APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5009018-36.2014.404.7108/RS
RELATOR | : | JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
APELANTE | : | CAROLINA FERREIRA GONCALVES (Absolutamente Incapaz (Menor que 16 anos)) |
ADVOGADO | : | SÍLVIO CÉSAR CARRION MERLADETE |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
INTERESSADO | : | CARINE TERESINHA FERREIRA |
ADVOGADO | : | SÍLVIO CÉSAR CARRION MERLADETE |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. DEFICIÊNCIA INCONTESTE. COMPROVAÇÃO. ESTADO DE MISERABILIDADE NÃO DEMONSTRADO. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA.
Em que pese comprovada a deficiência, tenho que não restou preenchido o requisito do estado de miserabilidade, devendo ser mantida a sentença de improcedência.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 06 de maio de 2015.
Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7472323v3 e, se solicitado, do código CRC D1FFF7C0. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | João Batista Pinto Silveira |
| Data e Hora: | 08/05/2015 15:12 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5009018-36.2014.404.7108/RS
RELATOR | : | JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
APELANTE | : | CAROLINA FERREIRA GONCALVES (Absolutamente Incapaz (Menor que 16 anos)) |
ADVOGADO | : | SÍLVIO CÉSAR CARRION MERLADETE |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
INTERESSADO | : | CARINE TERESINHA FERREIRA |
ADVOGADO | : | SÍLVIO CÉSAR CARRION MERLADETE |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta contra a sentença que julgou improcedente o pedido - de concessão de benefício assistencial a portador de deficiência, com pagamento das parcelas vencidas desde a DER correspondente ao preenchimento dos requisitos até a DIB do NB 700.012.144-1 (28.10.2012), quando o benefício assistencial foi concedido administrativamente - condenando a requerente ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% do valor da causa, suspensa a exigibilidade do pagamento em face da concessão da AJG.
Da sentença apelou a parte autora postulando a condenação da recorrida na concessão do benefício assistencial desde o NB 520.839.477-0 - DER 12/06/2007, ou NB 540.080.231-8 - DER 22/03/2010 ou NB 548.123.530-3 - DER 26/09/2011, ou desde a data que comprovados todos os requisitos para concessão do benefício assistencial, com pagamento das parcelas vencidas e vincendas, considerando que restou preenchido o requisito da miserabilidade.
Sem contrarrazões de apelação, subiram os autos.
O Ministério Público Federal, com assento nesta Corte, opinou pelo provimento do apelo.
É o relatório.
VOTO
Controverte-se nos autos acerca do direito da parte autora à percepção de benefício assistencial a portadora de deficiência.
A Constituição Federal instituiu o benefício assistencial ao deficiente e ao idoso nos seguintes termos:
Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente da contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
(...)
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
A Lei n.º 8.742, de 7 de dezembro de 1993, veio a regular a matéria, merecendo transcrição o caput e os parágrafos 1º a 3º do art. 20, in verbis:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de 1 (um) salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 70 (setenta) anos ou mais e que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, entende-se como família o conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991, desde que vivam sob o mesmo teto. (Redação dada pela Lei n. 9.720, de 30.11.1998)
§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho.
§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa cuja renda mensal per capita seja inferior a ¼ (um quarto) do salário mínimo.(...)
A redação do art. 20 da LOAS, acima mencionado, foi alterada pelas Leis nº 12.435, de 06-07-2011 e nº 12.470, de 31-08-2011, passando a apresentar o seguinte teor:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)
§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 4o O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os da assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 5o A condição de acolhimento em instituições de longa permanência não prejudica o direito do idoso ou da pessoa com deficiência ao benefício de prestação continuada. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 6º A concessão do benefício ficará sujeita à avaliação da deficiência e do grau de impedimento de que trata o § 2º, composta por avaliação médica e avaliação social realizadas por médicos peritos e por assistentes sociais do Instituto Nacional de Seguro Social - INSS. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)
(...)
§ 8º A renda familiar mensal a que se refere o § 3o deverá ser declarada pelo requerente ou seu representante legal, sujeitando-se aos demais procedimentos previstos no regulamento para o deferimento do pedido. (Incluído pela Lei nº 9.720, de 30.11.1998)
(...)
§ 10. Considera-se impedimento de longo prazo, para os fins do § 2o deste artigo, aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)
No tocante ao idoso, o art. 38 da mesma Lei, com a redação dada pela Lei n.º 9.720, de 30 de novembro de 1998, dispunha (antes de ser revogado pela Lei 12.435/2011) que a idade prevista no art. 20 reduz-se para 67 anos a partir de 1º de janeiro de 1998. Esta idade sofreu nova redução, desta feita para 65 anos, pelo art. 34, caput, da Lei n.º 10.741, de 1º de outubro de 2003 (Estatuto do Idoso), idade esta que deve ser considerada a partir de 1º de janeiro de 2004, data de início da vigência do Estatuto, nos termos do seu art. 118.
Portanto, o direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: a) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, consoante a redação original do art. 20 da LOAS, ou aquela pessoa que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, consoante a redação atual do referido dispositivo) ou idoso (neste caso, considerando-se, desde 1º de janeiro de 2004, a idade de 65 anos); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) do autor e de sua família.
Acerca dos critérios para aferição da pobreza, vinha justificando a consideração do § 3º do art. 20 da LOAS, nos seguintes termos:
O Tribunal parece caminhar no sentido de se admitir que o critério de 1/4 do salário mínimo pode ser conjugado com outros fatores indicativos do estado de miserabilidade do indivíduo e de sua família para concessão do benefício assistencial de que trata o art. 203, inciso V, da Constituição.
Entendimento contrário, ou seja, no sentido da manutenção da decisão proferida na Rcl 2.303/RS, ressaltaria ao menos a inconstitucionalidade por omissão do § 3 do art. 20 da Lei n° 8.742/93, diante da insuficiência de critérios para se aferir se o deficiente ou o idoso não possuem meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, como exige o art. 203, inciso V, da Constituição.
A meu ver, toda essa reinterpretação do art. 203 da Constituição, que vem sendo realizada tanto pelo legislador como por esta Corte, pode ser reveladora de um processo de inconstitucionalização do § 3º do art. 20 da Lei n° 8.742/93.
Diante de todas essas perplexidades sobre o tema, é certo que o plenário do Tribunal terá que enfrentá-lo novamente.
Ademais, o próprio caráter alimentar do benefício em referência torna injustificada a alegada urgência da pretensão cautelar em casos como este.
(STF, Rcl 4374 MC/PE, Rel. Ministro Gilmar Mendes, DJ 06-02-07)
Nesse sentido, a orientação consolidada do Superior Tribunal de Justiça:
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. LOAS. ASSISTÊNCIA SOCIAL. PREVISÃO CONSTITUCIONAL. AFERIÇÃO DA CONDIÇÃO ECONÔMICA POR OUTROS MEIOS LEGÍTIMOS. VIABILIDADE. PRECEDENTES. PROVA. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N.º 7/STJ. INCIDÊNCIA.
1. Este Superior Tribunal de Justiça pacificou entendimento no sentido de que o critério de aferição da renda mensal previsto no § 3.º do art. 20 da Lei n.º 8.742/93 deverá ser observado como um mínimo, não excluindo a possibilidade de o julgador, ao analisar o caso concreto, lançar mão de outros elementos probatórios que afirmem a condição de miserabilidade da parte e de sua família.
2. "A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo." (REsp 1.112.557/MG, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, DJe 20/11/2009).
3. "Em respeito aos princípios da igualdade e da razoabilidade, deve ser excluído do cálculo da renda familiar per capita qualquer benefício de valor mínimo recebido por maior de 65 anos, independentemente se assistencial ou previdenciário, aplicando-se, analogicamente, o disposto no parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso." (Pet 2.203/PE, Rel. Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, TERCEIRA SEÇÃO, DJe 11/10/2011).
4. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no Ag 1394595/SP2011/0010708-7, Min. Og Fernandes, Sexta Turma, DJ de 09-05-2012)
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. LOAS. ASSISTÊNCIA SOCIAL. PREVISÃO CONSTITUCIONAL. AFERIÇÃO DA CONDIÇÃO ECONÔMICA POR OUTROS MEIOS LEGÍTIMOS. VIABILIDADE. PRECEDENTES. PROVA. REEXAME. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N.° 7/STJ.INCIDÊNCIA. REPERCUSSÃO GERAL. RECONHECIMENTO. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. SOBRESTAMENTO. NÃO APLICAÇÃO.
1. Este Superior Tribunal de Justiça pacificou entendimento no sentido de que o critério de aferição da renda mensal previsto no § 3.° do art. 20 da Lei n.° 8.742/93 deverá ser observado como um mínimo, não excluindo a possibilidade de o julgador, ao analisar o caso concreto, lançar mão de outros elementos probatórios que afirmem a condição de miserabilidade da parte e de sua família.
2. "A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo." (REsp 1.112.557/MG, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, DJe 20/11/2009).
3. Assentando a Corte Regional estarem demonstrados os requisitos à concessão do benefício assistencial, verificar se a renda mensal da família supera ou não um quarto de um salário-mínimo encontra óbice no Enunciado n.° 7 da Súmula da Jurisprudência deste Tribunal.
4. O reconhecimento de repercussão geral pelo colendo Supremo Tribunal Federal, com fulcro no art. 543-B do CPC, não tem o condão de sobrestar o julgamento dos recursos especiais em tramitação nesta Corte.
5. Agravo regimental a que se nega provimento.
(AgRg no REsp 1267161/PR, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA, julgado em 13/09/2011, DJe 28/09/2011)
Recentemente, o Egrégio Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 567985/MT (18-04-13), com repercussão geral reconhecida, revendo o seu posicionamento anterior (ADI nº 1.232/DF e Reclamações nº 2303/RS e 2298/SP), reconheceu e declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do § 3º do art. 20 da Lei 8.742/93, que estabelecia a renda familiar mensal per capita inferior a ¼ do salário mínimo para a concessão de benefício a idosos ou deficientes, em razão da defasagem do critério caracterizador da miserabilidade contido na mencionada norma. Segundo o Relator do acórdão, Min. Gilmar Mendes, os programas de assistência social no Brasil utilizam atualmente o valor de meio salário mínimo como referencial econômico para a concessão dos respectivos benefícios, tendo referido o Programa Nacional de Acesso à Alimentação - Cartão Alimentação (Lei n.º 10.689/03), o Programa Bolsa Família - PBF (Lei n.º 10.836/04), o Programa Nacional de Renda Mínima Vinculado à Educação - Bolsa Escola (Lei 10.219/2001), Programa Nacional de Renda Mínima Vinculado à Saúde - Bolsa Alimentação (MP 2.206-1/2001) Programa Auxílio-Gás (Decreto n.º 4.102/2002), Cadastramento Único do Governo Federal (Decreto 3.811/2001).
Assim, inexistindo critério numérico atual tido por constitucional pelo STF, como referencial econômico para aferição da pobreza, e tendo sido indicada a razoabilidade de considerar o valor de meio salário mínimo per capita, utilizado pelos programas de assistência social no Brasil, tal parâmetro também deve ser utilizado como balizador para aferição da miserabilidade para a concessão de benefício assistencial, conjugado com outros fatores indicativos da situação de hipossuficiência.
Por outro lado, o Supremo Tribunal Federal por decisões monocráticas de vários de seus Ministros vinha mantendo decisões que excluíam do cálculo da renda familiar per capita os valores percebidos por pessoa idosa a título de benefício previdenciário de renda mínima, não as considerando atentatórias à posição daquele Excelso Tribunal (Reclamação 4270/RN, Rel. Ministro EROS GRAU).
Mais do que isso, recentemente (sessão de 18-04-13), no julgamento do RE 580963/PR, o Pretório Excelso, por maioria de votos, reconheceu e declarou incidenter tantum a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 34 da Lei nº 10.741/03 (Estatuto do idoso), por reputar violado o princípio da isonomia, uma vez que o legislador abrira exceção para o recebimento de dois benefícios assistenciais de idoso, mas não permitira a percepção conjunta de benefício de idoso com o de deficiente ou de qualquer outro previdenciário.
Aponto, apenas, que a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 34 da Lei 10.741/2003 deu-se por omissão parcial, permitindo sua interpretação de forma extensiva. Assim, o critério da exclusão dos benefícios assistenciais continua sendo aplicado, mas não somente ele, admitindo-se, extensivamente, em razão da omissão declarada.
Assim, no cálculo da renda familiar per capita, deve ser excluído o valor auferido por idoso com 65 anos ou mais a título de benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima (EIAC nº 0006398-38.2010.404.9999/PR, julgado em 04-11-2010), ou de benefício previdenciário de valor superior ao mínimo, até o limite de um salário mínimo, bem como o valor auferido a título de benefício previdenciário por incapacidade ou assistencial em razão de deficiência, independentemente de idade (EIAC N.º 2004.04.01.017568-9/PR, Terceira Seção, julgado em 02-07-2009. Ressalto que tal pessoa, em decorrência da exclusão de sua renda, também não será considerada na composição familiar, para efeito do cálculo da renda per capita.
Por outro lado, não podem ser incluídos no cálculo da renda familiar os rendimentos auferidos por irmãos ou filhos maiores de 21 anos e não inválidos, bem assim por avós, tios, sobrinhos, primos e outros parentes não relacionados no art. 16 da Lei de Benefícios, conforme disposto no art. 20, § 1º, da Lei n.º 8.742/93, na redação dada pela Lei n.º 9.720, de 30-11-1998, ao entender como família, para efeito de concessão do benefício assistencial, o conjunto de pessoas, que vivam sob o mesmo teto, elencadas no art. 16 da Lei de Benefícios - entre as quais não se encontram aquelas antes referidas.
O egrégio Supremo Tribunal Federal tem assentado, por decisões monocráticas de seus Ministros, que decisões que excluem do cálculo da renda familiar per capita os rendimentos auferidos por pessoas não relacionadas no art. 16 da Lei de Benefícios não divergem da orientação traçada no julgamento da ADI 1.232-1, como se constata, v. g., de decisões proferidas pelos Ministros GILMAR MENDES (AI 557297/SC - DJU de 13-02-2006) e CARLOS VELLOSO (Reclamação 3891/RS - DJU de 09-12-2005).
Porém, a partir da entrada em vigor da Lei n.º 12.435, de 06-07-2011, que alterou a redação do art. 20, § 1º, da Lei n.º 8.742/93, o conceito de família, para efeito de concessão do benefício assistencial, passou a ser o conjunto de pessoas, que vivam sob o mesmo teto, ali elencadas ("Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.").
Ressalto, outrossim, que cuidados que se fazem necessário com a parte autora, em decorrência de sua deficiência, incapacidade ou idade avançada, geram despesas com aquisição de medicamentos, alimentação especial, tratamento médico, psicológico e fisioterápico, entre outros -, tais despesas podem ser levadas em consideração na análise da condição de miserabilidade da família do demandante. Referido entendimento não afronta o entendimento do Supremo Tribunal Federal esposado na ADI 1.232-1, como demonstram as decisões monocráticas dos Ministros CARLOS VELLOSO (Reclamação 3891/RS - DJU de 09-12-2005), CELSO DE MELLO (Reclamações 3750/PR, decisão de 14-10-2005, e 3893/SP, decisão de 21-10-2005) e CARLOS BRITTO (RE 447370 - DJU de 02-08-2005).
Destaca-se, por fim, que eventual circunstância de a parte autora ser beneficiária e perceber renda proveniente do Programa Bolsa Família, não só não impede a percepção do benefício assistencial do art. 203, V, da Constituição Federal, como constitui forte indicativo de que a unidade familiar encontra-se em situação de risco social.
DO CASO CONCRETO
A parte autora, menor de idade, devidamente representada por sua genitora, ajuizou a presente ação contra o INSS objetivando, sem sede de antecipação de tutela, a concessão de benefício assistencial de amparo à pessoa portadora de deficiência, inclusive com pagamento das parcelas vencidas, desde a DER correspondente ao preenchimento dos requisitos até a DIB do NB 700.012.144-1 (28.10.2012), quando o benefício assistencial foi concedido administrativamente.
Sustenta que requereu administrativamente a concessão do benefício em questão, por cerca de 05 (cinco) vezes (NB 515.550-376-7- DER 05/01/2006, NB 520.839.477-0 - DER 12.06.2007, NB 540.080.231-8 - DER 22/03/2010, NB 548.123.530-3- DER 26/09/2011 e NB 700.012.144-1 - DER 28.10.2012), sendo que obteve o deferimento apenas quanto ao último (evento 01- PADM10, pág. 02).
A sentença de primeiro grau julgou improcedente o pedido cujos fundamentos e argumentos utilizo como razões de decidir, in verbis (ev. 85 - sent1):
2. FUNDAMENTAÇÃO
I - Preliminar: Coisa julgada
Analisando o presente caso, constato que a situação que ensejou o primeiro requerimento administrativo (NB 515.550-376-7- DER 05/01/2006) restou analisado nos autos do processo 2008.71.58.007748-5, em que foi proferida sentença, em 17.12.2008, de improcedência do pedido, ante a ausência do requisito objetivo, conforme transcrição dos trechos da fundamentação:
"(...) b) Da situação narrada nos autos
Dos autos se extrai que a parte autora requereu, em 05.01.2006, o benefício de prestação continuada, havendo sido o pleito indeferido em razão do não enquadramento no art. 20, § 2º da Lei 8.742/93.
(...)
E, considerando-se que a renda mensal do pai da autora é de R$650,00 (seiscentos e cinquenta reais), bem como que o valor das despesas mensais do grupo familiar é em torno de R$ 290,00 (duzentos e noventa reais) mensais, a renda auferida pelo grupo familiar cobre as despesas mensais do grupo.
Portanto, tendo em vista a renda auferida pela família cobrir as despesas mensais do grupo, bem como ser a renda per capta familiar superior a ¼do salário mínimo, não se verifica no caso concreto o preenchimento dos requisitos para a concessão do benefício assistencial requerido (...)".
Dessa forma, as questões relativas à verificação da presença dos requisitos para concessão de benefício assistencial à parte autora no primeiro requerimento e ao pedido de pagamento das parcelas vencidas desde a referida DER já foram apreciadas nos autos supracitados, não cabendo a renovação da discussão nestes autos, sob pena de ofensa à coisa julgada material.
II- Mérito: Benefício de prestação continuada da Lei Orgânica da Assistência Social (BPC/LOAS)
A Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB) de 1988 estabeleceu, em seu art. 203, V, a "garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei".
Esse dispositivo foi complementado pela Lei Orgânica da Assistência Social, de n°. 8.742, de 07-12-93, a qual, em seus arts. 20 e 21, delineou o benefício de prestação continuada da Assistência Social.
De sua feita, essa parcela da Lei n°. 8.742/93 foi regulamentada pelo Decreto n°. 1.744, de 08-12-95.
O benefício de prestação continuada da Lei Orgânica da Assistência Social (BPC/LOAS) exige, para sua concessão, a presença de uma condição - entre duas previstas - e de dois pressupostos. Apresentam-se como condições do BPC/LOAS: (a) que a pessoa seja portadora de deficiência; ou (b) que a pessoa seja idosa. E são seus pressupostos: (a) inexistência de meios do administrado de prover à própria manutenção; e (b) inexistência de meios da família do administrado de prover à sua manutenção.
Passo a examinar essas condições e pressupostos.
I - Portador de deficiência
De acordo com o art. 20, § 2°, da Lei n°. 8.742/93 (LOAS), deve-se considerar como portadora de deficiência, para efeito de concessão do benefício, aquela comprovadamente incapaz de trabalhar e de viver as atividades da vida diária de forma independente. Essa acepção, todavia, não se coaduna com o art. 203, V, do texto constitucional, pelo qual o amparo social deve ser prestado ao portador de deficiência quando vislumbrada a impossibilidade de ter sua subsistência provida por si próprio ou por sua família.
A imposição de que a invalidez abranja os atos simples da vida demonstra-se absolutamente avessa aos preceitos do benefício assistencial, pois desampara pessoas que, embora detenham capacidade de se vestir, alimentar-se, higienizar-se e locomover-se, não ostentam condições de exercer atividade produtiva, condenando-os, mediante a impossibilidade de auferimento de renda, a uma vida de penúria extrema ou, possivelmente, à morte. Nesses casos, a subsistência dos deficientes, quando ausente condições de sua família provê-la, depende geralmente da compaixão de vizinhos e conhecidos, os quais abrem mão, por meio de donativos, de parcela de seus ganhos para socorrer os necessitados.
Evidencia-se, assim, o imprescindível auxílio de terceiros para a sobrevivência dos deficientes incapazes de laborar, corroborando uma absurda contradição, ao ponto que deixam de receber amparo assistencial justamente por serem considerados hábeis para a vida independente. Fica claro, nesse sentido, que a acepção de deficiente para o fim de concessão do BPC/LOAS está intrinsecamente conexo à comprovação da invalidez laborativa, pois ela própria é suficiente à caracterização, outrossim, da incapacidade para os atos da vida independente.
O que se vislumbra, em verdade, é uma notória distorção de valores. Enquanto a Carta Magna, exegese no art. 203, caput, aponta como o critério à concessão do BPC/LOAS o estado de necessidade, evidenciado pelo deficiente sem meios de ter provida a sua mantença por si ou por sua família, as normas hierarquicamente inferiores estabelecem a necessidade de constatar-se a incapacidade laborativa e à vida independente. Nessa seita, a análise deveria, por força hierárquica, restringir-se à necessidade ou não da percepção do amparo social à sobrevivência do deficiente. Este critério, contudo, demonstra-se de subjetivismo extremo, configurando-se a incapacidade para o trabalho como o devido ponto de abordagem, porquanto imperiosa a análise da capacidade laborativa do deficiente para o ideal exame dos pressupostos relativos à inexistência de meios de provimento da sua subsistência, demonstrando-se, caso satisfeitos estes pressupostos, um real estado de necessidade do portador de deficiência.
Daniel Machado da Rosa e José Paulo Baltazar Junior asseveram que o art. 20, § 2°, da LOAS, não pode ser chancelado, à medida que permite ao Estado dar as costas para situações de necessidade social absoluta, ferindo, dessa maneira, o princípio da universalidade. Salientam os referidos autores, ainda, que o injustificado tratamento discriminatório promovido contra os deficientes, no atinente à exigência de que estes sejam, além de invalidados ao desempenho laborativo, incapazes para a vida independente, ou seja, que reclamem o auxílio de terceiros para o exercício das atividades básicas do dia-a-dia, consiste em um verdadeiro atentado ao princípio da igualdade, uma vez que não há essa mesma exigência com relação aos idosos.
A jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região tem decidido nesse sentido, como se verifica pelo seguinte precedente, em que o Excelentíssimo Senhor Desembargador Alcides Vettorazzi, da 5ª Turma Recursal, atuou como relator:
"PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. AFASTADO. ARTIGO 20 DA LEI N.º 8.742/93. DOENÇA. HIV. RENDA MÍNIMA. REQUISITOS PREENCHIDOS. (...). A concessão do amparo assistencial é devida às pessoas portadoras de deficiência e idosos, mediante a demonstração de não possuírem meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. (...). A Constituição Federal direciona, no art. 203, inc. V, que fará jus ao benefício a pessoa "portadora de deficiência", nada referindo quanto a vida independente, sendo vedado à norma regulamentar avançar sobre aspecto não constante daquela hierarquicamente superior. Possível extrair que a deficiência deve ser compreendida como aquela que impede o portador de exercer um trabalho, com o que seguramente também resta obstado de ter uma vida independente. Conclusão emergente da leitura da própria Lei nº 8742/93, art. 20, quando faz a junção de vida independente e trabalho. (...). O fato do pretendente não necessitar de auxílio para se alimentar, se vestir, se locomover, não é razão para obstruir o direito ao benefício. Precedentes do STJ e TRF 4ª Região. (...)." (TRF4, APELREEX n. 200472010057936, 5ª Turma, Rel. Des. Fed. Alcides Vettorazzi, Sessão de 30.09.2008).
Quanto à concessão do BPC/LOAS a pessoas deficientes, cabe sinalar, ainda, que o entendimento deste Juízo é pelo necessário caráter permanente e total da deficiência. Embora o tema motive grande controvérsia jurisprudencial, essa acepção possui sustentação em acórdãos dos TRFs, como se vislumbra pelas seguintes ementas:
"PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. LEI 8.742/93, ARTS. 20 E 21. PROVA PERICIAL: INCAPACIDADE TEMPORÁRIA E PARCIAL. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO. 1. A prova pericial se encarregou de demonstrar que a autora tem incapacidade parcial e temporária, pelo que não faz jus ao benefício, nos termos do art. 20 da Lei 8.742/93. (...)." (TRF1, AC n. 199901000518210, 2ª Turma, Rel. Juiz Carlos Alberto Simões de Tomaz, Sessão de 15.09.2004).
"CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL - PROVA ORAL REQUERIDA NÃO REALIZADA - CERCEAMENTO DE DEFESA - INOCORRÊNCIA. ASSISTÊNCIA SOCIAL - BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA - ART. 203, INCISO V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL - DEFICIENTE - CONDIÇÃO NÃO RECONHECIDA - NECESSIDADE NÃO COMPROVADA. (...). O autor é portador de doença grave, angiofibroma juvenil, que provoca reações alérgicas, com sangramento e dor de cabeça, mas passível de recuperação, através de tratamento médico adequado, sendo sua incapacidade para o trabalho apenas temporária, restando, assim, não preenchido o requisito da deficiência. (...)." (TRF3, AC n. 200061130043826, 9ª Turma, Rel.(a) Juíza Marisa Santos, Sessão de 07.03.2005).
"PREVIDENCIÁRIO - BENEFÍCIO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL - ART. 203, V, DA CF/88 - PESSOA DEFICIENTE - INCAPACIDADE TOTAL E TEMPORÁRIA - AGRAVO IMPROVIDO - APELO DA AUTORA IMPROVIDO - SENTENÇA MANTIDA. (...). Ausente um dois requisitos legais, vez que a deficiência incapacitante apresentada pela autora é apenas temporária, impõe-se a denegação do benefício de assistência social (art. 203, V, da CF/88). (...)." (TRF3, AC n. 200303990043021, 7ª Turma, Rel.(a) Juíza Daldice Santana, Sessão de 06.10.2003).
Demonstra-se, de fato, sem sentido a concessão do BPC/LOAS a portadores de deficiência parcial e temporária. A debilidade parcial não tem o condão de obstar o exercício oniprofissional, podendo o deficiente, segundo a espécie de deficiência, ser direcionado ou reabilitado a atividades laborativas distintas, configurando-se, assim, a possibilidade de se prover a própria manutenção e, por conseguinte, de viver de forma independente. Da mesma forma, não faz jus ao benefício aquele que ostentar deficiência meramente temporária, porquanto é da essência do BPC/LOAS a concessão por prazo indeterminado.
Não obstante a necessária revisão bienal do benefício, prevista no art. 42, caput, do Decreto 6.214/2007, consistente na avaliação da continuidade das suas condições originárias, não é possível que seja esse estabelecido por prazo igual ao do estado incapacitante. Para exemplificar, livrando-se o portador de deficiência dessa condição dentro de alguns meses da concessão do BPC/LOAS, manter-se-ia auferindo o benefício, de forma indevida, pelo período superior a um ano, até a realização do reexame bienal. Seria absolutamente irracional coagir a Previdência Social a esse tipo de procedimento, pelo qual faz-se forçoso o caráter total e permanente da deficiência.
Assim sendo, deve-se reputar como deficiente, para o fim de concessão do benefício ora postulado, a pessoa portadora de deficiência total e permanente, incapacitada ao exercício de atividade laborativa.
II - Inexistência de meios do administrado de prover à própria manutenção:
É pressuposto do BPC/LOAS que o administrado não possua meios de se sustentar. Logo, o administrado não pode auferir renda de natureza alguma. Também não pode possuir patrimônio que lhe garanta alguma renda.
III - Inexistência de meios da família do administrado de prover à sua manutenção:
Igualmente figura como pressuposto do BPC/LOAS que a família do administrado não possua meios de prover à sua manutenção.
Família, para o fim de concessão do BPC/LOAS, é o conjunto formado por cônjuges, companheiros, filhos, pais, irmãos, enteados e menores tutelados. Esse conjunto deve ser mononuclear e seus integrantes devem viver sob o mesmo teto. Demais disso, a economia desse conjunto deve ser mantida pela contribuição de seus integrantes. Exegese do art. 20, § 1°, da Lei n°. 8.742/93; e do art. 2°, I, do Dec. n°. 1.744/95.
Dispõe o art. 20, § 3°, da Lei n°. 8.742/93, que se considera "incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a ¼ (um quarto) do salário mínimo."
Esse dispositivo - art. 20, § 3°, da Lei n°. 8.742/93 - foi objeto da ADIN n°. 1.232-1/DF. Nesta Ação, aduziu-se a inconstitucionalidade do dispositivo em exame frente ao teor do art. 203, V, da Carta Política. Foi ela julgada improcedente (STF, Sessão Plenária de 27-8-98, DJ de 01-6-01, Rel. para o Acórdão Min. Nelson Jobim).
Esse julgamento vincula os demais Órgãos do Poder Judiciário: art. 28, parágrafo único, da Lei n°. 9.868/99. Contudo, essa vinculação, no meu entender, somente se opera na medida da causa de pedir do pedido de inconstitucionalidade julgado improcedente. Logo, quanto ao tema em foco, tenho que os demais Órgãos do Poder Judiciário não podem mais declarar a inconstitucionalidade do art. 20, § 3°, da Lei n°. 8.742/93 por afronta ao art. 203, V, da CRFB. Todavia, podem fazê-lo, se for o caso, por violação a qualquer outro dispositivo da Carta Política.
Dito isso, julgo que o valor de ¼ do salário mínimo fixado - no art. 20, § 3°, da Lei n°. 8.742/93, pelo Legislador infraconstitucional - como limite máximo da renda mensal per capita da família que pode ser considerada incapaz de prover o sustento do administrado candidato à concessão do BPC/LOAS viola o princípio da dignidade humana, o qual foi insculpido como fundamento da República Federativa do Brasil no art. 1°, III, da Carta Política de 1988.
A Constituição de um Estado Democrático de Direito deve ter valor efetivo na vida real e cotidiana dos cidadãos, os quais são os detentores do poder que legitimou sua feitura. O princípio da dignidade da pessoa humana está assentado, na Constituição, como fundamento de nosso País. Logo, ele deve pautar a atividade de todos os Poderes de nosso Estado.
Considerando os contornos da vida real, sabe-se que exigir que uma família - que tenha como um de seus integrantes uma pessoa portadora de deficiência ou uma pessoa idosa com mais de sessenta e sete anos de idade (atualmente) - ostente renda mensal per capita igual ou inferior a ¼ do salário mínimo para que seu integrante deficiente ou idoso faça jus ao benefício assistencial de um salário mínimo por mês afronta, no meu entender, o princípio da dignidade humana. Isso, na vida real, significa exigir que a família do administrado candidato ao benefício viva sob a condição de extrema miséria para que faça jus à assistência do Estado. Exemplificando, significa exigir que tal família não tenha direito a moradia, alimentação e vestuário, ao menos de forma digna. Nem há sentido em cogitar sobre a falta dos valores saúde, educação, cultura e lazer, porque, para quem não tem aqueles primeiros (moradia, alimentação e vestuário), gozar destes não passa de um sonho distante e inalcançável. Em síntese, tenho que essa exigência normativa malfere o princípio da dignidade humana.
Sendo assim, entendo que o art. 20, § 3°, da Lei n°. 8.742/93 se mostra inconstitucional por violação ao art. 1°, III, da CRFB de 1988.
Revelada essa inconstitucionalidade, tenho que cabe ao juiz, a cada caso concreto, definir o conceito da elementar inexistência de meios da família do administrado de prover à sua manutenção, a qual integra a tipicidade do direito ao BPC/LOAS construída no art. 203, V, da CRFB de 1988 e no art. 20 da Lei n°. 8.742/93 (excetuando-se o § 3° ora declarado inconstitucional).
Dessa forma, deve o juiz verificar, no caso concreto, se a família do administrado possui, ou não, condições de provê-lo. Nesse mister, devem ser examinados os elementos socioeconômicos da família, tais como número de integrantes, rendas e despesas. Tenho que é o cotejo desses elementos da família que pode revelar se esta tem, ou não, condições de prover o sustento do integrante deficiente ou idoso.
IV - Impende sinalar, por derradeiro, que o BPC/LOAS possui o valor mensal de um salário mínimo, não gerando direito à gratificação natalina.
III- Do caso concreto
Conforme já mencionado, considerando que houve a concessão de benefício assistencial em favor da parte autora, pela via administrativa, o qual vem mantido até a presente data, ressalto que a análise no presente feito restringe-se ao lapso temporal referente à data de um dos quatro requerimentos administrativos que antecederam a concessão que corresponder a data em que a parte autora implementou os requisitos até a DIB do NB 700.012.144-1, período em que a parte autora sustenta ter permanecido desassistida do benefício de prestação continuada.
Conforme já assinalado em preliminar, o requerimento referente ao NB 515.550-376-7 (DER 05/01/2006) encontra-se indiscutivelmente abrangido pela coisa julgada.
Passo, então, a análise dos requisitos referentes aos demais requerimentos (NB 520.839.477-0 - DER 12.06.2007, NB 540.080.231-8 - DER 22/03/2010 e NB 548.123.530-3- DER 26/09/2011), nos termos da legislação vigente àquela época.
Quanto ao requisito subjetivo, considerando que a parte autora é menor de idade, esta somente fará jus ao benefício se enquadrar-se como deficiente.
De acordo com a Súmula nº 29, da Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais, "Para os efeitos do art. 20, § 2º, da Lei n. 8.742, de 1993, incapacidade para a vida independente não é só aquela que impede as atividades mais elementares da pessoa, mas também a impossibilita de prover ao próprio sustento".
Segundo o laudo médico (evento 62), a parte autora nasceu com o diagnóstico de nerofibromatose e desenvolveu pseudoartrose congênita das tíbias bilateral, em tratamento (Q68.4), patologia congênita que a incapacita totalmente não somente para o exercício do trabalho como também para os atos da vida independente.
Conforme conclusão do médico perito, a Parte Autora apresenta incapacidade laborativa total, decorrente de moléstias progressivas, estando, por conseguinte, implementado o requisito subjetivo em todos os requerimentos administrativos.
Quanto ao requisito objetivo, de acordo com as informações resultantes da perícia socioeconômica realizada (evento 70), o grupo familiar relevante para o cômputo da renda per capita é atualmente composto pela parte autora, sua genitora e três irmãos menores de idade (cinco pessoas).
Segundo o laudo pericial, atualmente, a autora sobrevive dos rendimentos auferidos pelas atividades informais exercidas pela genitora (artesã), que oscilam em torno de R$ 250,00 (duzentos e cinquenta reais), bem como pelo cadastro no programa social Bolsa Família, no valor de R$ 217,00 (duzentos e dezessete reais). Além disso, segundo informado pela mãe da autora, não recebem auxílio do ex-marido.
Ocorre que, segundo o laudo socioeconômico, até o ano de 2012 aproximadamente, o grupo familiar era composto pela autora, seus pais e os três irmãos e que, após tal data, pela separação dos pais, houve diminuição da renda familiar, haja vista o genitor não mais contribuir para a prestação alimentar do grupo.
Assim, apesar de atualmente a parte autora preencher o requisito objetivo - tanto que tal fato foi reconhecido pelo INSS, ainda no ano de 2012, quando do deferimento pedido administrativo -, há que se ponderar, no entanto, que a análise em questão, por tratar-se de pleito referente à verbas não pagas, deve ser retroativa.
Nesse sentido, em que pese a fundamentação da sentença não gerar o efeito de coisa julgada, não se pode simplesmente ignorar, justamente por se tratar de análise retrospectiva, que durante a instrução da ação nº 2008.71.58.007748-5 (ajuizada em junho/2008), em que se pleiteava a concessão do primeiro requerimento administrativo (DER em 2006), constatou-se que a renda familiar ultrapassava o limite previsto como renda per capita.
Nesse contexto, o segundo requerimento administrativo (NB 520.839.477-0 - DER 12.06.2007), apesar de não ser objeto direto do referido processo judicial, encontra-se igualmente abrangido por este, na medida em que as provas judiciais ali produzidas demonstram que a parte autora não preenchia o requisito econômico, ao menos até o ano de 2008 (data da realização da perícia socieconômica).
Por fim, quanto aos requerimentos NB 540.080.231-8 (DER 22/03/2010) e NB 548.123.530-3 (DER 26/09/2011), observo que, de acordo com informação obtida por ocasião da realização da perícia socieconômica de instrução deste feito, associada à informação da sentença proferida nos autos do processo nº 2008.71.58.007748-5, a mesma situação econômica constatada ainda na perícia realizada em 2008 manteve-se a mesma até o ano de 2012, período em que genitor da parte autora, provedor do grupo familiar, manteve convívio com esta.
Dessa forma, compulsando os autos, observo que justamente quando houve alteração do grupo familiar da parte autora e, consequentemente, a redução da renda familiar auferida, ensejando o preenchimento do requisito objetivo exigido pela LOAS, o benefício assistencial foi concedido administrativamente (NB 700.012.144-1 (DIB 28.10.2012).
Nesse passo, não há que se falar em lapso temporal em que a parte autora tenha permanecido desassistida, ante a ausência de requisito essencial à concessão do benefício assistencial em data anterior à DIB do NB 700.012.144-1 (28.10.2012), não havendo verbas devidas a serem pagas, de modo que se impõe a improcedência do pleito.
Como bem observou o magistrado na sentença, quando houve alteração do grupo familiar da parte autora que gerou a redução da renda familiar auferida, e, por consequência o preenchimento do requisito da miserabilidade, o benefício assistencial foi concedido administrativamente (NB 700.012.144-1 (DIB 28.10.2012). Assim, não há que se falar em lapso temporal em que a parte autora tenha permanecido desassistida, ante a ausência de requisito essencial à concessão do benefício assistencial em data anterior à DIB do NB 700.012.144-1 (28.10.2012), não havendo verbas devidas a serem pagas.
Ônus sucumbenciais mantidos nos termos em que fixados na r. sentença de primeiro grau, suspensos enquanto perdurar a condição da autora de necessitada.
Ante o exposto, voto por negar provimento ao recurso.
Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 06/05/2015
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 5009018-36.2014.404.7108/RS
ORIGEM: RS 50090183620144047108
RELATOR | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PRESIDENTE | : | Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Flávio Augusto de Andrade Strapason |
APELANTE | : | CAROLINA FERREIRA GONCALVES (Absolutamente Incapaz (Menor que 16 anos)) |
ADVOGADO | : | SÍLVIO CÉSAR CARRION MERLADETE |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
INTERESSADO | : | CARINE TERESINHA FERREIRA |
ADVOGADO | : | SÍLVIO CÉSAR CARRION MERLADETE |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 06/05/2015, na seqüência 228, disponibilizada no DE de 24/04/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
: | Des. Federal CELSO KIPPER | |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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