse de agir, porquanto o requerimento administrativo formulado foi de auxílio-doença, enquanto nestes autos o pleito é pela concessão de benefício assistencial (fls. 68-70). O pedido foi reiterado pela autarquia (fls. 93) e o magistrado afastou a falta de interesse de agir (fls. 99).
Contra essa decisão o INSS interpôs agravo retido (fls. 112-115).
Sentenciando, o R. Juízo julgou improcedente a demanda, uma vez que não comprovada a miserabilidade familiar, condenando a parte requerente ao pagamento de custas processuais e de honorários advocatícios de R$ 800,00, cuja exigibilidade resta suspensa em virtude da gratuidade da justiça concedida (fls. 139-142).
A parte autora apelou, sustentando que embora tenha pedido auxílio-doença sem deter qualidade de segurada, a autarquia deveria ter orientado para que requeresse o benefício assistencial, ao qual faria jus. Aduz que o marido recebe apenas um salário mínimo de aposentadoria e que eles vivem em uma casa modesta, enfrentando dificuldades. Alega que nem sempre consegue pelo Sistema Único de Saúde os medicamentos de que necessita. Assevera que tem obesidade mórbida e diabetes, não tendo condições de laborar, razão pela qual deve ser reformada a sentença para que julgado procedente o pedido (fls. 144-154).
O Ministério Público opinou pelo sobrestamento do feito, para que a autora requeira administrativamente o benefício assistencial (fls. 157-159).
Sem contrarrazões, os autos vieram conclusos para julgamento.
VOTO
Ordem cronológica dos processos
O presente feito está sendo levando a julgamento em consonância com a norma do art. 12 do atual CPC (Lei nº 13.105/2015, com redação da Lei nº 13.256/2016) que assim dispõe: os juízes e os tribunais atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão. Nessa ordem de julgamento, também são contempladas as situações em que estejam litigando pessoa com mais de sessenta anos (idoso, Lei n. 10.741/2013), pessoas portadoras de doenças indicadas no art. 6º, inciso XIV, da Lei n. 7.713/88, as demandas de interesse de criança ou adolescente (Lei n. 8.069/90) ou os processos inseridos como prioritários nas metas impostas pelo CNJ.
Ademais, cumpre registrar que foi lançado ato ordinatório na informação processual deste feito programando o mês de julgamento, com observância cronológica e preferências legais. Esse procedimento vem sendo adotado desde antes (2013) da vigência do novo CPC.
CPC/2015
Conforme o art. 14 do CPC/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Logo, serão examinados segundo as normas do CPC/2015 tão somente os recursos e remessas em face de sentenças publicadas a contar do dia 18/03/2016.
Tendo em vista que a sentença em comento foi publicada depois desta data, o recurso será analisado em conformidade com o CPC/2015.
Preliminares
Agravo retido
O agravo retido, regulado pelos arts. 522 e 523 do CPC de 1973, dependia de pedido expresso nas razões de apelação para que fosse apreciado.
No caso em tela, o recurso foi interposto pelo INSS, questionando a falta de requerimento administrativo próprio para concessão do benefício assistencial pleiteado pela autora nestes autos. Tendo em vista que a sentença foi de improcedência e que não houve apelação da autarquia, tampouco pedido para que o agravo fosse analisado, não conheço do recurso.
Superada a preliminar, passo à análise do mérito.
Controvérsia dos autos
A controvérsia recursal envolve a comprovação da miserabilidade familiar.
Benefício assistencial
O direito ao benefício assistencial, previsto no art. 203, V, da Constituição Federal, e nos arts. 20 e 21 da Lei 8.742/93 (Lei Orgânica da Assistência Social - LOAS) pressupõe o preenchimento de dois requisitos: a) condição de pessoa com deficiência ou idosa (com mais de 65 anos) e b) situação de risco social, ou seja, de miserabilidade ou de desamparo.
O referido art. 20 da LOAS, com as modificações introduzidas pelas Leis 12.435 e 12.470, ambas de 2011, e pela Lei 13.146, de 2015, detalha os critérios para concessão do benefício:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
§ 1o Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
§ 2o Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
§ 3o Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo.
§ 4o O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os da assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória.
§ 5o A condição de acolhimento em instituições de longa permanência não prejudica o direito do idoso ou da pessoa com deficiência ao benefício de prestação continuada.
§ 6º A concessão do benefício ficará sujeita à avaliação da deficiência e do grau de impedimento de que trata o § 2o, composta por avaliação médica e avaliação social realizadas por médicos peritos e por assistentes sociais do Instituto Nacional de Seguro Social - INSS
§ 7o Na hipótese de não existirem serviços no município de residência do beneficiário, fica assegurado, na forma prevista em regulamento, o seu encaminhamento ao município mais próximo que contar com tal estrutura.
§ 8o A renda familiar mensal a que se refere o § 3o deverá ser declarada pelo requerente ou seu representante legal, sujeitando-se aos demais procedimentos previstos no regulamento para o deferimento do pedido.
§ 9o Os rendimentos decorrentes de estágio supervisionado e de aprendizagem não serão computados para os fins de cálculo da renda familiar per capita a que se refere o § 3o deste artigo.
§ 10. Considera-se impedimento de longo prazo, para os fins do § 2o deste artigo, aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos.
§ 11. Para concessão do benefício de que trata o caput deste artigo, poderão ser utilizados outros elementos probatórios da condição de miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade, conforme regulamento.
A Lei nº 10.741/2003 - Estatuto do Idoso, por sua vez, em complemento à LOAS, dispõe:
Art. 34. Aos idosos, a partir de 65 (sessenta e cinco) anos, que não possuam meios para prover sua subsistência, nem de tê-la provida por sua família, é assegurado o benefício mensal de 1 (um) salário-mínimo, nos termos da Lei Orgânica da Assistência Social - Loas.
Parágrafo único. O benefício já concedido a qualquer membro da família nos termos do caput não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a Loas.
Em relação à criança com deficiência, deve ser analisado o impacto da incapacidade na limitação do desempenho de atividades e na restrição da participação social, compatível com a sua idade.
Conceito de família
A partir da alteração promovida pela Lei n. 12.435/2011 na Lei Orgânica da Assistência Social, o conceito de família compreende: o requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
Quanto aos filhos maiores de idade e capazes, importante refletir sobre a responsabilidade que estes têm com os membros idosos da família. Uma vez que o benefício em questão, tratado no art. 203, V, da Constituição Federal, garante um salário mínimo mensal à pessoa deficiente ou idosa que comprove não possuir meios de prover à própria manutenção ou tê-la provida por sua família, não seria razoável excluir a renda de filho maior e capaz que aufere rendimentos, uma vez que este tem responsabilidade para com seus genitores idosos.
Por outro lado, considerar aqueles filhos maiores e capazes que não auferem renda para fins de grupo familiar seria beneficiá-los com uma proteção destinada ao idoso, ou seja, estariam contribuindo para a implementação dos requisitos do benefício (cálculo da renda per capita) sem contribuir para o amparo de seus ascendentes. Logo, tem-se que devem ser computados no cálculo da renda per capita tão somente os filhos que possuem renda.
Condição socioeconômica
Em relação ao critério econômico, o art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/1993, estabelecia que era hipossuficiente a pessoa com deficiência ou idoso cuja família possuísse renda per capita inferior a ¼ do salário mínimo.
No entanto, ao julgar o REsp 1.112.557 representativo de controvérsia, o Superior Tribunal de Justiça relativizou o critério econômico previsto na legislação, admitindo a aferição da miserabilidade por outros meios de prova que não a renda per capita, consagrando os princípios da dignidade da pessoa humana e do livre convencimento do juiz:
RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA, QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
(...) 4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana, especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente o cidadão social e economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. Recurso Especial provido.
(REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009)
Nesse sentido, tenho adotado posição de flexibilizar os critérios de reconhecimento da miserabilidade, merecendo apenas adequação de fundamento frente à deliberação do Supremo Tribunal Federal, que, por maioria, ao analisar os recursos extraordinários 567.985 e 580.963, ambos submetidos à repercussão geral, reconheceu a inconstitucionalidade do § 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/1993 - LOAS, assim como do art. 34 da Lei 10.741/2003 - Estatuto do Idoso.
Com efeito, reconhecida a inconstitucionalidade do critério econômico objetivo em regime de repercussão geral, cabe ao julgador, na análise do caso concreto, aferir o estado de miserabilidade da parte autora e de sua família.
Mais recentemente, a Lei 13.146/2015 introduziu o § 11 no referido artigo 20 da LOAS, o qual dispõe que para concessão do benefício assistencial poderão ser utilizados outros elementos probatórios da condição de miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade, conforme regulamento.
Caso concreto
A autora, nascida em 20/11/1966 (carteira de identidade, fls. 17), aos 43 anos de idade requereu o benefício de auxílio-doença, em 22/03/2010, indeferido sob o argumento de que ausente a qualidade de segurada (fls. 55). Novo pedido de auxílio-doença foi formulado em 18/04/2012, mais uma vez indeferido com o mesmo fundamento (fls. 72). Na presente ação, ajuizada em 07/08/2014, a requerente busca a concessão de benefício assistencial.
Não há óbice ao fato de o requerimento administrativo ser pela concessão de auxílio-doença, enquanto o pedido nestes autos é de benefício assistencial, visto que a jurisprudência deste Regional consagrou a fungibilidade dos benefícios previdenciários de auxílio-doença e de aposentadoria por invalidez e do benefício assistencial ao deficiente, uma vez que todos possuem como requisito a redução ou supressão da capacidade laboral. Logo, cabe ao INSS, administrativamente, ou ao magistrado conceder o benefício adequado à situação fática, ainda que tenha sido formulado pedido diverso, sem incorrer em julgamento extra petita.
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. FUNGIBILIDADE. REQUISITOS. 1. Embora o pedido inicial do autor tenha sido de benefício por incapacidade (auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez), dois dos requisitos necessários para sua concessão (qualidade de segurado e carência) não foram preenchidos. Assim, considerando o caráter eminentemente social do direito previdenciário, é possível a fungibilidade dos benefícios pleiteados, pois se deve sempre atentar para o deferimento do benefício que melhor corresponda à situação demonstrada nos autos. 2. O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: a) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, de acordo com a redação original do art. 20 da LOAS, ou impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, conforme redação atual do referido dispositivo) ou idoso (neste caso, considerando-se, desde 1º de janeiro de 2004, a idade de 65 anos); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família. 2. Atendidos os pressupostos, deve ser concedido o benefício. (TRF4, APELREEX 0012943-17.2016.404.9999, QUINTA TURMA, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, D.E. 21/06/2017)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. FUNGIBILIDADE. Este Regional, em suas duas Turmas especializadas em Direito Previdenciário, tem o entendimento consolidado de que os benefícios previdenciários de auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e assistencial à pessoa com deficiência são fungíveis, cabendo ao magistrado (e mesmo ao INSS, em sede administrativa) conceder à parte ou a conversão, o benefício apropriado à sua condição fática, sem que disso resulte julgamento extra petita. (TRF4, AC 5009859-20.2016.404.9999, SEXTA TURMA, Relator MARCELO DE NARDI, juntado aos autos em 06/04/2017)
Superada a questão do requerimento administrativo, passo à análise dos requisitos para concessão de benefício assistencial.
a) Impedimentos de longo prazo
Perícia médica realizada em 11/08/2015 pelo médico do trabalho Juarez Antônio Guarienti concluiu que a requerente, 48 anos, agricultora, era portadora de obesidade mórbida, diabetes, hipertrofia ventricular severa, ectasia aórtica e dislipidemia, patologias que geravam incapacidade total desde 03/2009, por período indeterminado, havendo indicação cirúrgica. Consignou no laudo que a autora tinha dificuldade para caminhar, apresentava edema importante nos membros inferiores e obesidade mórbida, pesando 165 quilos (fls. 103-106).
Comprovado o requisito impedimentos de longo prazo, procedo à análise da situação socioeconômica da família da autora.
b) Condição socioeconômica
O estudo socioeconômico, realizado em março de 2015, apontou que a autora, Nair (48 anos), vivia com o marido, Elsio (52 anos), em casa própria, em madeira, grande, em bom estado de conservação, com sala, cozinha e quartos, guarnecida com móveis modestos, situada na cidade de Giruá/RS. A renda familiar, na data da perícia, era de um salário mínimo, percebido pelo marido a título de auxílio-doença.
Na visita domiciliar, a autora relatou que foi morar na cidade há dois anos (em 2013), quando deixou de trabalhar na agricultura, em razão de sua doença. Afirmou que hoje é dona de casa, realizando tão somente os afazeres domésticos em ritmo prolongado, devido à obesidade mórbida, diabetes e hipertensão. Mencionou que tem dificuldade de locomoção e que quando necessita ir ao posto de saúde ou ao mercado depende da ajuda dos vizinhos ou precisa chamar um táxi. Referiu que os medicamentos são fornecidos pelo sistema público de saúde e que quando precisa consultar o especialista em endocrinologia consegue transporte até a cidade vizinha de Santa Rosa (fls. 87-89).
Em consulta ao CNIS, observa-se que ao tempo do primeiro pedido administrativo, em 03/2010, o marido da autora estava desempregado há poucos dias. Em 01/10/2010 ele voltou a laborar, com remuneração pouco superior a um salário mínimo, vínculo que se estendeu até 07/05/2013. Verifica-se que em 2011 a remuneração média passou a ser de um salário mínimo e meio, aumentando para a faixa de dois salários mínimos nos anos de 2012 e 2013. O cônjuge esteve laborando também entre 01/2014 e 05/2014, tendo deferida a aposentadoria por tempo de contribuição em 08/2014, benefício com DIB em 02/08/2010 e no valor de um salário mínimo mensal, conforme consta do sistema Plenus.
Ademais, foram juntadas notas fiscais de venda de produção rural relativas aos anos de 2008 e 2009, totalizando a comercialização de seis mil quilos de soja em cada ano, com renda anual na faixa de R$ 4.000,00 (fls. 19-26), assim como contrato de comodato de imóvel rural firmado pela autora, referente a uma área de quatro hectares, com prazo entre 03/2008 e 03/2013 (fls. 27-28).
Tais dados corroboram as informações prestadas pela requerente no dia da visita domiciliar da assistente social (fls. 87-89) e na entrevista rural perante o INSS (fls. 30-31), no sentido de que ela laborou na agricultura, com o auxílio do marido, até 2013, quando foram morar na cidade.
Com base nos elementos carreados aos autos, conclui-se que o núcleo familiar, formado pela requerente (incapacitada em razão de obesidade mórbida, diabetes e hipertensão) e pelo marido (com 52 anos na data da perícia), vive em uma residência própria, simples, mas em boas condições, contando com a aposentadoria por tempo de contribuição de um salário mínimo percebida pelo cônjuge. Ademais, não foram referidos gastos extraordinários, sendo que os medicamentos e consultas médicas são acessados na rede pública de saúde. Por outro lado, no período prévio à mudança para a cidade (anteriormente a 2013) também não se verifica situação de vulnerabilidade, visto que o marido da autora continuou laborando boa parte do tempo, com remuneração superior ao salário mínimo, somada à eventual renda proveniente da atividade rural.
Portanto, não verificada a situação de miserabilidade, não merece guarida a apelação, mantendo-se a sentença de improcedência.
Ônus sucumbenciais
Mantida a improcedência, a verba honorária deve ser majorada de R$ 800,00 para R$ 1.200,00, nos termos do art. 85, § 11, do CPC/2015. Custas processuais a cargo da parte vencida. A condenação em ônus sucumbenciais resta suspensa em virtude da concessão de gratuidade da justiça.
Conclusão
Não conhecido o agravo retido. Negado provimento ao apelo da parte autora e majorada a verba honorária para R$ 1.200,00, cuja exigibilidade resta suspensa em virtude da concessão de gratuidade da justiça.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por não conhecer do agravo retido e negar provimento à apelação da autora.
Juíza Federal Gisele Lemke
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 26/09/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0014614-75.2016.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00018859320148210100
RELATOR | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
PRESIDENTE | : | Luiz Carlos Canalli |
PROCURADOR | : | Dra. Solange Mendes de Souza |
APELANTE | : | NAIR TAVARES CORIM |
ADVOGADO | : | Jones Izolan Treter |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 26/09/2017, na seqüência 1, disponibilizada no DE de 11/09/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NÃO CONHECER DO AGRAVO RETIDO E NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA AUTORA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
VOTANTE(S) | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
: | Des. Federal LUIZ CARLOS CANALLI | |
: | Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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