PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ARTIGO 20, DA LEI Nº 8. 742/93 (LOAS). RISCO SOCIAL. REQUISITO NÃO PREENCHIDO...

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

MICHELE FLORES GUTERRES, representada por sua curadora, ajuizou a presente ação contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS objetivando o restabelecimento do benefício assistencial previsto no art. 20 da Lei nº 8.742/93 - LOAS, e a desconstituição do débito decorrente do suposto recebimento indevido da prestação.

O magistrado a quo, em sentença prolatada em 19/12/2016, julgou parcialmente procedente o pedido, reconhecendo a regularidade do pagamento da renda mensal do benefício assistencial à autora MICHELE FLORES GUTERRES (NB 87/106.092.472-0) até 04-02-2015, nos termos da fundamentação, motivo pelo qual deverá o INSS abster-se da pretendida restituição de tais valores; e, no que se refere ao montante da renda mensal daquela prestação paga no interregno de 05-02-2015 a 24-04-2015, determinar ao INSS que limite a 20% (vinte por cento) o desconto a ser procedido no benefício de aposentadoria por idade NB 41/171.903.748-2, em nome de MARIA ADELAIDE FLORES GUTERRES, a título de restituição dos referidos valores.

A parte autora interpôs recurso. Aduz em suas razões que recebeu de boa-fé os valores do benefício assistencial a partir de 02/2015, afirmando, com base em jurisprudência do TRF4 e do STJ, que a restituição é indevida.

Com contrarrazões, vieram os autos para julgamento.

Neste Tribunal, o parecer do Ministério Público Federal foi pelo provimento do apelo.

Nos termos do artigo 1.046 do Código de Processo Civil (CPC), em vigor desde 18 de março de 2016, com a redação que lhe deu a Lei 13.105, de 16 de março de 2015, suas disposições aplicar-se-ão, desde logo, aos processos pendentes, ficando revogada a Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973.

Com as ressalvas feitas nas disposições seguintes a este artigo 1.046 do CPC, compreende-se que não terá aplicação a nova legislação para retroativamente atingir atos processuais já praticados nos processos em curso e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada, conforme expressamente estabelece seu artigo 14.

A parte autora passou a receber benefício assistencial devido ao deficiente a partir de 01/11/1997, deferido no âmbito administrativo e pago regulamente até 24/04/2015, quando foi constatado pelo INSS que a renda per capita do grupo familiar sofrera alteração a partir de 05/02/2015, em razão da concessão do benefício de aposentadoria por idade à genitora da requerente, pago concomitantemente com o benefício de pensão por morte.

Como decorrência, a autarquia previdenciária apurou débito no valor de R$ 43.920,31, a ser restituído mediante desconto da renda mensal dos benefícios percebidos pela mãe da autora.

O juízo monocrático declarou válidos os pagamentos efetuados pela autarquia até 05/02/2015, desconstituindo, assim, parte substancial do débito, bem como reconheceu cabível a cobrança dos valores recebidos no período compreendido entre 05/02/2015 a 24/04/2015, limitando a restituição a descontos de 20%, incidentes sobre o benefício de aposentadoria por idade concedido à mãe da autora.

A parte autora apelou buscando afastar a cobrança desses valores, afirmando tê-los recebido de boa-fé.

A controvérsia, portanto, diz respeito à possibilidade de dispensa da devolução de valores recebidos na esfera administrativa.

Os princípios da razoabilidade, da segurança jurídica e da dignidade da pessoa humana, aplicados à hipótese, conduzem à impossibilidade de repetição das verbas previdenciárias. Trata-se de benefício de caráter alimentar, recebido pelo beneficiário de boa-fé.

Por sua vez, o Regulamento da Previdência - Decreto nº 3.048/1999 reza que:

A propósito, os seguintes precedentes, verbis:

Destaque-se, ainda, a jurisprudência do STJ, no sentido de não ser devida a restituição de valores pagos aos segurados por erro/equívoco administrativo do INSS, observado o princípio da irrepetibilidade ou da não devolução dos alimentos, como se vê da ementa a seguir, verbis:

No mesmo sentido, as decisões proferidas nos seguintes precedentes: REsp Nº 1.588.526 RS, Rel. Min. Gurgel de Faria, DJe 16/05/2016, e REsp 1561814 , Rel. Min. Assusete Magalhães, DJe 27/10/2015.

Sobre o tema colho, ainda, o precedente do STF, que afasta violação ao princípio da reserva de plenário:

Com efeito, cuidando-se de verba alimentar, não é dado ao INSS exigir a devolução de valores recebidos, ressalvados os casos de comprovada má-fé do segurado, o que não se verifica no caso específico.

Portanto, é de se concluir que a parte autora recebeu os valores de boa-fé. Por isso, e porque os benefícios previdenciários têm caráter alimentar, considero que as referidas parcelas são irrepetíveis, não podendo ser exigida a sua devolução.

Sucumbência mantida nos limites fixados na sentença.

O recurso da autora foi provido.

Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação da parte autora.

Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 05/07/2017, na seqüência 719, disponibilizada no DE de 19/06/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.

Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.