| D.E. Publicado em 30/10/2015 |
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0011305-80.2015.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | ANAURELINO BATISTA DE OLIVEIRA |
ADVOGADO | : | Luiz Alfredo Ost e outro |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE SANTO CRISTO/RS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. LOAS. PESSOA INCAPACITADA DE PROVER A PRÓPRIA MANUTENÇÃO OU TÊ-LA PROVIDA DE OUTRA FORMA. COMPROVAÇÃO. CONCESSÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CUSTAS PROCESSUAIS.
1. Procede o pedido de concessão do benefício assistencial previsto no art. 203, V, da CF/88 quando atendidos os requisitos previstos na Lei nº 8.742/1993. 2. Determinada a implantação do benefício assistencial pleiteado, a partir da data do primeiro requerimento administrativo. 3. Quanto à correção monetária, cabe ao juízo da execução, quando da liquidação, dar cumprimento aos exatos termos da decisão a ser proferida pelo Supremo Tribunal Federal no RE 870947, deixando assentada, entretanto, a possibilidade de expedição de precatório da parte incontroversa da demanda. 4. Consolidou-se na 3ª Seção desta Corte, na linha de precedentes do STJ, o entendimento de que a Lei nº 11.960, de 29/06/2009 (publicada em 30/06/2009), que alterou o art. 1.º-F da Lei nº 9.494/97, determinando a incidência nos débitos da Fazenda Pública, para fins remuneração do capital e compensação da mora, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice de juros da caderneta de poupança, aplica-se imediatamente aos feitos de natureza previdenciária. 5. O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS). 6. Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas. Súmula nº 76 desta Corte.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Colenda 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao apelo do INSS e à remessa oficial, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 20 de outubro de 2015.
Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7819809v17 e, se solicitado, do código CRC 5AEED4DB. | |
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APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0011305-80.2015.4.04.9999/RS
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RELATÓRIO
Trata-se de remessa oficial e apelação interposta contra sentença que julgou procedente o pedido de concessão de benefício assistencial de amparo ao deficiente, com efeitos financeiros retroativos à data do requerimento administrativo.
Em suas razões, a autarquia previdenciária pede a reforma do decisum ao argumento de que o autor não preenche os requisitos legais para a obtenção do benefício requerido.
Com as contrarrazões, subiram os autos.
O Ministério Público Federal opinou pelo provimento do recurso.
É o relatório.
Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7819807v4 e, se solicitado, do código CRC D320597E. | |
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APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0011305-80.2015.4.04.9999/RS
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VOTO
Benefício assistencial
Trata a presente ação do direito da parte autora à percepção do benefício assistencial previsto no art. 203, inciso V, da Constituição Federal, regulado pela Lei nº 8.742/93.
A Constituição Federal instituiu o benefício assistencial ao deficiente e ao idoso nos seguintes termos:
Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente da contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
(...)
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
A Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, veio a regular a matéria, merecendo transcrição o caput e os parágrafos 1º a 3º do art. 20, verbis:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de 1 (um) salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 70 (setenta) anos ou mais e que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, entende-se como família o conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei n. 8.213, de 24 de julho de 1991, desde que vivam sob o mesmo teto. (Redação dada pela Lei n. 9.720, de 30.11.1998)
§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, a pessoa portadora de deficiência é aquela incapacitada para a vida independente e para o trabalho.
§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa portadora de deficiência ou idosa cuja renda mensal per capita seja inferior a ¼ (um quarto) do salário mínimo.
A redação do art. 20 da LOAS, acima mencionado, foi alterada pelas Leis nº 12.435, de 06-07-2011, e nº 12.470, de 31-08-2011, passando a apresentar, a partir desta última, o seguinte teor:
Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário-mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 1º Para os efeitos do disposto no caput, a família é composta pelo requerente, o cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 2º Para efeito de concessão deste benefício, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)
§ 3º Considera-se incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 4º O benefício de que trata este artigo não pode ser acumulado pelo beneficiário com qualquer outro no âmbito da seguridade social ou de outro regime, salvo os da assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 5º A condição de acolhimento em instituições de longa permanência não prejudica o direito do idoso ou da pessoa com deficiência ao benefício de prestação continuada. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)
§ 6º A concessão do benefício ficará sujeita à avaliação da deficiência e do grau de impedimento de que trata o § 2o, composta por avaliação médica e avaliação social realizadas por médicos peritos e por assistentes sociais do Instituto Nacional de Seguro Social - INSS. (Redação dada pela Lei nº 12.470, de 2011)
§ 7º Na hipótese de não existirem serviços no município de residência do beneficiário, fica assegurado, na forma prevista em regulamento, o seu encaminhamento ao município mais próximo que contar com tal estrutura. (Incluído pela Lei nº 9.720, de 30.11.1998)
§ 8º A renda familiar mensal a que se refere o § 3º deverá ser declarada pelo requerente ou seu representante legal, sujeitando-se aos demais procedimentos previstos no regulamento para o deferimento do pedido. (Incluído pela Lei nº 9.720, de 30.11.1998)
§ 9º A remuneração da pessoa com deficiência na condição de aprendiz não será considerada para fins do cálculo a que se refere o § 3º deste artigo. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)
§ 10. Considera-se impedimento de longo prazo, para os fins do § 2º deste artigo, aquele que produza efeitos pelo prazo mínimo de 2 (dois) anos. (Incluído pela Lei nº 12.470, de 2011)
No tocante ao idoso, o art. 38 da mesma Lei, com a redação dada pela Lei n.º 9.720, de 30 de novembro de 1998, dispunha (antes de ser revogado pela Lei 12.435/2011) que a idade prevista no art. 20 se reduz para 67 anos a partir de 1º de janeiro de 1998. Esta idade sofreu nova redução, desta feita para 65 anos, pelo art. 34, caput, da Lei n.º 10.741, de 1º de outubro de 2003 (Estatuto do Idoso), idade esta que deve ser considerada a partir de 1º de janeiro de 2004, data de início da vigência do Estatuto, nos termos do seu art. 118.
Logo, o direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: a) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, consoante a redação original do art. 20 da LOAS, ou impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, consoante a redação atual do referido dispositivo) ou idoso (neste caso, considerando-se, desde 1º de janeiro de 2004, a idade de 65 anos); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família.
Face a tanto, passo a analisar os requisitos específicos para o benefício pleiteado pela parte autora, cotejando-os com o caso concreto.
Condição de deficiente
A Constituição Federal, ao instituir o benefício, remete sua regulação à lei (conforme dispuser a lei, parte final do inciso V do art. 203). No entanto, conquanto seja atribuída à lei regular, concretizar, conformar, configurar ou organizar o direito à percepção do benefício da pessoa portadora de deficiência que não tenha condições de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, não pode, nesse desiderato, estabelecer um conceito restritivo de deficiência, por várias razões.
Em primeiro lugar, da análise da norma constitucional, verifico que consta o comando de que a assistência social será prestada a quem dela necessitar, o que demonstra inequivocamente a intenção constitucional de ampliação do conjunto de beneficiários da assistência social. Em linha de consequência, tal dispositivo (caput do art. 203) serve como princípio hermenêutico ou, se se preferir, como linha orientadora na interpretação dos demais dispositivos relativos à assistência social, entre os quais o do inciso V do mesmo artigo. Daí podemos inferir uma primeira conclusão, a de que se deve interpretar a locução pessoa portadora de deficiência (inciso V do art. 203) em um sentido amplo, jamais restritivo.
Em segundo, em sua importante missão de integrar a norma constitucional, não dispõe o legislador de liberdade plena. Ao revés, está limitado pelos preceitos da própria norma constitucional, sob pena de, a não ser assim, esvaziá-la de conteúdo. Nesse sentido, o ensinamento de JOSÉ JOAQUIM GOMES CANOTILHO:
"Em alguns casos, as remissões constitucionais para as leis significa abertamente a concretização da constituição segundo as leis. Todavia, este reenvio aberto não implica arbítrio legislativo de conformação, pois sempre se terá de admitir que o cerne da regulamentação legal é determinado materialmente, de forma expressa ou implícita, por princípios recebidos na lei constitucional". (Constituição dirigente e vinculação do legislador: contributo para a compreensão das normas constitucionais programáticas. Coimbra Editora, 1994, reimpressão, p. 485).
Nesse sentido, a Constituição limita o legislador, "as suas leis devem ater-se a esse norte, sobretudo ao dos direitos fundamentais e das normas restantes fixadas na Constituição" (KLAUS STERN, O Juiz e a Aplicação do Direito, in Direito Constitucional - Estudos em Homenagem a Paulo Bonavides, Eros Roberto Grau e Willis Santiago Guerra Filho (Org.), Malheiros Editores, São Paulo, 2001, p. 515).
Em terceiro, trata-se aqui de um direito fundamental, não só porque o art. 6º da Constituição Federal inclui entre os direitos sociais a assistência aos desamparados, mas principalmente porque o art. 203, inciso V, consagra expressa e cristalinamente a garantia (rectius: o direito) de um salário mínimo mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que se encontrem em situação de desamparo. Pois bem, no âmbito das normas constitucionais definidoras de direitos fundamentais, pode-se afirmar a existência de uma eficácia vinculante reforçada para todos os poderes públicos, inclusive o legislador (INGO WOLFGANG SARLET, A Eficácia dos Direitos Fundamentais, Livraria do Advogado, Porto Alegre, 1998). O citado autor, a respeito, assim ensina:
"Neste contexto, cumpre referir a paradigmática e multicitada formulação de Krüger, no sentido de que hoje não há mais falar em direitos fundamentais na medida da lei, mas, sim, em leis apenas na medida dos direitos fundamentais, o que - de acordo com Gomes Canotilho - traduz de forma plástica a mutação operada nas relações entre a lei e os direitos fundamentais. De pronto, verifica-se que a vinculação aos direitos fundamentais significa para o legislador uma limitação material de sua liberdade de conformação no âmbito de sua atividade regulamentadora e concretizadora. Para além disso, a norma contida no art. 5º, § 1º, da CF gera, a toda evidência, uma limitação das possibilidades de intervenção restritiva do legislador no âmbito de proteção dos direitos fundamentais. Se, por um lado, apenas o legislador se encontra autorizado a estabelecer restrições aos direitos fundamentais, por outro, ele próprio encontra-se vinculado a eles, podendo mesmo afirmar-se que o art. 5º, § 1º, da CF traz em seu bojo uma inequívoca proibição de leis contrárias aos direitos fundamentais, gerando a sindicabilidade não apenas do ato de edição normativa, mas também de seu resultado, atividade, por sua vez, atribuída à Jurisdição Constitucional. Isto significa, em última ratio, que a lei não pode mais definir autonomamente (isto é, de forma independente da Constituição) o conteúdo dos direitos fundamentais, o qual, pelo contrário, deverá ser extraído exclusivamente das próprias normas constitucionais que os consagram."
A necessidade de o legislador definir o conteúdo dos direitos fundamentais de forma vinculada com o sentido objetivo da norma constitucional é ressaltada pela doutrina mesmo nos casos, como o presente, em que a Constituição remete à lei a regulamentação ou concretização do direito fundamental. Nesse sentido, o ensinamento de JORGE MIRANDA:
"Mesmo quando a Constituição parece devolver para a lei a regulamentação de certos direitos ou institutos (...), o legislador não é livre de lhe emprestar qualquer conteúdo; a norma legislativa (insistimos) tem, na perspectiva global da Constituição, de possuir um sentido que seja compatível ou conforme com o sentido objectivo da norma constitucional. Fórmulas como "nos termos da lei" (...) ou equivalentes apenas podem indiciar que se trata de normas constitucionais não exeqüíveis por si mesmas" (Manual de Direito Constitucional, Tomo IV - Direitos Fundamentais, Coimbra Editora, Coimbra, 1993, pp. 280-1).
A doutrina constitucional, nacional ou estrangeira, é torrencial no sentido de que o legislador, em sua tarefa de concretização, está obrigatoriamente vinculado, antes de mais nada, ao texto constitucional, ou, em outras palavras, o texto constitucional limita a interpretação feita pelo legislador ao concretizar a norma constitucional (nesse sentido, KONRAD HESSE, El Texto Constitucional como Limite de la Interpretación, in División de Poderes e Interpretación, ANTONIO LÓPEZ PINA (Org.), Tecnos, Madrid, 1987). Em conseqüência, o legislador encontra-se vinculado ao conteúdo constitucionalmente declarado dos direitos fundamentais, caso se aparta desse, cabe ao juiz protegê-lo, com o que é o juiz e não a lei a garantia última dos direitos (FRANCISCO RUBIO LLORENTE, La Forma del Poder, Centro de Estudios Constitucionales, Madrid, 1997, pp. 339-340).
Por fim, a impossibilidade de a lei estabelecer um conceito restritivo de deficiência é reforçada em razão de um dos objetivos constitucionais que devem servir de base à organização da seguridade social, o de universalidade da cobertura e do atendimento (Constituição Federal, art. 194, parágrafo único, inciso I). Ora, caso se exigisse que, para perceber o benefício assistencial, deveria a pessoa ser portadora de deficiência que a incapacitasse não só para o exercício de atividade laboral, como para todos os atos da vida, a pessoa que se subsumisse na primeira hipótese (deficiência incapacitante para o trabalho) mas não na segunda (deficiência incapacitante para todos os atos da vida) ficaria completamente desprotegida da seguridade social - pois, evidentemente, não teria condições de ser segurado da previdência social -, em afronta ao princípio da dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III), ao objetivo da seguridade social de universalidade da cobertura e do atendimento (CF, art. 194, parágrafo único, I) e à ampla garantia de prestação da assistência social (CF, art. 203, caput).
Por todo o exposto, a exigência, para a percepção do benefício, de ser a pessoa incapaz para a vida independente, se entendida como incapacidade para todos os atos da vida, não se encontra na Constituição. Ao contrário, tal exigência contraria o sentido da norma constitucional, seja considerada em si, seja em sintonia com os demais princípios e objetivos constitucionais acima analisados. Se aquela fosse a interpretação para a locução "incapacitada para a vida independente", constante do art. 20, § 2º, da Lei n.º 8.742/93, o legislador teria esvaziado indevidamente o conteúdo material do direito fundamental da pessoa portadora de deficiência, deixando fora do seu âmbito uma ampla gama de pessoas portadoras de deficiência incapacitante para o trabalho, e, em consequência, incorreria em inconstitucionalidade.
Assim, a incapacidade para a vida independente a que se refere a Lei 8.742/93, na redação original, deve ser interpretada de forma a garantir o benefício assistencial a uma maior gama possível de pessoas portadoras de deficiência.
Nesse sentido, a incapacidade para a vida independente (a) não exige que a pessoa possua uma vida vegetativa ou que seja incapaz de locomover-se; (b) não significa incapacidade para as atividades básicas do ser humano, tais como alimentar-se, fazer a higiene e vestir-se sozinho; (c) não impõe a incapacidade de expressar-se ou de comunicar-se; e (d) não pressupõe dependência total de terceiros.
Precedentes do Egrégio Superior Tribunal de Justiça confortam tal entendimento, como demonstra a ementa a seguir transcrita:
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ART. 20, § 2º DA LEI 8.742/93. PORTADOR DO VÍRUS HIV. INCAPACIDADE PARA O TRABALHO E PARA PROVER O PRÓPRIO SUSTENTO OU DE TÊ-LO PROVIDO PELA FAMÍLIA. LAUDO PERICIAL QUE ATESTA A CAPACIDADE PARA A VIDA INDEPENDENTE BASEADO APENAS NAS ATIVIDADES ROTINEIRAS DO SER HUMANO. IMPROPRIEDADE DO ÓBICE À PERCEPÇÃO DO BENEFÍCIO. RECURSO DESPROVIDO.
I - A pessoa portadora do vírus HIV, que necessita de cuidados freqüentes de médico e psicólogo e que se encontra incapacitada, tanto para o trabalho, quanto de prover o seu próprio sustento ou de tê-lo provido por sua família - tem direito à percepção do benefício de prestação continuada previsto no art. 20 da Lei 8.742/93, ainda que haja laudo médico-pericial atestando a capacidade para a vida independente.
II - O laudo pericial que atesta a incapacidade para a vida laboral e a capacidade para a vida independente, pelo simples fato da pessoa não necessitar da ajuda de outros para se alimentar, fazer sua higiene ou se vestir, não pode obstar a percepção do benefício, pois, se esta fosse a conceituação de vida independente, o benefício de prestação continuada só seria devido aos portadores de deficiência tal, que suprimisse a capacidade de locomoção do indivíduo - o que não parece ser o intuito do legislador.
III - Recurso desprovido.
(STJ, 5ª Turma, RESP 360.202/AL, Rel. Min. Gilson Dipp, DJU de 01-07-2002)
No mesmo sentido, reiteradas decisões deste Tribunal (v.g., AC n. 2003.04.01.027597-7/PR, 5ª Turma, de minha relatoria, DJU de 14-06-2006; AC n. 2001.04.01.068468-6/SC, 5ª Turma, Rel. Des. Federal Antônio Albino Ramos de Oliveira, DJU de 10-04-2002; AC n. 2000.71.12.003233-1, 5ª Turma, Rel. Des. Federal Victor Luiz dos Santos Laus, DJU de 12-07-2006; AC n. 2005.04.01.012524-1/RS, 5ª Turma, Rel. Des. Federal Otávio Roberto Pamplona; AC n. 2002.71.04.000395-5/RS, 6ª Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, DJU de 19-04-2006; AC n. 2005.04.01.015590-7, 6ª Turma, Rel. Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, DJU de 27-07-2005).
Condição de deficiente no caso concreto
No caso dos autos, ANAURELINO BATISTA DE OLIVEIRA, brasileiro, nascido em 23/10/1965 (fl. 12), ajuizou, em 08/07/2013, ação contra o INSS, postulando a concessão do benefício assistencial de amparo ao deficiente, com efeitos financeiros retroativos à data do primeiro requerimento administrativo (05/03/2013, fl. 11).
O perito judicial, respondendo aos quesitos do INSS (fls. 50-51) e da parte autora (fl. 53), apontou que (fls. 59-61):
- O examinado apresenta claudicação leve por lesão no joelho esquerdo. Contudo, tem um quadro de insuficiência cardíaca, angina e arritmia que o impede de exercer atividades laborais.
- O quadro cardiológico é tratável, porém somente a evolução poderá definir se será reversível ou não.
- Sendo o periciando agricultor (código 6120-5 pela Classificação Brasileira de Ocupações), encontra-se incapacitado para todas as tarefas que fazem parte do seu trabalho habitual.
Assim, tendo o expert concluído que, efetivamente, a incapacidade é total e multifuncional, mostra-se preenchido o requisito sub examen.
Requisito econômico
No que diz respeito ao requisito econômico, é de ver-se que o parágrafo 3º do artigo 20 da Lei 8.742/93 (LOAS) prevê como critério para a concessão do benefício assistencial a idosos ou deficientes o fato de a renda familiar mensal per capita ser inferior a um quarto do salário mínimo.
Todavia, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar, em 18-04-2013, a Reclamação nº 4374 e o Recurso Extraordinário n. 567985, este com repercussão geral, reconheceu e declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da Lei 8.742/93 (LOAS), por considerar que o critério ali previsto está defasado para caracterizar a situação de miserabilidade.
Além disso, o Superior Tribunal de Justiça já havia reconhecido, em sede de Recurso Repetitivo, a possibilidade de demonstração da condição de miserabilidade por outros meios de prova, quando a renda per capita familiar fosse superior a ¼ do salário mínimo, como se vê do seguinte acórdão:
RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA, QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana, especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente a o cidadão social e economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. Recurso Especial provido.
(REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009)
Vale ressaltar, também, que sempre que os necessários cuidados com a parte autora, em decorrência de sua deficiência, incapacidade ou avançada idade, acarretarem gastos - notadamente com medicamentos, alimentação especial, fraldas descartáveis, tratamento médico, psicológico e fisioterápico, entre outros -, tais despesas podem ser levadas em consideração na análise da condição de miserabilidade da família do demandante. Aliás, se o objetivo do legislador, tanto o constituinte quanto o ordinário, é a proteção social reforçada da pessoa portadora de deficiência e do idoso, passa ao largo do princípio da razoabilidade entendimento que inclui na renda familiar - para efeito, justamente, de averiguar o preenchimento de requisito à concessão de benefício em favor daqueles - valores desde já comprometidos com os cuidados inerentes à incapacidade e à avançada idade. A posição aqui defendida, ademais, não afronta o entendimento do Supremo Tribunal Federal esposado na ADI 1.232-1, como demonstram as decisões monocráticas dos Ministros CARLOS VELLOSO (Reclamação 3891/RS - DJU de 09-12-2005), CELSO DE MELLO (Reclamações 3750/PR, decisão de 14-10-2005, e 3893/SP, decisão de 21-10-2005) e CARLOS BRITTO (RE 447370 - DJU de 02-08-2005).
Por fim, a eventual circunstância de a parte autora ser beneficiária e perceber renda proveniente do Programa Bolsa Família, que, segundo consta no site do Ministério do Desenvolvimento Social e de Combate à Fome (http://www.mds.gov.br/bolsafamilia/), "é um programa de transferência direta de renda que beneficia famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza em todo o País" e "tem como foco de atuação os 16 milhões de brasileiros com renda familiar per capita inferior a R$ 70 mensais, e está baseado na garantia de renda, inclusão produtiva e no acesso aos serviços públicos", não só não impede a percepção do benefício assistencial do art. 203, V, da Constituição Federal, como constitui forte indicativo de que a unidade familiar encontra-se em situação de risco social.
Requisito econômico no caso concreto
Na hipótese sub judice, o Parecer Social aposto aos autos (fls. 88-90) registra que o autor nunca frequentou a escola, aprendeu a escrever o nome com uma tia, reside em Porto Lucena onde trabalhou inicialmente como diarista e há 10 anos vive em uma moradia improvisada no galpão cedido por Valdino e Zilá de Gaspari. Mostra-se muito agradecido por ter sido acolhido pelo casal. Quando possível auxilia com alguns serviços, porém não recebe salário fixo, apenas alimentação e algumas roupas. Há dias em que ele não tem condições de trabalhar, pois sente muita dor na perna, devido a uma fratura que sofreu em um acidente e também por causa das dores no peito provocadas pelo infarto e outros problemas cardíacos.
Conforme seu relato, o lugar onde mora é ruim e com bastante pó. O cheiro é muito desagradável, tendo em vista que a ordenha das vacas é feita ao lado do seu quarto e da cozinha onde faz as refeições. Não tem condições financeiras para alugar uma casa ou de procurar outro lugar. Em razão disso, precisa se sujeitar a viver nesse local insalubre.
A par disso, a assistente social Michele Raquel Ackermann - CRESS 10º/9192, deixou consignado que Anaurelino carece de suporte familiar. A mãe encontra-se enferma e vive com a filha Dorila, que possui deficiência física, na cidade de Santa Rosa. Ambas estão sob os cuidados de Liliana, outra irmã do autor. Eliane e Oracila também residem em Santa Rosa. A irmã Helena mora em Porto Xavier e Djalmira, a quem não vê há mais de 25 anos, mora em Porto Alegre. De acordo com a sua análise, o autor vive em lugar impróprio, totalmente sem higiene em razão da sua incapacidade para o trabalho ocasionada pelas lesões e enfermidade, aliadas à ausência de recursos.
Em síntese, tendo em vista a situação fática, insta manter a sentença a quo, reconhecendo o direito da parte autora ao benefício assistencial pleiteado.
Implantação do benefício
Reconhecido o direito ao benefício, impõe-se a determinação para sua imediata implantação, nos termos do art. 461 do CPC (TRF4, Terceira Seção, QO-AC nº 2002.71.00.050349-7, Rel. p/ acórdão Des. Federal Celso Kipper).
A bem da celeridade processual, já que o INSS vem opondo embargos de declaração em todos os feitos nos quais determinada a implantação imediata do benefício, alegando, para fins de prequestionamento, violação dos artigos 128 e 475-O, I, do CPC e 37 da Constituição Federal de 1988, abordo desde logo a matéria.
Não se cogita de ofensa aos artigos 128 e 475-O, I, do CPC, porque a hipótese, nos termos do precedente da 3ª Seção, não é de antecipação, de ofício, de atos executórios. A implantação do benefício decorre da natureza da tutela judicial deferida.
Dessa forma, em vista da procedência do pedido e do que estabelecem os artigos 461 e 475-I, caput, bem como dos fundamentos expostos no precedente referido alhures, e inexistindo embargos infringentes, deve o INSS implantar o benefício em até 45 dias, conforme os parâmetros acima definidos, incumbindo ao representante judicial da autarquia que for intimado deste acórdão dar ciência à autoridade administrativa competente e tomar as demais providências necessárias ao cumprimento da tutela específica, sob pena de multa diária de R$ 100,00 (cem reais).
Correção monetária
A correção monetária, segundo o entendimento consolidado na 3ª Seção deste TRF4, incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, quais sejam:
- ORTN (10/64 a 02/86, Lei nº 4.257/64);
- OTN (03/86 a 01/89, Decreto-Lei nº 2.284/86);
- BTN (02/89 a 02/91, Lei nº 7.777/89);
- INPC (03/91 a 12/92, Lei nº 8.213/91);
- IRSM (01/93 a 02/94, Lei nº 8.542/92);
- URV (03 a 06/94, Lei nº 8.880/94);
- IPC-r (07/94 a 06/95, Lei nº 8.880/94);
- INPC (07/95 a 04/96, MP nº 1.053/95);
- IGP-DI (05/96 a 03/2006, art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6.º, da Lei n.º 8.880/94);
- INPC (de 04/2006 a 29/06/2009, conforme o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, combinado com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91).
- TR (a partir de 30/06/2009, conforme art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/2009)
O Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento das ADIs 4.357 e 4.425, declarou a inconstitucionalidade por arrastamento do art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/2009, afastando a utilização da TR como fator de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública, relativamente ao período entre a respectiva inscrição em precatório e o efetivo pagamento.
Em consequência dessa decisão, e tendo presente a sua ratio, a 3ª Seção desta Corte vinha adotando, para fins de atualização dos débitos judiciais da Fazenda Pública, a sistemática anterior à Lei nº 11.960/2009, o que significava, nos termos da legislação então vigente, apurar-se a correção monetária segundo a variação do INPC, salvo no período subsequente à inscrição em precatório, quando se determinava a utilização do IPCA-E.
Entretanto, a questão da constitucionalidade do uso da TR como índice de atualização das condenações judiciais da Fazenda Pública, no período antes da inscrição do débito em precatório, teve sua repercussão geral reconhecida no RE 870.947, e aguarda pronunciamento de mérito do STF. A relevância e a transcendência da matéria foram reconhecidas especialmente em razão das interpretações que vinham ocorrendo nas demais instâncias quanto à abrangência do julgamento nas ADIs 4.357 e 4.425.
Recentemente, em sucessivas reclamações, a Suprema Corte vem afirmando que no julgamento das ADIs em referência a questão constitucional decidida restringiu-se à inaplicabilidade da TR ao período de tramitação dos precatórios, de forma que a decisão de inconstitucionalidade por arrastamento foi limitada à pertinência lógica entre o art. 100, § 12, da CRFB e o artigo 1º-F da Lei 9.494/97, na redação dada pelo art. 5º da Lei 11.960/2009. Em consequência, as reclamações vêm sendo acolhidas, assegurando-se que, ao menos até que sobrevenha decisão específica do STF, seja aplicada a legislação em referência na atualização das condenações impostas à Fazenda Pública, salvo após inscrição em precatório. Os pronunciamentos sinalizam, inclusive, para eventual modulação de efeitos, acaso sobrevenha decisão mais ampla quanto à inconstitucionalidade do uso da TR para correção dos débitos judiciais da Fazenda Pública (Rcl 19.050, Rel. Min. Roberto Barroso; Rcl 21.147, Rel. Min. Cármen Lúcia; Rcl 19.095, Rel. Min. Gilmar Mendes).
Em tais condições, com o objetivo de guardar coerência com os mais recentes posicionamentos do STF sobre o tema, e para prevenir a necessidade de futuro sobrestamento dos feitos apenas em razão dos consectários, a melhor solução a ser adotada, por ora, é orientar para aplicação do critério de atualização estabelecido no art. 1º-F da Lei 9.494/97, na redação da lei 11.960/2009.
Este entendimento não obsta a que o juízo de execução observe, quando da liquidação e atualização das condenações impostas ao INSS, o que vier a ser decidido pelo STF em regime de repercussão geral, bem como eventual regramento de transição que sobrevenha em sede de modulação de efeitos.
Juros de mora
Até 29-06-2009 os juros de mora, apurados a contar da data da citação, devem ser fixados à taxa de 1% ao mês, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009. Os juros devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, 5ª Turma, AgRg no AgRg no Ag 1211604/SP, Rel. Min. Laurita Vaz).
Quanto ao ponto, esta Corte já vinha entendendo que no julgamento das ADIs 4.357 e 4.425 não houvera pronunciamento de inconstitucionalidade sobre o critério de incidência dos juros de mora previsto na legislação em referência.
Esta interpretação foi, agora, chancelada, pois no exame do recurso extraordinário 870.947, o STF reconheceu repercussão geral não apenas à questão constitucional pertinente ao regime de atualização monetária das condenações judiciais da Fazenda Pública, mas também à controvérsia pertinente aos juros de mora incidentes.
Em tendo havido a citação já sob a vigência das novas normas, inaplicáveis as disposições do Decreto-lei 2.322/87, incidindo apenas os juros da caderneta de poupança, sem capitalização.
Honorários advocatícios
No ponto, impõe-se a observância do que dispõe a Súmula 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência". Assim, a verba honorária a ser paga pelo INSS resta fixada em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação.
Custas processuais
Neste aspecto, especificamente, merece parcial provimento a remessa oficial, pois o INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS),
Conclusão
Confirmada a sentença que julgou procedente o pedido de benefício assistencial, com efeitos desde a data do requerimento administrativo, isentando o INSS dos valores referentes às custas processuais.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao apelo do INSS e à remessa oficial, tão somente para adequar consectários.
Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 20/10/2015
APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0011305-80.2015.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00021228920138210124
RELATOR | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Jorge Luiz Gasparini da Silva |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | ANAURELINO BATISTA DE OLIVEIRA |
ADVOGADO | : | Luiz Alfredo Ost e outro |
REMETENTE | : | JUIZO DE DIREITO DA 1A VARA DA COMARCA DE SANTO CRISTO/RS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 20/10/2015, na seqüência 81, disponibilizada no DE de 02/10/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DO INSS E À REMESSA OFICIAL, TÃO SOMENTE PARA ADEQUAR CONSECTÁRIOS.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO | |
: | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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