| D.E. Publicado em 13/09/2016 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0021687-40.2012.4.04.9999/PR
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | ANA CAROLINE ANTONUSSI COSTA |
ADVOGADO | : | Morgana Iglesias Costa |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA COMARCA DE TERRA RICA/PR |
EMENTA
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. CONCESSÃO. PORTADOR DE DEFICIÊNCIA. CONDIÇÃO SOCIOECONÔMICA. MISERABILIDADE. PREENCHIMENTO DE REQUISITOS. TERMO INICIAL. CONSECTÁRIOS LEGAIS. IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
1. O direito ao benefício assistencial, previsto no art. 203, V, da Constituição Federal, e nos arts. 20 e 21 da Lei 8.742/93 (LOAS) pressupõe o preenchimento de dois requisitos: a) condição de pessoa com deficiência ou idosa e b) situação de risco social, ou seja, de miserabilidade ou de desamparo.
2. Reconhecida a inconstitucionalidade do critério econômico objetivo em regime de repercussão geral, bem como a possibilidade de admissão de outros meios de prova para verificação da hipossuficiência familiar, cabe ao julgador, na análise do caso concreto, aferir o estado de miserabilidade da parte autora e de sua família.
3. Preenchidos os requisitos no caso em apreço, é de ser concedido o benefício pleiteado.
4. O termo inicial do benefício deve ser a data do ajuizamento desta ação, uma vez que reconhecida a existência de coisa julgada nos autos n. 2006.70.11.000422-3, que tramitaram no Juizado Especial Federal de Paranavaí/PR, com trânsito em julgado em 2007.
5. Juros e correção monetária na forma do art. 1º-F, da Lei n.º 9.494/97, com a redação dada pela Lei n.º 11.960/2009.
6. O cumprimento imediato da tutela específica independe de requerimento expresso do segurado ou beneficiário, e o seu deferimento sustenta-se na eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 461 do CPC/1973, bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537 do CPC/2015.
7. A determinação de implantação imediata do benefício, com fundamento nos artigos supracitados, não configura violação dos artigos 128 e 475-O, I, do CPC e 37 da Constituição Federal.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao apelo do INSS e à remessa oficial, determinando a imediata implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 06 de setembro de 2016.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal ROGER RAUPP RIOS, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8476644v4 e, se solicitado, do código CRC 9270ED7B. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Roger Raupp Rios |
| Data e Hora: | 06/09/2016 18:24 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0021687-40.2012.4.04.9999/PR
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | ANA CAROLINE ANTONUSSI COSTA |
ADVOGADO | : | Morgana Iglesias Costa |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA COMARCA DE TERRA RICA/PR |
RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária ajuizada pela menor Ana Caroline Antonussi Costa, representada nestes autos pela genitora, Lucimar Antonussi Costa, em face do INSS, com o intuito de obter o benefício assistencial a partir da DER, em 01/02/2006.
Sentenciando, o MM. Magistrado a quo concedeu a antecipação de tutela e julgou procedente o pedido para conceder o benefício assistencial a menor com deficiência, a contar do requerimento na esfera administrativa, condenando-se o INSS ao pagamento de custas processuais e de honorários advocatícios, arbitrados em 15% do valor da condenação.
O INSS, em suas razões, sustenta a ocorrência de coisa julgada, uma vez que foi ajuizada ação idêntica, com mesmo pedido e causa de pedir, no Juizado Especial de Paranavaí (PR), julgada improcedente, com trânsito em julgado em 2007. Em 2011, foi ajuizada a presente ação no Juízo Estadual, na Comarca de Terra Rica (PR). Aduz que a extinção do processo pelo Juizado Especial tornou aquele juízo prevento. Assevera que entendimento contrário afrontaria o princípio do juiz natural. Caso ultrapassadas as preliminares, pugna pela improcedência do pedido com base nos argumentos expostos na contestação: que a autora não era incapaz para a vida independente, que não houve novo requerimento administrativo para concessão do benefício e que a renda familiar ultrapassava o limite legal. Pede a extinção do processo sem julgamento do mérito ou a anulação de todo o processo, com remessa dos autos ao Juizado Especial de Paranavaí.
O Ministério Público opinou pelo desprovimento da apelação do INSS (fls. 112).
Com contrarrazões e por força da remessa oficial, vieram os autos conclusos.
Nesta Corte, em decisão por maioria, foi anulada a sentença e determinada a reabertura da instrução processual, para que produzido o estudo socioeconômico, mantendo-se a antecipação de tutela concedida. Outrossim, a Turma reconheceu a ocorrência de coisa julgada em relação à pretensão de concessão do benefício assistencial desde 2006, admitindo-se a apreciação do pedido a partir do ajuizamento desta demanda, em 2011 (fls. 126-128).
Sobrevieram embargos de declaração, em que o INSS aduziu que não fora analisada a eficácia preclusiva da coisa julgada (fls. 131-133), aos quais foi negado provimento (fls. 134-137).
O INSS interpôs recurso especial (fls. 139-144) e recurso extraordinário (fls. 146-153), ambos inadmitidos por decisão desta Vice-Presidência (fls. 177-180). Das decisões que inadmitiram os recursos, foram interpostos agravos ao STJ (fls. 184-191) e ao STF (fls. 193-196), aos quais foi negado provimento (no STJ, fls. 204-207) e negado seguimento (no STF, fls. 209).
O Magistrado da Comarca de Terra Rica/PR proferiu despacho, determinando a realização de estudo socioeconômico (fls. 213), produzido em 03/06/2015 (fls. 215- 217).
O R. Juízo a quo confirmou a antecipação de tutela e proferiu sentença de procedência, para que concedido de forma imediata o benefício assistencial à requerente (sem fixar o termo inicial), sob pena de multa diária de R$ 100,00. Condenou o INSS ao pagamento de custas processuais e de honorários advocatícios de 15% sobre o valor da condenação (fls. 240-245).
A autarquia apelou, sustentando que a mãe da requerente é professora, percebendo renda mensal de R$ 1.320,00, e que o pai recebe remuneração mensal de R$ 1.100,00, não havendo que se falar em miserabilidade. Assevera que dispõem, ainda, de um veículo que, segundo a parte autora, foi obtido por meio de doação de familiares, embora não tenha comprovado tal alegação. Pede a reforma da sentença, para que julgado improcedente o pedido. Caso mantido o decisum, requer que a DIB seja fixada na data do ajuizamento da ação, que os honorários advocatícios sejam reduzidos e que seja aplicado o art. 1º-F da Lei 9.494/97 no que tange aos consectários legais.
O Ministério Público opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 296).
Com contrarrazões e por força da remessa oficial, vieram os autos conclusos.
É o relatório.
VOTO
Do novo CPC (Lei 13.105/2015)
Consoante a norma inserta no art. 14 do atual CPC, Lei 13.105, de 16/03/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Portanto, apesar da nova normatização processual ter aplicação imediata aos processos em curso, os atos processuais já praticados, perfeitos e acabados não podem mais ser atingidos pela mudança ocorrida a posteriori.
Nesse sentido, serão examinados segundo as normas do CPC de 2015 tão somente os recursos e remessas em face de sentenças/acórdãos publicado(a)s a contar do dia 18/03/2016.
Da ordem cronológica dos processos
Dispõe o art. 12 do atual CPC (Lei nº 13.105/2015, com redação da Lei nº 13.256/2016) que "os juízes e os tribunais atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão", estando, contudo, excluídos da regra do caput, entre outros, "as preferências legais e as metas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça" (§2º, inciso VII), bem como "a causa que exija urgência no julgamento, assim reconhecida por decisão fundamentada" (§2º, inciso IX).
Dessa forma, deverão ter preferência de julgamento em relação àqueles processos que estão conclusos há mais tempo, aqueles feitos em que esteja litigando pessoa com mais de sessenta anos (idoso, Lei n. 10.741/2013), pessoas portadoras de doenças indicadas no art. 6º, inciso XIV, da Lei n. 7.713/88, as demandas de interesse de criança ou adolescente (Lei n. 8.069/90) ou os processos inseridos como prioritários nas metas impostas pelo CNJ.
Observado que o caso presente se enquadra em uma das hipóteses referidas (demanda de interesse de menor), justifica-se seja proferido julgamento fora da ordem cronológica de conclusão.
Da controvérsia nos autos
A controvérsia recursal cinge-se à comprovação da miserabilidade familiar.
Do benefício assistencial
Trata a presente ação do direito da parte autora à percepção do benefício assistencial previsto no art. 203, V, da Constituição Federal de 1988, e regulado nos arts. 20 e 21 da Lei 8.742/93, a Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), com as alterações introduzidas pelas Leis 9.720/1998, 12.435/2011, 12.470/2011 e 13.146/2015.
Pela redação atual, decorrente da pela Lei 12.435/2011, o benefício de prestação continuada é a garantia de um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência ou ao idoso com 65 ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família.
Logo, a concessão do benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos:
a) condição de deficiente ou idoso (65 anos ou mais, a partir de 1º de janeiro de 2004, quando passou a viger o Estatuto do Idoso - Lei 10.741/2003); e
b) situação de risco social - ausência de meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, caracterizando situação de miserabilidade ou de desamparo.
Na redação original do art. 20, § 2º, da Lei 8.742/93, era considerada portadora de deficiência a pessoa incapacitada para a vida independente e para o trabalho. A Lei 12.470/2011 definiu a pessoa com deficiência como aquela com impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. Já a Lei 13.146/2015 alterou apenas a parte referente às barreiras, ao referir que é deficiente quem tem impedimentos de longo prazo, os quais, em contato com uma ou mais barreiras, podem obstruir sua participação plena e em igualdade de condições na sociedade.
Importante referir que deficiência não significa que a pessoa possua uma vida vegetativa, dependente totalmente de terceiros, e que não tenha condições de locomover-se, de comunicar-se e de executar atividades básicas, como higienizar-se, vestir-se e alimentar-se com autonomia.
Do conceito de família
A família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto, nos termos do art. 20, § 1º, da Lei 8.742/93 (com redação da Lei 12.435/2011).
Registre-se que o conceito acima não contempla todos os desenhos familiares existentes na sociedade contemporânea. A interpretação literal pode levar o julgador a contrariar o objetivo da norma constitucional, que prevê socorro do Poder Público ao portador de deficiência e ao idoso em situação de risco social. Assim, tenho que o rol de integrantes da família elencado na legislação ordinária não é taxativo, merecendo análise acurada no caso concreto.
Da condição socioeconômica
Quanto ao critério econômico, o art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 dispõe que se considera incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 do salário mínimo.
No entanto, ao julgar o REsp 1.112.557 representativo de controvérsia, o Superior Tribunal de Justiça relativizou o critério econômico previsto na legislação, admitindo a aferição da miserabilidade por outros meios de prova que não a renda per capita, consagrando os princípios da dignidade da pessoa humana e do livre convencimento do juiz, nos seguintes termos:
RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA, QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
(...) 4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana, especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente o cidadão social e economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. Recurso Especial provido.
(REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009)
O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE 567.985/MT, com repercussão geral reconhecida, reviu posicionamento anterior e declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do referido § 3º do art. 20 da Lei 8.742/93.
Consta da ementa do julgado:
(...) foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a Municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas. O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores posicionamentos acerca da intransponibilidade do critérios objetivos. Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro)
(RE 567985, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 18/04/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-194 DIVULG 02-10-2013 PUBLIC 03-10-2013)
Nessa senda, reconhecida a inconstitucionalidade do critério econômico objetivo em regime de repercussão geral, bem como a possibilidade de admissão de outros meios de prova para verificação da hipossuficiência familiar, tenho que cabe ao julgador, na análise do caso concreto, aferir o estado de miserabilidade da parte autora e de sua família.
Caso concreto
a) Condição de pessoa com deficiência
A parte autora nasceu em 11/02/2005, contando com seis anos à época do ajuizamento da presente demanda, 13/05/2011. Conforme já relatado, foi formulado pedido administrativo em 1º/02/2006, que fundamentou a ação ajuizada perante o Juizado Especial de Paranavaí (autos n. 2006.70.11.000422-3), julgada improcedente, com trânsito em julgado em 17/01/2007. Com o agravamento da situação de saúde da autora, foi ajuizada a presente ação. Havendo reconhecimento de coisa julgada em relação à demanda anterior por decisão desta Corte a fls. 126-128, limita-se a análise da pretensão a partir do ajuizamento desta ação, em 13/05/2011.
Neste feito, o exame recursal abrange a apelação cível e a remessa oficial, expressamente interpostas diante da sentença recorrida (fls. 240-245).
Nessas circunstâncias, havendo recurso de apelação por parte do INSS, onde suscitados os tópicos indicados no relatório, tenho que quanto aos demais fundamentos de mérito a sentença deve ser confirmada por suas próprias razões, uma vez que lançada conforme a legislação aplicável. Tanto que a autarquia previdenciária deles teve expressa ciência e resolveu não se insurgir.
Condição socioeconômica
O estudo social, realizado em 03/06/2015, informou que residiam na mesma casa à época: a autora, Ana Caroline (10 anos); o pai, Alécio (34 anos); a mãe, Lucimar (40 anos); e o irmão, Gabriel (2 anos). A renda familiar era, na data da perícia, de R$ 1.320,00, proveniente do trabalho da mãe como professora. O pai da autora estava desempregado à época, realizando trabalhos eventuais, que não somavam um salário mínimo mensal (fls. 215).
A assistente social afirmou que a família vivia em uma casa própria, financiada, em alvenaria, com seis cômodos, em boas condições de higiene, guarnecida com utensílios básicos, localizada na cidade de Guairaçá/PR (fls. 215). Informou que possuíam um veículo adquirido com doações da família (veículo Meriva, ano 2005/2006, comprado em 2014 - fls. 228), que se sensibilizou diante da situação de Ana Caroline e da dificuldade em utilizar transporte público.
Quanto às despesas mensais, referiu que eram aplicados R$ 500,00 na parcela do financiamento habitacional, R$ 180,00 em fraldas, R$ 700,00 em medicamentos (deste total, a Secretaria Municipal da Saúde fornece R$ 180,00), R$ 1.000,00 em alimentação e R$ 400,00 em gastos com consultas e exames não oferecidos pela rede pública de saúde.
Relatou que Ana Caroline apresenta microcefalia, paralisia cerebral, refluxo, deslocamento do quadril, limitação visual, tetraplegia, disfagia orofaríngea grave, com dependência total para a alimentação, que deve ser triturada e coada, já que qualquer alimentação mais consistente pode ser aspirada para os pulmões. A autora usa fraldas e necessita de alimentação especial (alimentos funcionais - verduras, frutas, leite e derivados) e de exames periódicos e consultas médicas, não oferecidas pelo Sistema Único de Saúde. A requerente faz uso também de uma cadeira de rodas adaptada. O irmão de Ana Caroline, Gabriel, de dois anos, tem intolerância à lactose, o que gera gastos adicionais com alimentação (fls. 216).
O parecer da assistente social foi favorável à concessão do benefício, referindo expressamente que a casa financiada e a posse de um veículo automotivo não devem descaracterizar a vulnerabilidade social, uma vez que tais aquisições foram primordiais para garantir a saúde e o desenvolvimento da autora (fls. 216).
Em consulta ao CNIS, constata-se que o pai da autora permaneceu desempregado de 02/2015 a 01/2016, quando voltou a laborar, com salário médio de R$ 1.200,00.
O caso em tela guarda peculiaridade. Embora a renda familiar seja considerável - na faixa de R$ 2.5000,00, contabilizando o salário atual do genitor e da genitora da requerente - a grave situação de saúde de Ana Caroline, que demanda investimentos elevados para garantir uma condição de vida minimamente razoável, é um fator de ponderação.
Compulsando os autos, verifica-se que a parte autora é menor (nascida em 11/02/2005 - fls. 16), sofre de paralisia cerebral e retardo mental grave (fls. 75), em razão de trabalho de parto prolongado (fls. 35), resultando em comprometimento motor, deficiência mental e epilepsia refratária (fls. 26), deficiência visual grave (fls. 31), complicações pulmonares (fls. 35) e incontinência urinária (fls. 27), entre outras limitações. O laudo médico judicial, realizado a partir de exame feito em 23/01/2012, apontou que a doença está evoluindo com piora de maneira lenta e gradual desde a data do seu início (fls. 75). O expert referiu que a criança não consegue andar nem falar, sendo totalmente dependente dos familiares e apresentando convulsões com frequência (fls. 74).
Atestado emitido em 1º de dezembro de 2015 pela neuropediatra Ana Grabriela Ferrari Strang aponta que Ana Caroline apresenta sequelas definitivas de paralisia cerebral, com comprometimento global da função motora. Relata que a menina utiliza cadeira de rodas para locomoção, usa fraldas, precisa ser alimentada e necessita de um cuidador para todas as suas atividades, realizando fisioterapia motora e respiratória quatro vezes por semana (fls. 246).
Mais recentemente, foi juntado aos autos atestado emitido pela fisioterapeuta Lidiane de Souza Cruz e pela fonoaudiólogia Maria Júlia de Souza, em 01/04/2016, no qual informam que a autora realiza tratamento fisioterápico e fonoaudiológico devido a complicações da paralisia cerebral severa, apresentando quadro de pneumonia recorrente, causada pela disfagia orofaringe severa e distúrbios pulmonares, com grande quantidade de secreção e incapacidade de liberação e limpeza voluntária das vias aéreas. Afirmam que é fundamental o acompanhamento sistemático por tempo indeterminado com especialistas da área, pois a paciente corre iminente risco de vida perante possíveis broncoaspirações (fls. 277). As fotos coloacionadas aos autos ilustram as limitações da requerente (fls. 276).
Com base nestas informações, conclui-se que se trata de um caso extremo, excepcional, em que a autora se encontra em situação de vulnerabilidade social, razão pela qual não merece reforma a sentença que concedeu o benefício assistencial.
Do termo inicial
Ante o reconhecimento de coisa julgada nos autos n. 2006.70.11.000422-3, que tramitaram no Juizado Especial Federal de Paranavaí/PR, com trânsito em julgado em 2007 (fls. 126-128), o termo inicial do benefício assistencial concedido à parte autora deve ser na data do ajuizamento da ação, em 13/05/2011. Acolhido o apelo do INSS e a remessa oficial no ponto.
Dos consectários legais
Correção monetária
A correção monetária, segundo o entendimento consolidado na 3ª Seção deste TRF4, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, quais sejam:
- ORTN (10/64 a 02/86, Lei nº 4.257/64);
- OTN (03/86 a 01/89, Decreto-Lei nº 2.284/86);
- BTN (02/89 a 02/91, Lei nº 7.777/89);
- INPC (03/91 a 12/92, Lei nº 8.213/91);
- IRSM (01/93 a 02/94, Lei nº 8.542/92);
- URV (03 a 06/94, Lei nº 8.880/94);
- IPC-r (07/94 a 06/95, Lei nº 8.880/94);
- INPC (07/95 a 04/96, MP nº 1.053/95);
- IGP-DI (05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6.º, da Lei n.º 8.880/94);
- INPC (de 04/2006 a 29/06/2009, conforme o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, combinado com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91).
- TR (a partir de 30/06/2009, conforme art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/2009)
O Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento das ADIs 4.357 e 4.425, declarou a inconstitucionalidade por arrastamento do art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/2009, afastando a utilização da TR como fator de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública, relativamente ao período entre a respectiva inscrição em precatório e o efetivo pagamento.
Em consequência dessa decisão, e tendo presente a sua ratio, a 3ª Seção desta Corte vinha adotando, para fins de atualização dos débitos judiciais da Fazenda Pública, a sistemática anterior à Lei nº 11.960/2009, o que significava, nos termos da legislação então vigente, apurar-se a correção monetária segundo a variação do INPC, salvo no período subsequente à inscrição em precatório, quando se determinava a utilização do IPCA-E.
Entretanto, a questão da constitucionalidade do uso da TR como índice de atualização das condenações judiciais da Fazenda Pública, antes da inscrição do débito em precatório, teve sua repercussão geral reconhecida no RE 870.947, e aguarda pronunciamento de mérito do STF. A relevância e a transcendência da matéria foram reconhecidas especialmente em razão das interpretações que vinham ocorrendo nas demais instâncias quanto à abrangência do julgamento nas ADIs 4.357 e 4.425.
Recentemente, em sucessivas Reclamações, a Suprema Corte vem afirmando que, no julgamento das ADIs em referência, a questão constitucional decidida restringiu-se à inaplicabilidade da TR ao período de tramitação dos precatórios, de forma que a decisão de inconstitucionalidade por arrastamento foi limitada à pertinência lógica entre o art. 100, § 12, da CRFB e o artigo 1º-F da Lei 9.494/97, na redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/2009. Em consequência, as Reclamações vêm sendo acolhidas, assegurando-se que, ao menos até que sobrevenha decisão específica do STF, seja aplicada a legislação em referência na atualização das condenações impostas à Fazenda Pública, salvo após inscrição em precatório. Os pronunciamentos sinalizam, inclusive, para eventual modulação de efeitos, acaso sobrevenha decisão mais ampla quanto à inconstitucionalidade do uso da TR para correção dos débitos judiciais da Fazenda Pública (Rcl 19.050, Rel. Min. Roberto Barroso; Rcl 21.147, Rel. Min. Cármen Lúcia; Rcl 19.095, Rel. Min. Gilmar Mendes).
Em tais condições, com o objetivo de guardar coerência com os mais recentes posicionamentos do STF sobre o tema, e para prevenir a necessidade de futuro sobrestamento dos feitos apenas em razão dos consectários, a melhor solução a ser adotada, por ora, é orientar para aplicação do critério de atualização estabelecido no art. 1º-F da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009.
Este entendimento não obsta a que o juízo de execução observe, quando da liquidação e atualização das condenações impostas ao INSS, o que vier a ser decidido pelo STF em regime de repercussão geral, bem como eventual regramento de transição que sobrevenha em sede de modulação de efeitos.
Juros de mora
Até 29-06-2009 os juros de mora, apurados a contar da data da citação, devem ser fixados à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009. Os juros devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, 5ª Turma, AgRg no AgRg no Ag 1211604/SP, Rel. Min. Laurita Vaz).
Quanto ao ponto, esta Corte já vinha entendendo que no julgamento das ADIs 4.357 e 4.425 não houvera pronunciamento de inconstitucionalidade sobre o critério de incidência dos juros de mora previsto na legislação em referência.
Esta interpretação foi, agora, chancelada, pois, no exame do Recurso Extraordinário 870.947, o STF reconheceu repercussão geral não apenas à questão constitucional pertinente ao regime de atualização monetária das condenações judiciais da Fazenda Pública, mas também à controvérsia pertinente aos juros de mora incidentes.
Em tendo havido a citação já sob a vigência das novas normas, inaplicáveis as disposições do Decreto-lei 2.322/87, incidindo apenas os juros da caderneta de poupança, sem capitalização.
Acolhido o apelo do INSS e a remessa oficial, para determinar a aplicação do art. 1º-F da Lei 9.494/97 no que tange aos consectários legais.
Dos honorários advocatícios e periciais
Os honorários advocatícios são devidos pelo INSS no percentual de 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforma a sentença de improcedência, nos termos da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça e Súmula nº 76 deste TRF.
Honorários periciais a cargo da parte vencida.
Acolhida a apelação e a remessa oficial no tópico, para reduzir a verba honorária para 10% do valor das prestações vencidas.
Das custas processuais
Deve o INSS responder integralmente pelas custas devidas, uma vez que a isenção prevista no art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96 não se aplica às ações ajuizadas na Justiça Estadual do Paraná, a teor do que dispõe a Súmula nº 20 do TRF4, verbis:
O art. 8°, parágrafo 1°, da Lei 8620/93 não isenta o INSS das custas judiciais, quando demandado na Justiça Estadual.
Mantida a sentença no ponto.
Da implantação do benefício
A Terceira Seção desta Corte, ao julgar a Questão de Ordem na Apelação Cível nº 2002.71.00.050349-7, firmou entendimento no sentido de que, nas causas previdenciárias, deve-se determinar a imediata implementação do benefício, valendo-se da tutela específica da obrigação de fazer prevista no art. 461 do CPC/1973, bem como nos artigos 497, 536 e parágrafos e 537 do CPC/2015, independentemente de requerimento expresso por parte do segurado ou beneficiário (QUOAC 2002.71.00.050349-7, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, D.E. 01/10/2007).
Em razão disso, sendo procedente o pedido, o INSS deverá implantar o benefício concedido no prazo de 45 dias, consoante os parâmetros acima definidos, sob pena de multa.
Cumpre esclarecer que, em se tratando de benefício já concedido em sede de antecipação de tutela na sentença ou em agravo de instrumento, dada a provisoriedade do provimento, é de torná-lo definitivo desde logo, em face do seu caráter alimentar.
Em homenagem aos princípios da celeridade e da economia processual, tendo em vista que o INSS vem opondo embargos de declaração sempre que determinada a implantação imediata do benefício, alegando, para fins de prequestionamento, violação dos artigos 128 e 475-O, I, do CPC/1973, e 37 da CF/1988, esclareço que não se configura a negativa de vigência a tais dispositivos legais e constitucionais. Isso porque, em primeiro lugar, não se está tratando de antecipação ex officio de atos executórios, mas, sim, de efetivo cumprimento de obrigação de fazer decorrente da própria natureza condenatória e mandamental do provimento judicial; em segundo lugar, não se pode, nem mesmo em tese, cogitar de ofensa ao princípio da moralidade administrativa, uma vez que se trata de concessão de benefício previdenciário determinada por autoridade judicial competente.
Conclusão
O apelo do INSS e a remessa oficial foram parcialmente providos, para o fim de determinar: a) que o termo inicial do benefício assistencial seja na data do ajuizamento desta ação (13/05/2011); b) que a verba honorária seja reduzida para 10% das prestações vencidas; e c) a aplicação do art. 1º-F da Lei 9.494/97 no que tange aos consectários legais. Determinada a imediata implantação do benefício.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao apelo do INSS e à remessa oficial, determinando a imediata implantação do benefício.
É o voto.
Des. Federal ROGER RAUPP RIOS
Relator
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal ROGER RAUPP RIOS, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8476643v4 e, se solicitado, do código CRC D9A65B76. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Roger Raupp Rios |
| Data e Hora: | 06/09/2016 18:24 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 06/09/2016
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0021687-40.2012.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00009794220118160167
RELATOR | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
PRESIDENTE | : | Rogerio Favreto |
PROCURADOR | : | Dr. Carlos Eduardo Copetti Leite |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | ANA CAROLINE ANTONUSSI COSTA |
ADVOGADO | : | Morgana Iglesias Costa |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA COMARCA DE TERRA RICA/PR |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 06/09/2016, na seqüência 255, disponibilizada no DE de 17/08/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DO INSS E À REMESSA OFICIAL, DETERMINANDO A IMEDIATA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS |
: | Juiz Federal LUIZ ANTONIO BONAT | |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
| Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8574868v1 e, se solicitado, do código CRC 4F5092EF. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Lídice Peña Thomaz |
| Data e Hora: | 06/09/2016 19:06 |
