APELAÇÃO CÍVEL Nº 5029163-39.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | ÉZIO TEIXEIRA |
APELANTE | : | ELIANE NUNES DE PROENCA |
ADVOGADO | : | GABRIELA BARROS SANTOS SILVA |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. INCAPACIDADE. MISERABILIDADE. TERMO INICIAL. DATA DE REALIZAÇÃO DA PERÍCIA JUDICIAL. TUTELA ANTECIPADA.
1. Comprovado pelo conjunto probatório que a parte autora é portadora de enfermidade que a torna permanentemente incapaz, considerados o quadro clínico e a impossibilidade de recuperação, bem como existente o estado de miserabilidade do grupo familiar, é de ser concedido o benefício assistencial.
2. O termo inicial é a data da perícia, na ausência de elementos outros que possam apontar o início da incapacidade.
3. Tutela antecipada mantida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao Apelo da parte autora e à Remessa Oficial, bem como determinar o cumprimento do acórdão, mantendo-se a antecipação de tutela anteriormente deferida, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 17 de maio de 2017.
Ezio Teixeira
Relator
| Documento eletrônico assinado por Ezio Teixeira, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8945109v3 e, se solicitado, do código CRC A1D41C1F. | |
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| Signatário (a): | Ezio Teixeira |
| Data e Hora: | 22/05/2017 14:58 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5029163-39.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | ÉZIO TEIXEIRA |
APELANTE | : | ELIANE NUNES DE PROENCA |
ADVOGADO | : | GABRIELA BARROS SANTOS SILVA |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação interposta pela Parte Autora e Remessa Oficial contra sentença que assim decidiu:
"III - DISPOSITIVO
ANTE TODO O EXPOSTO, resolvendo o mérito na forma do art. 269, I do CPC, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido formulado por ELAINE DE NUNES PROENÇA, para condenar o INSS a conceder à autora o benefício de AMPARO ASSISTENCIAL A PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA (Código B-87) nos termos do art. 20, § 2º e § 3º, todos da Lei 8.743/92, desde a data da realização do laudo médico pericial, em 14.08.2014, TORNANDO DEFINITIVOS OS EFEITOS DA TUTELA ANTECIPADA.
Condeno ainda a requerida ao pagamento das custas processuais, por não aplicar-se à jurisdição delegada as regras da Lei Federal nº 9.289/96.
Deverá o vencido pagar honorários advocatícios a parte autora, fixados em 10% sobre o valor atualizado (Súmula 14 do STJ) das prestações vencidas até a presente data (Súmula 111 do STJ).
Oportunamente, observe-se artigo 475, § 2º, do Código de Processo Civil, com a redação dada pela Lei n.º 10.352/2001.
Publicações e registros já formalizados. Intimem-se.
Cumpram-se as demais disposições do Código de Normas da Corregedoria Geral da Justiça."
Apela a parte autora, pugnando pela reformada da sentença para que a DIB do benefício seja fixada em 13/09/2011 (DER), com o pagamento dos atrasados desde o ano de 2011.
Subiram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
REMESSA NECESSÁRIA
O art. 14 do CPC/2015 prevê a irretroatividade da norma processual a situações jurídicas já consolidadas. A partir disso, verifico que a sentença foi publicada na vigência do CPC/1973, de modo que não é aplicável o art. 496 do CPC/2015, em relação à remessa necessária, em razão da irretroatividade.
De acordo com a decisão do Superior Tribunal de Justiça, por sua Corte Especial (EREsp 934642/PR), em matéria previdenciária, as sentenças proferidas contra o INSS só não estarão sujeitas ao duplo grau obrigatório se a condenação for de valor certo (líquido) inferior a sessenta salários mínimos.
Não sendo esse o caso dos autos, admito como interposta a remessa necessária.
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL
O benefício assistencial encontra amparo constitucional no art. 203, inciso V, da Constituição Federal, com a seguinte redação:
"Art. 203. [...]
V - A garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei."
A Assistência Social é técnica de proteção social prestada com base no critério da efetiva necessidade, que confere efetividade ao princípio da solidariedade social, como exigência do bem-estar comum. A Necessidade é dado fundamental para deflagrar a proteção assistencial. Nesse sentido, o beneficiário da assistência social não tem condições de colaborar na manutenção do sistema garantidor de Previdência. Não tendo condições de subsistência não pode, por isso mesmo, arcar com o plus de contribuir.
Para a concessão do referido benefício Assistencial de 01 (um) salário mínimo, por sua vez, segundo a lei regulamentadora, Lei nº 8.742/93, em seu art. 20, deverá o postulante enquadrar-se em uma das seguintes hipóteses:
- Ser portador de deficiência que acarrete incapacidade para a vida independente e para o trabalho.
- Ser idoso com 70 (setenta) anos de idade ou mais.
Porém, a partir da Lei nº 10.741/2003, que institui o Estatuto do Idoso, foi reduzido o requisito etário a 65 (sessenta e cinco) anos, para concessão do benefício assistencial ao idoso, na forma do seu art. 34, tornando regra positiva o entendimento jurisprudencial que já estava consolidado.
O Decreto nº 6.214/2007 regulamenta a Lei nº 8.742/1993 e a Lei nº 10.741/2003 (Estatuto do Idoso). Em seu art. 1º, limitado ao poder regulamentar, remete ao art. 20 da Lei nº 8.742/93, esclarecendo que a garantia de um salário mínimo mensal se estende à pessoa com deficiência e ao idoso, com idade de sessenta e cinco anos ou mais, que comprovem não possuir condições de auto-sustentar-se ou ter seu sustento assegurado por sua família.
O novo regulamento do benefício de Prestação Continuada apresenta os seus objetivos de enfrentar a pobreza, garantir a proteção social, prover condições para atender às contingências sociais e à universalização dos direitos sociais. Para tanto, atendendo à demanda da sociedade pela positivação explícita da interpretação jurisprudencial consolidada, acerca do benefício assistencial, o art. 4º do Decreto nº 6.214/2007, traz a definição das expressões lingüísticas que compõem o benefício assistencial, na seguinte redação:
"Art. 4º. Para os fins do reconhecimento do direito ao benefício, considera-se:
I - idoso: aquele com idade de sessenta e cinco anos ou mais;
II - pessoa com deficiência: aquela cuja deficiência a incapacita para a vida independente e para o trabalho;
III - incapacidade: fenômeno multidimensional que abrange limitação do desempenho de atividade e restrição da participação, com redução efetiva e acentuada da capacidade de inclusão social, em correspondência à interação entre a pessoa com deficiência e seu ambiente físico e social;
IV - família incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou do idoso: aquela cuja renda mensal bruta familiar dividida pelo número de seus integrantes seja inferior a um quarto do salário mínimo;
V - família para cálculo da renda per capita, conforme disposto no § 1o do art. 20 da Lei no 8.742, de 1993: conjunto de pessoas que vivem sob o mesmo teto, assim entendidos, o requerente, o cônjuge, a companheira, o companheiro, o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 anos ou inválido, os pais, e o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 anos ou inválido; e
VI - renda mensal bruta familiar: a soma dos rendimentos brutos auferidos mensalmente pelos membros da família composta por salários, proventos, pensões, pensões alimentícias, benefícios de previdência pública ou privada, comissões, pró-labore, outros rendimentos do trabalho não assalariado, rendimentos do mercado informal ou autônomo, rendimentos auferidos do patrimônio, Renda Mensal Vitalícia e benefício de Prestação Continuada, ressalvado o disposto no parágrafo único do art. 19." (Grifei)
Dos dispositivos supracitados, infere-se que a parte autora deve comprovar a sua condição de miserabilidade e sua deficiência, agora enquanto fenômeno multidimensional que revela a limitação para o desempenho de atividade laboral e restrição da participação na sociedade por estar limitada a capacidade de inclusão social.
Não se pode deixar de referir, todavia, as mudanças na LOAS, promovidas pela Lei nº 12.435/2011. No art. 20, caput, da Lei nº 8.742/93, foi integrado o requisito etário para o idoso, conforme já fixado no Estatuto do Idoso, ou seja, 65 anos. Logo em seguida, o § 1º traz regra interpretativa que amplia o conceito de família, para incluir (além dos dependentes previstos no art. 16 da Lei nº 8.213/91) a madrasta ou padrasto, na ausência dos pais; os irmãos solteiros, os enteados solteiros e os menores tutelados. Porém, o núcleo essencial da caracterização da família, passa a ser a expressão "desde que vivam sob o mesmo teto".
Mudança significativa foi realizada na análise da deficiência, à medida que o art. 20, § 2º, da Lei nº 8.742/93 conceituou pessoa com deficiência como "aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade com as demais pessoas". Complementa o conceito a definição de impedimentos de longo prazo como "aqueles que incapacitam a pessoa com deficiência para a vida independente e para o trabalho pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos".
Todavia, é de ser ressalvado que a exigência de duração do impedimento por 2 anos, somente se aplica aos requerimentos administrativos ou revisões administrativas realizados após 07/07/2011, início da vigência da Lei nº 12.435/2011, à medida que estabelece nova exigência para caracterizar a deficiência, restringindo o acesso ao benefício. Nesse sentido, busca-se evitar violação a direito adquirido pelas pessoas cuja deficiência atender ao suporte fático da regra anterior que definia a deficiência sem a exigência de impedimento por prazo mínimo. Necessário acrescentar que pode ser aplicado o prazo mínimo de 2 anos nas revisões administrativas dos benefícios, realizadas após 07/07/2011, ainda que derivados de concessão judicial, porque se trata de relação de trato sucessivo.
Ainda no art. 20, da Lei nº 8.742/93, o acréscimo do § 5º transforma em direito positivo o entendimento jurisprudencial dominante, quanto à possibilidade de concessão do benefício ao idoso ou deficiente que se encontrar sob o abrigo de instituições de longa permanência.
Por fim, destacam-se as inovações realizadas no art. 21, da Lei nº 8.742/93, pela inserção dos §§3º e 4º, que permitem a manutenção do benefício para pessoa em habilitação e reabilitação profissional não remunerada, bem como a possibilidade de nova concessão após ser cancelado o benefício, conforme se pode observar nesses dispositivos abaixo transcritos:
Art. 21. [...]
§ 3o O desenvolvimento das capacidades cognitivas, motoras ou educacionais e a realização de atividades não remuneradas de habilitação e reabilitação, entre outras, não constituem motivo de suspensão ou cessação do benefício da pessoa com deficiência. (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 4o A cessação do benefício de prestação continuada concedido à pessoa com deficiência, inclusive em razão do seu ingresso no mercado de trabalho, não impede nova concessão do benefício, desde que atendidos os requisitos definidos em regulamento. (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011)
Consideradas essas premissas, passo à análise do preenchimento dos requisitos para concessão do benefício.
DA DEFICIÊNCIA
A prova da deficiência, a partir do regulamento, não se limita ao caráter técnico, devendo ser considerada as possibilidades da pessoa em evitar o processo de marginalização social, devendo ser conjugada a análise técnica com as circunstâncias existenciais do beneficiário, nos termos do art. 16 do Decreto nº 6.214/2007:
"Art. 16. A concessão do benefício à pessoa com deficiência ficará sujeita à avaliação da deficiência e do grau de incapacidade, com base nos princípios da Classificação Internacional de Funcionalidades, Incapacidade e Saúde - CIF, estabelecida pela Resolução da Organização Mundial da Saúde no 54.21, aprovada pela 54a Assembléia Mundial da Saúde, em 22 de maio de 2001.
§ 1º A avaliação da deficiência e do grau de incapacidade será composta de avaliação médica e social.
§ 2º A avaliação médica da deficiência e do grau de incapacidade considerará as deficiências nas funções e nas estruturas do corpo, e a avaliação social considerará os fatores ambientais, sociais e pessoais, e ambas considerarão a limitação do desempenho de atividades e a restrição da participação social, segundo suas especificidades.
§ 3º As avaliações de que trata o § 1o serão realizadas, respectivamente, pela perícia médica e pelo serviço social do INSS.
§ 4º O Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e o INSS implantarão as condições necessárias para a realização da avaliação social e a sua integração à avaliação médica."
Acerca do tema, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais editou a seguinte Súmula nº 29:
"29 - Para os efeitos do art. 20, § 2º, da Lei n. 8.742, de 1993, incapacidade para a vida independente não só é aquela que impede as atividades mais elementares de pessoa, mas também a impossibilita de prover ao próprio sustento". (Grifei)
Assim, para efeitos de concessão do benefício assistencial, destaco que a deficiência/incapacidade deve ser avaliada pelo parâmetro da possibilidade do beneficiário prover o seu próprio sustento ou tê-lo provido por sua família.
Para a verificação da deficiência/incapacidade de que a parte autora é portadora, imprescindível que seja analisado o laudo pericial elaborado por profissional habilitado a diagnosticar a moléstia referida na inicial.
Em seu parecer (evento 50, LAUDPERÍ1), O Sr. Perito informou que a última atividade exercida pela parte autora foi a de boia-fria, até 2006, sem registro na CTPS. Iniciou com dores em mãos e pés em 1988. Realizou tratamento com reumatologista. Apresenta deformidades importantes em dedos das mãos e pés, com posição viciosa de dedos em ambos, impotência funcional e leve edema nas mãos e pés.
Diagnosticou a enfermidade denominada "artrite reumatóide", CID 10 M 05.
Tendo em vista o comprometimento da funcionalidade das mãos e pés, considerou a parte autora incapaz de forma total e permanente, sem possibilidade de reabilitação, a partir de 14/08/2014 (data da perícia).
Em seu Apelo, a parte autora insurge-se quanto à DII fixada, alegando que à época do requerimento administrativo, em 13/09/2011, já se encontrava incapacitada.
No entanto, a demandante não logrou comprovar o alegado estado incapacitante anterior à data fixada pelo expert. Os documentos acostados aos autos demonstram a existência da patologia, mas não há dados que permitam concluir que estivesse incapaz. Tal ocorreu somente por ocasião da perícia judicial, na qual se verificou que era portadora de enfermidade progressiva que até poderia ter causado limitações às suas atividades, mas sendo impossível verificar-se incapacidade pretérita com as provas até então produzidas, conforme referido pelo Perito em seu laudo complementar (evento 62, INF1).
Dessa forma, entendo caracterizada a deficiência da autora, com quadro de incapacidade permanente e insusceptível de reabilitação desde 14/08/2014.
Passo à análise do requisito da necessidade, imprescindível à concessão do benefício.
DA NECESSIDADE (OU MISERABILIDADE)
O art. 20, § 3º, da Lei 8.742/93 instituiu requisito objetivo para análise da necessidade, ao exigir do requerente do benefício a comprovação de renda familiar mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
O STF, na ADI 1.232-1/DF, julgada em 27/08/1998, havia considerado constitucional o critério do § 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93 como parâmetro para aferição da miserabilidade.
Em momento recente, entretanto, o Plenário do STF declarou incidentalmente a inconstitucionalidade do art. 20, §3° da Lei n° 8.742/93, ao julgar conjuntamente os Recursos Extraordinários 567.985 e 580.963. Conforme constou na ementa, ocorreu o processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro), permitindo ser declarada a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993:
"Ao apreciar a Ação Direta de Inconstitucionalidade 1.232-1/DF, o Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade do art. 20, § 3º, da LOAS. 3. Decisões judiciais contrárias aos critérios objetivos preestabelecidos e Processo de inconstitucionalização dos critérios definidos pela Lei 8.742/1993. A decisão do Supremo Tribunal Federal, entretanto, não pôs termo à controvérsia quanto à aplicação em concreto do critério da renda familiar per capita estabelecido pela LOAS. Como a lei permaneceu inalterada, elaboraram-se maneiras de se contornar o critério objetivo e único estipulado pela LOAS e de se avaliar o real estado de miserabilidade social das famílias com entes idosos ou deficientes. Paralelamente, foram editadas leis que estabeleceram critérios mais elásticos para a concessão de outros benefícios assistenciais, tais como: a Lei 10.836/2004, que criou o Bolsa Família; a Lei 10.689/2003, que instituiu o Programa Nacional de Acesso à Alimentação; a Lei 10.219/01, que criou o Bolsa Escola; a Lei 9.533/97, que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro a Municípios que instituírem programas de garantia de renda mínima associados a ações socioeducativas. O Supremo Tribunal Federal, em decisões monocráticas, passou a rever anteriores posicionamentos acerca da intransponibilidade do critérios objetivos. Verificou-se a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro). 4. Declaração de inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993. 5. Recurso extraordinário a que se nega provimento. (RE 567985, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 18/04/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-194 DIVULG 02-10-2013 PUBLIC 03-10-2013)"
A partir dessa decisão do STF, a miserabilidade deve ser analisada com base nas condições socioeconômicas da família a que pertence o beneficiário da assistência social.
Aliás, esse é o teor do § 11 do art. 20 da Lei nº 8.742/93, recentemente incluído pela Lei nº 13.146/2015, que expressamente prevê a possibilidade de utilização de outros elementos probatórios da condição de miserabilidade do grupo familiar e da situação de vulnerabilidade.
Nesse sentido, a análise da avaliação socioeconômica é imprescindível para resolução da controvérsia.
No Parecer Socioeconômico apresentado no evento 57, OUT3, consta que o grupo familiar é composto por quatro integrantes:
1) a autora, Eliane Nunes de Proença, com 38 anos de idade, solteira, desempregada, estudou até a 5ª série;
2) Raiane Nunes Proença Alves, filha da autora, 14 anos, estudante da 8ª série;
3) Alexandre de Proença Pinheiro, filho da autora, 11 anos, estudante da 5ª série; e
4) Taynara Proença Pinheiro, filha da autora, 09 anos, estudante da 3ª série.
A residência é própria, mista, com 5 peças, tem luz, água e está em boas condições de moradia.
Como renda, a autora recebe pensão alimentícia no valor de R$ 100,00 e o bolsa-família de R$ 166,00.
O parecer apresenta a seguinte conclusão:
"Após a realização da sindicância, através da visita familiar, constatamos que a Srª Eliane Nunes de Proença não tem renda.
Sendo assim, ela enquadra-se nas condições necessárias para poder receber o B.P.C - avaliado com perfil positivo quanto a sua condição no que diz respeito à situação financeira, a renda per capita da família interior a ¼ do salário mínimo."
Em que pese residirem em imóvel próprio, a renda auferida pelo grupo familiar é praticamente nula, limitando-se à ínfima pensão alimentícia paga pelo pai dos filhos da autora e o bolsa-família, ambas insuficientes para prover o mínimo existencial a uma família com quatro integrantes, sendo três filhos menores a mãe incapaz para o trabalho.
Portanto, para fins de análise de concessão de benefício assistencial, resta, então, preenchido o requisito econômico da renda per capita mensal inferior a ¼ de salário mínimo, previsto na Lei Previdenciária.
Assim, as informações do Laudo de Avaliação Socioeconômica revelam que a parte autora é pessoa pertencente a uma família que está à margem da sociedade, sem acesso a recursos básicos para sobrevivência digna, sem condições de proporcionar à parte autora o suporte necessário à recuperação da sua capacidade física e psíquica e, conseqüentemente, buscar sua inclusão social.
Há de ser considerado, também, o princípio da dignidade humana, valor finalístico da concessão do benefício assistencial, que visa estipular a obrigação do Estado em suprir as necessidades mínimas dos cidadãos brasileiros que não tenham condições de manter sua sobrevivência ou tê-la provida pela família.
Portanto, entendo plenamente caracterizado o estado de miserabilidade capaz de ensejar a concessão do benefício ora requerido. Nesse passo, tratando-se de pessoa deficiente/incapaz e que necessita da ajuda financeira do Estado para sobreviver com dignidade, tendo em vista a situação socioeconômica averiguada, é de deferir-se o benefício.
Assim, é de ser mantida a sentença para conceder à parte autora o benefício assistencial desde 14/08/2014 (data da perícia judicial).
TUTELA ESPECÍFICA
O CPC/2015 aprimorou a eficácia mandamental das decisões que tratam de obrigações de fazer e não fazer e reafirmou o papel da tutela específica. Enquanto o art. 497 do CPC/2015 trata da tutela específica, ainda na fase cognitiva, o art. 536 do CPC/2015 reafirma a prevalência da tutela específica na fase de cumprimento da sentença. Ainda, os recursos especial e extraordinário, aos quais está submetida a decisão em segunda instância, não possuem efeito suspensivo, de modo que a efetivação do direito reconhecido pelo tribunal é a prática mais adequada ao previsto nas regras processuais civis. Assim, determino o cumprimento imediato do acórdão, no sentido de manter o benefício assistencial implantado em antecipação dos efeitos da tutela.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS E PERICIAIS
Confirmo a sentença monocrática no tópico e condeno exclusivamente o INSS ao pagamento de honorários advocatícios em favor do patrono da parte autora, fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência".
Condeno o INSS, ainda, a ressarcir os honorários periciais adiantados.
JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.
Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O recente art. 491 do NCPC, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.
E no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo, especialmente se considerado que pende de julgamento no STF a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810).
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente definidos por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que seja diferida a solução definitiva para a fase de cumprimento do julgado, em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentado que "diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução. 4. Embargos de declaração rejeitados". (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014).
Na mesma linha vêm decidindo as duas turmas de Direito Administrativo desta Corte (2ª Seção), à unanimidade, (Ad exemplum: os processos 5005406-14.2014.404.7101 3ª Turma, julgado em 01-06-2016 e 5052050-61.2013.404.7000, 4ª Turma, julgado em 25/05/2016)
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do novo Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a solução em definitivo acerca dos critérios de correção, ocasião em que, provavelmente, a questão já terá sido dirimida pelo tribunal superior, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
A fim de evitar novos recursos, inclusive na fase de cumprimento de sentença, e anteriormente à solução definitiva pelo STF sobre o tema, a alternativa é que o cumprimento do julgado se inicie, adotando-se os índices da Lei 11.960/2009, inclusive para fins de expedição de precatório ou RPV pelo valor incontroverso, diferindo-se para momento posterior ao julgamento pelo STF a decisão do juízo sobre a existência de diferenças remanescentes, a serem requisitadas, acaso outro índice venha a ter sua aplicação legitimada.
Os juros de mora, incidentes desde a citação, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Evita-se, assim, que o presente feito fique paralisado, submetido a infindáveis recursos, sobrestamentos, juízos de retratação, e até ações rescisórias, com comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional, apenas para solução de questão acessória.
Diante disso, difere-se para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009, restando prejudicado o recurso e/ou remessa necessária no ponto.
CUSTAS PROCESSUAIS
O INSS é isento do pagamento no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul (art. 11 da Lei nº 8.121/85, com a redação dada pela Lei nº 13.471/2010), isenção esta que não se aplica quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (art. 33, p. único, da Lei Complementar estadual 156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
DO PREQUESTIONAMENTO
Os fundamentos para o julgamento do feito trazem nas suas razões de decidir a apreciação dos dispositivos citados, utilizando precedentes jurisprudenciais, elementos jurídicos e de fato que justificam o pronunciamento jurisdicional final. Ademais, nos termos do § 2º do art. 489 do CPC/2015, "A decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da boa-fé". Assim, para possibilitar o acesso das partes às instâncias superiores, consideram-se prequestionadas as matérias constitucionais e legais suscitadas nos recursos oferecidos pelas partes, nos termos em que fundamentado o voto.
CONCLUSÃO
Apelação da parte autora e Remessa Oficial improvidas.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por negar provimento ao Apelo da parte autora e à Remessa Oficial, bem como determinar o cumprimento do acórdão.
Ezio Teixeira
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 17/05/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5029163-39.2015.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00002242220138160046
RELATOR | : | Juiz Federal ÉZIO TEIXEIRA |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da Republica Paulo Gilberto Cogo Leivas |
APELANTE | : | ELIANE NUNES DE PROENCA |
ADVOGADO | : | GABRIELA BARROS SANTOS SILVA |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 17/05/2017, na seqüência 2108, disponibilizada no DE de 02/05/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO APELO DA PARTE AUTORA E À REMESSA OFICIAL, BEM COMO DETERMINAR O CUMPRIMENTO DO ACÓRDÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal ÉZIO TEIXEIRA |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal ÉZIO TEIXEIRA |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA | |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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