D.E. Publicado em 09/09/2015 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0006631-59.2015.4.04.9999/RS
RELATORA | : | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | VERA LUCIA ATAIDE GARCIA |
ADVOGADO | : | Jorge Francisco Guimaraes |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 3A VARA DA COMARCA DE SAO BORJA/RS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. CRITÉRIO ECONÔMICO. VULNERABILIDADE SOCIAL NÃO COMPROVADA.
1. O benefício assistencial é devido à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
2. Se o cenário probatório não comprova as alegações do interessado quanto à sua condição socioeconômica de vulnerabilidade e desamparo, não há como considerar configurado pressuposto essencial à concessão do benefício.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento à remessa oficial e à apelação do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 25 de agosto de 2015.
Juíza Federal Taís Schilling Ferraz
Relatora
Documento eletrônico assinado por Juíza Federal Taís Schilling Ferraz, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7673516v19 e, se solicitado, do código CRC BA482351. | |
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Signatário (a): | Taís Schilling Ferraz |
Data e Hora: | 02/09/2015 16:07 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0006631-59.2015.4.04.9999/RS
RELATORA | : | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
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RELATÓRIO
Trata-se de apelação do INSS e remessa oficial em ordinária interposta em 11-02-2010 contra o INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, objetivando a concessão de benefício de amparo assistencial à pessoa portadora de deficiência, requerido em 24-11-2008.
Laudo de estudo social foi acostado aos autos (fls. 84-5) e complementado (fls. 100-1).
Acerca da incapacidade do autor foi realizada perícia médica (fl. 73).
O juízo a quo julgou procedente o pedido formulado para conceder à autora o benefício assistencial, a contar da data do requerimento administrativo, com abatimento de valores eventualmente já pagos; sobre as parcelas vencidas, incidente correção monetária pelo IGP-M a contar do vencimento de cada parcela e juros de mora no percentual de 6% ao ano, a contar da citação; condenou o demandado ao pagamento de custas processuais e ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% sobre as prestações vencidas até a data da prolação da sentença. Determinou a remessa dos autos a essa Corte por força do reexame necessário.
O INSS argumenta que a autora não preenche o requisito da deficiência/impedimentos de longo prazo, e tampouco restou comprovado o requisito da miserabilidade econômica. Acaso mantida a condenação, postula aplicação da Lei 9.494/1997 no tocante à correção monetária.
Com contrarrazões.
O Ministério Público Federal opina pelo desprovimento do apelo e da remessa oficial.
É o relatório
VOTO
Do reexame necessário
Cabe conhecer da remessa oficial, uma vez que não há condenação em valor certo, afastada, por isso, a incidência do § 2º do art. 475 do Código de Processo Civil.
Do benefício assistencial devido à pessoa com deficiência:
À época do requerimento administrativo, anteriormente às alterações promovidas na Lei nº 8.742/1993 no ano de 2011, os critérios de concessão do benefício assistencial estavam assim dispostos:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de 1 (um) salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 70 (setenta) anos ou mais e que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
§ 1o Para os efeitos do disposto no caput, entende-se como família o conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, desde que vivam sob o mesmo teto.
§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho.
§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
§ 4º O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo o da assistência médica.
§ 5º A situação de internado não prejudica o direito do idoso ou do portador de deficiência ao benefício.
§ 6o A concessão do benefício ficará sujeita a exame médico pericial e laudo realizados pelos serviços de perícia médica do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS.
Do conceito de família:
O conceito de família, à época do requerimento administrativo, compreendia: o requerente do benefício, o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido, os pais e o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido.
Da condição socioeconômica:
Em relação ao critério econômico, o art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/1993, estabelecia que se considerava hipossuficiente a pessoa com deficiência ou idoso cuja família possuísse renda per capita inferior a ¼ do salário mínimo.
Contudo, o Superior Tribunal de Justiça, por sua Terceira Seção, ao apreciar recurso especial representativo de controvérsia, relativizou o critério estabelecido pelo referido dispositivo legal. Entendeu que, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana, "a limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a ¼ do salário mínimo" (REsp n. 1.112.557/MG, rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Terceira Seção, j. 28/10/2009, DJ 20/11/2009).
Além disso, o STJ, órgão ao qual compete a uniformização da interpretação da lei federal, acrescentou, no julgado citado, que "em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado".
Como se percebe, o entendimento da Corte Superior consolidou-se no sentido de que é possível a aferição da miserabilidade do deficiente ou do idoso por outros meios, ainda que não observado estritamente o critério da renda familiar per capita previsto no § 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/1993.
Nesse sentido, são flexíveis os critérios de reconhecimento da miserabilidade.
Mais recentemente, o Supremo Tribunal Federal, ao analisar os recursos extraordinários 567.985 e 580.963, ambos submetidos à repercussão geral, reconheceu a inconstitucionalidade do § 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/1993 - LOAS, assim como do art. 34 da Lei 10.741/2003 - Estatuto do Idoso.
Reconhecida a inconstitucionalidade do critério objetivo para aferição do requisito econômico do benefício assistencial, em regime de repercussão geral, cabe ao julgador, na análise do caso concreto, identificar o estado de miserabilidade da parte autora e de sua família. De registrar que esta Corte, ainda que por outros fundamentos, vinha adotando uma maior flexibilização nos casos em que a renda per capita superava o limite estabelecido no art. 20, § 3º, da LOAS, agora dispensável enquanto parâmetro objetivo de aferição da renda familiar.
Em conclusão, o benefício assistencial destina-se àquelas pessoas que se encontram em situação de elevada pobreza por não possuírem meios para prover sua subsistência, nem de tê-la provida por sua família, ainda que a renda familiar per capita venha a ser considerada como meio de prova desta situação.
Do caso concreto:
A parte autora nasceu em 26-07-1957, contando, ao tempo do requerimento administrativo, formulado em 24-11-2008, com 51 anos de idade.
Informou o médico perito que ela é portadora de artrose degenerativa na articulação coxo femoral, que a limita para o trabalho, ocasionando incapacidade parcial, bem como que esta situação comporta tratamento com medicamentos e fisioterapia, embora se trate de doença degenerativa.
Quanto à condição de miserabilidade do grupo familiar, o estudo social (fls. 84-5), realizado em 13-03-2013, informou que (os grifos não são do original):
"(...)
Ao chegar à residência da autora fui recebida por essa, que veio desde a casa até o portão da residência aproximadamente 7 metros, caminhando normalmente. Após a apresentação ela mudou o modo de caminhar e começou a mancar.
Na residência havia duas casas, ambas de madeira, sendo que a entrevistada levou-me a casa dos fundos, onde dizia morar. No imóvel havia um cachorro doente e exalava mau cheiro no ambiente.
A entrevistada relatou que o imóvel era cedido por um casal, morador da casa da frente, que não cobrava aluguel, e auxiliam na alimentação da mesma.
Foi perguntada sobre o vínculo com o casal, informou que conheceu quando estava procurando casa para alugar, no início ela ajudava a pagar água e luz, depois ficou doente e não pode mais, então segundo ela, eles prestam caridade.
A casa tem três cômodos e parecia que não era habitada, existia muito pó e cheiro de mofo. Os móveis eram precários, tinha uma geladeira, que não funcionava, uma mesa e duas cadeiras, um sofá com dois lugares, um balcão, também dois colchões velhos que estavam enrolados e amarrados. Não foi observado a presença de vestuário e objetos de uso pessoal.
Durante a visita a entrevistada relatou que é alfabetizada, mora sozinha. Porém, quando solicitei seus documentos, ela foi apanhar na residência da frente. O mesmo aconteceu quando me trouxe documentos do morador da casa da frente. Causou a impressão de conhecer bem a rotina da casa.
Na casa da frente, segundo a entrevistada moram o casal e um bebê de seis meses. A casa é alugada e o casal paga R$ 200,00 (duzentos reais) de aluguel por mês. Possui energia elétrica, água encanada, o lixo é coletado. A casa tem cinco cômodos bem limpos e organizados, sendo que numa sala havia uma mesa e material de manicure. Segundo a entrevistada, de vez em quando a moradora da residência trabalha como manicure. Um quarto de hóspede com cama de casal e roupeiro, onde curiosamente se encontrava a bolsa da entrevistada. Um quarto de casal com cama de casal e um berço para o bebê. Uma cozinha com armário, pia, geladeira e fogão, um banheiro e uma varanda com mesa e duas cadeiras.
O casal não se encontrava no momento da entrevista, somente o bebê que a entrevistada estava cuidando, ela exibiu os documentos do pai do bebê (...).
(...)
(...) um vizinho próximo, morador a mais de cinquenta anos, relatou que a Sra. Vera é proprietária do imóvel, onde ela, sua filha marido e neto residem há mais de vinte e cinco anos.
PARECER:
De acordo com entrevistas e observações realizadas na residência da Sra. Vera foi constatado que a mesma deambulava perfeitamente e que seu relato não condiz com a realidade que se apresentava no momento da visita."
Ao retornar ao local, para nova diligência, a perita esteve na mesma residência onde vivia o casal que auxiliaria a requerente, tendo tentado conversar com as pessoas lá residentes, sem êxito.
Em tais condições, examinados os fatos postos à inicial e confrontando-os com os efetivamente constatados, impõe-se reconhecer a improcedência da demanda.
Os elementos coletados indicam que a requerente não vive do favor de quaisquer terceiros. Provavelmente reside com sua filha, seu genro e sua neta, segundo informou o vizinho, ouvido pela perita. Nada foi trazido aos autos a título de elementos que indiquem a situação econômica dessas pessoas. Ao sustentar sua versão, a autora deixou de fazer prova mínima de requisito essencial para o gozo do benefício.
Com razão a assistente social ao esclarecer que os instrumentais técnicos utilizados para a construção do estudo social são a visita domiciliar, a entrevista, a observação e em alguns casos a investigação, bem como que, amparado no art. 429 do CPC, para o desempenho de sua função, podem o perito e os assistentes técnicos utilizar-se de todos os meios necessários, ouvindo testemunhas, obtendo informações, solicitando documentos que estejam em poder de parte ou em repartições públicas, bem como instruir o laudo com plantas, desenho, fotografias e outras quaisquer peças.
A prova testemunhal pouco favoreceu à requerente, porque colhida sem o compromisso legal e foi pouco esclarecedora.
Da análise do conjunto probatório, não é possível ter-se como comprovada a situação atual de risco social e miserabilidade da parte autora, o que conduz à improcedência do pedido.
Nada obsta a que, modificado o contexto atual, seja o pleito renovado, diante de novos fatos.
Honorários advocatícios e custas processuais:
Invertidos os ônus sucumbenciais, condeno a parte autora ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios no percentual de 10% sobre o valor da causa, suspensa a exigibilidade por força do benefício da justiça gratuita.
Antecipação dos efeitos da tutela:
Julgado improcedente o pedido, revogo a antecipação de tutela concedida pelo juízo monocrático.
Conclusão:
Reforma-se a sentença, dando-se provimento à remessa oficial e à apelação do INSS para julgar improcedente o pedido inicial..
Dispositivo:
Ante o exposto, voto por dar provimento à remessa oficial e à apelação do INSS.
Juíza Federal Taís Schilling Ferraz
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 25/08/2015
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0006631-59.2015.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00076812320108210030
RELATOR | : | Juiza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
PRESIDENTE | : | Rogerio Favreto |
PROCURADOR | : | Dr. Flavio Augusto de Andrade |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | VERA LUCIA ATAIDE GARCIA |
ADVOGADO | : | Jorge Francisco Guimaraes |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 3A VARA DA COMARCA DE SAO BORJA/RS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 25/08/2015, na seqüência 221, disponibilizada no DE de 07/08/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO À REMESSA OFICIAL E À APELAÇÃO DO INSS.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
VOTANTE(S) | : | Juiza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
: | Juiz Federal JOSÉ ANTONIO SAVARIS | |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7788721v1 e, se solicitado, do código CRC 4B052BD. | |
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