APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5001335-96.2015.4.04.7209/SC
RELATOR | : | TAIS SCHILLING FERRAZ |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | JULIANA MICHALAK |
ADVOGADO | : | JULIAN PETERS |
APELADO | : | OS MESMOS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. IDOSO. CRITÉRIO ECONÔMICO. BENEFÍCIO DE VALOR MÍNIMO. DESCONSIDERAÇÃO. AUSÊNCIA DE IRREGULARIDADE. COBRANÇA INDEVIDA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO.
O art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/1993 - LOAS, estabelecia, quanto ao pressuposto econômico para deferimento do amparo, que seria considerada hipossuficiente a pessoa com deficiência ou idoso cuja família possuísse renda per capita inferior a ¼ do salário mínimo.
Entretanto, o Supremo Tribunal Federal, ao analisar os recursos extraordinários 567.985 e 580.963, ambos submetidos à repercussão geral, reconheceu a inconstitucionalidade do § 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/1993, assim como do art. 34 da Lei 10.741/2003 - Estatuto do Idoso, permitindo que o requisito econômico, para fins de concessão do benefício assistencial, seja aferido caso a caso.
O STF, no julgamento do RE 580.963/PR, com repercussão geral, proclamou a inconstitucionalidade por omissão parcial, sem declaração de nulidade, do art. 34, parágrafo único, da Lei 10.741/2003 (Estatuto do Idoso), o qual permite desconsiderar, para fins de cálculo da renda mensal per capita do grupo familiar do pretendente do benefício assistencial de prestação continuada, o valor de até um salário mínimo percebido por idoso já titular de benefício de mesma natureza.
Sendo a renda do marido da autora, à época da concessão do benefício assistencial, pouco superior a um salário mínimo, e sendo sopesados critérios de vulnerabilidade social que foram considerados determinantes para a concessão do amparo, não há falar em irregularidade no ato de outorga, sendo indevida a cobrança realizada pelo INSS no sentido de ver devolvidos os valores pagos no período referido na inicial.
Considerados os critérios do artigo 20, §3º e §4º, do CPC de 1973, justifica-se a majoração da verba advocatícia para 10% sobre o valor da causa.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso da parte autora e negar provimento ao apelo do INSS e à remessa necessária, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 19 de julho de 2016.
Juíza Federal Taís Schilling Ferraz
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Juíza Federal Taís Schilling Ferraz, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8397692v18 e, se solicitado, do código CRC 4E9FC5FD. | |
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5001335-96.2015.4.04.7209/SC
RELATOR | : | TAIS SCHILLING FERRAZ |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | JULIANA MICHALAK |
ADVOGADO | : | JULIAN PETERS |
APELADO | : | OS MESMOS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária proposta por Juliana Michalak contra o INSS, com pedido de tutela antecipada, objetivando a declaração da inexistência da dívida de R$ 71.480,38 (setenta e um mil, quatrocentos e oitenta reais e trinta e oito centavos), ao argumento de que não recebeu irregularmente o benefício de amparo assistencial no período de 25/03/2004 a 25/11/2013.
A tutela antecipada foi deferida (evento 3).
A sentença (evento 16) confirmou a antecipação dos efeitos da tutela e julgou procedente o pedido, extinguindo o feito com resolução do mérito, com base no art. 269, I, do CPC, para o efeito de reconhecer a inexistência da dívida apontada pelo INSS, de R$ 71.480,38 (setenta e um mil quatrocentos e oitenta reais e trinta e oito centavos), por conta do recebimento do benefício assistencial NB 88/132.054.493-0 e, por conseguinte, determinar que o INSS se abstenha de proceder à sua cobrança. Condenou-o, ainda, ao pagamento dos honorários advocatícios, fixados em 5% sobre o valor da causa. Sem custas processuais.
Apela a autora postulando a majoração dos honorários advocatícios para o montante de 20% sobre o valor da causa.
O INSS, por sua vez, recorre argumentando a possibilidade de cobrança dos valores relativos ao benefício assistencial ao idoso, devido à constatação de que a renda do marido, relativa à aposentadoria por tempo de contribuição, era superior ao salário mínimo.
Após as contrarrazões, e por força de reexame necessário, vieram os autos a este Tribunal para julgamento.
É o relatório.
VOTO
REMESSA NECESSÁRIA
Nos termos do artigo 14 do novo CPC, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada".
O intuito do legislador foi salvaguardar os atos já praticados, perfeitos e acabados, aplicando-se a nova lei processual com efeitos prospectivos.
Nesse sentido, quando publicada, a sentença destes autos estava sujeita a reexame obrigatório.
A superveniência dos novos parâmetros para remessa necessária (NCPC, art. 496, § 3º), entretanto, permitiria a interpretação de que houve fato superveniente à remessa, que suprimiu o interesse da Fazenda Pública em ver reexaminadas sentenças que a houvessem condenado ou garantido proveito econômico à outra parte em valores correspondentes a até mil salários mínimos. Inexistindo o interesse, por força da sobrevinda dos novos parâmetros, não haveria condição (interesse) para o conhecimento da remessa.
No entanto, em precedente sucessivamente repetido, o STJ assentou que a lei vigente à época da prolação da decisão recorrida é a que rege o cabimento da remessa oficial (REsp 642.838/SP, rel. Min. Teori Zavascki).
Nesses termos, em atenção ao precedente citado, impõe-se que a possibilidade de conhecimento da remessa necessária das sentenças anteriores à mudança processual observe os parâmetros do CPC de 1973.
No caso dos autos, ademais, incide o disposto na Súmula 490 do STJ, segundo a qual, a dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas, situação aqui configurada, razão pela qual conheço da remessa oficial.
Recurso do INSS
Devolução dos valores
A controvérsia que sobressai no caso concreto diz com o fato de ter sido indevido o pagamento do benefício assistencial à demandante, cancelado pelo INSS ao argumento de que foi considerado, de forma equivocada, na composição da renda familiar, benefício percebido pelo marido da autora, superior ao salário mínimo à época.
Na concessão do benefício assistencial, cabe registrar, em relação ao critério econômico, que o art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/1993, estabelecia que se considerava hipossuficiente a pessoa com deficiência ou idoso cuja família possuísse renda per capita inferior a ¼ do salário mínimo.
Contudo, o Superior Tribunal de Justiça, por sua Terceira Seção, ao apreciar recurso especial representativo de controvérsia, relativizou o critério estabelecido pelo referido dispositivo legal. Entendeu que, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana, "a limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a ¼ do salário mínimo" (REsp n. 1.112.557/MG, rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Terceira Seção, j. 28/10/2009, DJ 20/11/2009).
Além disso, o STJ, órgão ao qual compete a uniformização da interpretação da lei federal, acrescentou, no julgado citado, que "em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado".
Como se percebe, o entendimento da Corte Superior consolidou-se no sentido de que é possível a aferição da miserabilidade do deficiente ou do idoso por outros meios, ainda que não observado estritamente o critério da renda familiar per capita previsto no § 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/1993.
O Supremo Tribunal Federal, ao analisar os recursos extraordinários 567.985 e 580.963, ambos submetidos à repercussão geral, reconheceu a inconstitucionalidade do § 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/1993 - LOAS, assim como do parágrafo único do art. 34 da Lei 10.741/2003 - Estatuto do Idoso.
No primeiro caso, o STF identificou a ocorrência de um processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro), assentando, assim, que o critério econômico presente na LOAS não pode ser tomado como absoluto.
Quanto ao parágrafo único do art. 34, que estabelece que o benefício assistencial já concedido a qualquer idoso membro da família "não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS", entendeu a Suprema Corte que violou o princípio da isonomia. Isso porque abriu exceção para o recebimento de dois benefícios assistenciais por idosos, mas não permitiu a percepção conjunta de benefício de idoso com o de deficiente ou de qualquer outro previdenciário.
Assim, incorreu o legislador em equívoco, pois, tratando-se de situações idênticas, deveria ser possível a exclusão do cômputo do benefício, independentemente de sua origem.
Este Tribunal, a propósito, já vinha decidindo no sentido da desconsideração da interpretação restritiva do artigo 34, parágrafo único, do Estatuto do Idoso, como se percebe dos seguintes precedentes: Apelação Cível 5001120-20.2010.404.7202, 6ª. Turma, Relator Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle; Apelação Cível 5000629-13.2010.404.7202, 5ª. Turma, Relator Ricardo Teixeira do Valle Pereira; AC 0012386-06.2011.404.9999, 5ª Turma, Relator Rogério Favreto.
Reconhecida a inconstitucionalidade do critério objetivo para aferição do requisito econômico do benefício assistencial, em regime de repercussão geral, cabe ao julgador, na análise do caso concreto, identificar o estado de miserabilidade da parte autora e de sua família. De registrar que esta Corte, ainda que por outros fundamentos, vinha adotando uma maior flexibilização nos casos em que a renda per capita superava o limite estabelecido no art. 20, § 3º, da LOAS, agora dispensável enquanto parâmetro objetivo de aferição da renda familiar.
Nesse esteira, como bem consignou o magistrado singular, "não houve qualquer irregularidade na concessão do benefício assistencial à parte autora. Isso porque ao calcular a renda familiar do idoso (autora), o INSS não poderia considerar no cálculo o benefício previdenciário de aposentadoria por tempo de contribuição de renda próxima a mínima percebido por seu marido, ainda, que tal valor tivesse sido informado.
Saliento, que embora o benefício do marido da autora fosse um pouco superior ao valor do salário mínimo nacional vigente (RMI em 2013: 688,43 e Salário mínimo em 2013: 678,00), o TRF da 4ª Região possui precedente no sentido de que essa circunstância não é suficiente para afastar a situação de miserabilidade ensejadora do LOAS, porque atualmente inexiste critério numérico tido por constitucional pelo STF para a aferição objetiva da situação de miserabilidade (TRF4, AC 0006522-16.2013.404.9999, Sexta Turma, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 10/07/2013).
Ademais, tem-se entendido que, em razão do caráter alimentar da verba recebida, os valores recebidos pelo segurado por erro do INSS são irrepetíveis, salvo no caso em que demonstrada a má-fé daquele. E mesmo que assim não fosse, a autora recebe proventos no patamar de 1 (um) salário mínimo os quais não podem ser reduzidos mediante os descontos promovidos pelo INSS, em razão da garantia prevista no § 2º do art. 201 da Constituição Federal, segundo a qual "nenhum benefício que substitua o salário de contribuição ou o rendimento do trabalho do segurado terá valor mensal inferior ao salário mínimo".
Dessa forma, muito embora a renda do marido da autora, à época, fosse no valor um pouco superior ao salário mínimo, como se apura do evento 1 -PROCADM7 (fl. 19), a concessão foi legítima, não havendo qualquer irregularidade e valor a ser devolvido, não havendo motivo, outrossim, para que se perquira acerca da existência ou não de má-fé da demandante.
Ademais, trata-se de tentativa do INSS de rever critério de análise das condições para a concessão do benefício, que sempre passará por uma avaliação individualizada das condições específicas. A reanálise desta prova, sem que se identifique hipótese de ilegalidade, viola a segurança jurídica.
Nesse contexto, o recurso do INSS não merece acolhida.
Recurso da parte autora
Quanto aos honorários advocatícios, adoto o entendimento constante de precedente do Superior Tribunal de Justiça (REsp 556.741) no sentido de que a norma a reger a sucumbência é aquela vigente na data da publicação da sentença. Assim, para as sentenças publicadas ainda sob a égide do CPC de 1973, aplicável, quanto à sucumbência, aquele regramento.
Os honorários advocatícios foram fixados em 5% sobre o valor da causa. Sopesados os critérios do artigo 20, §3º e §4º, do CPC de 1973, justifica-se a majoração da honorária para 10% sobre o valor da causa, atendendo-se, em parte, o pedido da demandante.
Conclusão
Desprovido o apelo do INSS e a remessa oficial. Provido em parte o recurso da demandante para majorar os honorários advocatícios para 10% sobre o valor da causa.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao recurso da parte autora e negar provimento ao apelo do INSS e à remessa necessária.
Juíza Federal Taís Schilling Ferraz
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 19/07/2016
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5001335-96.2015.4.04.7209/SC
ORIGEM: SC 50013359620154047209
RELATOR | : | Juiza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Marcus Vinícius Aguiar Macedo |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | JULIANA MICHALAK |
ADVOGADO | : | JULIAN PETERS |
APELADO | : | OS MESMOS |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 19/07/2016, na seqüência 527, disponibilizada no DE de 28/06/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DA PARTE AUTORA E NEGAR PROVIMENTO AO APELO DO INSS E À REMESSA NECESSÁRIA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
VOTANTE(S) | : | Juiza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ | |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
| Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8466390v1 e, se solicitado, do código CRC 9D1032F3. | |
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