
Apelação Cível Nº 5008810-35.2017.4.04.7112/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: MARISA RIBEIRO RODRIGUES (AUTOR)
RELATÓRIO
O Instituto Nacional do Seguro Social interpôs apelação em face de sentença (prolatada em 05/03/2020) que julgou procedente o pedido para concessão de amparo assistencial ao portador de deficiência (LOAS), condenando-o ao pagamento das parcelas vencidas, acrescidas de juros e correção monetária, bem como das despesas processuais (exceto as custas) e honorários advocatícios, arbitrados no percentual mínimo de cada uma das faixas de valor do artigo 85, § 3°, do Código de Processo Civil (Evento 189).
Preliminarmente, alegou que houve prescrição do direito processual de ação, cujo objetivo é reverter o ato administrativo que negou o benefício, pela aplicação do art. 1º do Decreto 20.910/32. No mérito, sustentou que o requisito da deficiência não está satisfeito, pois a autora não se enquadra no conceito de pessoa portadora de deficiência insculpido no art. 4º do Decreto nº 3.298/99. Argumentou, ainda, que não há prova da miserabilidade ou situação de risco social do grupo familiar, tendo em vista que a renda mensal é superior ao limite de 1/4 do salário-mínimo per capita. Por fim, requereu a concessão de efeito suspensivo à apelação, a improcedência dos pedidos deduzidos na inicial, ou, subsidiariamente, a fixação do termo inicial de concessão do benefício na data da citação, pois não há prova do preenchimento dos requisitos à época do indeferimento administrativo (Evento 207).
Com contrarrazões, subiram os autos.
O Ministério Público Federal apresentou parecer (Evento 5 da apelação).
VOTO
Preliminar - Prescrição do fundo de direito
Rejeita-se a preliminar por se tratar de relação de trato sucessivo. Cabe observar, todavia, a prescrição quinquenal, conforme já determinado em sentença, estando prescritas as parcelas que antecedem o quinquênio, contado do ajuizamento da ação.
Preliminar - Efeito Suspensivo
O INSS requer a concessão de efeito suspensivo à apelação para cessar a antecipação dos efeitos da tutela deferida em sentença.
Contudo, fica prejudicada a análise da questão por se tratar de matéria que com o mérito se confunde, conforme adiante se verá.
Benefício Assistencial ao Idoso ou Portador de Deficiência
Trata-se de demanda previdenciária na qual a parte autora objetiva a concessão de benefício assistencial previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal, e regulamentado pelo artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pelas Leis nº 12.435, de 06 de julho de 2011, e nº 12.470, de 31 de agosto de 2011.
O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: a) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, de acordo com a redação original do art. 20 da LOAS, ou impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, conforme redação atual do referido dispositivo) ou idoso (neste caso, considerando-se, desde 1º de janeiro de 2004, a idade de 65 anos); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família.
Quanto à condição de deficiente, deve ficar comprovada a incapacidade para a vida independente, conforme disposto no artigo 20, da Lei 8.742/93, em sua redação original, esclarecendo que este Tribunal consolidou entendimento segundo o qual a interpretação que melhor se coaduna ao princípio da dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III) é a que garante o benefício assistencial à maior gama possível de pessoas portadoras de deficiência. Cumpre ao julgador, portanto, ao analisar o caso concreto, observar que a incapacidade para a vida independente (a) não exige que a pessoa possua uma vida vegetativa ou que seja incapaz de locomover-se; (b) não significa incapacidade para as atividades básicas do ser humano, tais como alimentar-se, fazer a higiene e vestir-se sozinho; (c) não impõe a incapacidade de expressar-se ou de comunicar-se; e (d) não pressupõe dependência total de terceiros (TRF4, EINF 0016689-58.2014.404.9999, Terceira Seção, Relator Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 29 de maio de 2015).
No que diz respeito ao requisito etário, em se tratando de benefício requerido na vigência do Estatuto do Idoso, é considerada idosa a pessoa com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. O requisito é objetivo, ou seja, comprovado o atributo etário, a análise da condição incapacitante é desnecessária, bastando apenas verificar a situação de vulnerabilidade socioeconômica a que submetido o idoso.
A situação de risco social, por sua vez, deve ser analisada inicialmente sob o ângulo da renda per capita do núcleo familiar, que deverá ser inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo. Registro, no ponto, que o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no bojo do Tema 185 esclarecendo que a limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, de modo a se presumir absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo (REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009).
Posteriormente, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar a Reclamação n. 4374 e o Recurso Extraordinário n. 567985 (este com repercussão geral), estabeleceu que o critério legal de renda familiar per capita inferior a um quarto do salário mínimo encontra-se defasado para caracterizar a situação de miserabilidade, não se configurando, portanto, como a única forma de aferir a incapacidade da pessoa para prover sua própria manutenção ou tê-la provida por sua família.
Na mesma oportunidade, o Plenário do STF, ao julgar o Recurso Extraordinário 580.963/PR, também declarou a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03), o qual estabelece que o benefício assistencial já concedido a qualquer idoso membro da família não será computado para fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS, com base nos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da isonomia, bem como no caráter de essencialidade de que se revestem os benefícios de valor mínimo, tanto previdenciários quanto assistenciais, concedidos a pessoas idosas e também àquelas portadoras de deficiência. De acordo com o STF, portanto, não se justifica que, para fins do cálculo da renda familiar per capita, haja previsão de exclusão apenas do valor referente ao recebimento de benefício assistencial por membro idoso da família, quando verbas de outra natureza (benefício previdenciário), bem como outros beneficiários de tais verbas (membro da família portador de deficiência), também deveriam ser contemplados.
Mais recentemente, a Primeira Seção do STJ, com fundamento nos princípios da igualdade e da razoabilidade, firmou entendimento segundo o qual, também nos pedidos de benefício assistencial feitos por pessoas portadoras de deficiência, deve ser excluído do cálculo da renda familiar per capita qualquer benefício, no valor de um salário mínimo, recebido por maior de 65 anos, independentemente se assistencial ou previdenciário, aplicando-se, analogicamente, o disposto no parágrafo único, do art. 34, do Estatuto do Idoso. Confira-se:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL PREVISTO NA LEI N. 8.742/93 A PESSOA COM DEFICIÊNCIA. AFERIÇÃO DA HIPOSSUFICIÊNCIA DO NÚCLEO FAMILIAR. RENDA PER CAPITA. IMPOSSIBILIDADE DE SE COMPUTAR PARA ESSE FIM O BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO, NO VALOR DE UM SALÁRIO MÍNIMO, RECEBIDO POR IDOSO. 1. Recurso especial no qual se discute se o benefício previdenciário, recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, deve compor a renda familiar para fins de concessão ou não do benefício de prestação mensal continuada a pessoa deficiente. 2. Com a finalidade para a qual é destinado o recurso especial submetido a julgamento pelo rito do artigo 543-C do CPC, define-se: Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93. 3. Recurso especial provido. Acórdão submetido à sistemática do § 7º do art. 543-C do Código de Processo Civil e dos arts. 5º, II, e 6º, da Resolução STJ n. 08/2008.(REsp 1355052/SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 25/02/2015, DJe 05/11/2015).
Assim, em regra, integram o cálculo da renda familiar per capita os rendimentos auferidos pelo cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto (art. 20, § 1º, da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei n.º 12.435/2011).
Devem ser excluídos do cálculo, todavia, o valor auferido por idoso com 65 anos ou mais a título de benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima (TRF4, EINF 5003869-31.2010.404.7001, Terceira Seção, Relator p/ Acórdão Roger Raupp Rios, juntado aos autos em 10 de fevereiro de 2014), bem como o valor auferido a título de benefício previdenciário por incapacidade ou assistencial em razão de deficiência, independentemente de idade (TRF4, APELREEX 2006.71.14.002159-6, Sexta Turma, Relatora Vânia Hack de Almeida, D.E. 10 de setembro de 2015), ressaltando-se que tal beneficiário, em decorrência da exclusão de sua renda, também não será considerado na composição familiar, para efeito do cálculo da renda.
Demais disso, os cuidados necessários com a parte autora, em decorrência de sua deficiência, incapacidade ou avançada idade, que acarretarem gastos - notadamente com medicamentos, alimentação especial, fraldas descartáveis, tratamento médico, psicológico e fisioterápico, entre outros -, configuram despesas a ser consideradas na análise da condição de risco social da família do demandante (TRF4, APELREEX 5002022-24.2011.404.7012, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, juntado aos autos em 27 de junho de 2013).
Em relação à percepção do benefício instituído pelo Programa Bolsa Família, não só não impede o recebimento do benefício assistencial do art. 203, V, da Constituição Federal, como constitui forte indicativo de que a unidade familiar encontra-se em situação de risco social (TRF4, APELREEX 2009.71.99.006237-1, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, D.E. 07 de outubro de 2014).
Concluindo, em linhas gerais, para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, a situação de risco social a que se encontra exposta a pessoa idosa ou portadora de deficiência e sua família deve ser analisada em cada caso concreto (TRF4, EINF 0016689-58.2014.404.9999, Terceira Seção, Relator Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 29 de maio de 2015).
Caso concreto
Com a finalidade de contextualizar a situação ora em análise, cumpre observar que a autora, atualmente com 69 anos de idade (nascida em 05/03/1951), ajuizou a presente ação em 18/07/2017, postulando a concessão de amparo assistencial por ser portadora de doença pulmonar obstrutiva crônica (CID J44), diabetes (CID E10) e HAS (CID I10), além de não possuir meios de prover a própria manutenção ou tê-la provida por sua família (Evento 1 - INIC1).
a) Condição de deficiente ou impedimento a longo prazo
No que diz respeito ao requisito da deficiência ou impedimento a longo prazo, o INSS argumenta que a parte autora não faz jus à concessão do benefício assistencial pois não se enquadra no conceito de pessoa portadora de deficiência insculpido no art. 4º do Decreto nº 3.298/99.
De acordo com as informações extraídas da perícia médica, realizada em 31/01/2019 (Evento 150), a autora trabalhou como empregada doméstica, cuidadora de crianças e cuidadora de idosos até 1998, ocasião em que passou a exercer apenas atividades do lar. Queixou-se de problemas respiratórios, iniciados há aproximadamente vinte anos, e informou ser portadora de diabetes. Referiu dispneia aos pequenos esforços e relatou que necessita de auxílio para vestir-se e banhar-se. Passa a maior parte do dia deitada e faz uso de oxigênio para dormir.
Após avaliação física e análise da documentação complementar apresentada, o diagnóstico foi de doença pulmonar obstrutiva crônica (CID J44), diabetes (CID E10) e HAS (CID I10). O perito foi categórico ao afirmar que a condição clínica da autora a incapacita para as atividades laborativas já realizadas e para algumas tarefas da vida diária, destacando que o impedimento possui caráter permanente. Confira-se:
3. Análise Técnica
A autora é portador a de Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica J44 , Diabetes E10 e HAS I10.
A condição clínica da autora a incapacita para as atividades laborativas já realizadas e para algumas tarefas da vida diária.
A incapacidade é PERMANENTE com data de início estimada em 2016.
A autora, embora não caracterizada como Portadora de Deficiência, nos termos do art. 4º do Decreto nº 3.298/99, não apresenta possibilidade de recuperação funcional em um período mínimo de dois anos.
O autora necessita do auxílio de terceiros para suas atividades da vida diária, tais como higiene e locomoção.
Em resposta aos quesitos, manifestou-se da seguinte forma:
G) Esta doença implica impedimentos (por exemplo, de natureza física, mental, intelectual ou sensorial) que geram limitação para o desempenho de atividade laborativa? Esclareça.
Resposta: Sim, a patologia pulmonar implica em impedimento de natureza física que gera limitação para o desempenho de atividade laborativa e limitação para as atividades da vida diária.
I) O(s) impedimento(s) observado(s) tem duração mínima de dois anos? Não sendo possível determinar o tempo de dura ção, há chances de ele(s) se estender(em) por tempo igual ou superior a dois anos?
Resposta:Sim, os impedimentos se estender ão por tempo superior a dois anos.
Em laudo pericial complementar (Evento 164), o expert esclareceu, ainda, que o quadro incapacitante teve início em janeiro de 2012, de modo que já estava presente à época da DER (06/01/2012). Nesse sentido:
Quesito Complementar
1) Tendo em vista que a douta perita afirma no seu laudo pericial que houve agravamento nas moléstias incapacitantes da parte autora desde a DER: em 2016 a doença se agravou, com base nessas informações e tendo em vista que na pericia a autora apresentou documentos médicos desde 2008, poderia a perita informar se na DER em 06/01/2012 a parte autora já encontrava se incapacitada?
Resposta: Embora apenas um documento médico anterior a 2012 anexado no processo, tal documento Nota de Alta, já informa o uso de hipoventilação alveolar com ventilação mecânica não invasiva. A condição física da autora e as informações contidas nos documentos anexados permitem inferir que a autora encontrava-se incapacitada para a atividade de cuidadora de idosos em janeiro de 2012.
Cumpre destacar que, embora o juiz não esteja vinculado ao laudo pericial judicial (art. 479, CPC), é o entendimento desta Corte que a convicção judicial acerca da existência de incapacidade laborativa para fins da concessão do benefício assistencial é formada predominantemente a partir da produção de prova pericial. Assim, apenas em situações excepcionais é que o magistrado pode, com base em sólida prova em contrário, afastar-se da conclusão apresentada pelo perito - hipótese de que, aqui, não se cuida.
Portanto, uma vez preenchido o requisito da condição de deficiente ou impedimento de longo prazo, passa-se à análise do critério econômico.
b) Situação de risco social
De acordo com as informações extraídas da perícia socioeconômica, referente à visita domiciliar realizada em 17/10/2018 (Evento 116), a autora reside apenas com o esposo, Ney Rosa Rodrigues (atualmente com 80 anos de idade, nascido em 06/06/1940), sendo que a renda mensal do núcleo familiar advém exclusivamente dos proventos da aposentadoria por tempo de contribuição auferida pelo cônjuge, no valor de um salário mínimo.
Cumpre destacar o entendimento dominante no âmbito desta Corte segundo o qual deve ser excluído do cômputo da renda familiar o benefício previdenciário de renda mínima auferido por idoso maior de 65 anos de idade, ressaltando-se que tal beneficiário, em decorrência da exclusão de sua renda, também não será considerado na composição familiar para efeito do cálculo. Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL AO DEFICIENTE. REQUISITOS ATENDIDOS. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO OCORRÊNCIA. PERÍCIA MÉDICA ADMINISTRATIVA. EXCLUSÃO DA RENDA PARA CÁLCULO PER CAPITA. ÓBITO DA PARTE AUTORA NO CURSO DO PROCESSO. DIREITO DOS SUCESSORES ÀS PARCELAS VENCIDAS ATÉ A DATA DO ÓBITO. CONSECTÁRIOS LEGAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS 1. O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: a) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, de acordo com a redação original do artigo 20 da LOAS, ou impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, conforme redação atual do referido dispositivo) ou idoso (neste caso, considerando-se, desde 1º de janeiro de 2004, a idade de 65 anos); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família. 2. Não resta configurado cerceamento de defesa se as provas pleiteadas pela parte são desnecessárias à solução da lide. 3. Esta Corte já firmou o entendimento de que pareceres médicos oficiais do INSS gozam de presunção de legitimidade, afastável, apenas, por contundente prova em contrário. 4. Comprovada a existência de restrição atual capaz de impedir a efetiva participação social da parte autora no meio em que se encontra inserida, é de ser deferido o pedido de concessão de benefício de amparo social ao deficiente. 5. Exclusão do valor de um salário mínimo recebido por idoso do cômputo da renda mensal familiar, conforme jurisprudência dominante. 6. A renda de filho maior e capaz não deve ser considerada para fins de cálculo de renda per capita, pois não se enquadra no conceito de família. Interpretação restritiva do art. 16 da Lei nº 8.213/91. (5001781-59.2011.4.04.7106, TURMA REGIONAL DE UNIFORMIZAÇÃO DA 4ª REGIÃO, Relator MARCUS HOLZ, juntado aos autos em 27/10/2014). 7. Presunção absoluta de miserabilidade diante da verificação da renda mensal do grupo familiar igual a zero, conforme o entendimento já uniformizado pelo TRF 4º Região, no IRDR nº 12 (50130367920174040000/TRF) de 21/2/2018. 8. Preenchidos os pressupostos para a concessão do benefício assistencial. 9. Atendidos os requisitos legais definidos pela Lei n.º 8.742/93, deve ser reconhecido o direito aos sucessores do autor ao recebimento do benefício assistencial referente ao período em vida do autor, a partir do requerimento administrativo até a data do óbito. 10. Consectários legais fixados nos termos do decidido pelo STF (Tema 810) e pelo STJ (Tema 905). 11. Honorários advocatícios, a serem suportados pelo INSS, fixados em 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a sentença. (TRF4, AC 5017838-62.2018.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, juntado aos autos em 30/08/2018)
Tal entendimento funda-se na intenção do legislador de assegurar ao idoso rendimento mensal mínimo, per capita, de um salário mínimo. Com efeito, considerando-se o afastamento da aposentadoria do esposo, conclui-se que a renda do núcleo familiar, segundo o critério legal, é nula, ficando comprovada a situação de risco ou vulnerabilidade social.
Devem ser levadas em consideração, ainda, as demais circunstâncias desfavoráveis evidenciadas na perícia socioeconômica. Nesse sentido, os registros fotográficos que instruem o feito demonstram a simplicidade do local de moradia da autora, devendo-se dar destaque para a existência de umidade nos cômodos. Além disso, o casal possui elevadas despesas mensais, incluindo os valores aproximados de R$ 207,00 com energia elétrica, R$ 147,00 com água, R$ 75,00 com gás, R$ 350,00 com alimentação, R$ 44,00 com telefone e R$ 348,00 com medicamentos não fornecidos pela rede pública. Some-se a isso o valor aproximado de R$ 300,00 despendido trimestralmente com insumos para a oxigenoterapia.
No ponto, cumpre observar que, além de ser idosa, a autora enfrenta problemas de saúde como doença pulmonar obstrutiva crônica, diabetes e hipertensão arterial, razão pela qual faz uso de medicação contínua e fraldas, necessitando do auxílio de terceiros para realizar atividades diárias. Ressalte-se que, segundo entendimento desta Corte, as despesas necessárias em virtude do estado de saúde devem ser consideradas na análise da condição de risco social da família, uma vez que comprometem a integralidade dos rendimentos.
Nesse contexto, embora suficientemente comprovado o preenchimento do requisito econômico, merece destaque a conclusão da assistente social, favorável à concessão do amparo:
O casal é idoso, a aposentadoria não da mais para sustentar o casal. A autora tem vários problemas de saúde e seu esposo tem 78 anos e deambula com a ajuda de andador. A idosa depende de oxigenioterapia. A organização da casa é feita pela filha Fernanda.
Ressalte-se, por fim, que o direito ao benefício de prestação continuada não pressupõe a verificação de um estado de miserabilidade extremo, bastando estar demonstrada a insuficiência de meios para o beneficiário, dignamente, prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
Assim sendo, presentes ambos os requisitos, deve-se negar provimento à apelação. No mesmo sentido, manifestou-se o Ministério Público Federal:
Dessa forma, restaram preenchidos ambos os requisitos do artigo 20 da Lei n. 8.742/93, tendo em vista que a parte autora apresenta incapacidade permanente e que a situação de miserabilidade restou demonstrada, devendo ser relativizado o critério da renda familiar per capita, a fim de conferir a manutenção da subsistência da demandante. Assim, não merecem prosperar as alegações da parte ré, sendo a manutenção da sentença medida que se impõe.
Termo inicial
No que diz respeito à data de início do benefício (DIB), agiu com acerto o magistrado sentenciante ao determinar a concessão do amparo assistencial desde a DER (06/01/2012). Isto porque, além do requisito do impedimento de longo prazo, o critério econômico estava igualmente satisfeito à época, uma vez que não houve alteração da composição do núcleo familiar ou da renda mensal auferida (um salário mínimo), conforme se depreende da análise do processo administrativo (Evento 1 - INFBEN7, fl. 4). Destaca-se, inclusive, que o Sr. Ney Rosa Rodrigues já havia completado 65 anos de idade, possibilitando a exclusão de sua aposentadoria do cálculo da renda familiar.
Portanto, deve ser mantida a decisão de primeiro grau no que diz respeito à concessão do amparo assistencial desde o requerimento administrativo (06/01/2012), observada a incidência da prescrição quinquenal, conforme ficou consignado na sentença. Em relação ao pagamento das parcelas em atraso, caberá ao INSS glosar o que já foi pago a tal título e observar os parâmetros abaixo.
Correção monetária
Após o julgamento, pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral, do Tema 810 (RE n. 870.947), a que se seguiu o dos embargos de declaração da mesma decisão, rejeitados e com afirmação de inexistência de modulação de efeitos, deve a atualização monetária obedecer ao Tema 905 do Superior Tribunal de Justiça, que estabelece para as condenações judiciais de natureza previdenciária:
As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91.
Assim, a correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices, que se aplicam conforme a pertinente incidência ao período compreendido na condenação:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94);
- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da lei 8.213/91).
Tratando-se, por fim, da apuração de montante correspondente às parcelas vencidas de benefícios assistenciais, deve observar-se a aplicação do IPCA-E.
Juros moratórios
Os juros de mora, de 1% (um por cento) ao mês, serão aplicados a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29 de junho de 2009. A partir de 30 de junho de 2009, os juros moratórios serão computados de forma equivalente aos aplicáveis à caderneta de poupança, conforme dispõe o art. 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei nº 9.494/97.
Honorários advocatícios
Desprovido o recurso interposto pelo réu da sentença de procedência do pedido, devem os honorários de advogado ser majorados, com o fim de remunerar o trabalho adicional do procurador da parte em segundo grau de jurisdição.
Consideradas as disposições do art. 85, §§ 2º e 3º, do Código de Processo Civil (CPC), arbitra-se a verba honorária total no valor correspondente a 12% (doze por cento) sobre as parcelas vencidas até a data da sentença (Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça), percentual que já inclui os honorários decorrentes da atuação no âmbito recursal (art. 85, §11, do CPC).
Prequestionamento
O enfrentamento das questões suscitadas em grau recursal, assim como a análise da legislação aplicável, são suficientes para prequestionar junto às instâncias Superiores os dispositivos que as fundamentam. Assim, deixo de aplicar os dispositivos legais ensejadores de pronunciamento jurisdicional distinto do que até aqui foi declinado. Desse modo, evita-se a necessidade de oposição de embargos de declaração tão somente para este fim, o que evidenciaria finalidade procrastinatória do recurso, passível de cominação de multa.
Dispositivo
Em face do que foi dito, voto por rejeitar as preliminares e negar provimento à apelação, nos termos da fundamentação, bem como, de ofício, majorar a verba honorária e adequar os consectários legais.
Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002100398v35 e do código CRC eaa6200e.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): OSNI CARDOSO FILHO
Data e Hora: 24/10/2020, às 16:25:7
Conferência de autenticidade emitida em 01/11/2020 04:00:56.

Apelação Cível Nº 5008810-35.2017.4.04.7112/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: MARISA RIBEIRO RODRIGUES (AUTOR)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA (LOAS). CONDIÇÃO DE DEFICIENTE. IMPEDIMENTO A LONGO PRAZO. SITUAÇÃO DE RISCO SOCIAL. EXCLUSÃO DE VALORES DA RENDA FAMILIAR. REQUISITOS PREENCHIDOS. CONSECTÁRIOS. ÍNDICES DE ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS.
1. O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, consoante a redação original do art. 20, da LOAS, ou impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, consoante a redação atual do referido dispositivo) ou idoso (assim considerado aquele com 65 anos ou mais, a partir de 1º de janeiro de 2004, data da entrada em vigor da Lei nº 10.741/2003 - Estatuto do Idoso) e situação de risco social (ausência de meios para a parte autora, dignamente, prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família).
2. O Supremo Tribunal Federal, em recurso extraordinário com repercussão geral, estabeleceu que o critério legal de renda familiar per capita inferior a um quarto do salário mínimo, previsto no art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/1993, não constitui a única forma de aferir a incapacidade da pessoa para prover sua própria manutenção ou tê-la provida por sua família (Tema nº 27).
3. Para a apuração da renda per capita, devem ser excluídos do cálculo da renda familiar os valores recebidos por pessoas idosas, com 65 anos ou mais, a título de benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima, bem como as quantias provenientes da manutenção de benefício previdenciário por incapacidade ou assistencial em razão de deficiência, independentemente de idade.
4. Comprovada a deficiência ou impedimento a longo prazo, bem como a situação de risco social, tem direito a parte autora à concessão do benefício assistencial de prestação continuada desde a data de entrada do requerimento na via administrativa.
5. As condenações impostas à Fazenda Pública, decorrentes de relação previdenciária, sujeitam-se à incidência do INPC, para o fim de atualização monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91.
6. A correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices, que se aplicam conforme a pertinente incidência ao período compreendido na condenação: IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94); INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da Lei 8.213/91), reservando-se a aplicação do IPCA-E aos benefícios de natureza assistencial.
7. Majorados os honorários advocatícios a fim de adequação ao que está disposto no art. 85, §11, do Código de Processo Civil.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, rejeitar as preliminares e negar provimento à apelação, bem como, de ofício, majorar a verba honorária e adequar os consectários legais, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 20 de outubro de 2020.
Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002100399v5 e do código CRC 91ddddc2.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): OSNI CARDOSO FILHO
Data e Hora: 24/10/2020, às 16:25:7
Conferência de autenticidade emitida em 01/11/2020 04:00:56.

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 13/10/2020 A 20/10/2020
Apelação Cível Nº 5008810-35.2017.4.04.7112/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PROCURADOR(A): ADRIANA ZAWADA MELO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: MARISA RIBEIRO RODRIGUES (AUTOR)
ADVOGADO: ANILDO IVO DA SILVA (OAB RS037971)
ADVOGADO: JULIA CAROLINA LONGHI KOSCIUK (OAB RS076632)
ADVOGADO: ALEXANDRA LONGONI PFEIL (OAB RS075297)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 13/10/2020, às 00:00, a 20/10/2020, às 14:00, na sequência 370, disponibilizada no DE de 01/10/2020.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, REJEITAR AS PRELIMINARES E NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO, BEM COMO, DE OFÍCIO, MAJORAR A VERBA HONORÁRIA E ADEQUAR OS CONSECTÁRIOS LEGAIS.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 01/11/2020 04:00:56.