Apelação Cível Nº 5001408-25.2024.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: TASSIANA DE SOUZA FERREIRA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Da sentença que julgou improcedente o pedido de concessāo de benefício assistencial, recorreu a autora Tassiana de Souza Ferreira sob o argumento principal de que possui deficiência que lhe ocasiona impedimento de longo prazo em contexto de comprovada miserabilidade social.
Argumentou, em síntese, que a sentença merece reforma, uma vez que o laudo médico que baseou a decisão judicial não compreendeu totalmente a sua situação pessoal, portadora de outras doenças. Além disso, alegou que se encontra em extrema miserabilidade, preenchendo o requisito econômico para o deferimento do benefício (
).Com contrarrazões (
), subiram os autos.VOTO
Benefício Assistencial ao Idoso ou Portador de Deficiência
Trata-se de demanda previdenciária na qual a parte autora objetiva a concessão de benefício assistencial previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal, e regulamentado pelo artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pelas Leis nº 12.435, de 06 de julho de 2011, e nº 12.470, de 31 de agosto de 2011.
O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: a) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, de acordo com a redação original do art. 20 da LOAS, ou impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, conforme redação atual do referido dispositivo) ou idoso (neste caso, considerando-se, desde 1º de janeiro de 2004, a idade de 65 anos); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família.
Saliente-se, por oportuno, que a incapacidade para a vida independente a que se refere a Lei nº 8.742, na redação original, deve ser interpretada de forma a garantir o benefício assistencial a uma maior gama possível de pessoas com deficiência, consoante pacífica jurisprudência do STJ (v.g.STJ, 5ª Turma, RESP 360.202/AL, Rel. Min. Gilson Dipp, DJU de 01 de julho de 2002) e desta Corte (v.g. AC n. 2002.71.04.000395-5/RS, 6ª Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, DJU de 19 de abril de 2006).
Desse modo, a incapacidade para a vida independente (a) não exige que a pessoa possua uma vida vegetativa ou seja incapaz de se locomover; (b) não significa incapacidade para as atividades básicas do ser humano, tais como alimentar-se, fazer a higiene pessoal e vestir-se sozinho; (c) não impõe a incapacidade de se expressar ou se comunicar; e (d) não pressupõe dependência total de terceiros.
No que diz respeito ao requisito econômico, cabe ressaltar que o Superior Tribunal de Justiça admitiu, em sede de recurso repetitivo, a possibilidade de demonstração da condição de miserabilidade por outros meios de prova, quando a renda per capita familiar for superior a ¼ do salário mínimo (REsp 1112557/MG, 3ª Seção, rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 20 de novembro de 2009). Posteriormente, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar, em 18 de abril de 2013, a reclamação nº 4374 e o recurso extraordinário nº 567985, este com repercussão geral, reconheceu e declarou a inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da Lei 8.742/93 (LOAS), por considerar que o critério ali previsto - ser a renda familiar mensal per capita inferior a um quarto do salário mínimo - está defasado para caracterizar a situação de miserabilidade.
Assim, forçoso reconhecer que as despesas com os cuidados necessários da parte autora, especialmente medicamentos, alimentação especial, fraldas descartáveis, tratamento médico, psicológico e fisioterápico, podem ser levadas em consideração na análise da condição de miserabilidade da família da parte demandante.
Portanto, o direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: (1) requisito etário - ser idoso (assim considerado aquele com 65 anos ou mais, a partir de 1º de janeiro de 2004, data da entrada em vigor do Estatuto do Idoso) ou apresentar condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente); e (2) situação de risco social (ausência de meios para, dignamente, prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família).
No que diz respeito ao requisito etário, em se tratando de benefício requerido na vigência do Estatuto do Idoso, é considerada idosa a pessoa com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. O requisito é objetivo, ou seja, comprovado o atributo etário, a análise da condição incapacitante é desnecessária, bastando apenas verificar a situação de vulnerabilidade socioeconômica a que submetido o idoso.
Quanto à condição de deficiente, deve ficar comprovada a incapacidade para a vida independente, conforme disposto no artigo 20, da Lei 8.742/93, em sua redação original, esclarecendo que este Tribunal consolidou entendimento segundo o qual a interpretação que melhor se coaduna ao princípio da dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III) é a que garante o benefício assistencial a maior gama possível de pessoas portadoras de deficiência. Cumpre ao julgador, portanto, ao analisar o caso concreto, observar que a incapacidade para a vida independente (a) não exige que a pessoa possua uma vida vegetativa ou que seja incapaz de locomover-se; (b) não significa incapacidade para as atividades básicas do ser humano, tais como alimentar-se, fazer a higiene e vestir-se sozinho; (c) não impõe a incapacidade de expressar-se ou de comunicar-se; e (d) não pressupõe dependência total de terceiros (TRF4, EINF 0016689-58.2014.404.9999, Terceira Seção, Relator Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 29 de maio de 2015).
A situação de risco social, por sua vez, deve ser analisada inicialmente sob o ângulo da renda per capita do núcleo familar, que deverá ser inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo. Registro, no ponto, que o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no bojo do Tema 185 esclarecendo que a limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, de modo a se presumir absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo (REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009).
Posteriormente, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar a Reclamação n. 4374 e o Recurso Extraordinário n. 567985 (este com repercussão geral), estabeleceu que o critério legal de renda familiar per capita inferior a um quarto do salário mínimo encontra-se defasado para caracterizar a situação de miserabilidade, não se configurando, portanto, como a única forma de aferir a incapacidade da pessoa para prover sua própria manutenção ou tê-la provida por sua família.
Na mesma oportunidade, o Plenário do STF, ao julgar o Recurso Extraordinário 580.963/PR, também declarou a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03), o qual estabelece que o benefício assistencial já concedido a qualquer idoso membro da família não será computado para fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS, com base nos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da isonomia, bem como no caráter de essencialidade de que se revestem os benefícios de valor mínimo, tanto previdenciários quanto assistenciais, concedidos a pessoas idosas e também àquelas portadoras de deficiência. De acordo com o STF, portanto, não se justifica que, para fins do cálculo da renda familiar per capita, haja previsão de exclusão apenas do valor referente ao recebimento de benefício assistencial por membro idoso da família, quando verbas de outra natureza (benefício previdenciário), bem como outros beneficiários de tais verbas (membro da família portador de deficiência), também deveriam ser contemplados.
A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, com fundamento nos princípios da igualdade e da razoabilidade, firmou entendimento segundo o qual, também nos pedidos de benefício assistencial feitos por pessoas portadoras de deficiência, deve ser excluído do cálculo da renda familiar per capita qualquer benefício, no valor de um salário mínimo, recebido por maior de 65 anos, independentemente se assistencial ou previdenciário, aplicando-se, analogicamente, o disposto no parágrafo único, do art. 34, do Estatuto do Idoso. Confira-se:
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL PREVISTO NA LEI N. 8.742/93 A PESSOA COM DEFICIÊNCIA. AFERIÇÃO DA HIPOSSUFICIÊNCIA DO NÚCLEO FAMILIAR. RENDA PER CAPITA. IMPOSSIBILIDADE DE SE COMPUTAR PARA ESSE FIM O BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO, NO VALOR DE UM SALÁRIO MÍNIMO, RECEBIDO POR IDOSO. 1. Recurso especial no qual se discute se o benefício previdenciário, recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, deve compor a renda familiar para fins de concessão ou não do benefício de prestação mensal continuada a pessoa deficiente. 2. Com a finalidade para a qual é destinado o recurso especial submetido a julgamento pelo rito do artigo 543-C do CPC, define-se: Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93. 3. Recurso especial provido. Acórdão submetido à sistemática do § 7º do art. 543-C do Código de Processo Civil e dos arts. 5º, II, e 6º, da Resolução STJ n. 08/2008.(REsp 1355052/SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 25/02/2015, DJe 05/11/2015).
Assim, em regra, integram o cálculo da renda familiar per capita os rendimentos auferidos pelo cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto (art. 20, § 1º, da Lei n.º 8.742/93, com a redação dada pela Lei n.º 12.435/2011).
Devem ser excluídos do cálculo, todavia, o valor auferido por idoso com 65 anos ou mais a título de benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima (TRF4, EINF 5003869-31.2010.404.7001, Terceira Seção, Relator p/ Acórdão Roger Raupp Rios, juntado aos autos em 10 de fevereiro de 2014), bem como o valor auferido a título de benefício previdenciário por incapacidade ou assistencial em razão de deficiência, independentemente de idade (TRF4, APELREEX 2006.71.14.002159-6, Sexta Turma, Relatora Vânia Hack de Almeida, D.E. 10 de setembro de 2015), ressaltando-se que tal beneficiário, em decorrência da exclusão de sua renda, também não será considerado na composição familiar, para efeito do cálculo da renda.
Demais disso, os cuidados necessários com a parte autora, em decorrência de sua deficiência, incapacidade ou avançada idade, que acarretarem gastos - notadamente com medicamentos, alimentação especial, fraldas descartáveis, tratamento médico, psicológico e fisioterápico, entre outros -, configuram despesas a ser consideradas na análise da condição de risco social da família do demandante (TRF4, APELREEX 5002022-24.2011.404.7012, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, juntado aos autos em 27 de junho de 2013).
Em relação à percepção do benefício instituído pelo Programa Bolsa Família, não só não impede o recebimento do benefício assistencial do art. 203, V, da Constituição Federal, como constitui forte indicativo de que a unidade familiar encontra-se em situação de risco social (TRF4, APELREEX 2009.71.99.006237-1, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, D.E. 07 de outubro de 2014).
Concluindo, em linhas gerais, para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, a situação de risco social a que se encontra exposta a pessoa idosa ou portadora de deficiência e sua família deve ser analisada em cada caso concreto (TRF4, EINF 0016689-58.2014.404.9999, Terceira Seção, Relator Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 29 de maio de 2015).
Mérito da causa
Tassiana de Souza Ferreira conta, atualmente, 37 (trinta e sete) anos de idade (07/02/1987), conforme sua certidão de nascimento (
, página 15).Relatou ao perito (
): vem trabalhando informalmente em sua residência, fazendo separação de palmilhas para calçados. Queixou-se de dores em região da hérnia umbilical, fazendo uso de analgésicos eventuais, esclarecendo ainda que é portadora de depressão (usa fluoxetina); gastrite (usa omeprazol); asma (usa bombinha) e hipertensão (usa enalapril); nega outras doenças crônicas. A título de atividades prévias, mencionou o ramo calçadista e a realização de faxinas.Ao realizar o exame físico, atestou o perito: está em bom estado físico, bom estado de nutrição e aparenta uma idade física compatível com a idade cronológica (altura: 1,64; peso: 104 kg). Quanto à saúde mental, disse: lúcida, orientada, no tempo e no espaço, o pensamento tem forma, curso e conteúdo normal, a memória está presente e preservada, o humor igualmente presente e adequado às situações propostas. Não observou a presença de delírios ou alucinações.
Além disso, mencionou o auxiliar do juízo: apresenta boa trofia muscular de membros superiores, inferiores, região de cintura escapular (ombros) e da musculatura paravertebral, com amplitude de movimentos preservados de coluna vertebral, ombros, cotovelos, punhos e mãos. Em relação aos membros inferiores apresenta boa mobilidade de quadris, joelhos, tornozelos e pés, com força preservada em membros superiores e inferiores, não apresentando cicatrizes relacionadas com as queixas alegadas.
A coluna vertebral, de igual modo, está com amplitude e mobilidade preservadas, compatível com faixa etária, e a musculatura paravertebral eutrófica, eutônica, simétrica, sem contraturas. Os punhos e as mãos não possuem atrofias musculares da região tenar, hipotenar e da musculatura intrínseca, sem déficits neurológicos detectáveis.
Concluiu o perito, ao final, que a autora apresenta diagnóstico de hérnia umbilical, a qual por si só não gera incapacidade laborativa, e que não houve verificação, quando do exame médico, de complicações decorrentes da hérnia, como encarceramento ou estrangulamento. Prosseguiu referindo que, ainda que o tratamento definitivo seja cirúrgico, poderá aguardar pelo procedimento mantendo suas atividades laborais.
Informou, também, que foram constatadas outras comorbidades, a saber: obesidade, asma, hipertensão e depressão. Assim constou da conclusão (negrito no original):
Conclusão
Para caracterização de incapacidade laborativa é fundamental que durante o exame médico pericial as patologias alegadas pela periciada ou consideradas nos exames complementares apresentem expressão clínica, ou seja, apresentem certo grau de limitação ou disfunção associada. Não ocorrendo expressões clínicas durante as manobras específicas no exame médico pericial NÃO se pode caracterizar situação de incapacidade laborativa.
Contudo, o que se apura aqui, como requisito legal, não deve ser a incapacidade para o trabalho, que legalmente origina benefício previdenciário de forma temporária ou permanente.
O que é relevante observar é se o estado clínico da autora lhe proporciona igualdade de concorrer no mercado de trabalho com outras pessoas sem as mesmas condições de saúde que apresenta.
Com a redação dada pela Lei nº 13.146, dispõe o art. 20, §2º, da Lei nº 8.742, in verbis:
Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
Se é certo que a presença de hérnia umbilical isoladamente não impede a autora de exercer qualquer atividade profissional, pois como bem atestou o perito, não existe encarceramento ou estrangulamento como causas motivadoras de imediato procedimento cirúrgico, estão ratificadas, no exame técnico, comorbidades: obesidade, asma, hipertensão e depressão.
As condições de vida da autora, constaram do laudo social (
, em 01/06/2020): vive com o companheiro, José Carlos Kapraski, 35 (trinta e cinco) anos de idade à época. Trabalham como catadores de recicláveis, recebendo, ainda, o Bolsa Família (R$ 200,00); pretende fazer cirurgia bariátrica, pois pesa 115 kg (altura: 1,68). Quanto à atividade laborativa pregressa, mencionou que tentou trabalhar na indústria calçadista, mas ficava um mês e devido ao cheiro de cola tinha que sair, já que é asmática. Residem com os filhos: Ana Clara (14 anos), Isabela (13 anos) e Lázaro (8 anos). Isabela é filha de Nilton Cardoso Sanches, que reside no Paraná. Todavia, ele não tem contato com a filha e não paga pensão alimentícia.O imóvel onde reside com seu companheiro e seus filhos está registrado por fotografias no estudo sócio-econômico. A visualização desses registros é bastante para a conclusão da miserabilidade das condições familiares (evento 46).
O contexto por inteiro permite então formular adequadamente a questão central: pessoa portadora de hérnia umbilical, com obesidade, asma, hipertensão e depressão comprovadas por laudo pericial, com três filhos, e trabalhando como catadora de reciclável, encontra barreiras que impedem sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas?
No atual momento, a meu ver, ainda é afirmativa a resposta.
Assim, é devido o benefício assistencial à autora, observada, no entanto, a impossibilidade de cumulação com qualquer outro no âmbito da seguridade social (art. 20, §4º, da Lei nº 8.742, em sua redação original e com as alterações promovidas pelas Leis nº 12.435 e nº 14.601, sucessivamente).
O benefício deverá ser revisto a cada 2 (dois) anos para avaliação da continuidade das condições que lhe deram origem (art. 21, caput da Lei nº 8.742).
Nesse contexto, a apelação merece provimento parcial para o fim de que seja concedido o benefício assistencial desde a data da realização do laudo social, que é o termo inicial a ser observado, pois é a partir deste momento que há certeza sobre o impedimento de longo prazo e a situação de vulnerabilidade social.
Logo, o valor das diferencas deve ser apurado a partir da citacao, momento no qual formalmente o INSS manifesta sua discordancia quanto à concessao do beneficio.
Correção monetária e juros
Após o julgamento, pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral, do Tema 810 (RE n. 870.947), a que se seguiu, o dos embargos de declaração da mesma decisão, rejeitados e com afirmação de inexistência de modulação de efeitos, deve a atualização monetária obedecer ao Tema 905 do Superior Tribunal de Justiça, que estabelece para as condenações judiciais de natureza previdenciária:
As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91.
Assim, a correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices, que se aplicam conforme a pertinente incidência ao período compreendido na condenação:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei n.º 9.711, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880);
- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da lei 8.213)
Tratando-se, por fim, da apuração de montante correspondente às parcelas vencidas de benefícios assistenciais, deve observar-se a aplicação do IPCA-E.
Os juros de mora, de 1% (um por cento) ao mês, serão aplicados a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29 de junho de 2009. A partir de 30 de junho de 2009, os juros moratórios serão computados de forma equivalente aos aplicáveis à caderneta de poupança, conforme dispõe o art. 5º da Lei nº 11.960, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei nº 9.494.
Por fim, a partir de 09/12/2021, conforme o disposto no art. 3º da Emenda Constitucional n.º 113, deverá incidir, para os fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, apenas a taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC), acumulada mensalmente.
Inversão dos ônus sucumbenciais
Diante do resultado do julgamento, invertem-se os ônus sucumbenciais em desfavor da autarquia.
O INSS é isento do pagamento das custas na Justiça Federal (art. 4º, I, d, da Lei nº 9.289) e na Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (art. 5º, I, da Lei Estadual/RS nº 14.634, que instituiu a Taxa Única de Serviços Judiciais desse Estado). Ressalve-se, contudo, que tal isenção não exime a autarquia previdenciária da obrigação de reembolsar eventuais despesas processuais, tais como a remuneração de peritos e assistentes técnicos e as despesas de condução de oficiais de justiça (art. 4º, I e parágrafo único, Lei nº 9.289; art. 2º c/c art. 5º, ambos da Lei Estadual/RS nº 14.634).
Essa regra deve ser observada mesmo no período anterior à Lei Estadual/RS nº 14.634, tendo em vista a redação conferida pela Lei Estadual nº 13.471/2010 ao art. 11 da Lei Estadual nº 8.121. Frise-se, nesse particular, que, embora a norma estadual tenha dispensado as pessoas jurídicas de direito público também do pagamento das despesas processuais, restou reconhecida a inconstitucionalidade formal do dispositivo nesse particular (ADIN estadual nº 70038755864). Desse modo, subsiste a isenção apenas em relação às custas.
No que concerne ao preparo e ao porte de remessa e retorno, sublinhe-se a existência de norma isentiva no CPC (art. 1.007, caput e § 1º), o qual exime as autarquias do recolhimento de ambos os valores.
Desse modo, cumpre reconhecer a isenção do INSS em relação ao recolhimento das custas processuais, do preparo e do porte de retorno, cabendo-lhe, todavia, o pagamento das despesas processuais.
Honorários advocatícios estabelecidos em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação e nos termos das Súmulas 76 do Tribunal Regional Federal e 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Tutela específica
Determina-se o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício, a ser efetivada em até 30 (trinta) dias úteis, mormente pelo seu caráter alimentar e necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais, bem como por se tratar de prazo razoável para que a autarquia previdenciária adote as providências necessárias tendentes a efetivar a medida.
Registre-se, contudo, que o referido prazo se inicia a contar da intimação desta decisão, independentemente de oposição de embargos de declaração, face à ausência de efeito suspensivo (art. 1.026 CPC).
Requisite a Secretaria da 5ª Turma o cumprimento desta decisão também à CEAB (Central Especializada de Análise de Benefícios).
TABELA PARA CUMPRIMENTO PELA CEAB | |
---|---|
CUMPRIMENTO | Implantar Benefício |
NB | |
ESPÉCIE | Benefício Assistencial Pessoa com Deficiência |
DIB | |
DIP | Primeiro dia do mês da decisão que determinou a implantação/restabelecimento do benefício |
DCB | |
RMI | A apurar |
OBSERVAÇÕES |
Conclusão
Apelação provida parcialmente para reconhecer o direito ao benefício assistencial desde a data da realização da perícia social.
Invertidos os ônus sucumbenciais em desfavor do INSS.
Determinada a implantação imediata do amparo assistencial.
Dispositivo
Em face do que foi dito, voto por dar provimento parcial à apelação, invertendo os ônus sucumbenciais em desfavor do INSS, determinando, ainda, a implantação imediata do benefício assistencial. Comunique-se à CEAB (Central Especializada de Análise de Benefícios).
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Apelação Cível Nº 5001408-25.2024.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: TASSIANA DE SOUZA FERREIRA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA (LOAS). IMPEDIMENTO A LONGO PRAZO. VULNERABILIDADE SOCIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. CONTEXTO PROBATÓRIO. INVERSÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS. TUTELA ESPECÍFICA.
1. O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, consoante a redação original do art. 20, da LOAS, ou impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, consoante a redação atual do referido dispositivo) ou idoso (assim considerado aquele com 65 anos ou mais, a partir de 1º de janeiro de 2004, data da entrada em vigor da Lei nº 10.741 - Estatuto do Idoso) e situação de risco social (ausência de meios para a parte autora, dignamente, prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família).
2. Comprovada a condição de deficiente que ocasione impedimento a longo prazo, bem como a situação de risco social e miserabilidade, tem direito a parte autora ao benefício assistencial de prestação continuada.
3. Inversão dos ônus sucumbenciais em desfavor do INSS, que deverá arcar com as despesas processuais e honorários advocatícios, estabelecidos em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, observado o limite imposto na Súmula 76 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
4. Determinada a implantação imediata do benefício.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento parcial à apelação, invertendo os ônus sucumbenciais em desfavor do INSS, determinando, ainda, a implantação imediata do benefício assistencial, por meio da CEAB (Central Especializada de Análise de Benefícios), nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 27 de junho de 2024.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 20/06/2024 A 27/06/2024
Apelação Cível Nº 5001408-25.2024.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PRESIDENTE: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL
PROCURADOR(A): JANUÁRIO PALUDO
APELANTE: TASSIANA DE SOUZA FERREIRA
ADVOGADO(A): CÍCERO ALEXANDRE DE ARAUJO (OAB RS034630)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 20/06/2024, às 00:00, a 27/06/2024, às 16:00, na sequência 216, disponibilizada no DE de 11/06/2024.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO PARCIAL À APELAÇÃO, INVERTENDO OS ÔNUS SUCUMBENCIAIS EM DESFAVOR DO INSS, DETERMINANDO, AINDA, A IMPLANTAÇÃO IMEDIATA DO BENEFÍCIO ASSISTENCIAL, POR MEIO DA CEAB (CENTRAL ESPECIALIZADA DE ANÁLISE DE BENEFÍCIOS).
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL
Votante: Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR
LIDICE PENA THOMAZ
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 09/07/2024 04:16:58.