APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5015930-83.2013.4.04.7108/RS
RELATOR | : | ROGERIO FAVRETO |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | JOSE MARCELO DE OLIVEIRA (Absolutamente Incapaz (Art. 3º, II e III CC)) |
ADVOGADO | : | IARA SOLANGE DA SILVA SCHNEIDER |
APELADO | : | OS MESMOS |
APELADO | : | MARIA DALGISA NETTO DE OLIVEIRA (Curador) |
ADVOGADO | : | IARA SOLANGE DA SILVA SCHNEIDER |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. PESSOA INCAPACITADA DE PROVER A PRÓPRIA MANUTENÇÃO OU TÊ-LA PROVIDA DE OUTRA FORMA. COMPROVAÇÃO. CONCESSÃO. CORREÇAÕ MONETÁRIA. ADEQUAÇÃO.
I. Procede o pedido de concessão do benefício assistencial previsto no art. 203, V da CF/88 quando atendidos os requisitos previstos na Lei nº 8.742/1993.
II. Comprovada a condição de pessoa deficiente ou idosa e a situação de risco social da parte autora e de sua família, é devido o benefício assistencial desde o cancelamento administrativo.
IV. Aplica-se o critério estabelecido no art. 1º-F da Lei 9.494/97, na redação da lei 11.960/2009 para fins de correção monetária e juros de mora.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, parcial provimento à remessa oficial e à apelação do INSS e negar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 14 de junho de 2016.
Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8280077v3 e, se solicitado, do código CRC A9A0DB5A. | |
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| Signatário (a): | Rogerio Favreto |
| Data e Hora: | 14/06/2016 16:30 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5015930-83.2013.4.04.7108/RS
RELATOR | : | ROGERIO FAVRETO |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | JOSE MARCELO DE OLIVEIRA (Absolutamente Incapaz (Art. 3º, II e III CC)) |
ADVOGADO | : | IARA SOLANGE DA SILVA SCHNEIDER |
APELADO | : | OS MESMOS |
APELADO | : | MARIA DALGISA NETTO DE OLIVEIRA (Curador) |
ADVOGADO | : | IARA SOLANGE DA SILVA SCHNEIDER |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
RELATÓRIO
Trata-se de ação em que a parte autora pretende o restabelecimento de benefício assistencial devido à pessoa deficiente, a contar da data da cessação administrativa, ocorrida em 17/02/2011. Requer também a declaração da inexigibilidade da cobrança pelo INSS dos valores recebidos no período de 23/10/2008 a 28/02/2011, cancelamento dos descontos nos valores que recebe a título de pensão alimentícia e a devolução em dobro dos valores descontados de sua pensão alimentícia.
Sentenciando, o MM. Juiz assim decidiu:
"Ante o exposto, presentes os requisitos legais:
(A) defiro o pedido de antecipação dos efeitos da tutela, determinando o imediato restabelecimento do benefício assistencial NB 516.722.459-0
(B) julgo parcialmente extinto o feito, com fundamento no art. 267, VI, do CPC, relativamente ao pedido de cancelamento dos descontos incidente sobre os valores que recebe a título de pensão alimentícia (NB 147.069.880-0), por falta de interesse de agir (perda superveniente do objeto);
(C) julgo procedentes os demais pedidos, resolvendo o mérito da demanda, nos termos do art. 269, I, do CPC, para o fim de:
(C1) declarar a regularidade na manutenção do benefício assistencial de NB 516.722.459-0 no período de 18/02/2008 a 17/02/2011 e, via de conseqüência, declarar a inexigibilidade da dívida cobrada pelo INSS a título de restituição de valores recebidos no período, calculada em R$ 14.665,88;
(C2) condenar o INSS ao imediato restabelecimento do benefício assistencial NB 516.722.459-0, bem como ao pagamento das parcelas vencidas, desde a data da cessação (17/02/2011), corrigidas na forma da fundamentação;
(C3) condenar o INSS à restituição dos valores descontados da pensão alimentícia NB 147.069.880-0, devidamente corrigidos, na forma da fundamentação,mediante utilização dos mesmos critérios para atualização das parcelas vencidas e devidas a título de benefício previdenciário;
Condeno, ainda, o INSS ao pagamento dos honorários advocatícios, os quais fixo em 10% do valor das parcelas vencidas até a prolação desta sentença, conforme Súmula 111 do STJ, bem como ao ressarcimento dos honorários periciais adiantados pela Seção Judiciária do Rio Grande do Sul.
Sem condenação em custas, visto que não adiantadas pela autora, sendo isenta a parte ré (art. 4º, I, da Lei n. 9.289/96)."
Irresignado, o INSS interpôs apelação pugnando pela reforma da sentença a fim do pedido ser julgado improcedente, sustentando que autor não preenche os requisitos para concessão do benefício. Aduz que, no caso, a renda per capita familiar é superior a ¼ do salário mínimo. Afirma ainda, que não foi realizado novo estudo social que comprove a miserabilidade do autor, bem como foi demonstrado que o autor desenvolveu atividade remunerada nos últimos anos, o que aumentaria a renda familiar e descaracterizaria a condição de incapaz do autor. Além disso, postula pela devolução dos valores recebidos indevidamente. No caso de manutenção da condenação, requer que a correção monetária seja estipulada com base nos índices oficiais de remuneração básica, conforme art. 1º-F da Lei 9.494/97, na redação dada pela Lei nº 11.960/2009.
A parte autora, por sua vez, interpôs apelação requerendo reforma dos honorários advocatícios para que sejam fixados em 10% incidam sobre o valor da condenação acrescido do valor que versava a pretensão do réu no que tange à devolução dos valores recebidos a título do benefício assistencial (R$ 14.665,88), ou em 20% sobre o valor da condenação. Requer ainda a devolução em dobro dos valores consignados em sua pensão alimentícia.
Oportunizadas as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
O Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento dos recursos.
É o relatório.
VOTO
Novo CPC (Lei 13.105/2015):
Direito intertemporal e disposições transitórias
Consoante a norma inserta no art. 14 do atual CPC, Lei 13.105, de 16/03/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Portanto, apesar da nova normatização processual ter aplicação imediata aos processos em curso, os atos processuais já praticados, perfeitos e acabados não podem mais ser atingidos pela mudança ocorrida a posteriori.
Nesses termos, para fins de remessa necessária e demais atos recursais, bem como quanto aos ônus sucumbenciais, aplica-se a lei vigente na data em que proferida a decisão recorrida.
Do benefício assistencial devido à pessoa com deficiência:
À época do requerimento administrativo, anteriormente às alterações promovidas na Lei nº 8.742/1993 no ano de 2011, os critérios de concessão do benefício assistencial estavam assim dispostos:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de 1 (um) salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 70 (setenta) anos ou mais e que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
§ 1o Para os efeitos do disposto no caput, entende-se como família o conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, desde que vivam sob o mesmo teto.
§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho.
§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
§ 4º O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo o da assistência médica.
§ 5º A situação de internado não prejudica o direito do idoso ou do portador de deficiência ao benefício.
§ 6o A concessão do benefício ficará sujeita a exame médico pericial e laudo realizados pelos serviços de perícia médica do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS.
Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa com deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho, ou seja, aquela portadora de incapacidade que impede o exercício de atividade remunerada, o que deve ser analisado à luz do caso concreto.
Em relação à criança com deficiência, deve ser analisado o impacto da incapacidade na limitação do desempenho de atividades e na restrição da participação social, compatível com a sua idade.
Assim, em conclusão, o benefício assistencial é devido à pessoa com deficiência integrante de grupo familiar em situação de miserabilidade.
Do conceito de família:
O conceito de família, à época do requerimento administrativo, compreendia: o requerente do benefício, o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido, os pais e o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido.
Da condição socioeconômica:
Em relação ao critério econômico, o art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/1993, estabelecia que se considerava hipossuficiente a pessoa com deficiência ou idoso cuja família possuísse renda per capita inferior a ¼ do salário mínimo.
Contudo, o Superior Tribunal de Justiça, por sua Terceira Seção, ao apreciar recurso especial representativo de controvérsia, relativizou o critério estabelecido pelo referido dispositivo legal. Entendeu que, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana, "a limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a ¼ do salário mínimo" (REsp n. 1.112.557/MG, rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Terceira Seção, j. 28/10/2009, DJ 20/11/2009).
Além disso, o STJ, órgão ao qual compete a uniformização da interpretação da lei federal em nosso sistema, acrescentou, no julgado citado, que "em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado".
Como se percebe, o entendimento da Corte Superior consolidou-se no sentido de que é possível a aferição da miserabilidade do deficiente ou do idoso por outros meios, ainda que não observado estritamente o critério da renda familiar per capita previsto no § 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/1993.
Nesse sentido, tenho adotado posição de flexibilizar os critérios de reconhecimento da miserabilidade, merecendo apenas adequação de fundamento frente à recente deliberação do Supremo Tribunal Federal, que, por maioria, ao analisar os recursos extraordinários 567.985 e 580.963, ambos submetidos à repercussão geral, reconheceu a inconstitucionalidade do § 3º do art. 20 da Lei nº 8.742/1993 - LOAS, assim como do art. 34 da Lei 10.741/2003 - Estatuto do Idoso.
Com efeito, reconhecida a inconstitucionalidade do critério econômico objetivo em regime de repercussão geral, cabe ao julgador, na análise do caso concreto, aferir o estado de miserabilidade da parte autora e de sua família, sendo o caso, a justificar a concessão do benefício assistencial. Cabe registrar que esta Corte - Tribunal Regional Federal da 4ª Região, ainda que por outros fundamentos, vinha adotando uma maior flexibilização nos casos em que a renda per capita superava o limite estabelecido no art. 20, § 3º, da LOAS, agora dispensável enquanto parâmetro objetivo de renda familiar.
Em conclusão, o benefício assistencial destina-se àquelas pessoas que se encontram em situação de elevada pobreza, por não possuírem meios para prover sua subsistência, nem de tê-la provida por sua família, ainda que a renda familiar per capita venha a ser considerada como meio de prova desta situação.
Do caso concreto:
A parte autora nasceu em 22/04/1981, contando, ao tempo do cancelamento administrativo, com 29 anos de idade.
Primeiramente, deve-ser salientar que o demandante é interditado em razão de ser portador de doença mental e teve deferido o benefício assistencial NB 516.722.459-0 em 19/05/2006, o qual foi cessado em 28/03/2011 (e. 14, INFBEN1). Em 11/02/2011 foi enviado ofício ao autor comunicando a existência de indício de irregularidade, consistente em exercício de atividade remunerada em 07/2006 (evento 1, PROCADM9, p. 23).
Verifica-se que em 23/10/2008 o demandante começara a receber pensão alimentícia no valor de R$ 162,00. Pela extrapolação do limite de ¼ do salário mínimo, a autarquia manteve a suspensão do benefício (evento 1, PROCADM9, p. 39) e consignou, na pensão alimentícia NB 147.069.880-0 titulada pelo demandante, a quantia de R$ 14.665,88, relativa ao valor recebido no benefício assistencial NB 516.722.459-0 no período de 23/10/2008 a 25/02/2011 (evento 1, PROCADM10, p. 5).
Quanto à incapacidade de prover a própria subsistência ou tê-la suprida de outra forma, tenho que restou incontroversa pelo reconhecimento pelo INSS por oportunidade da perícia administrativa (e. 1, LAU15), no qual foi reconhecido que o autor é portador de esquizofrenia hebefrenica. Além disso, encontra-se interditado desde 2007 (conforme certidão de interdição), tendo como atual curadora Maria Dalgisa Netto de Oliveira (evento 75, termo de curadoria).
Analisando o CNIS, verificou-se que o autor teve diversos vínculos empregatícios, mas todos foram esporádicos e de curto prazo.
Tal situação, contudo, não obsta o recebimento do benefício, tampouco enseja eventual devolução dos valores pagos a título de contribuição previdenciária, pois o autor, mesmo incapaz para o labor, teve cancelado o seu benefício na via administrativa - o que justifica eventual retorno ao trabalho para a sua sobrevivência. Ressalto que atualmente o demandante não exerce qualquer atividade laborativa, estando totalmente impossibilitado de trabalhar em razão das enfermidades que lhe acometem.
Não se desconhece a realidade fática das pessoas que, em diversas situações, são obrigadas, mesmo sem condições físicas plenas, a voltar ao exercício laboral, em razão da necessidade, por não possuírem outras fontes de sustento.
Quanto à condição de miserabilidade do grupo familiar da parte autora, o primeiro estudo social (e. 47), realizado em 17/12/2013, informa que o autor morava com um amigo, Altemir Sebastião Dutra, o qual faleceu dois dias antes da visita assistencial. Altemir era o provedor da casa por solidariedade, sendo que às vezes o autor ajudava este na venda de algodão-doce para aumentar a renda. Atualmente, o requerente vive sozinho na residência de seu amigo falecido, não possui renda e pretende retornar à sua terra natal para viver com a mãe.
Ainda, as fotos anexadas ao processo (e. 36) comprovam que a residência em que o autor vivia, bem como a mobília, era simples e possuía precárias condições para proporcionar ao autor uma vida digna.
Percebe-se que, à época do Estudo Social, o autor não possuía renda alguma, e o valor recebido a título de pensão alimentícia não era suficiente para suprir as necessidades do autor.
Em conseqüência de alteração fática no curso do processo, foi realizado novo Estudo Social em 13/01/2016 (Carta Precatória n.º 50068501820154047111 - e. 7), o qual informa que, atualmente, o grupo familiar é composto pelo autor, José Marcelo, e sua mãe, Maria Dalgisa, de 67 anos.
A casa em que residem é própria, de alvenaria e em ótimo estado de conservação, sendo que foi adquirida pelo Programa Minha Casa Minha Vida e está sendo financiada pela Caixa Econômica Federal. As chaves foram entreguem em 22/12/2015 e a família se mudou depois do natal.
A casa possui quatro cômodos: dois quartos, sala e cozinha, além de um banheiro. A mobília e eletrodomésticos são, na maioria, mais antigos e em bom estado de conservação.
Em relação à renda familiar, o autor recebe benefício no valor de um salário mínimo, e sua mãe recebe benefício de aposentadoria no mesmo valor.
Os gastos mensais desta família são com alimentação, higiene, água, luz, telefone, gás, prestação da casa, empréstimos, vigilante, prestações de roupas e calçados, totalizando aproximadamente R$1.480,00. Os empréstimos foram feitos para realizar a mudança no final de dezembro de 2015 e pagar dois meses de aluguel atrasados na antiga casa. Não possuem gastos com medicamentos, pois todos estão disponíveis pelo SUS - Sistema Único de Saúde.
Concluiu a assistente social que o grupo familiar não encontra-se em situação de vulnerabilidade, pois a renda que provém da aposentadoria da genitora e do benefício do autor suprem suas necessidades.
Entretanto, verifica-se que o benefício que o autor recebe no valor de um salário mínimo é decorrente do deferimento da antecipação de tutela, que determinou o restabelecimento do benefício ora em discussão. Ainda, o valor recebido pela mãe do autor, em sede de benefício de aposentadoria, seria insuficiente para arcar com os gastos do grupo familiar.
Ademais, deve ser salientado, no que toca ao requisito miserabilidade, que o Supremo Tribunal Federal, em julgamento ocorrido em 18/04/2013 (RE 567.985/MT e RE 580.963/PR), declarou a inconstitucionalidade do parágrafo único do artigo 34 da Lei 10.741/03 (Estatuto do Idoso), o qual estabelece que o benefício assistencial já concedido a qualquer idoso membro da família "não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS". Segundo entendeu o Supremo Tribunal Federal, o parágrafo único do artigo 34 da Lei 10.741/03 violou o princípio da isonomia. Isso porque abriu exceção para o recebimento de dois benefícios assistenciais por idosos, mas não permitiu a percepção conjunta de benefício de idoso com o de deficiente ou de qualquer outro previdenciário. Assim, incorreu o legislador em equívoco, pois, tratando-se de situações idênticas, deveria ser possível a exclusão do cômputo do benefício, independentemente de sua origem.
Portanto, além da possibilidade de aferição da miserabilidade por outros meios diversos da renda familiar per capita, destaca-se que, para o fim de preservar a dignidade dos idosos, o art. 34, parágrafo único, da Lei nº 10.741/03 (Estatuto do Idoso) determina que o benefício assistencial ou previdenciário já concedido a qualquer membro idoso da família não será computado na renda familiar per capita. O objetivo claro desta regra é preservar a dignidade do idoso, que, pelas peculiaridades que cercam essa fase da vida, não pode ser submetido a privações, obrigando-se a dividir o benefício assistencial por ele percebido com outros membros do grupo familiar que não possuam renda.
Portanto, o espírito do legislador foi o de assegurar, ao idoso ou deficiente, renda mensal mínima de um salário mínimo. Diante disso, o fato de integrante do grupo familiar auferir proventos não impede que outra pessoa da mesma família possa habilitar-se ao benefício assistencial, desde que verificada a situação de miserabilidade.
Logo, ao se calcular a renda familiar da parte autora, não se pode considerar no cálculo qualquer benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima que seja percebido por idoso integrante do grupo familiar.
Assim, diante das considerações, a parte autora está em evidente risco social e depende do benefício para garantir o controle da doença crônica que a acomete e a sua sobrevivência digna, tendo em vista estar inserida em um grupo familiar de vulnerabilidade.
Portanto, considerando que foi indevido o cancelamento do benefício assistencial, deve ser mantida a sentença que determinou o seu restabelecimento desde a data do cancelamento administrativo.
Em consequência, considerando que a cessação do benefício assistencial do autor foi ilegal, não cabe ao INSS cobrar os valores recebidos supostamente de forma indevida, de modo que resta mantida a sentença a fim de declarar a inexigibilidade do valor cobrado pelo INSS.
Ainda, tenho que eventuais valores descontados na pensão alimentícia do autor (NB 147.069.880-0), devem ser devolvidos pelo INSS, corrigidos monetariamente na forma da fundamentação infra.
No tocante ao pleito de devolução em dobro do montante alegadamente descontado, do mesmo modo, não merece reforma a sentença que bem examinou a matéria, seguindo a linha dos precedentes desta Corte, no sentido de admitir o ressarcimento em dobro apenas nos casos de comprovada má-fé da Autarquia, o que na espécie não ocorreu.
Dos consectários:
Segundo o entendimento das Turmas previdenciárias do Tribunal Regional Federal da 4ª Região estes são os critérios aplicáveis aos consectários:
a) Correção Monetária
A correção monetária, segundo o entendimento consolidado na 3ª Seção deste TRF4, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, quais sejam:
- ORTN (10/64 a 02/86, Lei nº 4.257/64);
- OTN (03/86 a 01/89, Decreto-Lei nº 2.284/86);
- BTN (02/89 a 02/91, Lei nº 7.777/89);
- INPC (03/91 a 12/92, Lei nº 8.213/91);
- IRSM (01/93 a 02/94, Lei nº 8.542/92);
- URV (03 a 06/94, Lei nº 8.880/94);
- IPC-r (07/94 a 06/95, Lei nº 8.880/94);
- INPC (07/95 a 04/96, MP nº 1.053/95);
- IGP-DI (05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6.º, da Lei n.º 8.880/94);
- INPC (de 04/2006 a 29/06/2009, conforme o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, combinado com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91).
- TR (a partir de 30/06/2009, conforme art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/2009)
O Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento das ADIs 4.357 e 4.425, declarou a inconstitucionalidade por arrastamento do art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/2009, afastando a utilização da TR como fator de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública, relativamente ao período entre a respectiva inscrição em precatório e o efetivo pagamento.
Em consequência dessa decisão, e tendo presente a sua ratio, a 3ª Seção desta Corte vinha adotando, para fins de atualização dos débitos judiciais da Fazenda Pública, a sistemática anterior à Lei nº 11.960/2009, o que significava, nos termos da legislação então vigente, apurar-se a correção monetária segundo a variação do INPC, salvo no período subsequente à inscrição em precatório, quando se determinava a utilização do IPCA-E.
Entretanto, a questão da constitucionalidade do uso da TR como índice de atualização das condenações judiciais da Fazenda Pública, no período antes da inscrição do débito em precatório, teve sua repercussão geral reconhecida no RE 870.947, e aguarda pronunciamento de mérito do STF. A relevância e a transcendência da matéria foram reconhecidas especialmente em razão das interpretações que vinham ocorrendo nas demais instâncias quanto à abrangência do julgamento nas ADIs 4.357 e 4.425.
Recentemente, em sucessivas reclamações, a Suprema Corte vem afirmando que no julgamento das ADIs em referência a questão constitucional decidida restringiu-se à inaplicabilidade da TR ao período de tramitação dos precatórios, de forma que a decisão de inconstitucionalidade por arrastamento foi limitada à pertinência lógica entre o art. 100, § 12, da CRFB e o artigo 1º-F da Lei 9.494/97, na redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/2009. Em consequência, as reclamações vêm sendo acolhidas, assegurando-se que, ao menos até que sobrevenha decisão específica do STF, seja aplicada a legislação em referência na atualização das condenações impostas à Fazenda Pública, salvo após inscrição em precatório. Os pronunciamentos sinalizam, inclusive, para eventual modulação de efeitos, acaso sobrevenha decisão mais ampla quanto à inconstitucionalidade do uso da TR para correção dos débitos judiciais da Fazenda Pública (Rcl 19.050, Rel. Min. Roberto Barroso; Rcl 21.147, Rel. Min. Cármen Lúcia; Rcl 19.095, Rel. Min. Gilmar Mendes).
Em tais condições, com o objetivo de guardar coerência com os mais recentes posicionamentos do STF sobre o tema, e para prevenir a necessidade de futuro sobrestamento dos feitos apenas em razão dos consectários, a melhor solução a ser adotada, por ora, é orientar para aplicação do critério de atualização estabelecido no art. 1º-F da Lei 9.494/97, na redação da lei 11.960/2009.
Este entendimento não obsta a que o juízo de execução observe, quando da liquidação e atualização das condenações impostas ao INSS, o que vier a ser decidido pelo STF em regime de repercussão geral, bem como eventual regramento de transição que sobrevenha em sede de modulação de efeitos.
Nesse sentido, merece parcial provimento a apelação do INSS e a remessa oficial, devendo a sentença ser adequada, quanto à correção monetária, aos critérios acima definidos.
b) Juros de mora
Até 29-06-2009 os juros de mora, apurados a contar da data da citação, devem ser fixados à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009. Os juros devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, 5ª Turma, AgRg no AgRg no Ag 1211604/SP, Rel. Min. Laurita Vaz).
Quanto ao ponto, esta Corte já vinha entendendo que no julgamento das ADIs 4.357 e 4.425 não houvera pronunciamento de inconstitucionalidade sobre o critério de incidência dos juros de mora previsto na legislação em referência.
Esta interpretação foi, agora, chancelada, pois no exame do recurso extraordinário 870.947, o STF reconheceu repercussão geral não apenas à questão constitucional pertinente ao regime de atualização monetária das condenações judiciais da Fazenda Pública, mas também à controvérsia pertinente aos juros de mora incidentes.
Em tendo havido a citação já sob a vigência das novas normas, inaplicáveis as disposições do Decreto-lei 2.322/87, incidindo apenas os juros da caderneta de poupança, sem capitalização.
c) Honorários advocatícios:
Os honorários advocatícios são devidos à taxa 10% sobre as prestações vencidas até a data da decisão de procedência (sentença ou acórdão), nos termos das Súmulas n.º 76 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região e n.º 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Os honorários advocatícios foram adequadamente fixados pela sentença, não merecendo provimento a apelação da parte autora quanto ao ponto.
d) Custas processuais:
O INSS é isento do pagamento de custas processuais quando demandado no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul (art. 11 da Lei nº 8.121/85, com a redação dada pela Lei nº 13.471/2010). Quando demandado perante a Justiça Estadual de Santa Catarina, a autarquia responde pela metade do valor (art. 33, p. único, da Lei Complementar Estadual nº. 156/97). Contudo, esta isenção não se aplica quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4).
Antecipação dos efeitos da tutela:
Confirmado o direito ao benefício e inalterados os requisitos para a concessão, resta mantida a antecipação dos efeitos da tutela concedida pelo juízo de origem.
Conclusão:
Resta mantida a sentença quanto à concessão do benefício assistencial desde a data do cancelamento administrativo.
Dá-se parcial provimento à apelação do INSS e à remessa oficial a fim de reformar a sentença quanto aos critérios de correção monetária.
Restam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pelas partes.
Dispositivo:
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à remessa oficial e à apelação do INSS e negar provimento à apelação da parte autora, nos termos da fundamentação.
Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 14/06/2016
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5015930-83.2013.4.04.7108/RS
ORIGEM: RS 50159308320134047108
RELATOR | : | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Sérgio Cruz Arenhart |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | JOSE MARCELO DE OLIVEIRA (Absolutamente Incapaz (Art. 3º, II e III CC)) |
ADVOGADO | : | IARA SOLANGE DA SILVA SCHNEIDER |
APELADO | : | OS MESMOS |
APELADO | : | MARIA DALGISA NETTO DE OLIVEIRA (Curador) |
ADVOGADO | : | IARA SOLANGE DA SILVA SCHNEIDER |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 14/06/2016, na seqüência 432, disponibilizada no DE de 24/05/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO À REMESSA OFICIAL E À APELAÇÃO DO INSS E NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
: | Des. Federal ROGER RAUPP RIOS | |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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