| D.E. Publicado em 01/09/2016 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0013347-44.2011.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | ADRELIS MACHADO DOS SANTOS |
ADVOGADO | : | César Augusto Zortéa e outro |
EMENTA
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. CONCESSÃO. PORTADOR DE DEFICIÊNCIA. CONDIÇÃO SOCIOECONÔMICA. MISERABILIDADE. PREENCHIMENTO DE REQUISITOS. TERMO INICIAL. CONSECTÁRIOS LEGAIS. IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
1. O direito ao benefício assistencial, previsto no art. 203, V, da Constituição Federal, e nos arts. 20 e 21 da Lei 8.742/93 (LOAS) pressupõe o preenchimento de dois requisitos: a) condição de pessoa com deficiência ou idosa e b) situação de risco social, ou seja, de miserabilidade ou de desamparo.
2. Reconhecida a inconstitucionalidade do critério econômico objetivo em regime de repercussão geral, bem como a possibilidade de admissão de outros meios de prova para verificação da hipossuficiência familiar, cabe ao julgador, na análise do caso concreto, aferir o estado de miserabilidade da parte autora e de sua família.
3. Preenchidos os requisitos no caso em apreço, é de ser concedido o benefício pleiteado.
4. As informações trazidas aos autos indicam que a requerente já estava incapacitada quando pediu administrativamente o benefício. No entanto, à míngua de recurso da parte autora, deve ser mantida a sentença que concedeu o benefício assistencial desde 21/11/2011, data em que a autora sofreu um acidente vascular cerebral.
5. Juros e correção monetária na forma do art. 1º-F, da Lei n.º 9.494/97, com a redação dada pela Lei n.º 11.960/2009.
6. O cumprimento imediato da tutela específica independe de requerimento expresso do segurado ou beneficiário, e o seu deferimento sustenta-se na eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 461 do CPC/1973, bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537 do CPC/2015.
7. A determinação de implantação imediata do benefício, com fundamento nos artigos supracitados, não configura violação dos artigos 128 e 475-O, I, do CPC e 37 da Constituição Federal.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, determinando a imediata implantação do benefício nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 23 de agosto de 2016.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal ROGER RAUPP RIOS, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8471877v2 e, se solicitado, do código CRC 34AE981E. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Roger Raupp Rios |
| Data e Hora: | 24/08/2016 17:59 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0013347-44.2011.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | ADRELIS MACHADO DOS SANTOS |
ADVOGADO | : | César Augusto Zortéa e outro |
RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária ajuizada por Andrelis Machado dos Santos em face do INSS, em que requer benefício assistencial por estar incapacitada para laborar, devido a várias patologias cardíacas.
Foi proferida sentença de improcedência (fls. 56), anulada por esta Corte em sede de apelação, sendo determinada a produção de prova pericial (fls. 70-72). Veio aos autos petição, informando que a autora teve um acidente vascular cerebral isquêmico em 21/11/2011, renovando o pedido para concessão de tutela antecipada (fls. 79-80), a qual foi deferida (fls. 83)
Sentenciando, o R. Juízo confirmou a antecipação de tutela e julgou parcialmente procedente o pedido, para conceder o benefício assistencial desde a data que em que a autora sofreu o AVC (em 21/11/2011), condenando-se o INSS ao pagamento das parcelas vencidas, acrescidas de correção monetária e juros de mora, nos termos da Lei 9.494/97 até 23/03/2015, a partir de quando passaria a incidir o IPCA-E a título de correção e juros moratórios de 6% ao ano. A autarquia foi onerada, ainda, com o pagamento de honorários periciais e de honorários advocatícios de 10% do valor das parcelas vencidas e de despesas processuais por metade.
Inconformado, o INSS apelou, sustentando que o termo inicial do benefício deveria ser a data da perícia médica, em 25/01/2014, descontando-se os valores já percebidos a título de tutela antecipada. Pede que seja afastada a condenação em honorários periciais, uma vez que, quando do indeferimento administrativo do benefício, não havia incapacidade. Pugna pela aplicação integral da Lei 11.960/2009 no que concerne aos consectários legais, inclusive, no período posterior a 03/2015.
O Ministério Público aduziu que não era caso de sua intervenção (fls. 186-188).
Com contrarrazões, vieram os autos conclusos para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Do novo CPC (Lei 13.105/2015)
Consoante a norma inserta no art. 14 do atual CPC, Lei 13.105, de 16/03/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Portanto, apesar da nova normatização processual ter aplicação imediata aos processos em curso, os atos processuais já praticados, perfeitos e acabados não podem mais ser atingidos pela mudança ocorrida a posteriori.
Nesse sentido, serão examinados segundo as normas do CPC de 2015 tão somente os recursos e remessas em face de sentenças/acórdãos publicado(a)s a contar do dia 18/03/2016.
Da ordem cronológica dos processos
Dispõe o art. 12 do atual CPC (Lei nº 13.105/2015, com redação da Lei nº 13.256/2016) que "os juízes e os tribunais atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão", estando, contudo, excluídos da regra do caput, entre outros, "as preferências legais e as metas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça" (§2º, inciso VII), bem como "a causa que exija urgência no julgamento, assim reconhecida por decisão fundamentada" (§2º, inciso IX).
O caso presente encontra-se dentre aqueles considerados urgentes no julgamento, vez que se refere a benefício por incapacidade, estando a parte autora, hipossuficiente, hipoteticamente impossibilitada de laborar e obter o sustento seu e de familiares.
Da remessa oficial
O Colendo Superior Tribunal de Justiça (STJ), seguindo a sistemática dos recursos repetitivos, decidiu que é obrigatório o reexame de sentença ilíquida proferida contra a União, Estados, Distrito Federal e Municípios e as respectivas autarquias e fundações de direito público. (REsp 1101727/PR, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, Corte Especial, julgado em 04/11/2009, DJe 03/12/2009).
Ainda que o juízo a quo não tenha determinado a remessa oficial, considerando que não houve a liquidação da condenação, a hipótese não se insere nas causas de dispensa previstas nos Códigos Processuais de 1973 e de 2015, razão pela qual far-se-á de ofício o reexame necessário.
Da controvérsia nos autos
A controvérsia recursal cinge-se à comprovação da incapacidade da parte autora.
Do benefício assistencial
Trata a presente ação do direito da parte autora à percepção do benefício assistencial previsto no art. 203, V, da Constituição Federal de 1988, e regulado nos arts. 20 e 21 da Lei 8.742/93, a Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), com as alterações introduzidas pelas Leis 9.720/1998, 12.435/2011, 12.470/2011 e 13.146/2015.
Pela redação atual, decorrente da pela Lei 12.435/2011, o benefício de prestação continuada é a garantia de um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência ou ao idoso com 65 ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
Logo, a concessão do benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos:
a) condição de deficiente ou idoso (65 anos ou mais, a partir de 1º de janeiro de 2004, quando passou a viger o Estatuto do Idoso - Lei 10.741/2003); e
b) situação de risco social - ausência de meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, caracterizando situação de miserabilidade ou de desamparo.
Na redação original do art. 20, § 2º, da Lei 8.742/93, era considerada portadora de deficiência a pessoa incapacitada para a vida independente e para o trabalho. A Lei 12.470/2011 definiu a pessoa com deficiência como aquela com impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. Já a Lei 13.146/2015 alterou apenas a parte referente às barreiras, ao referir que é deficiente quem tem impedimentos de longo prazo, os quais, em contato com uma ou mais barreiras, podem obstruir sua participação plena e em igualdade de condições na sociedade.
Importante referir que deficiência não significa que a pessoa possua uma vida vegetativa, dependente totalmente de terceiros, e que não tenha condições de locomover-se, de comunicar-se e de executar atividades básicas, como higienizar-se, vestir-se e alimentar-se com autonomia.
Do conceito de família
A família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto, nos termos do art. 20, § 1º, da Lei 8.742/93 (com redação da Lei 12.435/2011).
Registre-se que o conceito acima não contempla todos os desenhos familiares existentes na sociedade contemporânea. A interpretação literal pode levar o julgador a contrariar o objetivo da norma constitucional, que prevê socorro do Poder Público ao portador de deficiência e ao idoso em situação de risco social. Assim, tenho que o rol de integrantes da família elencado na legislação ordinária não é taxativo, merecendo análise acurada no caso concreto.
Da condição socioeconômica
Quanto ao critério econômico, o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 dispõe que se considera incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 do salário mínimo.
No entanto, ao julgar o REsp 1.112.557 representativo de controvérsia, o Superior Tribunal de Justiça relativizou o critério econômico previsto na legislação, admitindo a aferição da miserabilidade por outros meios de prova que não a renda per capita, consagrando os princípios da dignidade da pessoa humana e do livre convencimento do juiz, nos seguintes termos:
RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA, QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
(...) 4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana, especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente o cidadão social e economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. Recurso Especial provido.
(REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009)
O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE 567.985/MT, com repercussão geral reconhecida, reviu posicionamento anterior e declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do referido § 3º do art. 20 da Lei 8.742/93.
Consta da ementa do julgado:
(...) foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a Municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas. O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores posicionamentos acerca da intransponibilidade do critérios objetivos. Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro)
(RE 567985, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 18/04/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-194 DIVULG 02-10-2013 PUBLIC 03-10-2013)
Nessa senda, reconhecida a inconstitucionalidade do critério econômico objetivo em regime de repercussão geral, bem como a possibilidade de admissão de outros meios de prova para verificação da hipossuficiência familiar, tenho que cabe ao julgador, na análise do caso concreto, aferir o estado de miserabilidade da parte autora e de sua família.
Caso concreto
a) Condição de pessoa com deficiência
A parte autora nasceu em 24/03/1977, contando com 32 anos à época do requerimento administrativo, formulado em 09/2009. A presente ação foi ajuizada em 13/10/2009.
A incapacidade foi comprovada por meio da perícia médica, realizada em 08/01/2014 pelo médico Vitor Rizowy, cuja conclusão foi no sentido de que a requerente, 37 anos, doméstica encontrava-se incapacitada de forma total e permanente, uma vez que dependia de cadeira de rodas e necessitava de auxílio de terceiros para se locomover e realizar as atividades diárias, após acidente vascular encefálico com perda de forças do lado direito do corpo. Relatou que a autora apresentava também problemas para se comunicar, por dificuldades na fala em decorrência do AVC.
O médico relatou que em 07/2008 Andrelis foi internada com infarto agudo do miocárdio extenso, complicado com choque cardiogênico, quando houve colocação de stent. Em 02/2009, houve nova internação, para colocação de ponte de safena e implante mamário, tendo alta hospitalar com severa disfunção do ventrículo esquerdo e insuficiência cardíaca congestiva. A terceira internação ocorreu em 21/11/2011, em razão de acidente vascular cerebral isquêmico por trombose em artéria cerebral, apresentando paresias em membros direitos, tendo alta com sequelas já relatadas no laudo (fls. 106-107).
Com base na sequência de internações referidas e na gravidade do quadro, conclui-se que, embora a autora fosse jovem, já se encontrava incapacitada para a sua atividade laboral como doméstica - atividade que envolve esforço físico e exige movimentação constante -, quando requereu o benefício assistencial, em 09/2009.
Ante tais considerações, tenho que, no caso dos autos, restou comprovada a incapacidade autorizadora da concessão do benefício.
b) Condição socioeconômica
Foram realizados dois estudos sociais. O primeiro, em 06/10/2010, apontou que a autora, Andrelis (33 anos), residia na casa do tio Luis Carlos (70 anos), aposentado, que recebia um salário mínimo mensal, e com os três filhos: Maurício (13 anos), Vinicius (10 anos) e Andriele (7 anos). Conforme a assistente social, a família vivia em uma casa de alvenaria, com seis peças, guarnecida com móveis e utensílios simples, situada em Arroio do Sal/RS. Informou que a autora não conseguia laborar, devido a vários problemas de saúde, apresentando cansaço e tonturas (fls. 50-52).
Novo estudo foi realizado em 18/11/2014, apontando que a autora, agora com 37 anos, vivia com o companheiro, Luiz (74 anos). A assistente social relatou que a requerente apresentava sequelas motoras de AVC ocorrido há três anos, deslocando-se em cadeira de rodas e apresentando comprometimento parcial da fala. Informou que a renda familiar era de um salário mínimo, proveniente do benefício assistencial concedido em antecipação de tutela à autora. Referiu que viviam em uma residência própria, de alvenaria, com três quartos, sala, cozinha e banheiro, em condições de higiene precárias, localizada em Arroio do Sal/RS. Mencionou que os vizinhos auxiliavam o casal com alimentos. O parecer da assistente social foi favorável à concessão do benefício (fls. 164-167).
Com base em tais informações, depreende-se que a parte autora está em evidente risco social, necessitando do benefício assistencial para garantir uma sobrevivência digna.
Em vista disso, preenchidos ambos os requisitos legais, deve ser mantida a sentença que determinou a concessão do benefício assistencial, descontadas as parcelas já pagas a título de antecipação de tutela, ponto no qual o apelo do INSS merece guarida.
Do termo inicial do benefício
O juiz fixou como termo inicial do benefício a data de 21/11/2011, quando a autora sofreu um acidente vascular isquêmico, que a deixou com sequelas motoras e na fala. No entanto, considerando as informações trazidas aos autos, que referem uma sequência de internações por problemas cardíacos graves desde 2008, culminando com o AVC em 2011, tenho que em 09/2009, quando requereu o benefício assistencial, a autora já se encontrava incapacitada.
Logo, o termo inicial do benefício seria na data de protocolização do requerimento administrativo. No entanto, à míngua de recurso da parte autora, deve ser mantida a sentença que concedeu o benefício assistencial desde 21/11/2011, não havendo que se falar em prescrição.
O apelo do INSS não merece acolhida.
Dos consectários legais
Correção monetária
A correção monetária, segundo o entendimento consolidado na 3ª Seção deste TRF4, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, quais sejam:
- ORTN (10/64 a 02/86, Lei nº 4.257/64);
- OTN (03/86 a 01/89, Decreto-Lei nº 2.284/86);
- BTN (02/89 a 02/91, Lei nº 7.777/89);
- INPC (03/91 a 12/92, Lei nº 8.213/91);
- IRSM (01/93 a 02/94, Lei nº 8.542/92);
- URV (03 a 06/94, Lei nº 8.880/94);
- IPC-r (07/94 a 06/95, Lei nº 8.880/94);
- INPC (07/95 a 04/96, MP nº 1.053/95);
- IGP-DI (05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6.º, da Lei n.º 8.880/94);
- INPC (de 04/2006 a 29/06/2009, conforme o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, combinado com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91).
- TR (a partir de 30/06/2009, conforme art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/2009)
O Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento das ADIs 4.357 e 4.425, declarou a inconstitucionalidade por arrastamento do art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/2009, afastando a utilização da TR como fator de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública, relativamente ao período entre a respectiva inscrição em precatório e o efetivo pagamento.
Em consequência dessa decisão, e tendo presente a sua ratio, a 3ª Seção desta Corte vinha adotando, para fins de atualização dos débitos judiciais da Fazenda Pública, a sistemática anterior à Lei nº 11.960/2009, o que significava, nos termos da legislação então vigente, apurar-se a correção monetária segundo a variação do INPC, salvo no período subsequente à inscrição em precatório, quando se determinava a utilização do IPCA-E.
Entretanto, a questão da constitucionalidade do uso da TR como índice de atualização das condenações judiciais da Fazenda Pública, antes da inscrição do débito em precatório, teve sua repercussão geral reconhecida no RE 870.947, e aguarda pronunciamento de mérito do STF. A relevância e a transcendência da matéria foram reconhecidas especialmente em razão das interpretações que vinham ocorrendo nas demais instâncias quanto à abrangência do julgamento nas ADIs 4.357 e 4.425.
Recentemente, em sucessivas Reclamações, a Suprema Corte vem afirmando que, no julgamento das ADIs em referência, a questão constitucional decidida restringiu-se à inaplicabilidade da TR ao período de tramitação dos precatórios, de forma que a decisão de inconstitucionalidade por arrastamento foi limitada à pertinência lógica entre o art. 100, § 12, da CRFB e o artigo 1º-F da Lei 9.494/97, na redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/2009. Em consequência, as Reclamações vêm sendo acolhidas, assegurando-se que, ao menos até que sobrevenha decisão específica do STF, seja aplicada a legislação em referência na atualização das condenações impostas à Fazenda Pública, salvo após inscrição em precatório. Os pronunciamentos sinalizam, inclusive, para eventual modulação de efeitos, acaso sobrevenha decisão mais ampla quanto à inconstitucionalidade do uso da TR para correção dos débitos judiciais da Fazenda Pública (Rcl 19.050, Rel. Min. Roberto Barroso; Rcl 21.147, Rel. Min. Cármen Lúcia; Rcl 19.095, Rel. Min. Gilmar Mendes).
Em tais condições, com o objetivo de guardar coerência com os mais recentes posicionamentos do STF sobre o tema, e para prevenir a necessidade de futuro sobrestamento dos feitos apenas em razão dos consectários, a melhor solução a ser adotada, por ora, é orientar para aplicação do critério de atualização estabelecido no art. 1º-F da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009.
Este entendimento não obsta a que o juízo de execução observe, quando da liquidação e atualização das condenações impostas ao INSS, o que vier a ser decidido pelo STF em regime de repercussão geral, bem como eventual regramento de transição que sobrevenha em sede de modulação de efeitos.
Juros de mora
Até 29-06-2009 os juros de mora, apurados a contar da data da citação, devem ser fixados à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009. Os juros devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, 5ª Turma, AgRg no AgRg no Ag 1211604/SP, Rel. Min. Laurita Vaz).
Quanto ao ponto, esta Corte já vinha entendendo que no julgamento das ADIs 4.357 e 4.425 não houvera pronunciamento de inconstitucionalidade sobre o critério de incidência dos juros de mora previsto na legislação em referência.
Esta interpretação foi, agora, chancelada, pois, no exame do Recurso Extraordinário 870.947, o STF reconheceu repercussão geral não apenas à questão constitucional pertinente ao regime de atualização monetária das condenações judiciais da Fazenda Pública, mas também à controvérsia pertinente aos juros de mora incidentes.
Em tendo havido a citação já sob a vigência das novas normas, inaplicáveis as disposições do Decreto-lei 2.322/87, incidindo apenas os juros da caderneta de poupança, sem capitalização.
Acolhido o apelo do INSS e a remessa oficial, para determinar a aplicação da Lei 11.960/2009 no que tange aos consectários legais.
Das custas processuais
Havendo o feito tramitado perante a Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, o INSS está isento do pagamento de custas, mas obrigado ao pagamento de eventuais despesas processuais, consoante o disposto no art. 11 da Lei Estadual n. 8.121/85, na redação dada pela Lei n. 13.471, de 23 de junho de 2010.
Dos honorários advocatícios e periciais
Os honorários advocatícios são devidos pelo INSS no percentual de 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforma a sentença de improcedência, nos termos da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça e Súmula nº 76 deste TRF.
Honorários periciais a cargo da parte vencida.
Não merece guarida o pleito da autarquia, para que afastada a condenação em honorários periciais, uma vez que não havia incapacidade quando indeferido administrativamente o benefício assistencial à autora. Conforme já referido, o laudo pericial narrou uma série de internações hospitalares da autora desde 2008, por problemas graves de saúde, que a impossibilitaram de continuar laborando, o que permite depreender que estava incapacitada quando formulou o pedido administrativo, em 09/2009.
Negado provimento ao apelo do INSS no que concerne aos honorários periciais.
Da implantação do benefício
A Terceira Seção desta Corte, ao julgar a Questão de Ordem na Apelação Cível nº 2002.71.00.050349-7, firmou entendimento no sentido de que, nas causas previdenciárias, deve-se determinar a imediata implementação do benefício, valendo-se da tutela específica da obrigação de fazer prevista no art. 461 do CPC/1973, bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537 do CPC/2015, independentemente de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário (QUOAC 2002.71.00.050349-7, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, D.E. 01/10/2007).
Em razão disso, sendo procedente o pedido, o INSS deverá implantar o benefício concedido no prazo de 45 dias, consoante os parâmetros acima definidos, sob pena de multa.
Cumpre esclarecer que, em se tratando de benefício já concedido em sede de antecipação de tutela na sentença ou em agravo de instrumento, dada a provisoriedade do provimento, é de torná-lo definitivo desde logo, em face do seu caráter alimentar.
Em homenagem aos princípios da celeridade e da economia processual, tendo em vista que o INSS vem opondo embargos de declaração sempre que determinada a implantação imediata do benefício, alegando, para fins de prequestionamento, violação dos artigos 128 e 475-O, I, do CPC/1973, e 37 da CF/1988, esclareço que não se configura a negativa de vigência a tais dispositivos legais e constitucionais. Isso porque, em primeiro lugar, não se está tratando de antecipação ex officio de atos executórios, mas, sim, de efetivo cumprimento de obrigação de fazer decorrente da própria natureza condenatória e mandamental do provimento judicial; em segundo lugar, não se pode, nem mesmo em tese, cogitar de ofensa ao princípio da moralidade administrativa, uma vez que se trata de concessão de benefício previdenciário determinada por autoridade judicial competente.
Conclusão
O apelo do INSS e a remessa oficial foram providos, para o fim de determinar a aplicação da Lei 11.960/2009 no que tange aos consectários legais e que sejam descontadas as parcelas já pagas a título de antecipação de tutela. Determinada a imediata implantação do benefício.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, determinando a imediata implantação do benefício.
É o voto.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal ROGER RAUPP RIOS, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8471876v3 e, se solicitado, do código CRC 60F4724F. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Roger Raupp Rios |
| Data e Hora: | 24/08/2016 17:59 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 23/08/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0013347-44.2011.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00469914120098210072
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Flávio Augusto de Andrade Strapason |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | ADRELIS MACHADO DOS SANTOS |
ADVOGADO | : | César Augusto Zortéa e outro |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 23/08/2016, na seqüência 446, disponibilizada no DE de 28/07/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E À REMESSA OFICIAL, DETERMINANDO A IMEDIATA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ | |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
| Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8544560v1 e, se solicitado, do código CRC EC2032D6. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Lídice Peña Thomaz |
| Data e Hora: | 24/08/2016 00:30 |
